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A Lei de Responsabilidade Fiscal e os Tribunais de Contas (final)

5 de novembro de 2001

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Os objetivos fundamentais da Lei de Responsabilidade Fiscal e a atuação dos Tribunais de Contas

A Lei de Responsabilidade Fiscal está formada por linhas centrais que objetivam modificar a conduta dos agentes públicos, em razão dos fatos comprovarem que eles arrecadam mal e gastam sem qualquer planejamento e, em muitas ocasiões, sem vinculação com o interesse nacional.

Busca, pelas modificações introduzidas, que a eficiência administrativa na gestão fiscal imponha equilíbrio nas contas públicas, a fim de que abra-se espaço para que as atividades administrativas voltem-se ao atendimento das necessidades de saúde, educação, segurança, amparo à velhice, proteção à infância, ser erradicada à pobreza, surgindo assim o desenvolvimento que a cidadania reclama.

O exame primeiro da lei dá a impressão de que ela contém regras que afetarão o princípio federativo, pela falsa sensação que se tem da posição intervencionista que a União passa a adotar em face dos Estados e dos Municípios.

O seguimento, contudo, de uma interpretação sistêmica da Constituição Federal, partindo-se dos propósitos moralizadores insculpidos no seu art. 37, em combinação com as disposições dos arts. 1º e 3º, permite a conclusão de que a Lei de Responsabilidade Fiscal não gera nenhum conflito com os desígnios federativos. Ela cultua a moralidade, a legalidade, a impessoalidade, a eficiência nas realizações administrativas, tudo em benefício do bem comum. Essa circunstância não interfere na autonomia dos Estados e dos Municípios, pois, eles, também, devem filiar-se aos mesmos propósitos.

A atenção dos Tribunais de Contas no tratar com essa lei deve voltar-se para os seus aspectos fundamentais e que podem ser resumidos no esquema que passo a registrar:

a) Confere aos Tribunais de Contas um controle singular da gestão fiscal, fortalecendo tais órgãos.

b) Ela estabelece os princípios essenciais e as normas gerais de finanças públicas, além de definir o que deve ser acatado como gestão fiscal responsável.

c) A implantação do abaixo seqüenciado está entre os objetivos da Lei Complementar nº 101, de 04.05.2000: c.1 – um tipo de controle das despesas que acabe com o déficit público; c.2 – uma política tributária estável e previsível; c.3 – contenção e delimitação da dívida pública; c.4 – prudência na gestão financeira e patrimonial; c.5 – transparência de todos os gastos públicos; c.6 – medidas para evitar desvios da política de equilibrar as contas públicas;. c.7 – vias  de restrição ao endividamento público; c.8 – conduta administrativa que obrigue compensar despesas de longo prazo com a redução de outras despesas ou aumento de receitas; c.9 – um rígido regulamento para o inter-relacionamento fiscal dos entes da Federação.

d) A finalidade maior da lei é a consolidação de uma cultura de que a máquina do Estado deve servir ao cidadão e não aos governantes.

e) A sua destinação é de adotar estabilidade fiscal, de forma gradativa, proporcionando tempo para que seja encontrada solução para o desequilíbrio das contas públicas, reduzindo, assim, os impactos negativos que esse desencontro de contas provoca sobre os investimentos públicos básicos (saúde, educação, segurança, proteção ao meio ambiente, lazer), sobre os meios de produção, sobre a renda dos indivíduos e sobre a capacidade das empresas aumentar a oferta de empregos.

f) A sua aprovação faz parte da estratégia adotada pelo Governo para sair da crise financeira que atualmente impede o desenvolvimento econômico da Nação, optando por um ajuste rápido e suficiente para, no menor tempo possível, alcançar o nível desejado que é o equilíbrio entre receitas e despesas.

g) A lei tem como filosofia econômica reduzir o déficit público, para evitar o aumento dos juros, a diminuição dos investimentos e, conseqüentemente, a redução do crescimento dos setores empresariais.

h) A sua finalidade específica é de mudar, de forma definitiva,  ambiente fiscal, resolvendo o problema do déficit público, para que o Brasil volte a crescer sem depender da poupança externa.

É importante a compreensão sobre o sentido político da Lei de Responsabilidade Fiscal, para que a sua interpretação seja feita, pelos Tribunais de Contas, de modo que valorize os seus verdadeiros propósitos.

