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Disponibilidade do interesse público envolvendo as causas de competência dos Juizados Especiais Federais

5 de setembro de 2004

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A Declaração Universal dos Direitos do Homem contém os princípios básicos aos quais os Estados nacionais devem obedecer para que seja viabilizado o eficaz acesso à Justiça. A observância de tais princípios caracteriza o primeiro passo da atuação estatal, a anteceder outras atividades igualmente importantes, no sentido de que o cidadão, habitante de um Estado Democrático de Direito, possa vivenciar a presença da democracia e da justiça, seus valores primordiais, assegurando, assim, os direitos do homem.

Segundo o art. VII do mencionado Estatuto, “todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei”. Para que esse princípio cumpra as suas finalidades, deve ele ser considerado juntamente com o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, resultando no princípio da igualdade aristotélica, que consiste em igualar os iguais e desigualar os desiguais (igualdade em sentido geométrico).

Além de garantir o direito de igualdade, a Declaração Universal dos Direitos do Homem ainda estabelece que: “todo homem tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela Constituição ou pela lei” e que “todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa” (arts. VIII e X).

Também o princípio do devido processo legal se presta a assegurar proteção ao indivíduo, na medida em que atua tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao garantir paridade total de condições entre o Estado-acusador e a plena defesa do réu.

Assim, compete ao Estado a primordial responsabilidade de a todos assegurar a obediência aos princípios da igualdade e do devido processo legal.

A forma de atuação do Estado, para que seja atingido esse fim, deve se dar através de uma ação regula-tória, disponibilizando o acesso ao Poder Judiciário, por meio de lei, em qualquer caso.

É necessário, porém, que, eventualmente, as barreiras limitadoras da atuação estatal – por vezes presentes nos países não classificados como de primeiro mundo – sejam superadas, com o conseqüente alcance da democracia e maior efetividade dos direitos humanos, como, aliás, destacava Norberto Bobbio:

“nestes últimos anos, falou-se e continua a se falar de direitos do homem, entre eruditos, filósofos, juristas, sociólogos e políticos, muito mais do que se conseguiu fazer até agora para que eles sejam reconhecidos e protegidos efetivamente, ou seja, para transformar aspirações (nobres, mas vagas), exigências (justas, mas débeis), em direitos propriamente ditos (isto é, no sentido em que os juristas falam de ‘direito’).”

O acesso à justiça

Capelletti relacionou as principais barreiras para o efetivo acesso à Justiça:

• Custas judiciais;

• Pequeno valor das causas (às vezes os custos excedem o montante da controvérsia);

• Tempo

• Pequenas possibilidades, por parte da população em geral, para reconhecer um direito e propor uma ação ou sua defesa;

• Dificuldades do litigante eventual perante o habitual (normalmente grandes empresas);

• Dificuldades na defesa dos interesses difusos.

A realidade brasileira, adequando-se aos ensinamentos de Capelletti, mostra que o acesso à Justiça não é amplo, seja pela dificuldade de obter a prestação jurisdicional, seja pela delonga desmedida na solução dos litígios.

Ainda na visão de Capelletti, soluções podem ser obtidas para que tais dificuldades sejam ao menos amenizadas, ampliando-se o acesso à Justiça:

“a primeira solução para o acesso é a assistência judiciária; a segunda diz respeito às reformas tendentes a proporcionar representação jurídica para os interesses ‘difusos’; e a terceira é o que se denomina ‘enfoque de acesso à Justiça’, representam do uma tentativa de atacar as barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo, além de medidas de caráter geral, com reformas no campo dos direitos material e processual, além das estruturas dos órgãos jurisdicionais.”

Foi nesse contexto que nasceu a idéia dos Juizados Especiais, que foram criados com o objetivo de eliminar, ou pelo menos diminuir, alguns dos obstáculos ao efetivo acesso à Justiça, assegurando, assim, a  observância dos direitos esculpidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem.

