Acumulação de cargos públicos

1 de agosto de 2013

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Erika Cilena BaumannA Constituição federal veda em seu artigo 37, XVI, a acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públicas, salvo, exceções expressamente previstas e quando houver compatibilidade de horários. Verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(…)
XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI.
a) a de dois cargos de professor;

b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico;
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas; (g.n.)

José dos Santos Carvalho Filho1 assevera que:

O fundamento da proibição é impedir que o cúmulo de funções públicas faça com que o servidor não execute qualquer delas com a necessária eficiência. Além disso, porém, pode-se observar que o Constituinte quis também impedir a cumulação de ganhos em detrimento da boa execução das tarefas públicas.

O próprio texto constitucional estende a proibição às empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público, conforme literalidade do inciso XVII, do artigo 37.

Art. 37 omissis
(…)
XVII – a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público; (g.n.) 

Da leitura do inciso XVI, do art. 37, supracitado, depreende-se que a acumulação remunerada de cargos, empregos e funções pública só será lícita quando decorrente do exercício de dois cargos de professor; um cargo de professor com outro técnico ou científico; ou dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas, e, desde que haja compatibilidade de horários e respeito ao teto remuneratório.

A celeuma que se traz aqui, contudo, diz respeito à verificação do requisito relativo à compatibilidade de horários.

À primeira vista, poder-se-ia concluir que a simples verificação quanto a não coincidência de horários seria suficiente para aferir a ausência de ilicitude na acumulação de cargos prevista no art. 37, XVI, acima comentado.

Contudo, a questão afigura-se controvertida.

Isso porque, embora não haja fixação legal acerca da jornada máxima permitida, em se tratando de hipótese de acumulação lícita de cargos, a Advocacia Geral da União – AGU manifestou-se por meio do parecer AGU/WM-9/98 (Anexo ao Parecer GQ-145), cuja ementa segue abaixo transcrita:

Ilícita a acumulação de dois cargos ou empregos de que decorra a sujeição do servidor a regimes de trabalho que perfaçam o total de oitenta horas semanais, pois não se considera atendido, em tais casos, o requisito da compatibilidade de horários.

Nessa esteira, o Tribunal de Contas da União vem se posicionando no seguinte sentido:

ADMISSÕES. MINISTÉRIO DA SAÚDE. ACUMULAÇÃO DE CARGO PÚBLICO COM EMPREGOS NA INICIATIVA PRIVADA. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIO. ACUMULAÇÃO DE TRÊS CARGOS PÚBLICOS. VEDAÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL. ILEGALIDADE DE DOIS ATOS. NEGATIVA DE REGISTRO. LEGALIDADE DOS DEMAIS ATOS. REGISTRO.
A jurisprudência do TCU é pacífica no sentido da ilegalidade de jornadas de trabalho superiores a sessenta horas por semana (acórdãos 533/2003, 2.047/2004, 2.860/2004, 155/2005, 933/2005, 2.133/2005, 544/2006, todos da 1a Câmara).
– Viola o princípio da legalidade e da moralidade administrativa a acumulação do cargo público de médico do Ministério da Saúde, no regime de vinte horas semanais, com o exercício de outros três empregos na iniciativa privada, totalizando oitenta horas de expediente semanais.
– Ofende, também, a Constituição Federal a acumulação de três cargos públicos de médico, com o exercício de oitenta e três horas de expediente.
A possibilidade constitucional de dupla acumulação de cargos, no caso de médicos, não prescinde da compatibilidade de horários, plenamente exigível pelo administrador público competente.”2 (grifou-se)

Nessa linha de raciocínio, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) adotou a tese do Tribunal de Contas da União, permitindo a acumulação de cargos e empregos públicos, somente se o módulo semanal de trabalho for limitado em 60 (sessenta) horas, como forma de dar eficácia ao preceito constitucional, bem como preservar a higidez do trabalhador:

RECURSO DE REVISTA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. PROFISSIONAL DE SAÚDE. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS.
1. A Constituição da República, em seu artigo 37, XVI, -c-, dispõe que é possível a acumulação de dois cargos públicos pelo profissional de saúde, desde que a profissão seja regulamentada e exista compatibilidade de horários.
2. No entanto, na hipótese dos autos, verifica-se que o acúmulo de cargos exigiria da Reclamante trabalho com carga horária de setenta e duas horas semanais. Significa que a Autora teria que trabalhar de segunda-feira a sábado, seis vezes por semana, cumprindo jornada de doze horas. Portanto, verifica-se que a Reclamante pleiteia o acúmulo de cargos com carga horária de trabalho muito superior ao limite constitucional e legal estabelecido. Tal situação caracterizaria jornada de trabalho exaustiva, em ofensa à legislação trabalhista vigente.
3. O Tribunal de Contas da União, em razão da competência do art. 71, III, da Constituição da República, tem se manifestado no sentido de que o limite máximo de jornada de trabalho em casos de acumulação de cargos ou empregos públicos é de 60 (sessenta) horas semanais. Precedentes da Corte de Contas.
4. Por todo o exposto, pode-se concluir que o requisito da compatibilidade de que trata o texto constitucional para acumulação de dois cargos públicos não deve ser interpretado meramente com base na colisão de horários. Deve considerar, também, a possibilidade efetiva de cumprimento de jornada, sem prejuízo ao desempenho do cargo ou à saúde do trabalhador.
Recurso de Revista não conhecido3. (grifou-se) 