A sua aplicação não pode ficar desvinculada dos princípios que inspiraram o legislador para a sua elaboração, acatando proposta do Executivo.

Esses princípios podem ser escalonados, de forma resumida, como sendo:

– o da necessidade de ser estabelecido um processo de mudanças básicas nos ambientes institucionais vinculados à gestão fiscal;

– o de ser priorizada conduta administrativa que implique em redução de despesas;

– o de afastar os beneficiários de privilégios do âmbito do setor público;

– o de fazer aumentar as receitas, especialmente, com a adoção de política fiscal que consiga reduzir ou acabar a sonegação;

– o de que deve ser instituída uma gestão fiscal responsável, com absoluta prioridade para o controle do gasto e do endividamento.

Uma outra visão que deve ser formada sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal é de que ela faz parte de um conjunto de medidas legais que visam mudanças institucionais. Integra esse complexo, também, leis vigentes que limitam despesas com pessoal (Lei Rita Camata), a tudo juntando-se uma Lei Geral da Previdência dos Servidores Públicos e outras que tratarão da reformulação do processo orçamentário.

Saliente-se, por último, embora já tenha tratado do assunto, que os Tribunais de Contas, no contexto constitucional onde atualmente eles estão inseridos, não exercem função pura de órgãos auxiliares do Poder Legislativo, como pode parecer claro no art. 70 da Carta Magna.

A sua competência é de natureza mais ampla. É exercida por determinação constitucional que exige deliberação de forma colegiada a respeito de como os recursos públicos foram aplicados. Impõe um julgamento gerador de responsabilidades, quando os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da eficiência, da continuidade do serviço público, da prudência administrativa e da publicidade são violados.

A destinação de auxiliar o Poder Legislativo tem conotação técnica e representa uma das etapas para a consumação do controle externo da Administração Pública exercida por aquele Poder.

Os Tribunais de Contas, em face da Lei de Responsabilidade Fiscal, recebem atribuições mais ampliadas, passando a serem concebidos como órgãos com competência privativa para impor o desejado equilíbrio fiscal.

Ele, ao julgar contas públicas, assume posição definida no texto da mencionada Lei Complementar, a reforçar o entendimento já anteriormente manifestado pela doutrina de que tais instituições manifestam, por suas decisões, vontade estatal, o que não se permite interpretar que sobre os mesmos fatos ocorram duplicidade de pronunciamentos.

A posição constitucional dos Tribunais de Contas, no exercício de auxiliar o Poder Legislativo na atividade de controlar, externamente, os atos da Administração Pública e julgar as contas anuais do Chefe do Poder Executivo, deve ser compreendida como sendo eles parte de um procedimento onde atua como órgão formado por “um conjunto orgânico perfeitamente autônomo¹”.

Inserido nesse contexto, sem qualquer subordinação hierárquica, a sua relação com o Legislativo é de colaboração técnica, pelo que as suas decisões assumem relevo de confiabilidade quando obedientes aos princípios do ordenamento jurídico.

É de se anotar que, em referência à Lei de Responsabilidade Fiscal, os Tribunais de Contas receberam, por força do art. 56, ampliação de suas atribuições no referente ao parecer prévio e a amplitude do controle. Essa nova feição dos Tribunais de Contas deve influir na interpretação a ser dada, em seus acórdãos, à referida lei, não só porque ela visa, como já afirmado, encontrar o equilíbrio da gestão fiscal, bem como, ser veículo contribuidor para que o estado, no aplicar as receitas que lhe são destinadas, não se afaste dos princípios fundamentais postos na Carta Magna, especialmente, aqueles que cuidam de potencializar a democracia, dando ênfase a garantia dos direitos fundamentais do cidadão.

Mecanismos de controle e de fiscalização das contas que podem ser utilizados pelos Tribunais de Contas

A Lei de Responsabilidade Fiscal outorga aos Tribunais de Contas novos mecanismos jurídicos de controle e de fiscalização das contas públicas, além dos já existentes. Esses novos instrumentos apresentam-se, em tese, eficazes para os fins a que eles se destinam. O que se faz necessário é que sejam bem aplicados e deles afastadas quaisquer influências que descaracterizem os resultados que eles produzem.

