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Floriano Peixoto – O Marechal de Ferro

5 de janeiro de 2005

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Os dez primeiros anos da República foram terríveis: escândalos financeiros, arrocho salarial, clientelismo, aumento de impostos, oligarquias, coronelismo, repressão aos movimentos populares, desvio de verbas, impunidade, fraude eleitoral, fechamento do Congresso, estado de sítio, crimes políticos, confronto entre governos civis e militares.

Não bastasse tudo isso, o Brasil na primeira década republicana foi sacudido por suas duas maiores guerras civis: a Revolta Federalista de 1893, no Rio Grande do Sul, e a Revolta da Armada, no Rio de Janeiro.

Para que se entenda esse período turbulento da história brasileira até chegarmos a Floriano Peixoto, é necessário que se fale de Deodoro da Fonseca, cuja renúncia favoreceu seu vice-presidente. O livro História do Brasil, coordenado por Eduardo Bueno, em suas 320 páginas relata os episódios da pré-história, o Brasil indígena e o descobrimento até o governo de Fernando Henrique; Bueno descreve assim os dois governos de Deodoro:

“Os governos do Marechal Deodoro começaram e terminaram no mesmo lugar: na cama. Deodoro estava doente e, após derrubar o Ministério de Ouro Preto, na confusa quartelada do alvorecer de 15 de novembro de 1889, proclama a República na mesma noite, em sua casa, provavelmente de pijama, rodeado pelos golpistas que empossou como membros do Ministério do Governo Provisório”

O Marechal Deodoro começou a cair, segundo Bueno, no mesmo dia em que tomou posse. No dia 25 de fevereiro de 1891, o Congresso o elegeu presidente com 129 votos contra 97 dados a Prudente de Morais. No entanto, Floriano Peixoto, candidato a vice na chapa de Prudente obteve 153 votos, 24 a mais que Deodoro e quase o triplo dos 57 votos dados a Eduardo Wandekolk, vice de Deodoro. No dia da posse, o Congresso recebeu Deodoro com um silêncio constrangedor, para, minutos depois, aclamar Floriano com urras ensurdecedoras.

No dia 3 de novembro de 1891, indignado com a aprovação de uma lei que permitia o impeachment do presidente, Deodoro fechou o Congresso. No dia 23 do mesmo mês, o Almirante Custódio de Melo, a bordo do encouraçado Riachuelo, ameaçou bombardear o Rio de Janeiro. Doente e de cama, Deodoro renunciou em favor de Floriano Peixoto. Teimoso, autoritário e sem experiência administrativa, Deodoro fez um governo desastroso: a política financeira de seu ministro Rui Barbosa mergulhou o país num caos. O fechamento do Congresso e a decretação de estado de sítio candidataram Deodoro ao posto de primeiro ditador brasileiro. Como ditadores não renunciam, o titulo acabou ficando com seu sucessor Floriano Peixoto.

O médico e historiador Roberval Bezerra de Menezes, através de uma pesquisa nos arquivos da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro levantou a causa mortis de todos os presidentes brasileiros, de Deodoro a Costa e Silva. Segundo ele, “adeus vida” foram as últimas palavras do Marechal Deodoro da Fonseca que se achava na sala de visitas da sua residência na Rua Senador Vergueiro, no Flamengo, recostado em seu sofá acompanhado de familiares, do irmão João Severiano da Fonseca e do Dr. José Félix. Às 7horas da manhã do dia 23 de agosto de 1892, estava tranqüilo quando foi acometido de um forte acesso de dispnéia. Segundo o médico Joaquim Duarte Murtinho, o Marechal Deodoro da Fonseca foi vítima de uma arterioesclerose. Natural de Alagoas, nasceu no dia 5 de agosto de 1827, o primeiro presidente republicano faleceu aos 65 anos de idade e foi enterrado no Cemitério do Caju em trajes civis.

O governo de Floriano Peixoto

O Marechal Floriano Peixoto, segundo os historiadores, era uma figura misteriosa e evasiva. Considerado o primeiro ditador de fato da história do Brasil, assumiu o governo como vice-presidente em exercício no dia 23 de novembro de 1891. Logo de saída restabeleceu o Congresso, suspendeu o estado de sítio e seu governo foi considerado inconstitucional. O artigo 42 da Constituição dizia que se o presidente não completasse a metade do mandato, novas eleições deveriam ser convocadas. Mas, Floriano com o apoio do PRP (Partido Republicano Paulista, fundado em 16 de abril de 1873) e da classe média de Itu, sentiu-se à vontade no papel de consolidador da República, lançando as bases de uma Ditadura de Salvação Nacional. Realizou um governo nacionalista e centralizador, enfrentando seus inimigos. Tornou-se o Marechal de Ferro quando venceu a queda-de-braço contra a Marinha na Segunda Revolta da Armada. No sul, apoiou Julio de Castilhos.

