Homenagem ao Superior Tribunal de Justiça

19 de maio de 2014

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RobertoNeste aniversário da Revista Justiça & Cidadania, nada melhor que homenagear o tribunal da cidadania por seus relevantes esforços e trabalhos nos últimos 25 anos, no número de processos julgados, nas inúmeras teses aprovadas e no aperfeiçoamento do direito brasileiro. A conclusão é assustadora: se o Superior Tribunal de Justiça não tivesse sido criado, o Supremo Tribunal Federal não estaria hoje em crise e sim arrasado.

A Constituição de 1988 criou o Superior Tribunal de Justiça, que foi instalado no dia 7 de abril de 1989. Esse fato, realmente, foi determinante para a grande mudança na estrutura judicial, porque afastou-se do Supremo Tribunal Federal toda a matéria infraconstitucional, exceto a criminal, com a intenção de deixar à Corte Suprema precipuamente constitucional.

O Superior Tribunal de Justiça, nesses 25 anos, tem sido provocado com grande intensidade, talvez como última oportunidade dos demandistas para a fuga dos padrões locais e até a revisão mais qualificada das decisões.

Verificamos adiante as origens históricas dos problemas do STJ, o excesso de demandas, um panorama das soluções e, finalmente, o futuro da corte para que não sofra dos mesmos males sofridos pelo Supremo, que foram definidores para a necessidade de uma nova corte: o STJ.

Na oportunidade dos 25 anos de existência do Superior Tribunal de Justiça impõe-se uma vista sobre a duplicidade de jurisdições, e até mais de duas, quanto ao papel de um tribunal da federação e a evolução, principalmente na República, do prestígio da lei federal. Nesse contexto, que se inicia no Império, passa pelo século XX e deve ser prospectivo com vistas ao século XXI, na dimensão federalista, e até de sua revisão ou ajuste como pregam alguns, está valendo uma visão do Superior Tribunal de Justiça nesse período, até no volume de causas julgadas (três milhões e quinhentos mil processos), no seu papel de corte federal, mas antes de tudo de tribunal nacional.

Surgiu então o Supremo Tribunal Federal com nítida vocação para a matéria constitucional; no entanto, coarctada por falta de espaço ou visão políticos, a propiciar, como no nosso modelo americano, a excelência da suprema corte para as questões excepcionais, ou somente constitucionais, e então um tribunal nacional para as demais questões.

O projeto do Governo Provisório (1890) admitiu a introdução do writ of error dos americanos no direito brasileiro, com o recurso para o Supremo Tribunal das decisões da justiça estadual contrárias às leis federais. Já o Decreto no 848 (1890) admitiu recurso para o Supremo Tribunal das decisões contrárias à aplicabilidade de lei do Congresso.

A Constituição de 1891 acolheu esse recurso. Ora, o writ of error americano tinha como finalidade a correção de erros de direito de uma instância inferior. Chegou-se, portanto, àquele entendimento de Pedro Lessa – aplicação errônea da lei.

O Decreto 848 delimitou o Judiciário brasileiro na fase republicana, porque impôs o modelo derivado do regime para a fixação da duplicidade de jurisdições. O Recurso Extraordinário foi criado, portanto, com a múltipla finalidade de por cobro às decisões contrárias à Constituição federal e a má aplicação da lei. Portanto, com duplo objetivo: preservar a Constituição e a lei federal.

Como observou Epitácio Pessoa, em 1907, então ministro do Supremo Tribunal Federal, o Recurso Extraordinário era o ponto de maiores controvérsias no direito constitucional, porque destinava-se a atender à jovem federação e à preservação da lei federal, sem mutilar a autonomia estadual. Era a indagação de Alexander Hamilton sobre a jurisdição federal na Constituição americana e a conveniência de sua abrangência (O Federalista, no 80).

A Constituição de 1891 foi alterada no capítulo do Recurso Extraordinário para reduzi-lo na sua importância. Substituição do seu cabimento sobre a aplicação da lei federal por vigência da lei federal (Reforma Constitucional de 1926).

Ainda que Pontes de Miranda considere dispensável no regime federativo a unidade de justiça ao contrário é importante na integração da lei federal a uniformização dessa lei, na sua aplicação. Foi assim até o advento da Constituição de 1946, como proclamou Pontes de Miranda, mas a ampliação tem sido benéfica.

Na esteira deste século, entramos em 1946, com a quarta Constituição republicana e com ela os problemas da jurisdição do Supremo Tribunal Federal, surgindo então, nessa década, longos trabalhos sobre a chamada crise do Supremo, então com cerca de 5000 processos distribuídos.

Que fazer sobre o Supremo Tribunal? Mais especificamente sobre o Recurso Extraordinário?

Para amenizar, essa crise, se comparada com o volume atual, era insignificante. Criou-se, então, o Tribunal Federal de Recursos (1947), com competência para os recursos nas causas da União e autarquias, então na competência do Supremo Tribunal Federal, aí tribunal de segundo grau (apelação).