Esses mecanismos não estão exaustivamente consagrados no texto da Lei. Merecem destaques, entre outros, os que devem ser utilizados pelos Tribunais de Contas, ora agindo diretamente sobre o ato de gestão fiscal com a adoção de providências que permitam adequá-lo à lei, ora tomando medidas preventivas, para que o equilíbrio fiscal seja atingido.

É da competência dos Tribunais de Contas:

– alertar os gestores das contas públicas de que estão descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 59, § 1º);

– fazer uso dos instrumentos ancorados na Lei de Diretrizes Orçamentárias para fins de exercício do controle de custos e resultados;

– acompanhar e controlar os saldos dos créditos abertos, investigando se estão sendo obedecidos os limites pretendidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 38, § 3º);

– controlar as dívidas consolidadas e mobiliárias (art. 31, § 4º, da LC nº 101);

– impor medidas para a limitação do poder de efetuar despesas (art. 5º, § 5º, da Lei de Responsabilidade Fiscal);

– emitir pareceres prévios, separadamente, sobre as contas anuais do Chefe do Poder Executivo, do Legislativo e do Judiciário;

– assinar prazo razoável para que o órgão da administração corrija desvios praticados ou que está praticando na execução de negócios jurídicos bilaterais ou plurilaterais;

– sustar a execução ou a continuação de qualquer contrato ou atividade administrativa que apresente violação à lei ou, se a União figurar como contratante, representar ao Congresso Nacional para que efetue a sustação;

– buscar, nos registros dos órgãos dos Poderes, informações necessárias para expedir o ato de alerta, para julgar as contas ou para emitir os pareceres prévios;

– declarar nulo, de pleno direito, qualquer ato que aumente a despesa com pessoal e não atenda, ainda, aos requisitos que estão expostos nos arts. 4º, § 1º; 16, I, II, 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e nos arts. 37, XIII, 169, § 1º da CF;

– declarar a nulidade de pleno direito de ato de desapropriação de imóvel urbano, quando não atendidos os requisitos do art. 182, § 3º da Constituição Federal;

– declarar a vedação de unidades da federação receberem transferências voluntárias e contratarem operações de crédito por ter havido descumprimento do art. 51 da Lei de Responsabilidade Fiscal (dever de encaminhamento das contas ao Poder Executivo, por parte dos Estados e Municípios, para consolidação e publicação); e/ou por não ter reduzido a despesa com pessoal (art. 23, da Lei de responsabilidade Fiscal, em combinação com o art. 169, § 2º da CF); e por não ter tomado providências administrativas para o pleno exercício das atividades relativas à cobrança dos tributos devidos de acordo com as regras do ordenamento jurídico;

– exigir cumprimento das sanções previstas no art. 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal, quando a despesa total com pessoal exceder a noventa e cinco por cento do previsto pelo art. 20 da mesma lei;

– representar ao Ministério Público contra os agentes administrativos que, ao descumprirem as normas da Lei de Responsabilidade Fiscal, cometem ilícitos penais, infrações que deverão ser apuradas e punidas segundo as prescrições do Código Penal, das Leis nº 1.079, de 1950, e 8.429, de 1991, do Decreto-lei nº 201, de 1967, e demais diplomas legais pertinentes, enquanto não for aprovada a Lei que vai definir, especificamente, os crimes cometidos contra a gestão fiscal.

Outros mecanismos de controle e fiscalização podem ser utilizados pelos Tribunais de Contas. O rol acima apresentado não é exaustivo. Há de se compreender que a Lei de Responsabilidade Fiscal abre espaço para que, qualquer tipo de irregularidade praticada pelos agentes públicos seja, imediatamente, apurada e punida, quer na órbita administrativa, quer no âmbito político, quer pelo Poder Judiciário.

Os Tribunais de Contas e os Conselhos de Gestão Fiscal

O art. 67 da Lei de Responsabilidade Fiscal instituiu uma inédita forma de controle da gestão fiscal. É a que passa a ser feita pelos Conselhos de Gestão Fiscal.

O referido dispositivo dispõe: “Art. 67. O acompanhamento e a avaliação, de forma permanente, da política e da operacionalidade da gestão fiscal serão realizados por conselho de gestão fiscal, constituído por representantes de todos os Poderes e esferas de Governo, do Ministério Público e de entidades técnicas representativas da sociedade, visando a:

I – harmonização e coordenação entre os entes da Federação;

II – disseminação de práticas que resultem em maior eficiência na alocação e execução do gasto público, na arrecadação de receitas, no controle do endividamento e na transparência da gestão fiscal;

III – adoção de normas de consolidação das contas públicas, padronização das prestações de contas e dos relatórios e demonstrativos de gestão fiscal de que trata esta Lei Complementar, normas e padrões mais simples para os pequenos Municípios, bem como outros, necessários ao controle social;

IV – divulgação de análises, estudos e diagnósticos.

