Da aplicabilidade do artigo 745-A do CPC na Justiça do Trabalho

16 de abril de 2013

Compartilhe:

Nota introdutória

O presente artigo tem por finalidade realizar um breve estudo sobre a aplicação do instituto contido no artigo 745-A do Código de Processo Civil e que lhe foi introduzido por meio da lei nº. 11.382/06, sua natureza jurídica, bem como a possibilidade de ser exercido na Justiça do Trabalho como instrumento de satisfação do crédito exequendo de forma mais rápida e eficiente.

Inicialmente, vale o comentário acerca das razões pela qual o legislador incluiu este verbete no texto do código processual, uma vez que se trata de forma de quitação de obrigações pendentes, sendo certo que referido instituto encontra-se previsto no Código Civil (Livro das Obrigações).

O que se pode salientar neste início de comentário diz respeito ao fato de que o instituto consignado no referido artigo – estando situado topologicamente no capítulo destinado aos embargos à execução – tem por objetivo precípuo conceder ao executado a possibilidade de reconhecimento imediato da dívida pelo executado que, neste sentido, demonstrando de forma inequívoca que tem a firme intenção de quitá-lo, porém atendendo à proteção que lhe é concedida pelo artigo 620 do mesmo diploma legal, o faz de forma parcelada evitando eventuais interrupções no curso do seu patrimônio e onerando de forma menos impactante possível.

A bem da verdade, não podemos perder de vista que sendo a seara do direito material aquela que certifica a existência de uma obrigação, cabe ao direito instrumental viabilizar a efetividade do primeiro (tutela do direito assegurado ao credor por via prática). Trata-se de uma operacionalização do direito material com vistas à conceder-lhe máxima eficácia possível, auferindo ao credor o bem da vida que lhe foi assegurado através do devido processo legal com sentença transitada em julgado.

Certifique-se ainda nesta esteira que a obrigação prevista e acolhida pelo artigo em comento diz respeito à processo executivo que se opera em face do devedor, podendo a parte contrária requerer por meios admissíveis em direito, e sem prejuízo excessivo à situação patrimonial do devedor, que lhe seja assegurado o direito de receber o que tem por direito.

Aliás, este foi o mote do legislador ao inserir o verbete no capítulo originalmente destinado aos embargos à execução fundada em sentença, posto que o espírito da lei foi conservado mesmo após a reforma.

Deste modo, a inserção do artigo 745-A no capítulo destinado aos embargos à execução buscou conceder ao devedor mais uma oportunidade para ser ver livre das amarras que lhe prendem ao credor e que, mais cedo ou mais tarde, virá a onerar em excesso seu patrimônio, podendo, inclusive comprometer sua subsistência.

Destaque relevante que precisa ser abordado refere-se ao fato de que não se trata de um direito subjetivo do devedor, posto que se assim o fosse, iria de encontro ao direito subjetivo do credor que não pode ser abalado, postergado ou elidido apenas para que a parte contrária veja-se protegida de sua própria inércia. O direito de um indivíduo não pode, sob qualquer hipótese, ferir o direito de outro, especialmente quando este encontra-se assegurado por determinação judicial sobre a qual pende o manto da coisa julgada.

Breve apanhado doutrinário do verbete

Para que possamos desempenhar um trabalho visualmente mais prático, ensejamos a transcrição do verbete em estudo, o que fazemos a seguir:

Art. 745-A. No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de 30% (trinta por cento) do valor em execução, inclusive custas e honorários de advogado, poderá o executado requerer seja admitido a pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e juros de 1% (um por cento) ao mês. (Artigo acrescentado pela Lei nº 11.382, de 06/12/2006 – DOU 07/12/2006)

§ 1º Sendo a proposta deferida pelo juiz, o exequente levantará a quantia depositada e serão suspensos os atos executivos; caso indeferida, seguir-se-ão os atos executivos, mantido o depósito.

§ 2º O não pagamento de qualquer das prestações implicará, de pleno direito, o vencimento das subsequentes e o prosseguimento do processo, com o imediato início dos atos executivos, imposta ao executado multa de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações não pagas e vedada a oposição de embargos.