Apesar de uma aparência democrática, o governo de Floriano Peixoto herdou forte tendência autoritária. A situação política do país passou por grandes perturbações. A oposição ao seu governo foi constante e ativa. Governadores ligados a Deodoro da Fonseca pressionavam e pediam novas eleições. Algumas guarnições militares rebelaram-se, mas a resposta do Marechal de Ferro foi imediata e dura: depôs todos os governadores ligados ao antigo governo e prendeu os militares rebelados.

As duas revoltas

A Segunda Revolta da Armada foi um movimento militar que pretendia depor Marechal Floriano. Mais tarde, os revoltosos liderados pelo Almirante Custódio de Melo, o mesmo que derrubara Deodoro na Primeira Revolta da Armada em novembro de 1891, e por Saldanha da Gama, uniram-se aos federalistas que travavam, no Rio Grande do Sul, a Guerra Civil de 1893 contra Julio de Castilhos e seus aliados. Foi uma luta interna envolvendo diversas facções representantes da oligarquia local, num conflito que durou até 1895 e acabou por envolver o governo federal. O Rio Grande do Sul dividia-se politicamente entre os partidários de Julio de Castilhos, Presidente do Estado e apoiado por Floriano, cujos seguidores eram conhecidos por “pica-paus castilhistas”, e os partidários de Silveira Martins, conhecidos como “federalistas ou maragatos”. Fator agravante no conflito foi o apoio dado aos maragatos pela Marinha então rebelada contra Floriano.

“A Segunda Revolta da Armada eclodiu às 11 da noite de 6 de setembro de 1893, quando Custódio de Melo fez içar, no encouraçado Aquidabã, o pavilhão rubro da rebelião. A ele se uniram 16 vapores de guerra e oito vapores mercantes, navios velhos e quase imprestáveis. No dia 13 de março de 1895, depois de um ano e meio de revolta infrutífera na Baía de Guanabara, os rebeldes desistiram da luta e pediram asilo em navios portugueses ancorados nas cercanias”. (Bueno, p.164)

O fim da rebelião

A narrativa ainda é do livro: “os confrontos se concentraram na Baía de Guanabara, no Rio. Mas, os rebeldes não bombardearam a cidade, só trocaram tiros contra a Fortaleza de Santa Cruz. Incapazes de tomar o Rio, Custódio de Melo e Saldanha da Gama que se odiavam, adotaram táticas diferentes: Melo partiu para o exílio na Europa e Gama se aliou aos rebeldes gaúchos. Morreu em combate no Rio Grande do Sul em junho de 1895”.

No episódio, a população carioca ficou do lado de Floriano. Entretanto, as tensões entre o Exército e a Marinha só terminaram ao fim do mandato de Floriano que apesar de vitorioso do ponto de vista militar, seu governo encontrava-se desgastado. Muitos viam a necessidade de um novo tipo de governo que restabelecesse a tranqüilidade e a ordem civil.

República dos Fazendeiros

As oligarquias e elites rurais deram apoio à candidatura de Floriano Peixoto para derrubar Deodoro e dividir os militares. Entretanto, esse foi um acordo de certo prazo, e o governo nacionalista, de apoio à indústria e à classe média urbana, do Marechal de Ferro logo desagradaria a chamada “República dos Fazendeiros”, integrada pelos cafeicultores paulistas, especialmente porque os jacobinos (republicanos, exaltados e radicais, inimigos dos oligarcas) se uniram a Floriano no ato.

De qual quer modo, as atribuições políticas do Governo Floriano –apoiadas pela Revolução Federalista do Rio Grande do Sul- levaram as elites civis ao consenso de que era preciso afastar os militares da política e retomar o controle do país. E foi o que aconteceu com a eleição do primeiro presidente civil Prudente de Morais, em 15 de novembro de 1894.

A morte do Marechal

Nascido em Alagoas no dia 30 de abril de 1839, o Marechal de Ferro morreu em 29 de junho de 1895 aos 56 anos de idade. A revista O Cruzeiro na reportagem “Presidentes do Brasil – a morte de cada um”, de autoria deste jornalista, assim fala sobre a morte do Marechal de Ferro:

“Governando o Brasil de 1891 a 1894, Floriano Peixoto também natural de Alagoas, morreu às 17horas do dia 29 de junho de 1895 na Fazenda Paraíso em Barra Mansa, de uma esclerose hepática hipertrófica. Segundo atestado passado pelos médicos Pedro Nolasco Buarque de Gusmão, Carlos Augusto de Oliveira e Manoel Fernandes da Silva. Seu corpo foi embalsamado e trasladado paro o Rio de Janeiro, onde foi sepultado”.