O surgimento dos rudimentos dos Juizados Especiais remonta à Inglaterra do século XI, passando pela legislação austríaca, em 1873. Na Noruega, instituiu-se um sistema, nos fins do século XIX, tendo por objetivo proteger os camponeses que não podiam pagar advogado. Nos EUA, a experiência pôde ser observada já a partir de 1912, com a instituição da Poor Man’s Court. Em 1934, apareceu, em Nova York, as Small Claims Courts, destinadas a julgar causas com valor inferior a US$50.00.

Mas foi na Alemanha, através do denominado Stuttgarter Moddel, criado em 1965, que o Brasil foi buscar inspiração para os Juizados Especiais.

As bases de funcionamento do Stuttgarter Moddel eram a simplicidade, a informalidade, a oralidade, a especialização, a concentração e a ativa participação do juiz.

Assim, em 7/11/84, foi publicada a Lei n. 7.244, criando o Juizado Especial de Pequenas Causas, precursor dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

A CF/88, reconhecendo o grande sucesso desses Juizados, previu-os no art. 98, I, passando a denominá-los Juizados Especiais. Os Juizados Especiais nos Estados foram instituídos pela Lei n. 9.099, de 26/9/95. Os Juizados Especiais Federais, pela Lei n. 10.259, de 12/07/01.

O processo nesses juízos valoriza os critérios da oralidade, da simplicidade, da informalidade, da economia processual e da celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação das partes.

O que se observa nos JEF’s, porém, é que essa conciliação das partes não vem sendo alcançada, vez que os representantes judiciais dos órgãos públicos federais, via de regra, não se encontram dispostos a conciliar, por entenderem que se trata de direito indisponível e que o interesse público se sobrepõe ao interesse privado, princípios fundamentais do regime jurídico-administrativo que representam.

Os princípios básicos que fundamentam o regime jurídico-administrativo

É sabido que uma disciplina jurídica somente vem a ganhar autonomia quando corresponde a um conjunto sistematizado de princípios e normas que lhe dão identidade e a diferenciam dos demais ramos do Direito.

Assim, para que se possa falar em Direito Administrativo, é necessário aceitar que este corresponde a um conjunto sistematizado de princípios e normas que lhe são próprios e peculiares, e que guardam entre si uma relação lógica de coerência e unidade, compondo o regime jurídico-administrativo.

Relativamente ao Direito Adminis-trativo, pois, esse regime jurídico-administrativo, que dá autonomia ao ramo, consiste, fundamentalmente, na consagração de dois princípios:

• Supremacia do interesse público sobre o privado

• Indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos

São eles considerados pela

como fonte matriz do sistema jurídico-administrativo brasileiro, proclamando a superioridade do interesse da coletividade sobre o particular, não podendo o administrador dele dispor.

Com efeito, é o binômio “prerrogativas da Administração”/“direitos dos administrados” que termina por orientar a aplicação do Direito Administrativo, nos diversos sistemas jurídico-positivos existentes, mostrando, eventualmente, uma feição mais autoritária ou, ao contrário, mais democrática, conforme a prevalência de um ou de outro aspecto.

São esses dois elementos que se expressam nos dois princípios fundamentais de Direito Administrativo que passaremos agora a ver.

Supremacia do interesse público sobre o privado

De acordo com a mais abalizada doutrina administrativista brasileira, decorre desse princípio, em regra, a posição privilegiada do órgão administrativo nas relações com os particulares, sendo defeso ao Administrador Público representar interesses meramente pessoais, devendo atuar sempre sob o influxo da finalidade pública instituída por lei.

Indisponibilidade do interesse público

Já esse princípio significa que sendo o interesse público qualificado como próprio da coletividade, não se encontra ao livre dispor de quem quer que seja, por ser inapropriável.

Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello:

“O necessário é encarecer que na administração os bens e os interesses não se acham entregues à livre disposição da vontade do administrador. Antes, para este, coloca-se a obrigação, o dever de curá-los nos termos da finalidade a que estão adstritos. É a ordem legal que dispõe sobre ela”.

Repensando esses princípios

Só a um primeiro olhar, entretanto, é adequada essa descrição desses dois princípios.