Inexistem dúvidas acerca da conceituação da natureza jurídica do verbete ora em estudo – por ampla maioria doutrinária – tratar-se de moratória legal que concede ao executado um prazo de seis meses para quitação do débito. As demais correntes (minoritárias a bem da verdade) descarecem de qualquer consideração mais aprofundada senão apenas a notificação de sua existência no mundo doutrinário.

Senão vejamos. CARREIRA ALVIM atribui-lhe vestimenta de injunção monitória e que é veemente rechaçada por outros mestres com a alegação de que seria mais uma injunção que favorece ao credor na rapidez com que forma o título executivo judicial.[1]

Outra corrente aventa a possibilidade de tratar-se de remição, mas que não suporta uma crítica mais assertiva no sentido de que incabível o instituto por confundir a vontade do legislador.

Esta pequena exposição serve apenas e tão somente para evidenciar que a corrente majoritária – que trata o instituto contido no artigo 745-A como moratória – não o é apenas porque mais clarificada do ponto de vista doutrinário, mas sim porque atende às expectativas implícitas no texto conjugado pelo legislador, vislumbrando, inclusive, a possibilidade de tratar-se de direito potestativo do devedor, uma vez que desnecessária a oitiva da parte contrária e sua eventual concordância.

Abrimos aqui uma pequena interrupção na marcha de nossa análise para deixar claro que o artigo em comento refere-se à uma faculdade do Juiz que pode ser exercida desde que tenha o credor cumprido com as exigências prevista no título, descabendo, como se constata, a intimação do credor para que acerca do pedido formulado se manifeste em qualquer sentido.

Seguindo-se o alcance da norma, a tese majoritária também afirma ser o verbete incidente processual admissível em sede de execução do título judicial, que pode ser utilizado dentro do prazo para impugnação à pretensão do cumprimento da sentença, ou ainda em prazo para interposição de embargos à execução. E seu surgimento no processo condiz com a hipótese de suspensão voluntária dilatória do processo executivo, que apenas carece da concessão pelo juiz como forma de pacificação social, evitando a demora no cumprimento da sentença, dada a evidência de que o devedor pretende ver-se livre dela, bem como impedir a discordância do credor que, almejando receber o que tem direito de uma só vez, poderia (como realmente acontece) invadir de forma espoliativa o patrimônio do devedor, deixando-o à míngua de recursos mínimos que lhe possibilitem a sobrevivência, ou ainda, exaurindo todo este patrimônio antes mesmo que seu crédito venha a ser integralmente satisfeito.

Muito bem. Vencida esta etapa do nosso humilde trabalho, precisamos agora verificar a aplicabilidade do referido verbete nos processos executivos de natureza trabalhista, confrontando-o com o inteiro teor da Consolidação das Leis do Trabalho texto mais adequado ao processo laboral, bem como constatar a possibilidade de que este instituto possa ser usado com a finalidade precípua de assegurar ao trabalhador o recebimento de seus consectário legais constantes de sentença meritória transitada em julgado.

A abordagem juslaboral

Antes de mais nada faz-se necessário a compreensão de como se dá a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil ante a Consolidação das Leis do Trabalho enquanto instrumento complementar com vistas ao aprimoramento do processo do trabalho. Reza o artigo 769 do texto consolidado:

Art. 769 – Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

O verbete acima assinalado dispõe que o Código de Processo Civil pode servir de fonte subsidiária de aplicação ao texto juslaboral, quando este for omisso ou incompatível. A primeira (omissão) refere-se à possibilidade de que o texto consolidado nada fale a respeito do tema, enquanto o segundo excetua a mesma possibilidade em caso de incompatibilidade entre a Consolidação das Leis do Trabalho e o Código de Processo Civil.

Ora, a análise do que foi comentado acerca do artigo 745-A do Código de Processo Civil nos permite inferir que referido artigo é plenamente aplicável ao processo do trabalho, uma vez que a Consolidação das Leis do Trabalho não possui verbete similar, resumindo-se ao teor do artigo 880 que determina o pagamento em 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de penhora. E da mesma forma, o artigo 883 estabelece que a constrição deve seguir seu curso forçado até a satisfação integral do crédito exequendo.

