Um gesto. Uma data. Um estádio. Um local. Uma cerimônia. A história não esquecerá este dia. Ele não foi uma coincidência.

11 de dezembro de 2013

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O estádio Soccer City, em Soweto, na África do Sul já era conhecido por ter sido o palco da final da Copa do Mundo de Futebol, em 2010, em jogo em que a Espanha derrotou a Holanda e se sagrou campeã mundial.

Agora, o estádio está novamente no centro do mundo com as homenagens prestadas, no memorial fúnebre, pelo povo sul-africano e por mais de 120 lideres e personalidades mundiais, a um dos maiores humanistas e guerreiros pela liberdade e pelos direitos humanos da história recente, Nelson Mandela, cujo corpo será enterrado domingo.

O estádio não foi e é apenas o palco de uma homenagem histórica. Tornou-se, desde ontem, o cenário mundial em que um gesto simples, comum a todos em todos os países, já virou também história pelo seu significado e por tudo o que ele pode promover em um futuro próximo para o bem da humanidade.

O cumprimento, o aperto de mãos, do presidente norte-americano Barack Obama ao líder cubano Raul Castro, irmão de Fidel Castro, além de totalmente inesperado, foi o primeiro gesto entre as lideranças máximas dos dois países, desde o fim da Guerra Fria. Quase 55 anos se passaram para que isto acontecesse em uma espécie de lance do acaso, para surpresa global.

E aconteceu ali, exatamente ali, no histórico distrito de Soweto. Exatamente ali, no histórico estádio Soccer City. Exatamente ali quando o mundo inteiro se curvava solene em homenagem a um dos heróis máximos da liberdade, Nelson Mandela. Exatamente ali e 65 anos da promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

O gesto que já faz história promove o futuro. Ele não significou passar as mãos na cabeça de um regime, como o cubano, que não aceita oposição nem dissidências – como deixou claro Obama em seu discurso. Mas foi um gesto oportuno. Poderá ser o primeiro de muitos.

Aconteceu sob as bênçãos do humanismo de Mandela, sob os cânticos de esperança de uma África por dias melhores, em um estádio localizado exatamente no distrito de Johanesburgo, Soweto, onde a luta de Mandela pelos direitos dos negros, contra a segregação racial, pelo fim do apartheid, pela aproximação entre brancos e negros, pela democracia e pela liberdade se mostrou mais intensa e densa.

Soweto nunca deixou de ser lembrado como sinônimo dos horrores do apartheid assim como da luta contra o regime racista da África do Sul, liderada por Mandela, o “pai da nação”. Ali foi o local onde os negros foram forçados pela elite branca, a viver quase em confinamento, onde eles se insurgiram e foram violentamente reprimidos pelo governo racista. Hoje, esta imagem do histórico distrito foi progressivamente mudada pela presença de Mandela e Soweto começa a ser lembrado como cenário em que o ódio étnico foi vencido, um lugar em que a liberdade triunfou, um lugar não de segregação racial, mas de união entre negros, brancos, indianos e miscigenados.

“Quando a África chora, a África canta”- costumam dizer os moradores de Soweto.

A África tem chorado e cantado por Mandela. Mas o gesto, a data, o local, a cerimônia, o estádio, tudo tinha mesmo que ser, estar e acontecer ali em Soweto. E nada deve ter sido uma coincidência em um mundo em que a saudade de Nelson Mandela é tão grande quanto a necessidade de promovermos “a civilização do diálogo”, conforme diz o sábio japonês Daisaku Ikeda, outro humanista que o mundo inteiro reverencia. Onde o entendimento, a solidariedade e o espírito de compreensão do outro ultrapassam fronteiras e barreiras entre os povos, as nações, os seres humanos.

Nem que tudo isto se expresse em um simples gesto.

Tudo tinha que acontecer exatamente ali no dia 10 de dezembro de 2013. Sob uma foto com o largo sorriso de Mandela. A História não esquecerá este dia!

Carlos Alberto Luppi

Jornalista e escritor