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Mudanças na legislação trabalhista: A perspectiva empresarial

30 de junho de 2017

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Ney Prado, presidente da AIDE e o economista Maílson da Nóbrega, Ex-Ministro da fazenda

A FecomercioSP promoveu um seminário para debater a CLT e a atual proposta de reforma da legislação, a partir dos pontos de vista de diferentes segmentos produtivos,
e com a participação de importantes especialistas do Direito e da economia.

Em tempos de reforma trabalhista, um evento que promova o intercâmbio de informações é sempre bem-vindo. Ainda mais quando a iniciativa envolve as perspectivas de diferentes segmentos produtivos. Foi este um dos motivos para a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), por meio do seu Conselho Superior de Direito e da Academia Internacional de Direito e Economia (AIDE), escolher como tema para seu 34o seminário “A Legislação Trabalhista na visão empresarial: custos e benefícios”.

Com um grupo integrado por grandes especialistas na legislação trabalhista e economistas, o evento, trouxe um diagnóstico realista e propostas viáveis para servir de subsídio ao modelo de reforma em discussão no Congresso Nacional. O público foi formado por autoridades, empresários, educadores, cultores e operadores do direito e da economia.

A mesa oficial foi formada pelo desembargador Ney Prado, presidente da AIDE; Ives Gandra da Silva Martins, presidente de honra da AIDE; Alexandre Furlan, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI); José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro, presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo. “Hoje, há um consenso de que, não obstante suas inegáveis virtudes, a legislação trabalhista brasileira em muitos de seus aspectos envelheceu. Por decorrência, presenciamos um desejo crescente de modernizá-la. Repensar o atual modelo trabalhista se impõe como uma necessidade impostergável de nossos dias”, comentou Ney Prado.

O evento teve início com uma aula magna “A legislação trabalhista ajuda, dificulta ou impede o desenvolvimento das empresas e a criação de empregos”, conduzida pelo ministro Ives Gandra Martins Filho. Ele começou mencionando a importância do tema neste momento em que a reforma trabalhista está em debate. “A crise econômica, o desemprego de 14 milhões de pessoas, as companhias fechando, a dívida pública, praticamente um colapso do sistema previdenciário. Tudo isso está exigindo essa modernização da legislação trabalhista para tapar as lacunas; está exigindo mais segurança jurídica e mais equilíbrio nas relações de trabalho. Exige que a Justiça do Trabalho, tendo parâmetros mais claros e mais seguros, solva os conflitos trabalhistas de maneira mais equilibrada”, pontuou o presidente do TST.

O ministro afirmou que não se sente confortável para concordar em 100% com esse projeto de reforma. “As minhas divergências são poucas, conversei até com o próprio Rogério Marinho [autor do projeto]. Mas, ao mesmo tempo, no sentido global, entendo que é uma reforma positiva, porque ela está modernizando a CLT. Está colocando uma série de pontos em que a jurisprudência teve que avançar em um terreno no qual ela não poderia sequer chegar, porque não havia norma a autorizar; a reforma está estabelecendo os parâmetros”, declarou.

 

Ministro Ives Gandra Filho, presidente do TST

Comércio de bens e serviços

O primeiro painel, com o tema “A legislação trabalhista e seus reflexos no comércio de bens e serviços”, foi conduzido pelo economista José Pastore, acadêmico e economista. Foram debatedores o ex-ministro e relator da Constituinte, Bernardo Cabral, e Sólon Cunha, professor da Fundação Getúlio Vargas. O ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho foi o presidente da mesa.

Pastore destacou a importância do debate, neste momento em que a reforma trabalhista ainda segue seu curso até a aprovação. “Para que isso ocorra, é preciso que todos nós não só venhamos a entender bem o que é essa reforma, mas venhamos a informar outras pessoas a esse respeito”, declarou. O economista elogiou o texto da reforma, que considera ter sido orientado por princípios bastante inovadores. “O primeiro deles é que procura abrir um espaço de liberdade para as partes, para empregados e empregadores, mantendo as proteções”, declarou. Pastore também mencionou outro princípio orientador da reforma que considera positivo, que é o de permitir a criação de novas modalidades de contratação para “incluir os excluídos”, aqueles que trabalham de maneira informal.

Os reflexos na indústria

O segundo painel, com o tema “A legislação trabalhista e seus reflexos na indústria”, foi conduzido por Alexandre Furlan, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), tendo como presidente da mesa Ruy Martins Altenfelder, presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas, e, como debatedores, Adauto Duarte, diretor do Grupo FIAT, e Luciana Nunes Freire, diretora executiva jurídica da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Furlan abriu a palestra lembrando que a necessidade de modernizar as leis trabalhistas vem sendo discutida há pelos menos 20 anos, mas a crise econômica acentuou esta demanda. “Nós precisamos ter como foco a empresa sustentável, a competitividade no mercado nacional e internacional e o trabalho produtivo. É para isso que precisamos modernizar a legislação trabalhista, porque, obviamente, o trabalho é um dos pilares da competitividade no mundo e isso é fora de questão. Então são esses os motivos, muito mais do que uma legislação anacrônica, nós não podemos ficar alardeando para o mundo que estamos tratando as nossas relações de trabalho, que são importantes para o desenvolvimento econômico, como se nós fossemos um país totalmente atrasado”, defendeu o palestrante, ao citar a posição brasileira no ranking da competitividade global: 81o colocado dentre os 138 países.