O problema, entretanto, não é propriamente da descrição, mas sim do modo como é feita sua implementação pelos diversos setores da Administração Pública, especialmente em face dos recém-criados e implementados Juizados Especiais Federais.

Não se pretende aqui advogar o fim da prevalência do interesse público sobre o particular ou a total disponibilidade do interesse público, mas sim que a importância de ambos os princípios deve relativizar-se, cedendo, por vezes, espaço ao bem comum, como meio de composição harmônica do bem de cada um com o de todos.

Em outras palavras, os princípios da supremacia e da indisponibilidade explicam, antes, uma regra de preferência, que prevalecerá ou não, dependendo do caso concreto que se está a examinar, e não uma regra absoluta.

Ou seja: a exata compreensão desses princípios, no sentido de regra de preferência, significa que, diante de um caso concreto, o administrador assume o encargo de eleger a solução que melhor se ajuste às finalidades da norma, avaliando critérios de conveniência e oportunidade.

Tendo-se em conta o caráter genérico que é próprio da lei, ao administrador cabe, ante a hipótese fática que se lhe apresenta, a faculdade e o dever de apreciar discricionariamente a situação, implementando a finalidade legal a que está jungido, pelo princípio da legalidade, não olvidando, entretanto, que o fim legal é sempre o termo a ser atingido pela lei.

É evidente que tal faculdade não significa que o administrador possa agir desarrazoadamente. O princípio da razoabilidade está também implícito nessa nova leitura dos princípios da supremacia e da indisponibilidade.

Assim, sempre que, atuando com razoabilidade e proporcionalidade, o administrador ponderar aqueles dois princípios, estará cumprindo seu papel e a atribuição que lhe deferiu o parágrafo único do art. 10 da Lei n.10.259, de 12/07/01, verbis:

“Parágrafo único. Os representantes judiciais da União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, bem como os indicados na forma do caput, ficam autorizados a conciliar, transigir ou desistir, nos processos da competência dos Juizados Especiais Federais.”

Por conseguinte, pode-se afirmar que essa faculdade atribuída ao administrador – no caso ao procurador – de conciliar, transigir ou desistir, se encontra dentro da finalidade de celeridade processual, fixada pela lei que instituiu os JEF’s, donde não será a lei corretamente aplicada se o ato de sua aplicação não corresponder a essa sua finalidade.

A importância do interesse privado nos JEF’s

Nos JEF’s, o interesse privado assume especial importância, vez que se trata de particular litigando com o Poder Público.

Aqueles que se posicionam contrariamente à conciliação defendem que não é possível conciliar, nesse caso, por se encontrarem presentes o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular e o princípio da indisponibilidade do interesse público, de forma insuperável.

Será essa uma regra absoluta?

Para que a resposta a essa pergunta seja afirmativa, é necessária a verificação de três vertentes:

• que o interesse público seja dissociável do interesse privado, como forma de permitir, ainda que abstratamente, uma posição de supremacia em favor do primeiro;

• que haja uma relação bipolar entre os citados interesses;

• que o interesse público seja objetivamente determinável, no caso concreto, sob pena de ser insustentável uma supremacia dele sobre o interesse privado.

Ora, se nem sempre esses interesses podem ser verificados separadamente; se uma relação bipolar entre ambos nem sempre é possível; e se há dificuldades em se identificar o interesse público, diante de um caso concreto, pode-se afirmar que nem sempre ter-se-á uma primazia ipso facto e a priori do interesse público sobre o privado. Pelo contrário, ouso dizer que não há uma supremacia automática, preliminar e geral do interesse público.

A relação do interesse privado com o interesse público

Qual é, então, o significado geral que o interesse público possui para um Estado de Direito?

Trata-se de um postulado ético-político, referindo-se ao bem comum, no sentido de princípio fundamental da ética de uma comunidade determinada.

E é evidente que o bem comum engloba também o bem de cada um dos particulares que compõem a coletividade. Os interesses privados podem, sim, transformar-se em interesse público, dependendo de uma série de fatores.

Deve, assim, haver uma ponderação de valores, tanto dos interesses público e privado reciprocamente considerados, quanto do interesse público em si, podendo eventualmente prevalecer ora um, ora outro.

