Desembargador apostou na conciliação para diminuir processos no TRT-RJ

11 de julho de 2012

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Tudo pela conciliação. Esse é o principal objetivo do projeto idealizado pelos desembargadores José Geraldo da Fonseca e Rosana Salim Villela Travesedo, do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região. “Como ser legal sem burocracia” nasceu em maio de 2010 e uma dos principais metas do projeto é o incentivo por acordos nos processos da 7ª turma que aguardam julgamentos no 2º grau. As audiências ocorrem sempre às terças-feiras, a partir das 9h.

A iniciativa atende ao Movimento pela Conciliação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e integra-se ao Projeto Projus – Projeto Conciliar, instituído pela Presidência do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ) que pretende reduzir o tempo de duração e a quantidade de processos em andamento.

De acordo com o Desembargador, que gosta de ser chamado popularmente como Zé, é preciso inserir a cultura de conciliação no Judiciário brasileiro. Segundo ele, não adianta investimento em concursos e no aumento dos Tribunais porque há uma desproporcionalidade na quantidade de pleitos judiciais em relação aos órgãos criados para resolvê-los.

Como o principal objetivo do projeto é tornar a Justiça do Trabalho mais preocupada com a paz social, o Desembargador se mostra aberto ao diálogo e mantém uma página na internet para que as pessoas envolvidas nas causas e os próprios advogados possam se aproximar do processo. Ele e a desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo apostam no bom-humor e no diálogo para deixar todos no Tribunal à vontade e assim terem um bom resultado ao término da audiência.

Justiça & Cidadania – Como começou o projeto “Como ser legal sem burocracia”?

José Geraldo da Fonseca – Idealizei o projeto em maio de 2010. O nome foi criado por minha colega Rosana Salim Villela Travesedo, que participa dele comigo. Levamos a ideia ao presidente do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro, desembargador Aloysio Santos. Ele gostou, sugeriu a sua formalização por meio de um ato. Redigimos e ele publicou no Diário Oficial. A partir daí, começamos a executá-lo.

JC – Por que a ideia de um projeto voltado para a conciliação?

JG – Todo o modelo jurisdicional que temos, em qualquer nível do Judiciário, é pensado a partir da ideia do confronto. Nós [juízes] somos treinados a intervir em qualquer litígio apenas se provocados pela parte interessada. O próprio Código de Processo Civil diz que “nenhum juiz prestará a jurisdição senão depois de provocado”. Isso torna a sociedade extremamente litigiosa. As pessoas não hesitam em procurar o Judiciário ao primeiro aborrecimento. Não há cultura da conciliação. As pessoas preferem o confronto em vez de tentar a conciliação fora do processo. Esse modelo de jurisdição está esgotado, fadado ao fracasso. Numa sociedade de massa, as esferas de individualidade são muito reduzidas, e é provável que os direitos sejam violados mais frequentemente. Não adianta investir em concursos e formação de juízes e criar tribunais. As lides crescem em quantidade maior que os órgãos criados para resolvê-las. Pensamos em inverter essa lógica e tentar a conciliação no segundo grau.

JC – Como o senhor observa que o “Ser Legal sem Burocracia” atinge e beneficia as pessoas?

JG – O projeto existe desde maio de 2010, o que nós podemos observar de imediato é que ele abrevia o tempo de duração do processo e resolve as questões judiciais de modo definitivo, porque busca a conciliação.

JC – As pessoas observam essa vantagem do processo conciliatório?

JG – Nesse caso não é só o tempo, mas também o desgaste pelo qual as pessoas envolvidas não terão de passar. Por meio do nosso projeto, a solução da lide é encontrada pelas próprias partes envolvidas, sob nossa supervisão. Uma pendência judicial resolvida pelos próprios interessados sepulta definitivamente a discussão. O processo acaba ali, sem qualquer protelação. Na decisão judicial, feita por sentença, pelo juiz, a solução da lide é imposta pelo Estado. O processo de decisão é relativamente rápido, mas a solução do processo não tem dia certo para terminar porque, publicada a decisão no TRT, o processo baixa à Vara para ser liquidado e inicia-se a fase de execução da sentença, com todos os recursos que a lei prevê para essa fase. A conciliação acaba sendo o melhor caminho.

JC – O projeto foi um dos finalistas do I Prêmio Conciliar é Legal do CNJ. Como o senhor recebeu essa notícia?