Recentemente, a Advocacia-Geral da União – AGU enfrentou novamente o tema em apreço, por meio da Nota no 114/2010/DECOR/CGU/AGU, citada no parecer no 0075 – 3.20/2011/JPA/CONJUR/MP4, o qual, por sua vez, concluiu:

22. Essas peculiaridades que circundam o caso ora analisado denotam a impossibilidade de se sustentar o entendimento que a limitação ao regime de 60 (sessenta) horas semanais de trabalho seria uma condição suficiente e necessária para autorizar a acumulação de cargos públicos. A compatibilidade de horários reclamada pela Constituição Federal não há de ser entendida a partir do parâmetro único do somatório das jornadas de trabalho. Deve ela ser encarada sob duas perspectivas diversas: primeiramente, tomando por base a própria condição existencial do servidor, que não poderá ser privado e tampouco se privar voluntariamente do tempo necessário ao seu repouso, à preservação de sua higidez física e mental e ao desenvolvimento de atividades relacionada a sua vida privada; sob outro prisma, é mister considerar o interesse da Administração Pública em ter à sua disposição um agente física e mentalmente apto a desenvolver regularmente as suas atribuições, sem comprometer a idéia de eficiência que permeia a atuação do Poder Público (art. 37, caput, CRFB).
23. Com efeito, nos casos em que o exercício simultâneo de cargos públicos implique supressão de direitos sociais previstos na CRFB/88 (v.g, repouso semanal remunerado), não será lícito falar em compatibilidade de horários. O simples fato de inexistir choque ou superposição de horários entre as jornadas dos cargos acumulados não dispensa a observância das normas constitucionais de natureza cogente incidentes sobre a relação travada entre o servidor e a Administração Pública. Não se pode defender a idéia de compatibilidade de horários contra constitutionis ou à margem das disposições constitucionais referentes aos direitos sociais do trabalhador/servidor. (destaques no original) 

Não obstante, verifica-se que o próprio TCU possui entendimento divergente:

ADMISSÃO DE PESSOAL CONSIDERADA ILEGAL. ACUMULAÇÃO DE CARGOS POR PROFISSIONAIS DA ÁREA DE SAÚDE CONSIDERADA IRREGULAR, POR ULTRAPASSAR A CARGA HORÁRIA DE 60 HORAS SEMANAIS. DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO DO TRIBUNAL. MULTA. PEDIDOS DE REEXAME. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL QUE ADMITE O EXERCÍCIO CUMULATIVO DE FUNÇÕES, LEGALMENTE PERMITIDAS, SEM LIMITE DE CARGA HORÁRIA SEMANAL, DESDE QUE SEJA DEMONSTRADA, CASO A CASO, A COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. EXCLUSÃO DA MULTA, POR TER SIDO TORNADA INSUBSISTENTE A DETERMINAÇÃO QUE ORIGINOU TAL PENALIDADE.5 (grifou-se)

Na decisão supracitada, restou consignado que a Constituição permite a acumulação, sem nenhuma limitação, bastando para tanto haver compatibilidade horária, conforme argumentos transcritos abaixo:

Não havendo norma legal, limitando as acumulações à jornada semanal de 60 horas, torna-se arbitrária e injurídica aquela restrição, pela via que foi feita.
Conquanto a CLT estabeleça que deve haver intervalo não inferior a 11 horas, entre o término de uma jornada e o início da subseqüente (CLT, art. 66), esta regra é restrita a cada vínculo empregatício, não se aplicando aos cargos ou empregos diversos, nem a trabalho em órgãos ou entidades diferentes.
Por outro lado, a jornada semanal de trabalho, necessariamente, não se distribui, apenas, por cinco dias, visto como pode haver caso de expediente aos sábados, sobretudo nos estabelecimentos oficiais de ensino.
(…)
Cumpre salientar que o Constituinte assegurou a possibilidade de acumulação de dois cargos privativos de profissionais de saúde, mas não estabeleceu previamente a limitação da carga horária total, razão pela qual a possibilidade de exercício desse direito constitucionalmente assegurado deverá ser verificada caso a caso, principalmente levando-se em consideração as peculiaridades da função. Não cabe à Administração instituir uma limitação genérica não prevista e nem autorizada pela Carta Magna, haja vista o nítido tratamento excepcional estabelecido no inciso XVI do seu art. 37. (grifou-se)

