Por uma “limpeza” no judiciário _ Entrevista com César Asfor Rocha

31 de julho de 2007

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JORNAL DO COMMERCIO – Quais seus planos para a Corregedoria Nacional de Justiça?

CÉSAR ASFOR ROCHA – Primeiro, identificar plena-mente quais são os processos que envolvem os magistrados e que estão no CNJ. Temos dois tipos de corregedoria: a que funciona no CNJ e outras instaladas no âmbito dos tribunais estaduais e regionais do Trabalho e Federal. Lá correm também processos disciplinares. Então, (o objetivo é) identificar esses processos que estão no CNJ e nos tribunais, principalmente, aqueles considerados de maior gravidade. O ministro Pádua Ribeiro (corregedor anterior) fez esse apanhado, mas o trabalho ainda não está completo, pois alguns tribunais não passaram as informações. Tão logo a tenhamos, faremos o diagnóstico.

JC – No dia 14 de junho, o Tribunal Regional Federal – 2ª Região decidiu não afastar o desembargador Carreira Alvim, um dos investigados por envolvimento com a máfia dos caça-níqueis. O senhor não acha que, para casos como esse, a resposta do Judiciário deveria ser mais efetiva?

CAR – Estranho o TRF – 2a Região não ter, sequer, aberto procedimento administrativo, depois que foram noticiados fatos graves atribuídos a desembargadores. Com relação a tê-lo ou não afastado, pelo que sei, a corte entendeu que, como há um procedimento administrativo no CNJ, o exame desse fato devesse ser feito pelo órgão. E há esse processo realmente, no qual me debruçarei, além de outros que reclamam maior atenção.

JC – Qual sua expectativa em relação à duração do processo envolvendo a máfia dos caça-níqueis?

CAR – Inicialmente, ele foi distribuído para o ministro Vantuil Abdala, porque o ministro Pádua Ribeiro se deu por impedido. Não sei dizer ainda quais foram as providências adotadas pelo antigo relator. Vou me inteirar, saber em que pé esse processo se encontra e vou adotar as medidas que forem necessárias.

JC – O senhor não acha que a penalidade aplicada aos magistrados infratores deveria ser maior?

CAR – Sou favorável a uma modificação, a ser feita pelo Congresso, para que o magistrado, cujo desvio de conduta for reconhecido, sofra pena que importe em perda do cargo, sem a possibilidade de receber qualquer benefício, como hoje ocorre. Atualmente, no que diz respeito às penas disciplinares, o máximo que pode acontecer ao magistrado é ser aposentado compulsoriamente. Com isso, ele leva o benefício de receber seus vencimentos integrais, se já tiver alcançado o tempo de serviço, ou proporcionais, se ainda não tiver alcançado o tempo de aposentadoria. Acho que essa regra precisa ser modificada, porque não é compreensível que uma pessoa cuja conduta é desvirtuada, a tal ponto de comprometer a imagem de todo o Judiciário, não possa ser expulsa da magistratura e ainda venha a receber qualquer tipo de pensão.

JC – O que a Corregedoria Nacional de Justiça pode fazer para tentar inibir a corrupção no Judiciário?

CAR – Primeiro, apressar o processamento e o julgamento dos feitos administrativos que estão no âmbito da Corregedoria Nacional de Justiça. Segundo, acompanhar o desenvolvimento desses processos disciplinares que estão em curso nas corregedorias estaduais e regionais. Como disse, depois de fazermos um diagnóstico sobre os processos e sobre o quão grave são, vamos contatar os tribunais para que lhes sejam dada prioridade (na tramitação). Vamos identificar também os processos de natureza criminal que envolvem magistrados e que não correm no âmbito das corregedorias, e sim nos próprios tribunais estaduais e regionais. Assim, poderemos pedir às cortes que dêem prioridade ao julgamento, embora saibamos que, em muitos casos, a tramitação é lenta, uma vez que o Código de Processo Penal impõe certas formalidades que dem ser obedecidas. Muitas vezes, impõe o retardamento, sob pena de, posteriormente, poder ser declarada nulidade do processo, o que traria um prejuízo ainda maior, pois a sensação de impunidade se tornaria ainda mais evidente, viria ainda com mais intensidade.

