Edição

Marli Ferreira

31 de maio de 2007

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A Desembargadora Marli Ferreira, eleita Presidente do TRF 3‘ Região, diz que sua conduta como gestora se baseará na ética, julgando como bem enteder, mas sem usar sua toga para fazer pano de mesa de seu balcão de negócio.

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1 – A criação do fundo de reaparelhamento do judiciário está em análise. Como a senhora avalia essa iniciativa? 

É com alegria. E não só eu, mas todo o judiciário, pois estamos vivenciando um momento critico de falta de equipamento e infra-estrutura, e a criação desse fundo é de extrema importância para o aprimoramento dos serviços aos jurisdicionado.

No último encontro do Conselho da Justiça Federal, do qual participei apenas como ouvinte, pois ainda não pertencia à diretoria deste Tribunal, foi decidido que a criação do fundo servirá apenas para o reaparelhamento dos órgãos já existentes, não podendo ser usado para construção de novos prédios. Servirá, por exemplo, para finalizar a informatização, compra de materiais essenciais para desenvolvermos uma melhor prestação de serviços aos jurisdicionados e melhores condições de trabalhos aos servidores e magistrados.

Os recursos do fundo servirão também para aumentar a capacitação dos magistrados e funcionários com cursos, seminários e todo o tipo de treinamento necessário para alcançarmos nossas metas.

2 – Qual será o modelo dos fundos? 

Só posso falar sobre a Justiça Federal porque ainda não tenho conhecimento de como será na Justiça Estadual. Os recursos virão das taxas judiciais e emolumentos e deverão ser gerenciados pelo próprio CJF, abrangendo todas as cinco regiões, tentando diminuir as diferenças na prestação dos serviços. Particularmente, gostaria que os recursos arrecadados em cada região fossem destinados à própria região, pois hoje a terceira região, ou melhor, o TRF-3 é o maior tribunal do país, uma vez que abrange uma área com 43 milhões de jurisdicionados, e, evidentemente, necessita de maior atenção e de maiores investimentos.

3 – Os fundos deverão ser geridos pelos próprios juízes ou administradores especializados?

Acredito que o Conselho da Justiça Federal deverá distribuir a gerência do fundo entre as instâncias da Justiça Federal, com juízes de primeiro grau, desembargadores e ministros. Claro que isso não impede que se faça uso de serviços de profissionais especializados nesse tipo de gestão.

4 – Estes fundos poderão disponibilizar recursos para as Escolas de magistratura?

O STJ, dando seguimento aos trabalhos do Ministro Sálvio de Figueiredo para o desenvolvimento de uma escola nacional, criou a ENFAM, Escola de Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, atualmente dirigida pelo Ministro Nilson Naves, que, na minha opinião, deveria receber parte dos recursos do fundo para distribuir as Escolas de cada Tribunal Regional Federal dentro das necessidades peculiares de cada região.

 5 – O que a Senhora tem a dizer sobre as duras críticas à Polícia Federal que o presidente da OAB/SP, Dr. Flávio D’Urso, fez em discurso durante a posse de Vossa Excelência? 

Na verdade, o Dr. Flávio D’Urso, pessoa muito querida no circulo jurídico de São Paulo, manifestou sua posição como presidente de uma entidade de classe que se vê agredida por medidas que realmente não são nada simpáticas. Entretanto, precisa ficar esclarecido que o modus operandis da Polícia Federal não é igual aos da polícia civil ou militar. A polícia federal é uma polícia judiciária.

Eu não posso dizer como a polícia federal deveria agir, pois isso é um problema interno da própria polícia federal. As críticas a essa ação são completamente aceitáveis dentro do Estado democrático de direito. Se justas ou injustas, só o tempo, que é o senhor da razão, dirá. Ele é uma pessoa muito equilibrada e fez seu discurso dentro de sua irresignação de cidadão que trabalha com a justiça e vive da justiça, de forma que não me sinto capacitada a comentar suas opiniões, prefiro falar de mim mesma.

6 – A Senhora acredita que Polícia Federal estaria contrariando o estatuto da OAB ou, diante dos fatos que estamos vivenciando, deveríamos romper com os direitos individuais dos advogados para melhor investigar o crime organizado? 

Nem uma coisa nem outra. A polícia federal não está contrariando o estatuto da advocacia e também não estamos rompendo com a estrutura de direitos individuais dos advogados para investigar o crime organizado. Precisa ficar claro, principalmente em relação às investigações dos casos Hurricane e Têmis, que a Polícia Federal agiu com autorização judicial dos ministros relatores de cada caso, que determinaram prisões de pessoas envolvidas, e busca e apreensão de documentos e equipamentos, não só em escritórios de advocacia bem como em gabinetes de magistrados. Claro que, se houve excesso por parte da Polícia Federal, alguém será responsabilizado, mas não os ministros-relatores. Uma coisa é dar a ordem, outra é usarem dessa ordem para excederem seus poderes, ultrapassando os limites legais que contornam a decisão judicial.

7 – Na sua opinião, o magistrado deve apenas aplicar a lei ou pode interpretar, apoiado em uma hermenêutica mais extensiva? 

O que o juiz não deve é legislar, porque isso é a morte do princípio das funções estatais. O que o juiz pode fazer é dar sua interpretação à lei, pois, como diz Calamandrei, “a sentença expressa o sentimento do juiz”. Reparem que as duas palavras sentença e sentimento possuem o mesmo radical, assim o juiz pode usar de seu sentimento para julgar a causa. O que não pode é o juiz usar seu poder de administrar o processo e, conhecendo seu conteúdo, obter alguma vantagem. Assim, eu posso julgar da maneira que eu bem entender, o que eu não posso é usar minha toga para dela fazer pano de mesa do meu balcão de negócios.

8 – Quais são os projetos da nova gestão para agilizar os feitos no TRF-3?

O primeiro projeto já foi assinado, que é a abertura de concurso público para suprir nossas deficiências de servidores da justiça de primeira instância e do próprio Tribunal da 3ª Região.

O segundo grande projeto é a reestruturação do Tribunal para dar mais celeridade para suas atividades finalísticas, e para poder reorganizar as tarefas administrativas e burocráticas de uma forma mais útil.

Estamos também instituindo um grande cronograma de conciliação no Tribunal para podermos dar baixa nos inúmeros recursos que estão nos gabinetes dos desembargadores concernentes ao Sistema Brasileiro de Habitação, FGTS e Previdência Social, que, obviamente, comportem conciliação.

Conciliar é o melhor caminho porque o processo não gera filhotes, termina ali. E os casos que não tiverem conciliação serão imediatamente julgados por turmas suplementares que estão com nova forma. Haverá um desembargador coordenador que irá organizar toda a estrutura administrativa para que todas as turmas tenham os mesmos procedimentos, cada turma será presidida por um desembargador e formada por mais cinco juízes de primeiro grau, afeitos às matérias das referidas turmas. Estamos muito animados, pois, por exemplo, a turma suplementar da 3ª Seção, em dois meses, julgou mais de 1500 processos.