O interesse privado visto como componente do interesse público

Aquela mencionada relação bipolar ‘interesse público X interesse privado’ é uma forma de interpretação já ultrapassada desses dois princípios, e deve ceder frente a uma nova leitura, que incorpore a multiplicidade de interesses privados que compõem o interesse público, que não envolve necessariamente uma contraposição bipolar entre interesse público e privado.

O Poder Judiciário, especialmente a Justiça Federal, vem atuando à frente dessa nova leitura, a cada vez que privilegia o interesse privado, em uma ponderação diferenciada de valores, operada em cada caso concreto. Ou, nos dizeres de Peter Häberle, “a ‘jurisprudência do bem particular’ torna-se uma parte – indireta – da ‘jurisprudência do bem comum’”.

A essa altura, não é demais afirmar que o interesse privado, no final das contas, também serve, indiretamente, ao interesse público, sendo também digno de sujeitar-se a uma ponderação de valores.

Em outras palavras: a motivação explicaria a prevalência do interesse privado no caso concreto, em vez de adotar-se um princípio de prevalência absoluta do interesse público. Valorar-se-ia, isto sim, a importância do bem comum.

Não é isso, entretanto, que estamos acompanhando nos JEF’s.

O preconceito contra a conciliação nos JEF’s

É notório o preconceito que existe contra a possibilidade de conciliação e transação nos JEF’s, com base na indisponibilidade dos interesse público.

Como já visto, entretanto, o princípio da indisponibilidade do interesse público não significa proibição de qualquer transação, mas tão-somente da transação que seja desvantajosa para o órgão público.

Uma conciliação/transação pode resultar em economia extremamente útil para os cofres públicos, na medida em que economiza uma parte do valor da condenação, além de, eventualmente, economizar também verbas sucumbenciais, o custo/hora de cada um dos profissionais envolvidos, pagos pelo Erário Público, evitando ainda o entulhamento desnecessário dos JEF’s, o que terminaria por eliminar seu princípio básico de celeridade, contrariando o que determina a Lei n. 10.259/01. Assim, impedir a transação é que é o comportamento contrário ao interesse público, vulnerando o interesse coletivo.

Destaque-se que já têm sido editados atos normativos que indicam que o Poder Público vem avaliando essa relação custo/benefício e considerando mais proveitoso desistir de litigar pelo simples hábito de litigar, como aquele que:

• dispensa a execução de honorários de sucumbência abaixo de R$1.000,00;

• dispensa a execução fiscal de débitos inferiores a R$1.000,00;

• dispensa o recurso voluntário, pelo órgão público, em causas já decididas em definitivo pelos tribunais superiores.

É a própria Administração Pública, por suas mais altas autoridades, que não considera proveitoso prosseguir na lide, abrindo, com isso, as portas para uma visão mais pragmática e objetiva do interesse público, divorciada de conceitos já superados.

Por outro lado, o medo de fraudes tampouco deve impedir a conciliação, “até porque a inexistência desta não impediu a ocorrência daquelas”.

É evidente que um Judiciário mais rápido, menos entulhado e mais eficiente contribui sobremaneira para dificultar a ocorrência de fraudes.

Além disso, a própria limitação de alçada dos Juizados contribui para dissuadir os fraudadores que, como demonstra a história, têm particular afeto com as causas de grande valor.

Por outro lado, ao moldar o procedimento do rito do Juizado Especial, o legislador teve em mente, como seu elemento principal, o princípio da celeridade, pelo que simplificou-o bastante e iniciou-o pela conciliação.

Como destaca Carreira Alvim:

“a conciliação nunca deve ser vista como uma mera formalidade processual, mas como uma forma de desarmar e apaziguar espíritos contraditores, em benefício deles próprios e da paz social. Quando se tem uma conciliação bem conduzida, os contendores saem da audiência dispostos a cumprir o acordo, deixando para trás as mágoas alimentadoras de novos conflitos; quando se tem uma conciliação mal conduzida, não só os contendores se mostram predispostos a não cumprir o acordo, como saem alimentados do propósito de conduzir seu adversário às barras do tribunal, na primeira oportunidade que tiver”.

