Edição 58
Semelhança pode não ser mera coincidência
5 de maio de 2005
Deputada Federal pelo Rio de Janeiro
É triste ter que admitir, mas o Financial Times tem razão quando afirma que no Brasil “a corrupção é um fato do cotidiano e as chances de ser punido por isso são próximas a zero’’.
Basta puxar um pouquinho pela memória, sem precisar cansar demais a cabeça, para encontrar nas lembranças uma série de casos de corrupção denunciados pela imprensa brasileira, depois esquecidos, sem punição ou respostas convincentes para a população.
É comum, de vez em quando, esbarrar por aí com um destes personagens da corrupção e vê-los tocando as suas vidas, sem qualquer perturbação; sem que as notícias os incomodem. A idéia que se tem é que eles lêem as notícias e ainda se sentem felizes por, de alguma maneira, serem manchete do dia.
Aos seus filhos, parentes, amigos, vizinhos e netos eles devem dizer que a vida é assim mesmo, repleta de injustiças – injustiças que não perdoam a competência de quem é capaz de transformar com a rapidez da luz os salários em fortunas – fortunas que financiam todo luxo que o dinheiro pode comprar.
São ladrões do dinheiro público, que enfiam na cabeça dos seus, serem gente bem sucedida nos negócios.
A impunidade alimenta o cinismo, a hipocrisia e a tranqüilidade dessa gente para confirmar a versão de que, no Brasil, há de fato uma corrupção endêmica, protegida por quem deveria reprimi-la com rigor, o Estado Brasileiro.
Chico Anysio, em entrevista que concedeu ao jornalista Marcone Formiga ao final do ano de 2002, afirmou: “O Brasil não foi o país que inventou a corrupção, mas inventou o perdão para ela.’’
Esta percepção foi medida pela Transparência Internacional e mostrada num ranking, onde o Brasil está colocado entre os países mais afetados pelo mal. Entretanto, no rastro da percepção da corrupção e da impunidade segue a descrença nas instituições.
Para comprovar esta verdade, da mesma Transparência Internacional nos veio o “Barômetro Global da Corrupção’’ de 2004, onde se vê que, no Brasil, os partidos, a polícia, o parlamento, o judiciário, os serviços de saúde e o sistema educacional são consideradas instituições com elevado grau de corrupção.
Quase nada se salva por aqui.
Indiferentes ao risco que isso tudo representa para a ordem pública, os mais corretos, em nome de uma tal governabilidade, tomam como normal fazer e chancelar acordos políticos, que transformam cargos e poder em dinheiro vivo, retirado da máquina pública pela corrupção e pela extorsão.
Acham normal perdoar a desonestidade em nome de composições partidárias, para garantir a aprovação de projetos e o sucesso em eleições.
Não percebem, ou não querem perceber, que a corrupção responde pela violência e pelo crime, num quadro a sujeitar ao risco, todos e qualquer um.
É visível que a sociedade está saturada com todo este movimento. A população não acompanha os governantes na sua acomodação fácil com a corrupção e com a impunidade.
Este quadro, que soma corrupção, impunidade, irresponsabilidade e conveniência política, definitivamente não vai nos levar a um bom lugar!
Em entrevista à imprensa brasileira, o novo presidente do Equador, Alfredo Palácio, ao comentar a expulsão do Senhor Lúcio Gutiérrez da Presidência da República por um movimento popular, avaliou a situação do seu país. A sua declaração bem que poderia servir como alerta para os que, por aqui, se acomodam com a situação denunciada pelo Financial Times:
“Temos de reconstruir as instituições, porque estão enfraquecidas. Temos um Poder Legislativo que deixou de legislar, um Judiciário que não fazia Justiça. O povo se cansou, deixou de acreditar. A economia supostamente melhora, mas existem mais pobres. O povo quer uma mudança de atitude. A mudança de um Estado que caducou. Temos que reconstruir a República.’’
Qualquer semelhança pode não ser mera coincidência!