JC – No discurso de posse, o senhor anunciou que promoverá um censo no Judiciário. Qual o objetivo da medida?

CAR – O censo visa à realização de um diagnóstico geral do Poder Judiciário: sobre o número de juízes, sobre as comarcas que estão ocupadas, sobre os juízes que residem nelas e sobre os desembargadores estaduais, do trabalho e federal que residem na cidade em que fica a sede de seus tribunais. Isso nos ajudará a acompanhar, inclusive, a duração dos processos (em poder deles). Será um censo do qual poderemos extrair um retrato verdadeiro do Poder Judiciário brasileiro que hoje não temos de forma completa. Com isso, poderemos acompanhar com maior eficácia, no âmbito da Corregedoria, o trabalho de cada magistrado, e também poderá haver melhores elementos para estabelecer estratégias de planejamento e de gestão para o Judiciário brasileiro. Hoje, cada tribunal tem atuado de forma isolada. Não há unidade no trabalho dessas cortes. Ainda que com respeito à autonomia deles, pelo menos linhas gerais de atuação poderão ser estabelecidas pelo Conselho. E isso só poderá ocorrer depois desse diagnóstico completo do Poder Judiciário.

JC – O senhor acha que dá para fazer isso em dois anos?

CAR – Em muito menos tempo. A idéia é que a Corregedoria Nacional de Justiça possa acompanhar a atividade de cada magistrado, para saber como cada um está agindo. Com isso, daremos maior transparência ao Judiciário.

JC – O que será feito em relação aos cartórios?

CAR – Hoje, se perguntar quantos cartórios existem no Brasil, ninguém saberá responder. Quantos foram fiscalizados, também. Assim como não saberemos responder qual é a fonte de receitas deles. Então, precisamos fazer um diagnóstico para estabelecer linhas de comportamento gerais e também para possibilitar às corregedorias um maior controle sobre a atividade cartorária.

JC – Quais seus planos no tocante à morosidade da Justiça?

CAR – Identificar os casos em que há demora na prestação jurisdicional. Muitas vezes, a demora decorre da própria natureza do processo; há regras que precisam ser obedecidas, sob pena de ser declarado nulo. Muitas vezes, pode até ser por culpa do magistrado, que não reside na comarca e que, portanto, trabalha pouco em sua vara. É preciso estimular o processo virtual e a prática de outros meios de solução de conflitos, como a conciliação, a mediação e a arbitragem, que ainda são pouco explorados no Brasil. Então, são esses os mecanismos dos quais poderemos lançar mão, a fim de possibilitar uma solução ou, ao menos, diminuir a morosi-dade. Como também estabelecer critérios para que as questões de massa sejam resolvidas de uma forma mais simplificada. Identificando todas as questões em andamento, poderemos sugerir a adoção de algumas medidas.

JC – O senhor acha que é possível combater a morosidade apenas com soluções administrativas?

CAR – Acho que pelo trabalho dos corregedores em questões mais pontuais e por mudança legislativa. É necessária uma mudança no sistema recursal, sem dúvida alguma. Muitos processos poderiam, por sua simplicidade, ser solucionados na primeira instância. Outros poderiam ir para a segunda instância e ali terminarem. E só alguns poucos deveriam ir para as instâncias especiais. Então, há uma necessidade de haver uma mudança na legislação processual. Apenas para questões pontuais os corregedores atuariam.

JC – Como será o controle dos processos mais antigos e dos prazos processuais?

CAR – Vou recomendar aos tribunais que dêem preferência ao julgamento dos processos mais antigos. De 100 em 100, vamos conseguir que os processos sejam julgados.