Ele terminou defendendo a ideia de que a modernização e a desburocratização das relações de trabalho são fundamentais para estimular a competitividade das empresas, aumentar a produtividade e ter o crescimento que todos esperam para o Brasil, com geração de emprego de qualidade, empregos que nos permitam efetivamente colocar o país entre uma das dez economias do mundo, mas que trata igualmente aqueles que produzem riqueza no país.

Senador Bernardo Cabral, relator geral da Assembleia Constituinte

Instituições financeiras

“A legislação trabalhista e seus reflexos nas instituições financeiras” foi o tema do terceiro painel do seminário, apresentado por José Virgílio Vita Neto, diretor jurídico do Itaú-Unibanco, representando Confederação Nacional do Sistema Financeiro. A presidência da mesa ficou a cargo de Ney Prado. Os debatedores foram o acadêmico e economista Maílson da Nóbrega e o doutor em Direito Econômico Jairo Sampaio Saddi.

O palestrante apresentou um panorama sobre como a reforma trabalhista pode apoiar o desenvolvimento de uma nova relação de trabalho que, hoje, sobressai no sistema financeiro nacional e dentro das empresas. Trata-se daquela decorrente da nova geração de pessoas que hoje entra no mercado de trabalho, os millenials. “Os estudos têm indicado que é uma geração ainda menos preocupada em separar a vida profissional da sua vida pessoal, vê o aspecto profissional como integrante de sua vida pessoal. Então, temos uma mistura muito grande, e com uma pitada muito diferente de objetivos”, esclareceu, acrescentando que este grupo de pessoas não está preocupado com a proteção trabalhista tradicional. “Agora, a CLT se torna muito anacrônica e parece muito claro que ela não responde mais aos anseios da sociedade de trabalho, não atende mais ao que as pessoas querem”, pontuou.

Reflexos no agronegócio

O painel seguinte tratou do tema “A legislação trabalhista e seus reflexos no agronegócio”, e foi conduzido pelo economista Helio Zylberstajn. A mesa foi presidida por Fabio Meirelles, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp), e os debatedores foram Cesário Ramalho da Silva, conselheiro da Sociedade Rural Brasileira, e Samantha Ribeiro Meyer Pflug Marquês, doutora em Direito e Constitucionalista.

Zyberstajn abordou pontos relacionados especificamente à agricultura, e não ao agronegócio, que é muito mais abrangente. Ele falou sobre a dimensão deste setor, as características e os principais problemas do trabalho na área. O palestrante mostrou que, hoje, 3% dos empregos formais do País estão na agricultura, assim como 5% do Produto Interno Bruto (PIB). Considerando-se também os empregos informais, o percentual de representação do trabalho agrícola sobre para 15% – o que, segundo ele, mostra que a agricultura é o setor onde mais existe informalidade. “Felizmente, temos agora a lei da terceirização, que está sendo complementada pela reforma trabalhista, e os empresários brasileiros de todas as áreas terão segurança jurídica muito maior para terceirizar”, opinou.

Setor imobiliário

“A legislação trabalhista e seus reflexos no setor imobiliário” foi o tema do quinto painel, conduzido por Alexandre Tirelli, presidente Sindicato dos Corretores de Imóveis no Estado de São Paulo (SCIESP). Os debatedores foram Flavio Augusto Ayres Amaury, presidente do Secovi, o Sindicato da Habitação, e Cláudio Hermolin, presidente da Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi).A presidência da mesa ficou a cargo de Ivette Senise Ferreira, diretora da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil (ESA/OAB).

Tirelli apresentou algumas das normas que trazem parâmetros para a atividade imobiliária e falou sobre os índices de desemprego no setor. “Percebemos que de 2013 até 2017 houve uma diminuição de algo próximo a 47% de profissionais que seriam colocados no segmento imobiliário. De 2014 para 2015 houve uma diminuição de 26%. Notem que a alteração da lei no 13.097, se deu em 19 de janeiro de 2015, e mesmo diante de um cenário extremamente difícil, de crise econômica severa, nós conseguimos perceber uma procura pelo segmento imobiliário, sobretudo dos corretores e corretoras de imóveis. Nós sabemos que houve uma diminuição bastante importante no número de lançamentos imobiliários, porém estamos cientes que alguns outros segmentos da cadeia imobiliária vêm mantendo o setor”.

A reforma e suas condicionantes

O último painel do seminário foi apresentado pelo ex-presidente do TST e ex-ministro do Trabalho, Almir Pazzianoto, em mesa presidida por Ney Prado. O tema foi “Proposta de Reforma Trabalhista e suas condicionantes”

Pazzianotto começou sua conferência com a afirmação de que a CLT é produto de uma circunstância de um momento histórico, “de um país que já não existe”. Ele analisou os diferentes projetos de modernização da CLT desde 1970. “O projeto do deputado Rogério Marinho [da atual reforma trabalhista] apanhou o projeto do Executivo, que tratava de trabalho temporário e valorização do negociado sobre o legislado, e ampliou. É um projeto extremamente ambicioso e volumoso. É um pé na porta, ele rompe um tabu de dezenas de anos. O principal mérito do projeto em minha modesta opinião é romper esse escudo ideológico que cerca a CLT e abrir caminho para uma discussão maior a respeito dos acertos e erros, atualidade e falta de atualidade da CLT”, defendeu. Deste modo, o palestrante deu o tom de encerramento do evento, abrindo espaço para um amplo debate sobre a proposta da reforma trabalhista em curso no Congresso e suas condicionantes.