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E por falar em mulher

19 de abril de 2013

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No mês de março, quando se comemorou o Dia Internacional da Mulher, um artigo de jornal me chamou atenção. Tinha como título “Três Prioridades Globais para Mulheres e Meninas”. O conteúdo do artigo ainda mais atenção me despertou: era do Presidente do Grupo Banco Mundial, Jim Young Kim, que após indagar “o que podemos fazer para acelerar o progresso?”, deu a resposta seguinte: “trabalhar em torno de três prioridades: 1) assegurar às mulheres as liberdades básicas; 2) executar as leis que combatem a violência contra as mulheres; e 3) aumentar significativamente as políticas públicas em favor das mulheres.”

As prioridades apontadas praticamente coincidem com as metas traçadas pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, no balanço semestral de 2012, quando indicou como fatores preponderantes à obtenção da igualdade substancial do gênero: 1) participação da mulher na vida econômica, com abertura de oportunidades; 2) poder político para as mulheres; 3) educação e saúde; e 4) sobrevivência.

O que me chamou atenção é verificar estar o poder econômico atento para a questão da desigualdade, como fator de desequilíbrio social e econômico e concluir: depois de vinte anos a luta pela igualdade das mulheres deixou de ser preocupação apenas de movimentos feministas, vistos, em princípio, como barulho de mulhe­res ridículas, feias, velhas e mal amadas. Agora é uma questão econômica, trabalhada pelo Estado como imprescindível à democracia.

Não é demais recordar que ainda nos anos noventa, quando as mulheres brasileiras, incipientemente engajadas em movimentos feministas, preparavam material para apresentarem no Congresso Internacional de Mulheres em Beijing, na China, em 1995, pela primeira vez notaram ser o Poder Judiciário o único a não ostentar em seus postos de mando uma mulher. Constataram também que, dos três Poderes da República, era o único a adotar como ingresso a mais democrática das formas: o concurso público, fator explicativo para um grande número de mulheres magistradas na base da pirâmide, muitas eram as mulheres juízas de primeiro grau. A presença se empalidecia na medida em que se ia galgando a hierarquia do Poder, até chegar aos Tribunais Superiores, cujo acesso se dava por escolha exclusivamente: nenhuma mulher nos Tribunais, só umas poucas nos Tribunais Intermediários e nenhuma no Supremo Tribunal Federal, a cúpula do Poder Judiciário.

A partir daí coube aos movimentos feministas exigir do Presidente da República fosse assinada uma Carta de Intenções, comprometendo-se a colocar representantes femininas na cúpula do Judiciário. Foi assim que cheguei, em 1999, como a primeira mulher a ocupar uma vaga no Superior Tribunal de Justiça e um ano depois ser nomeada a Ministra Ellen Gracie para o Supremo Tribunal Federal.

Contar esta história é importante por duas razões: para que sejam valorizadas as mulheres que estão à frente dos movimentos feministas, responsáveis diretas pela abertura dos caminhos que levam à igualdade, como também para que as mulheres, merecedoras do privilégio de estarem na cúpula, entendam não serem apenas os seus méritos a causa determinante do sucesso profissional.

Nesse ponto, é interessante observar que a alienação de algumas profissionais, inclusive dentro do Poder Judiciário, é deletéria para as próprias mulheres. Na tentativa de obterem as benesses de um poder ainda dominado pelos homens, assumem uma postura de subserviência pueril, passando a gozar da confiança daqueles que não querem ser incomodados no Poder. E na iminência de serem chamados à modernização, elegem mulheres não incômodas, mulherzinha boba e sem opinião própria, dando sequência a uma saga de dominação, agora fora de casa. Transportam para os umbrais das Cortes o poder de mando e domínio, em um jogo de faz de conta de quem não quer ser atrapalhado por mulher, mas também não quer ficar à margem da história. O que fazer: colocar mulheres que não atrapalhem dóceis, educadas, comportadas e se possível trabalhadoras.

Não podemos, em hipótese alguma, abrir mão de nossa condição feminina, não podemos esquecer que chegamos ao empoderamento não apenas por qualidades próprias, mas em decorrência de um sem número de mulheres anônimas que lutaram pela igualdade, sem medo de serem ridículas, não podemos interromper o ciclo das lutas pela igualdade de tantas outras mulheres que ainda precisam ter condições de acesso aos direitos para serem substancialmente iguais.

O artigo de que citei no início concluía afirmando: “Nós, do Grupo Banco Mundial, continuaremos a impulsionar o progresso nessas áreas prioritárias. Conseguir a igualdade para mulheres e para meninas é um desafio enorme. No Banco Mundial, faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para assegurar que estejamos na vanguarda”.

Pergunto então: “E você mulher profissional e bem sucedida, o que fez em favor de outras mulheres para atingir a igualdade?” Não basta ser mulher, é preciso mostrar porque se é mulher.