O Supremo Tribunal Federal – STF e o Superior Tribunal de Justiça – STJ, também já se pronunciaram de maneira diversa à posição majoritária do TCU, conforme acórdãos a seguir:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. EXISTÊNCIA DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL QUE LIMITA A JORNADA SEMANAL DOS CARGOS A SEREM ACUMULADOS. PREVISÃO QUE NÃO PODE SER OPOSTA COMO IMPEDITIVA AO RECONHECIMENTO DO DIREITO À ACUMULAÇÃO. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS RECONHECIDA PELA CORTE DE ORIGEM. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
I – A existência de norma infraconstitucional que estipula limitação de jornada semanal não constitui óbice ao reconhecimento do direito à acumulação prevista no art. 37, XVI, c, da Constituição, desde que haja compatibilidade de horários para o exercício dos cargos a serem acumulados.
II – Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo acórdão recorrido quanto à compatibilidade de horários entre os cargos a serem acumulados, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF. III – Agravo regimental improvido.6 (grifou-se)

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. PROFISSIONAL DA SAÚDE. ART. 17 DO ADCT.
1. Desde 1o.11.1980, a recorrida ocupou, cumulativamente, os cargos de auxiliar de enfermagem no Instituto Nacional do Câncer e no Instituto de Assistência dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro – IASERJ. A administração estadual exigiu que ela optasse por apenas um dos cargos.
2. A recorrida encontra-se amparada pela norma do art. 17, § 2o, do ADCT da CF/88. Na época da promulgação da Carta Magna, acumulava dois cargos de auxiliar de enfermagem.
3. O art. 17, § 2o, do ADCT deve ser interpretado em conjunto com o inciso XVI do art. 37 da Constituição Federal, estando a cumulação de cargos condicionada à compatibilidade de horários. Conforme assentado nas instâncias ordinárias, não havia choque de horário nos dois hospitais em que a recorrida trabalhava. 4. Recurso extraordinário conhecido e improvido.7

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS. LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA SEMANAL: IMPOSSIBILIDADE. REQUISITO NÃO PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.8

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. PROFISSIONAL DA SAÚDE. LIMITAÇÃO DA CARGA HORÁRIA. INEXISTÊNCIA. EXEGESE DO ART. 37, XVI, DA CF/88 E ART. 118, § 2o, DA LEI 8.112/90. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. Comprovada a compatibilidade de horários e estando os cargos dentro do rol taxativo previsto na Constituição Federal, não há falar em ilegalidade na acumulação, sob pena de se criar um novo requisito para a concessão da acumulação de cargos públicos. Exegese dos arts. 37, XVI, da CF e 118, § 2o, da Lei 8.112/90.
2. Agravo regimental improvido.9

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. DEMISSÃO. VERIFICAÇÃO DE COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. MERA APLICAÇÃO DO PARECER AGU GQ-145. VIOLAÇÃO DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO, PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. Cuida-se de impetração efetuada por servidora pública federal demitida por acumulação supostamente ilícita de dois cargos públicos da área de saúde, na qual a administração tão somente cotejou o quantitativo máximo de horas fixado pelo Parecer GQ-145, da Advocacia-Geral da União, com o que era laborado pela servidora. Do cotejamento, instou-se que a servidora reduzisse a carga ou se exorasse de um dos cargos. Da negativa, iniciou-se processo administrativo disciplinar em rito sumário para demitir a servidora por acumulação ilícita de cargos, ou seja, por infração ao art. 118, da Lei n. 8.112/90.
2. No caso concreto, a servidora possuía uma jornada de 40 horas semanais, num cargo, combinada com plantões noturnos de 12 horas de trabalho, por 48 horas de descanso, noutro cargo, sem sobreposição de horários. A administração entendeu que a simples totalização semanal de 72 horas e meia, por si, configura a ilegal cumulação.
3. Os Tribunais Regionais Federais possuem jurisprudência assentada de que o Parecer AGU GQ-145, de 30.8.1998, não assenta em força normativa a autorizar a aplicação de demissão por acumulação ilegal de cargos. Diversos precedentes do TRF-1, TRF-2, TRF-3 e TRF-4.
4. Anote-se que a observância à jurisprudência dos tribunais de origem se justifica, porquanto o STJ possui a função central de evitar discrepâncias notórias quanto ao modo de aplicar o direito entre os tribunais da federação. Esse cariz uniformizador das construções pretorianas federais evita desvios hermenêuticos entre plexos jurisdicionais de diferentes estados ou regiões da União, coibindo que o direito dos cidadãos seja aplicado de forma incoerente.
5. O Tribunal Regional Federal da 2a Região, inclusive, já se deparou com situações idênticas à que é encontrada nos autos, nas quais não acolheu que a existência de carga horária semanal de 72 horas e meia, por si, seja autorizadora de similar demissão por violação ao art. 118, da Lei n. 8.112/90. Precedentes do TRF-2.
6. O Supremo Tribunal Federal examinou a matéria e negou provimento ao recurso extraordinário, do Estado do Rio de Janeiro, que produziu Decreto similar ao Parecer AGU GQ-145, de 3.8.1998, considerando a regulamentação como violadora, aduzindo ser “regra não prevista” e “verdadeira norma autônoma” Precedente: Recurso Extraordinário 351.905, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, julgado em 24.5.2005, publicado no Diário da Justiça de 1o.7.2005, p. 88, Ementário vol. 2.198-05, p. 831, republicação no Diário da Justiça de 9.9.2005, p. 63, publicado na LEX-STF, v. 27, n. 322, 2005, p. 299-303.
7. O direito líquido e certo da impetrante decorre de que a Constituição Federal permite a acumulação de dois cargos na área de saúde (art. 37, XVI, da CF; art. 118, da Lei n. 8.112/90) e, assim, cumpre à Administração Pública comprovar a existência de incompatibilidade de horários em cada caso específico, não bastando tão somente cotejar o somatório de horas, com o padrão derivado de um parecer ou, mesmo de um Decreto.
Segurança concedida.10 (grifou-se)

