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O ativismo judicial e o impacto econômico das decisões nos contratos imobiliários

30 de junho de 2017

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Compreende-se por Ativismo Judicial a diretriz dada por um magistrado visando buscar através de uma hermenêutica jurídica expansiva, garantindo o direito das partes e atendendo às soluções dos litígios e às necessidades oriundas da lentidão ou omissão legislativa, e até mesmo do poder executivo.

Se o “ativismo” judiciário tem um viés favorável, já que a atitude proativa dos juízes, na determinação de direitos que se encontram em estado latente ou de forma nem sempre clara na Constituição e nas leis, não se pode deixar de perceber o risco dessa postura judicial, pelo menos quanto à expectativa em relação à titularidade de direitos que partes de um processo judicial possam ter (ou não), em determinadas circunstâncias.

Sabe-se que a simetria entre os “interesses econômicos” e os “ideais de justiça” era a regra nas sociedades tradicionais. Ocorre, que com a expansão da sociedade moderna de mercado esse liame foi se rompendo fazendo com que a retórica tradicional sobre a interpretação da lei e de integração de lacunas escondessem a realidade da influência das decisões do poder judiciário no mundo e na sociedade em que vivemos.

Para alguns operadores do direito, mesmo quando um comprador desiste imotivadamente do negócio feito, a incorporadora revende o imóvel e segue “realizando seus lucros normalmente”. Essa é uma visão completamente distorcida da realidade econômica do negócio imobiliário e sua propagação através de reiteradas decisões judiciais podem gerar grave risco sistêmico, capaz de fazer estruturas sólidas se aproximarem do colapso.

Não é demais pontuar, que as decisões em casos de resolução contratual não devem privilegiar aqueles que descumprem o contrato, rompendo a legítima expectativa que a incorporadora possui do recebimento do preço nas condições pactuadas, à medida que o comprador “inadimplente” ou “aquele que se faz de inadimplente”, venha a desestabilizar a relação contratual, gerando riscos, não somente para a incorporadora, mas também para todos os demais adquirentes que fazem parte daquele empreendimento.

O juiz que favorece o distrato imotivado por parte do comprador, diminui o número de novos lançamentos à população. O magistrado que beneficia a rescisão imotivada para o promitente comprador estará em um segundo momento aumentando os juros que lhes são cobrados ou mesmo alijando-os do mercado de crédito. Ainda que as consequências possam parecer pequenas no curto prazo, elas são razoavelmente altas em prazos mais longos.

Não obstante, a jurisprudência sobre as ações de resolução das promessas de compra e venda de bens imóveis, vem desconsiderando os efeitos da irretratabilidade, assim qualificada por expressa disposição do artigo 32, parágrafo 2o, da Lei no 4.591, de 1964, que, obviamente, exclui o direito de arrependimento ou desistência de qualquer das partes, impondo ao inadimplente a obrigação de indenizar as perdas e danos provocados pelo rompimento do contrato.

E inexiste dúvida de que a Lei no. 4.591/64 tem como foco principal, a SEGURANÇA JURÍDICA que se faz necessária, em todos os contratos. Assim, do Oiapoque ao Chuí, certo é que muitas empresas não estão sobrevivendo ao “massacre financeiro” a que estão sendo submetidas, devendo ser destacado que toda empresa necessita de relativa estabilidade para que possa dar seguimento aos seus negócios.

Ora, o imóvel comprado na planta é um negócio jurídico de cunho patrimonial, quer seja para o comprador, quer seja para a incorporadora. Pensar ao contrário, é “tapar os olhos com venda”, o que soa como o maior dos absurdos. Ninguém compra um imóvel para ter prejuízo, assim como nenhuma incorporadora lança um empreendimento esperando não ser bem sucedido. A via é de mão dupla, não podendo considerar esse negócio jurídico como uma via de mão única.

E é exatamente nesse contexto que o preclaro Ministro Luis Felipe Salomão, disse no Resp 1163283/RS, que: “Todo contrato de financiamento imobiliário, ainda que pactuado nos moldes do Sistema Financeiro da Habitação, é negócio jurídico de cunho eminentemente patrimonial e, por isso, solo fértil para a aplicação da análise econômica do direito”.

Os exemplos da vida cotidiana descortinam o absurdo, data vênia, que está ocorrendo no mercado imobiliário. Exemplificando: Se alguém compra um carro 0km em uma concessionária, irá fazer o pagamento antecipado ou assinar um contrato de financiamento, sendo razoável aguardar alguns dias até que seu carro esteja pronto. Quando isso ocorre, ele não pode desistir, sair do contrato ou pegar o seu dinheiro de volta.

Atente-se ainda, para os custos (encargos sociais) dos direitos que são inadequadamente criados por algumas decisões, em especial para os efeitos redistributivos de cada prestação jurisdicional que favorece o comprador inadimplente. É o que ocorre nos casos de resolução das promessas de compra e venda de um imóvel, desconsiderando-se os efeitos da irretratabilidade e admitindo, paradoxalmente, o arrependimento, ocasião em que o magistrado determina a devolução dos valores pagos, fixando o percentual entre 10% e 25%.

Assim, o Poder Judiciário nem sempre percebe que agrava os problemas que pretende corrigir, causando danos à economia e, na mesma proporção, à população em geral, ao se afastar do rigorismo da lei ou dos princípios que regem os contratos, com o pensamento voltado para o ideal de corrigir o problema econômico gerado tão somente, naquele caso em concreto.

Em suma, o que se pretende na realidade, é que com a obtenção de decisões judiciais seguras, equilibradas e sustentáveis, os negócios e investimentos prossigam, reduzindo-se o “risco jurídico” que os torna pouco atrativos, fazendo com que as empresas cumpram sua função social, impulsionando o desenvolvimento do país.