Estamos na década de cinquenta. Em 1956, o Supremo Tribunal distribuiu 6.379 processos e julgou 6.126, apenas empreendendo-se alterações procedimentais no Recurso Extraordinário, como o juízo de admissibilidade do presidente do tribunal a quo e da sua negação ao agravo de instrumento, aparente restrição, porque desde essa época, e muito mais hoje, os despachos denegatórios são impugnados mediante agravo.

Em 1966, o Supremo Tribunal distribuiu 7.096 processos e julgou 9.175, isso antes da Constituição de 1967. Em 1969, distribuiu 8.023 processos e julgou 9.206. A aguda crise do Supremo reuniu juristas eminentes que preconizaram, em 1965, a criação de novo tribunal para exame do recurso extraordinário (rectius: especial) em matéria não constitucional. A Constituição de 1967 nitidamente restringiu o cabimento do recurso extraordinário com a introdução da expressão negativa de vigência, sobre a qual muito controverteu-se.

A restrição não significou a distribuição dessa jurisdição, atribuindo a outro tribunal, nem ontologicamente queria restringir recursos. Foi a solução da restrição na cúpula, sem pensar no início ou no intermédio, isto é, na primeira e na segunda instâncias.

A crise continuou, a Constituinte de 1987 debateu-a e enfim encontrou-se a solução com a duplicidade de jurisdições – o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, com a criação do recurso especial.

O tempo encarregou-se da criação de um tribunal nacional na evolução do antigo Tribunal Federal de Recursos (e a transferência de competência do Supremo Tribunal Federal). Esse longo caminho histórico mostra uma verdade: o Supremo Tribunal Federal, principalmente na fase republicana, vocacionou-se para a matéria constitucional, aquilo que a Carta de 1988 chama de precipuamente constitucional. Somente agora houve a coragem para essa afirmação, sem tirar, desde 1890, de todos os juízes o exame constitucional.

Chegou-se então a um tribunal nacional, que não pode ser o Supremo, a quem se reservam as altas culminâncias da proteção da Constituição. O destino exige esse tribunal, que é, no caso, o Superior Tribunal de Justiça. Cabe-lhe, então, a eminência infraconstitucional mais abrangente, ainda que a constitucional seja tópica. Cabe a especulação sobre os seus limites, sua competência. Não se lhe atribuam excessos, porque haverá a inviabilidade de atuação.

De 1947 a 1987, 40 anos, verificou-se que o STF não saiu da crise, e o TFR entrou na crise. Novamente soluções e a mais contundente foi a criação do Superior Tribunal de Justiça para conciliar as crises do STF e do TFR. Não bastava a criação de um tribunal e sim lhe dar ossatura, feição própria e mensagem de otimismo aos militantes no Judiciário. Abriu-se a grande oportunidade do acesso das demandas a Brasília, na conciliação do poder local, com o federalismo e a isenção de uma corte longe dos embates locais.

O cidadão acredita na Justiça e quer acesso, mas também quer a saída no dilema entre a prestação jurisdicional – segura e rápida e isso não é resolvido nas eternas reformas do Judiciário, porque sem reforma estrutural da Justiça, a desburocratização processual e reforma do Judiciário com objetividade, estaremos enganando a sociedade, os juízes, os advogados e os jurisdicionados. Sem reforma processual profunda e objetiva para a massa das demandas nada será feito. Processo para todas as camadas, e não processo complexo que não atinge as milhões de demandas em curso no Brasil, e não solução para os órgãos de cúpula do Judiciário, vítima das conseqüências de um intrincado sistema processual, vazio de soluções para resolver, somente na cidade de São Paulo, a mais de dois milhões de processos que lá circulam.

Essa corte foi criada para ajudar no combate à crise. Tem lutado tenazmente para superá-la e atender ao cidadão, que respeita a Justiça, acredita no Judiciário, o mais respeitado, e acatado dos Poderes, aqui e no mundo. Necessita de meios e de fórmulas, mas o mundo jurídico agradece a esse Tribunal pelo que fez, e fará, mas nos unamos numa cruzada, para evitar uma chamada crise do Superior Tribunal de Justiça.

Essas observações refletiram a preocupação dos 25 anos. Vejamos então, se as observações procediam na superação de uma futura crise do Superior Tribunal de Justiça. Muito esforço tem sido empreendido pelas administrações, e o profundo entendimento dos ministros no atingimento de metas ideais, numa corte, talvez a mais gigante do mundo, onde cada ministro recebe cerca de mil processos, mensalmente. Com a maior diligência, se o magistrado julgar trinta processos por dia (inclusive domingos e feriados), concluirá o mês com 900 processos findos, e na prateleira, para o mês seguinte, com 100 processos. Saudemos o STJ, mas fiquemos atentos para a crise dele, que sejam encontradas soluções sem desnaturar o tribunal da cidadania.