Tais artigos não trazem à baila a possibilidade do executado oferecer o parcelamento do débito, sendo certo que também não fixa qualquer prazo para tal procedimento, cabendo ao executado apenas pagar ou garantir o juízo para discutir a execução – e somente ela – em sede de embargos à execução.

Já o caput do artigo 884 fixa o prazo – após a garantia da execução – para que o executado possa interpor embargos, prazo este que pode ser vislumbrado também como prazo para apresentação de pedido de parcelamento na forma estabelecida pelo artigo 745-A do Código de Processo Civil constatado que há, de fato, omissão do texto consolidado sobre o instituto previsto no código adjetivo.

A celeuma que se estabelece diz respeito exclusivamente ao fato de que a aplicação subsidiária do artigo 745-A do Código de Processo Civil encontrar-se-ia eivada de proibição legal, uma vez que incompatível com o pressuposto constante da espinha dorsal da Consolidação das Leis do Trabalho, vez que os princípios que a regem são o da celeridade e economia processuais, e o princípio protetivo ao trabalhador, inclusive quanto a natureza alimentar do crédito trabalhista (privilegiado por excelência).

Todavia, existem alguns aspectos de ordem doutrinária, hermenêutica e sociológica que nos impõe a necessidade imperativa de analisar-se a aplicabilidade do referido verbete processual civil na esfera do processo executivo trabalhista de modo a preservar a natureza dos institutos frente às necessidades das partes envolvidas.

Melhor explicando: não se pode simplesmente afirmar que um instituto como o parcelamento deixe de ser acolhido por análise jurisprudencial na esfera de atribuições do processo executivo trabalhista apenas e tão somente porque incompatível, uma vez que tal incompatibilidade carece de um olhar mais acurado sobre quais os interesses que estão em jogo e quais aqueles que merecem, efetivamente, uma tutela jurisdicional que tenha por objetivo a solução da lide e a consequente pacificação social.

Da prerrogativa do magistrado

No aspecto doutrinário ressalvamos a importância da análise que se faz acerca da aplicação dos artigos 764 e 765 da Consolidação das Leis do Trabalho que concedem ao Juiz do Trabalho os meios necessários à efetividade não apenas da sentença de mérito como também dos meios necessários à sua resolução com a quitação do devido ao autor, podemos afirmar que ele tem plena liberdade de agir no sentido de ver atendido o teor da sentença proferida e transitada, podendo valer-se de todos os meios na condução do procedimento executivo, velando pela rápida solução do conflito.

Consequentemente, temos que a aplicação do artigo 745-A do Código de Processo Civil de forma subsidiária é plenamente aceitável – do ponto de vista doutrinário – na Justiça do Trabalho – uma vez que os mecanismos à disposição do magistrado traduzem tal expectativa, bem como pode-se atribuir efeito de faculdade do magistrado a concessão do parcelamento previsto, desde que atendidos os pressupostos ali elencados.

Aliás, com o fito de corroborar nossas afirmações anteriores transcrevemos o seguinte excerto:

É dever do Juízo da execução velar pela rápida solução do litígio, determinando, para tanto, as diligências úteis e necessárias, nos termos dos arts. 125 e 130 do CPC e 765 da Consolidação das Leis do Trabalho. Acórdão: 20111361987 Turma: 17 Data Julg.: 13/10/2011 Data Pub.: 21/10/2011. Processo : 20110622358 Relator: SUSETE MENDES BARBOSA DE AZEVEDO.