Conclusão

Desse modo, embora a norma constitucional não tenha fixado limite objetivo à compatibilidade de horários, a jurisprudência do TCU esposa que a extrapolação do limite de 60 (sessenta) horas semanais pelo exercício dos cargos acumuláveis implica na ilicitude da acumulação.

Atente-se, contudo, que há decisão divergente desta tese, de lavra do próprio TCU, consignando que se a Constituição Federal não estabeleceu limite objetivo para a aferição da compatibilidade de jornada, não cabe ao intérprete fazê-lo.

Destaque-se que os Tribunais Superiores – STF e STJ – pronunciaram-se no sentido de que a compatibilidade de horários deve ser comprovada de forma casuística, não avalizando, portanto, a tese desenvolvida e adotada majoritariamente pelo TCU.

O TST, por seu turno, sem ainda ter posição pacificada, entende que jornada superior a 60 (sessenta) horas traduz-se em “jornada de trabalho exaustiva, em ofensa à legislação trabalhista vigente”.

Assim, conclui-se que, se por um lado à administração pública (direta e indireta) é recomendável a adoção do posicionamento majoritário do Tribunal de Contas da União, vez que, ante a sua sujeição ao controle e fiscalização deste,11 seus gestores podem ser responsabilizados pelos atos que forem de encontro às orientações por ele emanadas; por outro, o trabalhador privado de acumular licitamente cargos, empregos ou funções públicas, em razão de restrição que extrapola os limites constitucionais, poderá socorrer-se do Poder Judiciário, o qual já demonstrou possuir entendimento contrário, conforme se denota da jurisprudência colacionada.

Notas ___________________________________________________________________________

1 FILHO. José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 627.
2 TCU. Acórdão 2551/2011 – Primeira Câmara. PROCESSO 007.413/2011-4. Ministro Relator WALTON ALENCAR RODRIGUES. DOU 02/05/2011
3 TST. 8a Turma. PROCESSO No TST-RR-76300-34.2009.5.04.0007. Relator: Juíza Convocada Maria Laura Franco Lima de Faria. DEJT 25/11/2011.
4 http://www.tc.df.gov.br/ice4/legislacao/Parecer_0075_JPA320.htm. Acesso em 22/03/2013.
5 TCU. Acórdão 1606/2012 – Primeira Câmara. PROCESSO 025.870/2006-8. Ministro Relator AUGUSTO NARDES. DOU 11/04/2012.
6 STF, 6a Turma, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n.o 633.298/MG; Relator: Ministro Ricardo Lewandowski; Julgamento: 13/12/2011.
7 STF, 2a Turma, RE 351905 / RJ – RIO DE JANEIRO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a): Min. ELLEN GRACIE. Julgamento: 24/05/2005. DJ 01/07/2005.
8 STF, Decisão monocrática. AI 762427 GO; Relator: Ministra CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 08/04/2011. DJe-074 19/04/2011.
9 STJ. AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO No 1.007.619 – RJ 2008/0019125-2. 5a Turma. Relator: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA. DJe 25-08-2008.
10 STJ. MS 15415 / DF MANDADO DE SEGURANÇA 2010/0106093-8
Relator(a) Ministro HUMBERTO MARTINS (1130) Órgão Julgador
S1 – PRIMEIRA SEÇÃO. DJe 04/05/2011
11 “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária. (Redação dada pela Emenda Constitucional no 19, de 1998)
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete (…)”