O Instituto dos Advogados Brasileiros: origens e criação

11 de agosto de 2014

Membro do Conselho Editorial / Professor Titular Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UniRio)

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A5 Aurelio Bastos Ed 168“Somos o berço da OAB, e o IAB tem essa vocação acadêmica […] O IAB terá a oportunidade de dar a sua contribuição científica para o aprimoramento da ordem jurídica brasileira”. Técio Lins e Silva, presidente do IAB, discurso de Posse (9 de maio de 2014).

Raymundo Faoro, jurista e intelectual, ex-presidente do Conselho Federal da OAB, no período difícil de marchas e contra marchas da abertura do regime autoritário, escreveu um dos mais importantes e significativos estudos sobre as origens e a formação do Estado patrimonial brasileiro e a evolução do seu estamento burocrático: Os Donos do Poder. Em linha semelhante de estudo, Victor Nunes Leal, jurista, intelectual e ex-ministro do Supremo Tribunal de Justiça (ver Bastos, A.W. Criação e Organização do Supremo Tribunal de Justiça no Brasil. RJ. Casa de Rui Barbosa / Câmara dos Deputados. 1978) desenvolveu o seu livro intitulado Coronelismo, Enxada e Voto sobre as elites no poder e a força de dominação das oligarquias republicanas, através de mecanismos eleitorais (legais) e de fato. Procurando ampliar a compreensão da natureza política do estado patrimonialista. O meticuloso livro de José Honório Rodrigues sobre Conciliação e Reforma no Brasil estudou a compreensão estratégica da sobrevivência do Estado patrimonialista, originariamente patriarcalista e, oligárquico, cujas práticas impediam a renovação do País não promovia as reformas, tornava lento o processo histórico e o progresso que não respondesse aos interesses estamentais […]. A conciliação estava a serviço da grande propriedade (e a escravidão), levando Nabuco de Araújo a afirmar que o povo dominado por latifundiários só se poderia esperar a rejeição das reformas sociais e econômicas.

Na verdade, o Estado patrimonialista, na história política brasileira, foi o herdeiro dos pactos privados no poder público que se projetou no tempo histórico como uma rígida estrutura política insensível à dinâmica da sociedade e às ideologias compreensivas do Estado moderno. Foi exatamente neste contexto da dominação do Estado patrimonialista que se desenvolveram as lutas pela criação do Instituto Brasileiro dos Advogados (IAB), com o objetivo de se criar a Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB), seguindo o exemplo que adviera da criação da Ordem dos Advogados da França, promulgada por decreto imperial de Napoleão Bonaparte em 1810, assim como foi decisiva a influência do Estatuto da Associação dos Advogados de Lisboa, que tinha como objetivo conseguir a organização definitiva da Ordem dos Advogados, assim como o auxilio mútuo, tanto, para consultas como para manutenção de seus direitos.

Os Advogados brasileiros, muitos ainda formados na Universidade de Coimbra, outros na Academia de Direito de São Paulo e na Academia de Olinda, depois Recife, que se reuniram em torno de Montezuma (Francisco G. de Acayaba – 1794-1870), reconheceram nos seus argumentos que ainda não era o momento de se criar a Ordem, tendo em vista que o País acabava de proclamar sua independência. Acreditava que a Ordem só seria plenamente eficaz quando o País se organizasse e se regulamentasse, sistematizando os serviços públicos. Por esta razão, dentre outras, propôs criar uma organização que facilitasse a instalação de uma futura Ordem dos Advogados do Brasil, considerando principalmente a resistência parlamentar dos incisos XXIV e XXV do artigo 179 da Constituição Imperial. O texto imperial dispunha, respectivamente, que “nenhum gênero de trabalho, de cultura, de industria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes públicos, à segurança, e saúde dos cidadãos” e, ainda, “ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juízes, Escrivães, e Mestres”. Como se pode facilmente concluir, o texto imperial, fora promulgado, ainda, no calor do combate aos institutos corporativos medievais, que, monopolizavam os ofícios colocando sobre o controle centralizado o trabalho, especialmente o trabalho artesanal.

Neste contexto, o Aviso de 7 de agosto de 1843, aprovando os estatutos do Instituto dos Advogados Brasileiros, foi publicado com o seguinte teor sob os auspícios do Supremo Tribunal de Justiça e assinado pelo Imperador Pedro II, transcrito abaixo na forma original: “Sua Magestade o Imperador, deferindo benignamente ao que lhe representarão diversos advogados d’esta côrte, manda pela secretaria de Estado dos Negocios da Justiça, approvar os estatutos do Instituto dos Advogados Brasileiros, que os supplicantes fizeram subir á sua Augusta Presença, e que com esta baixão assignados pelo Conselheiro Official-maior da mesma Secretaria de Estado; com a clausula porém de que será tambem submetido á Imperial approvação o regulamento interno, de que tratão os referidos estatutos”. Palácio do Rio de Janeiro, em 7 de agosto de 1843. Honorio Hermeto Carneiro Leão.

Montezuma, de forma magistral, primeiro presidente, pronunciou o discurso inaugural de instalação do Instituto dos Advogados Brasileiros no salão do Collegio de Pedro II, que para esse fim fora facultado por aviso de 31 de agosto de 1843 (Gazeta dos Tribunaes, 1o ano, no 64, 12 de setembro de 1843). Conforme se observa nas diretrizes e justificativas da organização dos advogados, claramente o IAB não se impôs como uma corporação de ofício. No seu primoroso discurso conta a história da advocacia do Egito até a época em que vivia, evidenciando a antiguidade da profissão e sua importância para a sociedade civilizada, assim como, a importância de uma instituição como a que presidiria (Gazeta dos Tribunaes, no 35, 1o anno – 16 de maio de 1843, pp. 3 e 4). Senhores, Bacon, com a eloquencia que lhe é própria, disse: ‘O Espírito é o homem’. Eu direi – O Cidadão é a Lei: a Lei é sua execução: Esta depende da intelligencia que se lhe dá. Como desconhecer a importância da organização da classe, cuja profissão tem por objecto determinar a intelligencia da Lei (…). Os vindouros dirão o que houver de ser um instituto. Por ora é a sua utilidade que nos cumpre provar.

Finalmente, em 15 de maio de 1844, por ato do imperador, o Regimento Interno do IAB foi aprovado e seu artigo segundo muito claramente dispunha: o fim do instituto é organizar a Ordem dos Advogados, em proveito geral da ciência e da jurisprudência. Como se pode verificar a criação do IAB teve como finalidade política e estratégica buscar a criação da Ordem dos Advogados, cujos objetivos foram alcançados com o Decreto no 19.408, de 18 de novembro de 1930.