JG – Com orgulho, acima de tudo. Sabíamos que o projeto era bom, e quando a Conselheira do CNJ, Andrea Pachá, nos disse que éramos um dos três finalistas, dentre os 101 projetos inscritos, sentimos que estávamos no caminho certo. Acabamos em segundo lugar, com uma menção honrosa. Com grande mérito também, o vencedor foi São Paulo. “Ser Legal sem Burocracia” é ainda muito novo e, no ano que vem, temos chances reais de ganhar o prêmio, mas isso não é importante para nós. O reconhecimento da importância do projeto por um órgão como o CNJ já é premiação bastante.

JC – Há previsão de uma segunda etapa do projeto. Como será essa nova fase?

JG – Nosso projeto foi pensado em três fases. A primeira é essa, que estamos executando. A sua importância reside em quebrar os paradigmas da jurisdição. De início, os advogados pensaram que estávamos abrindo uma nova fase de provas, que poderiam aproveitar a oportunidade para corrigir eventuais falhas de procedimento ocorridas na primeira instância. Também enfrentamos a cultura das partes. As pessoas pensavam que conciliando estavam admitindo algum tipo de culpa. Quebradas essas falsas impressões sobre o projeto, a receptividade foi muito boa. Os próprios advogados nos procuram para pedir pauta de conciliação. Agora, na segunda fase, vamos identificar os maiores devedores da Justiça do Trabalho e convidá-los à conciliação, antes que os processos sejam distribuídos a um dos desembargadores do Tribunal. Nesse período, ainda vamos visitar as empresas que mais poluem o ambiente ou degradam a saúde do trabalhador e procurar ajudar na solução dos problemas.

JC – Quais foram os maiores diferenciais dessa primeira fase do projeto?

JG – Disponibilizamos os telefones do gabinete e nossos celulares pessoais para o agendamento de conciliações. Qualquer um pode ligar e falar diretamente conosco. Tenho um site (www.poisze.com.br). Através do link “Fale com o Zé” o advogado pode mandar e-mail pedindo inclusão de seus processos nas pautas de conciliação ou acompanhar o andamento do seu processo. Eu me preocupo com essa aproximação e com o diálogo e respondo a todos os e-mails que recebo.

JC – A sua área de jurisdição é a do Trabalho. O senhor considera importante projetos voltados para essa área?

JG – Sim. Se você pensar bem, existem apenas duas grandes forças motoras na sociedade: o capital (empresa) e o trabalho (empregado). Essa relação é, por essência, permanentemente tensa. Por isso, toda ação que aproxime esses dois parceiros sociais é importante e bem-vinda.

JC – Como será conduzido o projeto “Cooperativa Amiga da Justiça”?

JG – Na última fase do projeto pretendemos erradicar o tráfico de gente salariada que é comum no Rio de Janeiro por meio de falsas cooperativas. Faremos um grande seminário, com os maiores especialistas em trabalho cooperativo, Ministério Público, Organização das Cooperativas Brasileiras, entre outros órgãos. Dessa forma, identificaremos as cooperativas sérias e daremos a ela o selo “Cooperativa Amiga do Trabalhador”. A cooperativa séria será permanentemente acompanhada por nós. Será como separar o joio do trigo. Com isso, quem contratar com essa cooperativa saberá que está lidando com gente séria, que tem o aval da Justiça do Trabalho. Nosso objetivo é dar maior segurança aos trabalhadores, aos empresários que contratam os serviços das cooperativas e, a médio prazo, diminuir o volume de processos em que se pede reconhecimento de vínculo em face de cooperativas de trabalho.

JC – E sobre a meta de aproximar o Judiciário das universidades e escolas. Como será desenvolvido esse projeto?

JG – Na terceira fase do projeto, criamos o programa “O juiz vai à escola”, onde um grupo de colegas irá visitar escolas públicas de primeiro e segundo graus e universidades para passar noções básicas de Direito do Trabalho e cidadania. O juiz precisa mostrar a sua cara, chegar ao povo. As pessoas comuns têm uma ideia muito errada do juiz. Vejo isso nas audiências. Há um temor, uma reverência desnecessária. O magistrado é uma pessoa comum, que exerce uma profissão comum e tão importante quanto um lixeiro, um policial, uma enfermeira, um professor, um bombeiro. O homem comum tem de respeitar o juiz como respeita qualquer outro. Não tem de temê-lo, nem lhe prestar reverência que não condiz com o cargo. Nossa ideia é criar uma sociedade menos beligerante. Para isso, pediremos à presidência do TRT nossa inclusão na parceria que o órgão firmou com o CNJ e o TJERJ para estar presente nas ações comunitárias a serem desenvolvidas nas UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora).