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Burocracia esclerosada

28 de fevereiro de 2006

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A crise brasileira tem demonstrado que os anticorpos da democracia são fortes, nada obstante a desfiguração dos detentores do poder.

Juridicamente, a Constituição tem demonstrado possuir mecanismos capazes de controlar os anseios totalitários do governo de imitar Fidel Castro e Chavez pela tentativa de desqualificação dos adversários, assim como alguns arroubos da parte mais radical – não a maioria da oposição de afastar o presidente, por conduta indigna de membros do alto escalão, no Executivo e no Legislativo, quanto ao manuseio do dinheiro público.

O primeiro grande teste da Lei Suprema brasileira está demonstrar sua capacidade de resistência e da existência de instrumentos legais parta administrar a crise.

A oposição – em face deste desventrar de podridões partidárias da situação – chama o governo de corrupto. Este, por estar a oposição descobrindo, todos os dias, novos sinais de malversação do dinheiro público, chama-a de golpista.

Mauro Chaves, no O Estado de São Paulo de 10/12/05, sem receio, declara que “nunca tantos roubaram tanto de tanta gente em tão pouco tempo”!

Neste quadro, as instituições garantem o fluir econômico, que, a meu ver, não foi abalado pela maior crise política da história brasileira, após a saída do regime de exceção de 1964/85.

Ao contrário do que alguns pretendem, a Economia está infensa à crise política. Infelizmente, não está infensa à incompetência governamental.

A má performance da Economia no 3º trimestre não decorreu da crise política, mas de um mau gerenciamento do presidente, incapaz de definir uma linha e alimentador, por palavras dirigidas à imprensa, de um deletério debate entre dois de seus principais ministros, Dilma e Palocci, ora prestigiando um, ora prestigiando outro, mas sem definir ele mesmo sua própria posição.

Pior que isto, em 2005 o governo elevou os gastos com despesas da burocracia esclerosada, ou seja, 10,2% dos gastos da União com pessoal (com o que), como sinaliza  Raul Velloso (O Estado de São Paulo, 06/12/05, p. B3), sem um “novo aumento da carga tributária”, corremos o risco de voltar à espiral inflacionária. Declara, ainda, que o país está “à beira do precipício”.

De rigor, com carga tributária confiscatória, juros elevados e máquina administrativa ineficiente, a manutenção de um superávit primário elevado para garantir administrabilidade das contas públicas, termina por reduzir qualquer aspiração de crescimento, sendo estes efetivamente os fatores da má performance governamental e não a crise política, que se desenrola em outro plano e sem influenciar os agentes econômicos.

Estou absolutamente convencido que só há uma maneira de o País voltar a se desenvolver, qual seja, fazer com que a sociedade cresça e a máquina burocrática – esclerosada, inoperante e prenhe de amigos (correligionários do rei – presidente) diminua. No governo Lula, os gastos com pessoal e administração pública – despesas correntes – só aumentaram, sem que, infelizmente, a máquina aumentasse sua qualidade operacional.

Tenho receio de que o ano de 2006 poderá ser ainda pior, visto que a proposta orçamentária da União prevê um salário mínimo de 321 reais, ou seja, um reajuste de 7% e, por ser um ano eleitoral, poderá o governo relaxar o controle severo das contas públicas – já que não controla a ineficiência da máquina – para tentar conquistar eleitores. E, a ser verdade a declaração presidencial que o salário mínimo será de 350 reais, o descompasso tornar-se-á incontrolável. E o afrouxamento do único setor que ainda funciona – controle da inflação – poderá, realmente, acarretar o desarranjo das contas públicas e da economia, apesar da solidez das instituições. Se isto ocorrer, aí sim a crise política poderá ser um fator de desagregação dos fundamentos econômicos e o país ingressar no populismo social, na demagogia eleitoral e no retrocesso institucional.

Em 2005 fomos o país que menos cresceu na América Latina e no mundo emergente. Se não houver correção de rumos nos gastos públicos – o grande vilão do governo Lula -, certamente teremos um 2006 – como disse Raul Velloso – em que o país ficará à beira do precipício.