§ 1º – O conselho a que se refere o caput instituirá formas de premiação e reconhecimento público aos titulares de Poder que alcançarem resultados meritórios em suas políticas de desenvolvimento social, conjugados com a prática de uma gestão fiscal pautada pelas normas desta Lei Complementar.

§ 2º – Lei disporá sobre a composição e a forma de funcionamento do conselho.”

A instalação e funcionamento de tais Conselhos está na dependência da lei ordinária que deverá ser aprovada fixando a sua composição e a forma do seu funcionamento.

A seguir-se, rigorosamente, a vontade do legislador expressada no caput do art. 67, evidencia-se que representante do Tribunal de Contas integrará esses Conselhos.

É verdade que a doutrina há de esclarecer, de modo bem claro, as atribuições desses Conselhos, de modo que eles atuem de acordo com os propósitos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Conceitos novos firmados pela Lei de Responsabilidade Fiscal sobre entidades financeiras e a sua absorção pelos Tribunais de Contas

Não pode ficar sem comentário a técnica adotada na elaboração da Lei de Responsabilidade Fiscal de conceituar várias entidades de natureza financeira, fiscal e contábil.

Essas novas conceituações adotadas pelo legislador devem ser vistas como inseridas no contexto reformulador da norma aprovada e com a finalidade de evitar discussões teóricas sobre os fins que visam atingir.

Uma nova cultura interpretativa deve ser adotada pelos Tribunais de Contas a respeito de tais entidades, passando a trabalhar com elas de acordo com os elementos dispostos na lei para a configuração que elas passam a ter.

O espaço reservado a este trabalho não permite um aprofundamento sobre o tema, pelo que passo a enumerar, sem qualquer comentário, os conceitos firmados pela lei, adotando os seus termos, para as entidades seguintes:

Gestão fiscal: “A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência ao disciplinamento imposto para a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar” (art. 1º, § 1º);

Empresa controlada: “sociedade cuja maioria do capital social com direito a voto pertença, direta ou indiretamente, a ente da Federação” (art. 2º, II);

Empresa estatal dependente: “empresa controlada que receba do ente controlador recursos financeiros para pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária” (art. 2º, III);

Receita corrente líquida: “somatório das receitas tributárias, de contribuições, patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também correntes, deduzidos” (art. 2º, IV):

d.1 – na União, as quantias de dinheiro transferida aos Estados e Municípios por determinação constitucional ou legal, e as contribuições mencionadas na alínea a do inciso I e no inciso II do art. 195, e no art. 239 da Constituição;

d.2 – nos Estados, as parcelas entregues aos Municípios por determinação constitucional;

d.3 – na União, nos Estados e nos Municípios, a contribuição dos servidores para o custeio da sua previdência e assistência social e as receitas provenientes da compensação financeira citada no § 9º do art. 201 da Constituição².

Apuração de receita corrente líquida: “A receita corrente líquida será apurada somando-se as receitas arrecadadas no mês em referência e nos onze anteriores, excluídas as duplicidades” (art. 2º, § 3º);

Responsabilidade na gestão fiscal: “Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação” (art. 11);

Renúncia de receita: “A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado” (art. 14, § 1º);

Adequação de despesa com a lei orçamentária anual: “Para os fins desta Lei Complementar, considera-se: – adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados o círculo financeiro estabelecido para o exercício (art. 16, § 1º);

Compatibilidade de despesa com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias: Considera-se, para os fins da LC nº 101, de 04.05.2000, “compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas estabelecidas nesse instrumento e não infrinja qualquer de suas disposições” (art. 16, § 1º, II);

Despesa obrigatória de caráter continuado: “Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios” (art. 17);

Aumento permanente de receita: “… o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição” (art. 17, § 3º);

Aumento de despesa: Passou a ser, também, a prorrogação daquela criada por prazo determinado” (art. 17, § 7º);

Despesa total de pessoal: “Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência” (art. 18);

Transferências voluntárias de recursos: “Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde” (art. 25);