A questão jurisprudencial

Vejamos, agora, de que forma este conflito jurisprudencial pode ser resolvido à luz da ciência do Direito, da sociologia jurídica e da hermenêutica. À guisa de tema para debate, analisemos o seguinte excerto jurisprudencial:

EMENTA: DE NUMERÁRIO EXISTENTE EM CONTA BANCÁRIA DA EXECUTADA. APLICAÇÃO DO ART. 745-A, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE: “Na execução trabalhista, pode o Juiz atuar “ex officio”, cabendo-lhe a escolha de bens que melhor e mais rapidamente satisfaçam o crédito exequendo. Cuidando de execução definitiva, e existindo numerário suficiente para saldar o crédito trabalhista, não há que se pretender o parcelamento da dívida na forma estabelecida pelo art. 745-A, do CPC, especialmente porque esse dispositivo da lei processual comum é inaplicável na seara trabalhista, dado o caráter alimentar que revestem as prestações celetárias”. Agravo de Petição a que se nega provimento ( Rel. Dora Vaz Treviño, acórdão nº 20080455004, processo nº 00943-2005-004-02-00-0, 11ª Turma, ano 2008 ).

O ângulo pelo qual a i. Desembargadora observou a questão possui dois contextos independentes entre si. O primeiro diz respeito à faculdade do Juiz em promover de ofício a execução de forma célere e eficaz, cabendo-lhe o poder de decisão emanado do princípio da efetividade contido nos artigos 764 e 765 da Consolidação das Leis do Trabalho. O segundo situa-se no fato do executado ter numerário suficiente para saldar seu débito e assegurar a natureza alimentar do crédito trabalhista.

Outra controvérsia jurisprudencial e doutrinária refere-se ao fato de que o parcelamento previsto no artigo 745-A do Código de Processo Civil estaria situado no antigo capítulo relativo à execução de título extra-judicial, e, portanto, absolutamente inaplicável da seara trabalhista, tese esta que não se sustenta uma vez que o verbete encontra-se inserido no tema relativo aos embargos à execução que, por sua vez, dizem respeito à execução judicial.

E ainda em se tratando de direito potestativo do devedor que submete-se à exigência de intervenção do Estado no sentido de possibilitar seu exercício no âmbito judicial, descabendo intervenção do credor ou mesmo do Juiz que devem acolhê-lho como direito potestativo que é em sua essência.

Aliás, é o que comenta Luiz Guilherme Marinoni com acurada proeminência:

“(…) em razão da regra que permite a aplicação subsidiária ao cumprimento de sentença, naquilo que não for incompatível, das regras da execução por quantia certa fundada em título extrajudicial (art. 475-R, CPC). Como se trata de uma técnica de incentivo ao cumprimento espontâneo da obrigação – (portanto, em consonância com o princípio da efetividade), e não havendo qualquer inadequação com o procedimento executivo para a execução da sentença, seria possível que o executado, no prazo para impugnar a execução, exercesse o direito potestativo ao parcelamento da dívida previsto no art. 745-A do CPC. Marinoni” (2004 apud CUNHA, DIDER JR et al, 2009, p. 387-388).

Ratificando o entendimento de Marinoni, o Desembargador do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, Andrade Marques, no julgamento do Agravo de instrumento n. 990.10.202824-0[6], relatou o seguinte:

(…) As alterações do ordenamento processual civil foram realizadas na tentativa de tornar mais célere e efetiva a tutela jurisdicional, como, no caso, o instituto do cumprimento de sentença para, em prazo menor, entregar ao exequente, o direito perseguido.

Nessa cadência, houve a distinção entre os títulos executivos judiciais e extrajudiciais, cada um respeitando suas condições e particularidades.

Assim, os títulos executivos judiciais foram disciplinados em apartado na legislação processual e sua forma de execução é diferenciada.

Porém, para evitar lacunas em seu cumprimento, foi redigido o artigo 475-R que determina a aplicação, de forma subsidiária, das normas relativas aos títulos extrajudiciais, no que couber e sem prejuízo às partes.

No caso concreto, encontra-se a referida hipótese.” (…) (MARQUES, 2010, p. 2-3)

As considerações de ordem sociológica

Quanto ao aspecto sociológico, a análise do citado artigo de lei e sua respectiva aplicação no âmbito da Justiça do Trabalho, temos que a necessidade do trabalhador em ver satisfeito o seu crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, precisa de um grau de efetividade que conserve a segurança jurídica das decisões proferidas pelo judiciário nacional, bem como assegurar o instituto da pacificação social que é o conceito filosófico contido em nosso ordenamento jurídico e que deve ser perseguido com incessante desejo de realização na esfera do mundo real.

