Edição

A ameaça das interceptações telefônicas clandestinas

5 de julho de 2003

Compartilhe:

O Brasil vem acompanhando, nos últimos anos, um forte incremento nas atividades do chamado Crime Organizado, o qual, apoiado na inércia do aparelho repressor do Estado, e no poder corruptor do narco-dólar, constitui-se em uma séria ameaça ao cidadão e à tranqüilidade social.

Uma das características que distingue o crime organizado do crime comum é a existência de uma estrutura hierarquizada voltada para a realização de eventos criminosos seletivos e planejados, e que conta com vultosas verbas, livres de qualquer burocracia.

A mídia nacional apresenta, quase que diariamente reportagens que apresentam as ações cada vez mais inteligentes e audaciosas dessa modalidade criminosa, chegando ao ponto da tentativa de intimidação, chantagem, ou mesmo a execução de autoridades constituídas do Estado.

Com o constante refinamento de suas atividades, e com a crescente necessidade de obterem informações confidencias sobre seus possíveis alvos, ou sobre as autoridades que os investigam, cada vez mais os criminosos passam a fazer uso da interceptação telefônica ilegal, o chamado “grampo telefônico”, para fins de planejamento criminoso ou para chantagem.

Na área política são bastante conhecidos os últimos escândalos que envolveram a utilização da interceptação telefônicas clandestina por parte de notórias personalidades políticas, com o objetivo de obter informações para a montagem de “Dossiês”, destinados a desmoralizar ou afetar a carreira política de seus adversários.

Na área do judiciário já foram constatados alguns casos de utilização da interceptação clandestina contra Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, um dos quais apresentados na imprensa, enquanto outros não tiveram publicidade, a pedido dos interessados.

Na área econômica a interceptação ilegal é utilizada como uma importante arma na guerra econômica que muitas empresas travam entre si, buscando obter o maior número de dados sigilosos sobre as concorrentes, e que possam representar vantagens competitivas no mercado.

No plano internacional pesa contra privacidade das nossas comunicações telefônicas o grandioso esquema internacional de interceptações chamado “Echelon”, comandado pelos Estados Unidos da América e Grã-Bretanha, com capacidade para gravar qualquer comunicação dos satélite por eles controlados. Exemplo claro disso foi a divulgação, pelas autoridades do Pentágono, das comunicações entre os militares de alta patente do Iraque, por ocasião da última guerra.

Vez por outra a indústria de telefonia celular lança novos modelos assegurando que os mesmos tem garantias contra “grampo”. Isto é até possível, mas por tempo limitado, uma vez que a história mostra que a cada nova tecnologia de segurança das comunicações lançada, haverá sempre alguém realizando estudos para quebrá-la; tem sido assim durante todas as guerras. Hitler começou a perder a 2ª Guerra Mundial quando acreditou na garantia de seus generais de que haviam inventado uma máquina cifradora cujo código era inquebrável; ingleses e poloneses rapidamente o quebraram e decifraram todas as comunicações dos alemães.

A despeito da Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, que regula os casos em que as interceptações telefônicas são autorizadas para fins investigativos, é grande o número de pessoas dispostas a realizar este tipo de trabalho ilegal; basta procurar nos classificados dos grandes jornais. Isto nos leva à suposição de que deve ser uma atividade bastante rendosa e que vale o risco.

Verifica-se, assim, que o direito constitucional que assegura a privacidade das comunicações não pode ser adequadamente assegurado, uma vez que a quase totalidade das organizações governamentais dos três poderes não dispõem de um setor competente  de especialistas em segurança das comunicações que inspecionem, periodicamente, as linhas telefônicas das autoridades constituídas e dos funcionários graduados detentores de informações confidenciais, bem como que realizem a inspeção dos ambientes onde são tratados assuntos confidenciais

A despeito dos sucessivos escândalos e das sucessivas comprovações do uso indiscriminado das interceptações clandestinas, é surpreendente o fato de que muitas autoridades, talvez por ignorarem que o problema tem solução, não adotem medidas preventivas de segurança das comunicações, uma vez que existem empresas com especialistas e tecnologia avançada para detectar a existência de “grampos” telefônicos.

De qualquer forma, vale o ditado popular que diz “é melhor prevenir do que remediar”. Assim sendo, é sempre recomendável que tanto na esfera pública, como privada, as pessoas se habituem a evitar tratar ao telefone, de assuntos sigilosos ou mesmo assuntos de ordem pessoal que possam ser utilizados por criminosos e desafetos políticos, econômicos ou de relacionamentos amorosos para fins de chantagem ou extorsão.

No entanto, como poucos mantém essa disciplina, é recomendável que cada organização estabeleça um programa de segurança das comunicações telefônicas, que inclua, além das linhas, a inspeção eletrônica dos ambientes onde são tratados assuntos confidenciais, no sentido de detectar a existência de dispositivos clandestinos de escuta, os populares “bugs”.

As autoridades também devem se precaver contra a utilização de aparelhos celulares como transmissores – bastante utilizada e pouco percebida – adotando a utilização de equipamentos que neutralizam essas transmissões e que dão resultados bastante efetivos.

Finalmente, já é tempo de as autoridades dos três poderes da república reconhecerem que qualquer uma delas pode ser alvo da ação do crime organizado, adotando todas as medidas de segurança que possam minimizar as possibilidades de sucesso das organizações criminosas, ou de delinquentes que atuam individualmente por interesses políticos ou econômicos.