É importante destacar, também, que o conciliador não

A natureza jurídica da conciliação é a de jurisdição voluntária, inserida no decorrer do procedimento, com vistas a alcançar um resultado melhor, ou ao menos mais célere, do que aquele que se poderia obter com a jurisdição contenciosa. Observe-se, também, que esta somente atende aos interesses do autor, enquanto aquela atende ao de ambas as partes.

Conclusão

Como já visto, a conciliação e a transação são hoje legalmente possíveis. As dificuldades administrativas para sua concretização é que vêm tornando essas eficientes figuras em institutos de pouca utilidade prática.

Por um lado, habemus lex que autoriza a conciliação.

Por outro, os princípios da supremacia e da indisponibilidade não podem mais ser compreendidos no sentido de que os interesses privados ocupam uma posição de contraposição ao interesse público, uma vez que aqueles consistem em uma parte deste. Não podem, tampouco, ser descritos como uma regra absoluta de supremacia do interesse público sobre o privado, mas sim como regra de prevalência, diante de um caso concreto, de acordo com as variáveis em análise.

Dessa nova leitura, advêm duas importantes constatações:

• O órgão demandado deve sempre avaliar, casuisticamente, se cabe ou não conciliação, em um dado processo, levando em conta os pedidos e, dentre eles, quais têm grandes chances de sucesso, isso considerando a jurisprudência das Turmas Recursais, da Turma de Uniformização de Jurisprudência, dos Tribunais Superiores e, eventualmente, dos próprios Juizados. Devem ser considerados também o custo/hora do trabalho do Procurador e dos membros dos JEF’s, eis que toda a despesa é suportada, em última análise, pelos cofres públicos.

• Uma vez ponderados os interesses reciprocamente considerados, fundamentadamente, deve o órgão propor a conciliação, por meio de transação.

A repetição de tributos já definida pelos Tribunais Superiores, a concessão de benefício à companheira com filhos comuns com o instituidor da pensão, a indenização por danos materiais e morais amplamente comprovados, a correção monetária do FGTS, são exemplos de pedidos cuja ponderação de interesses certamente vai indicar o acerto da proposta de transação, favorecendo, a um só tempo, o interesse privado e o interesse público.

Assim, a ponderação deve, primeiro, determinar se a transação é vantajosa para a Administração para, depois, procurar proteger ao máximo ambos os interesses em jogo, propondo uma transação.

Esse caminho é bem diverso daquele que, a priori, direciona a interpretação das regras administrativas em favor do interesse público, no sentido de inviabilizar a conciliação.

Não se está negando a importância jurídica do interesse público. O que deve ficar claro, porém, é que deve haver uma ponderação dos interesses privado e público, em cada caso examinado.

É essa ponderação – que vai dar máxima aplicabilidade aos interesses envolvidos – que é o critério decisivo para a atuação administrativa, e não a simples recusa de conciliar, com base na supremacia do interesse público sobre o particular e na indisponibilidade do interesse público.

Já se encontra na jurisprudência da mais alta Corte deste país julgados nesse sentido, como faz ver a seguinte ementa, da lavra da eminente Ministra Ellen Gracie Northfleet, publicado no Diário de Justiça 1, de 21/06/02, verbis:

“PODER PÚBLICO. TRANSAÇÃO. VALIDADE.

Em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis, porque pertencem à coletividade. É, por isso, o Administrador, mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotada pela Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste interesse. Assim, tendo o acórdão recorrido concluído pela não onerosidade do acordo celebrado, decidir de forma diversa implicaria o reexame da matéria fático-probatória, o que é vedado nesta instância recursal (Súm. 279/STF). Recurso extraordinário não conhecido.” (RE-253.885/MG).

Cabe, portanto, a cada um de nós, envolvidos nesse processo de modernização do Poder Judiciário, contribuir para viabilizar e tornar a conciliação e a transação figuras efetivas e presentes no dia-a-dia dos Juizados Especiais Federais.