Ao alegar em sua defesa o direito contido no artigo 745-A do Código de Processo Civil o devedor está declarando encontrar-se em situação de moratória. Mas o que significa isso. Uma análise superficial denota que moratória é o prazo concedido pelo credor ao devedor para que promova o pagamento de sua dívida.

De outro lado, temos que a moratória é um ato unilateral do devedor que declara não possuir liquidez suficiente naquele momento para quitar seu débito frente ao credor ou credores. Veja-se que a unilateralidade não pode constituir elemento que denote estado de insolvência que, por si mesmo, induz ao direito da parte credora em requerer a falência do devedor.

Ausência de liquidez momentânea infere que o devedor não está insolvente, mas sim que, em dado momento a sua capacidade de converter bens ou serviços em dinheiro para saldar seus débitos está comprometida, porém, não induz que esta situação – tida como momentânea – possa se prolongar até o evento falencial.

Países, empresas e mesmos pequenos e microempresários podem incorrer em situações como a acima descrita, não havendo que se falar em insolvência, mas apenas ausência de liquidez que também não deve confundir-se com iliquidez, que é o estado que antecede ao falencial.

Não queremos aqui estabelecer premissas de defesa ao devedor que, de forma contumaz, age no sentido de não promover o pagamento de suas dívidas, locupletando-se de suas obrigações e promovendo a dilapidação (voluntária ou involuntária) de seu patrimônio apenas e tão somente com o intuito de prejudicar seus credores e retirar deles a expectativa anteriormente assumida ao celebrar compromisso de ordem pecuniária.

O que desejamos demonstrar é uma situação de ordem social que pode atingir qualquer um e cujas repercussões serão desastrosas se não puderem ser controladas a tempo. E é exatamente isso que o artigo 745-A pretende prevenir, possibilitando que o devedor possa restabelecer suas finanças e, consequentemente, quitar suas dívidas e, de outro lado, assegurando que o credor venha a receber seu crédito – de forma parcelada e devidamente atualizada monetariamente – sem o temor de que a crise de iliquidez venha a desenvolver uma situação de insolvência que, antes de tudo, pode tornar o pagamento das dívidas pelo devedor impossíveis de serem cumpridas.

A rigor, o interesse aqui tutelado é de ordem social, não apenas como um mecanismo de pacificação social, como também estabelecendo diretrizes fundadas em princípios de eticidade e moralidade pública do indivíduo que deve e tem a intenção de pagar. Aliás, intenção esta que se revela no fato de que ao solicitar o parcelamento o faz depositando 30% (trinta por cento) do valor devido, demonstrando sua firme intenção em promover a quitação do débito.

No mesmo sentido, temos que o direito assegurado ao devedor no parcelamento previsto na lei processual visa assegurar o pleno exercício do princípio constitucional de dignidade da pessoa humana, cujo escopo, neste caso, versa sobre a impossibilidade da dívida ultrapassar o devedor e atingir aqueles que dele dependem, impossibilitando sua sobrevivência e daqueles que com ele convivem e dele dependem, seja de forma direta ou de forma indireta.

Corroborando nossa tese no âmbito da sociologia jurídica cabe aqui uma abordagem do princípio da boa-fé objetiva que rege as relações obrigacionais e que impõe às partes a imperiosidade de sua fiel observância, sob pena de cometerem ato lesivo que comprometerá não apenas aquela relação, mas todo o complexo universo de relações sociais que se entrelaçam de demonstram diariamente e de forma inequívoca que a vida em sociedade nos tempos atuais cada vez mais de aproxima de uma aldeia globalizada em que todos relacionam-se com todos.