Dívida pública consolidada ou fundada: “montante total, apurado sem duplicidade, das obrigações financeira do ente da Federação, assumidas em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados e da realização de operações de crédito, para amortização em prazo superior a doze meses” (art. 29, I);

Dívida pública mobiliária: “dívida pública representada por títulos emitidos pela União, inclusive os do Banco Central do Brasil, Estados e Municípios” (art. 29, II);

Operação de crédito: “compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros” (art. 29, III), a tanto equiparando-se “a operação de crédito a assunção, o reconhecimento ou a confissão de dívida pelo ente da Federação, sem prejuízo do cumprimento das exigências dos arts. 15 e 16” (art. 29, § 1º);

Concessão de garantia: “compromisso de adimplência de obrigação financeira ou contratual assumida por ente da Federação ou entidade a ele vinculada” (art. 29, IV);

Refinanciamento da dívida mobiliária: “emissão de títulos para pagamento do principal acrescido da atualização monetária” (art. 29, V);

Operações de crédito por equiparação: “Equiparam-se a operações de crédito e estão vedados: I – captação de recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido, sem prejuízo do disposto no § 7º do art. 150 da Constituição; II – recebimento antecipado de valores de empresa em que o Poder Público detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital social com direito a voto, salvo lucros e dividendos, na forma da legislação; III – assunção direta de compromisso, confissão de dívida ou operação assemelhada, com fornecedor de bens, mercadorias ou serviços, mediante emissão, aceite ou aval de título de crédito, não se aplicando esta vedação a empresas estatais dependentes; IV – assunção de obrigação, sem autorização orçamentária, com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e serviços” (art. 37).

Esses conceitos são de natureza fechada, por estarem concentrados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Eles ingressam na órbita jurídica do modo que o legislador os assentou. A doutrina e a jurisprudência têm pouco campo de ação para discuti-los, pelo que a obediência dos Tribunais de Contas as linhas por eles fixadas é de imediato e sem restringir ou ampliar o raio das ações por eles delimitadas.

Conclusão

De tudo quanto exposto, sem esgotamento da análise dos vínculos dos Tribunais de Contas com a Lei de Responsabilidade Fiscal, há lugar para a afirmação de que a doutrina e a jurisprudência têm um campo fértil para trabalhar, com o objetivo de determinar uma compreensão dessa norma complementar de acordo com a filosofia por ela adotada.

São relevantes para o desenvolvimento da Nação todos os aspectos regulados pela Lei Complementar nº 101, de 04.05.2000. Ela, se bem aplicada, imporá sérias mudanças no cenário nacional no tocante à gestão de recursos públicos. As complexidades que ela possui criam dificuldades para a sua compreensão na maioria das situações reguladas. A sua marca maior, no tocante ao aspecto formal, é o seu elevado caráter técnico, com a redefinição de conceitos, princípios e normas de ordem financeira e econômica, introduzindo modificações no comportamento de agentes públicos não afeitos ao controle por ela introduzido.

Há acenos de parte da doutrina levantando a inconstitucionalidade de alguns dispositivos, a exemplificar o art. 20. Alega-se que há quebra do princípio federativo.

Os Tribunais de Contas não devem, ao meu entender, desenvolver preocupações com tais reivindicações. Cumpre-lhes, de imediato, emitir julgados que reflitam na instalação de condições para o seu efetivo respeito e alcance: o de, no menor prazo possível, impor o equilíbrio das contas públicas. Os incidentes de inconstitucionalidade sobre artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal serão apreciados pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. Esta Suprema Corte avaliará a harmonização ou não dos dispositivos legais com a Constituição Federal. Enquanto tal não ocorrer, ela impera em todos os sentidos, pela presunção de que está de conformidade com os princípios maiores da Carta Magna.

É de todo conveniente registrar que este trabalho abordou, de modo superficial, a repercussão da Lei de Responsabilidade Fiscal nas atribuições constitucionais dos Tribunais de Contas. Nele não há pretensão do assunto ter sido esgotado. Muito tem, ainda, a ser investigado e interpretado, para que tais Cortes possam desempenhar com facilidade a missão que lhe é confiada.

Notas _____________________________________________________________________

¹ A expressão “conjunto orgânico perfeitamente autônomo” é da autoria de Celso de Melo, in RDP 72/137.

² Guardou-se fidelidade ao texto da lei.