Ademais, não podemos perder de vista que o devedor que vem a juízo e manifesta seu interesse em quitar um dado débito pecuniário não o faz sem que tenha absoluta consciência do compromisso por ele assumido, uma vez que, valendo-se do inteiro teor do artigo 745-A do Código de Processo Civil, está ele afirmando e comprometendo-se não apenas com o credor, com o magistrado, mas sim com o sistema jurídico, sendo certo que eventual descumprimento ou má utilização do direito contido no citado artigo não ficará restrito àquela relação jurídica, visto que todas as relações jurídicas estabelecidas por aquele devedor com outros credores estarão sujeitas ao pressuposto da insegurança jurídica e social, tornando impossível a continuidade em estabelecer-se relações de qualquer ordem com indivíduo que não honrou compromisso por ele próprio assumido, dizendo em alto e bom tom de forma implícita que não é confiável e que sua capacidade de honrar compromissos restringe-se apenas ao seu próprio alvitre.

A bem da verdade, nossa exposição sofre com a ausência de jurisprudência consoante com as digressões aqui apresentadas, o que, ao nosso ver, deve-se primeiramente ao fato de que o instituto em comento não tem sido aplicado na Justiça Especializada, até mesmo porque os devedores trabalhista, na maior parte das vezes, prefere buscar um acordo que seja homologado pelo juízo, e cujas repercussões no mundo fático operam eficácia plena, desobrigando o devedor-empregador de preocupar-se com o longo braço de justiça que pode, inclusive, bloquear bens e valores por meio eletrônico.

Em segundo lugar, temos que o artigo 880 da Consolidação das Leis do Trabalho é norma de larga utilização no processo executivo assegurado ainda pelos mecanismos à disposição do juízo para a consecução dos meios assecuratórios que irão promover a garantia da execução por meio forçado, tendo-se em conta, portanto, que a aplicação do artigo 745-A do Código de Processo Civil fica relegado apenas ao plano de manifestação do executado que, demonstrando interesse em ver-se livre dos riscos de uma execução forçada, pode valer-se do instituto.

Ainda neste tópico salienta-se a importância de que o devedor tenha plena consciência de que sua situação poderá tornar-se cada vez mais comprometida no sentido de que tratando-se de execução de natureza alimentar, poderá o juiz valer-se de todos os meios a ele disponíveis, inclusive ultrapassando a figura empresarial para atingir a figura individual dos sócios que respondem pela execução do crédito por terem usufruído da força-trabalho do autor que não pode ser prejudicado mais ainda do que já foi dada a sua vulnerabilidade que ganha contornos protecionistas de ordem constitucional e que não podem ser postos de lado pelo magistrado que conduz dado processo.

Conclusões

Do que expusemos até aqui podemos concluir que a utilização do instituto do parcelamento previsto no artigo 745-A do Código de Processo Civil nas execuções trabalhistas é possível, inclusive por considerar-se um direito potestativo do executado desde que atendidos os requisitos previstos no verbete e observado pelo magistrado uma situação de iliquidez do executado – o que pode ser facilmente constatado por meio de informações existentes no meio eletrônico.

Ademais não podemos perder de vista que se trata de um instituto que tem por objetivo a boa-fé nas relações jurídicas, uma vez que o devedor que se vale do parcelamento assim o faz com o intuito de quitar seu débito e não apenas dele esquivar-se por meio oblíquo.

No mesmo sentido não nos esqueçamos do resgate do princípio da dignidade da pessoa humana cujo alargamento traz para seu interior credores e devedores que não tenham outra intenção que não seja a vontade firme e determinada de manter-se incólume perante a sociedade e plenamente apto a celebrar contratos e firmar obrigações que tem certeza do cumprimento final.

Por fim elucidemos que a interpretação dos artigos 764 e 765 da Consolidação das Leis do Trabalho induzem à possibilidade de aplicação do citado verbete, pelo magistrado juslaboral, em atendimento aos princípios da economia e celeridade processuais, bem como o interesse deste em velar pela rápida solução do litígio e a consequente pacificação social.

Lembremo-nos, por fim, que o Direito não é a ciência do impossível, mas sim a ciência do impossível que se torna possível pela determinação da alma humana.


[1] JOSÉ EDUARDO CARREIRA ALVIM e OUTRA, Nova Execução de Título Extrajudicial, 2ª ed., Juruá Editora, 2007, fls. 224.