Um magistrado à moda antiga

30 de maio de 2017

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Fernando ZorzenonNovo presidente do TRT da 1a Região, o desembargador Fernando Zorzenon definiu prioridades para comandar a corte em um período complicado, que combina restrição orçamentária com aumento da distribuição de processos – ambos fatores decorrentes da crise econômica que o Brasil enfrenta. O desafio é aumentar a produtividade com menos recursos.

O desembargador Fernando Antonio Zorzenon da Silva, presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região (TRT-RJ), está no cargo desde janeiro, substituindo a desembargadora Maria das Graças Cabral Viegas Paranhos. Eleito por seus pares em sessão ordinária do Tribunal Pleno em novembro do ano passado, o paulista de Ribeirão Preto é carioca de coração, mas sem perder o jeito interiorano. Legalista por definição, autodeclarado “magistrado à moda antiga”, o desembargador Zorzenon desenhou, em entrevista à Revista Justiça & Cidadania, as prioridades para comandar o tribunal trabalhista fluminense no biênio 2017-2019.

Nos próximos dois anos, Zorzenon pretende manter os projetos iniciados pelas gestões anteriores em andamento, mas elencou alguns que considera de maior urgência, como o já criado Comitê Gestor do Patrimônio, que está revisando o rol de imóveis ocupados e projetando a possibilidade de aquisição de sedes próprias para o TRT-RJ, prioridade máxima da nova gestão. O magistrado pretende ainda valorizar o primeiro grau de jurisdição, com ampliação do apoio dado a esta instância.

Em sua missão, o desembargador Zorzenon terá ao seu lado a desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo, como vice-presidente, o desembargador José Nascimento Araujo Netto, como corregedor e a desembargadora Mery Bucker Caminha, na vice-corregedoria.

Zorzenon ingressou no tribunal, como juiz substituto, em julho de 1982. Foi promovido a juiz titular em maio de 1988, exerceu a titularidade das 5a e 52a Varas do Trabalho do Rio de Janeiro e das Varas únicas de Três Rios e Cordeiro. Em 2001, tornou-se desembargador e, mais tarde, presidente da 7a Turma. Como membro eleito, integrou o Órgão Especial da Corte por quatro anos. Também foi corregedor do regional fluminense no biênio 2010-2012. Até a eleição para a presidência, ele ocupava a 2a Turma, sendo membro por antiguidade do Órgão Especial. Na atividade acadêmica, o desembargador lecionou na Universidade Estácio de Sá, de outubro de 2000 a dezembro de 2008, nas cadeiras de Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, e atuou como examinador e coordenador em concursos para ingresso na carreira da magistratura do TRT-RJ.

Revista Justiça & Cidadania – O senhor é paulista de nascimento, mas está atuando no Rio de Janeiro desde a década de 1980. É tempo suficiente para ter se adaptado à vida no Estado, mas o que ainda há do paulista de Ribeirão Preto em sua personalidade

Fernando Antonio Zorzenon da Silva – Realmente sou paulista, natural de Ribeirão Preto, mas carioca de coração, pois aqui cheguei aos 22 anos de idade, em 1972. Tenho mais tempo de vida no Rio de Janeiro do que em minha cidade natal. Aqui, nesta cidade maravilhosa, concluí a faculdade de Direito e iniciei minha vida profissional. Se estou adaptado? Plenamente, pois incorporei o espírito carioca de ser. Creio que, do paulista de Ribeirão Preto, restou somente o sotaque, pois jamais consegui me adaptar ao “r” do carioca. Da minha origem paulista não perdi aquela característica do “caipira” interiorano, aquela essência simples que tenho da vida.

O que o levou para a carreira da magistratura?

Quando ingressei na faculdade de Direito pretendia ser Delegado de Polícia. A vida, ou o destino, me conduziu à magistratura, pois, já formado, jamais tive a oportunidade de atuar na área criminal. Trabalho desde os 13 anos de idade e, enquanto estudava, trabalhava em um banco. Certo dia, fui transferido para o departamento Jurídico, área de Direito Imobiliário. Depois, sem que procurasse por isso, surgiram algumas causas trabalhistas para representar e acabei abrindo um escritório na área. Para aprimorar meu conhecimento jurídico, ingressei em um curso preparatório à magistratura, que englobava praticamente todos os ramos do Direito. Após um ano de estudo, me inscrevi no primeiro concurso que surgiu – coincidentemente para a magistratura trabalhista – com o exclusivo propósito de testar os conhecimentos adquiridos e, para minha surpresa, fui aprovado.

Há estudos respeitados que insinuam que juiz não sabe administrar. Alguns juízes reclamam do desconforto de ter de contrariar colegas na administração de um tribunal. De dois em dois anos, pelo menos quatro juízes saem da distribuição para dirigir os tribunais, o que faz com que a cota de serviço seja redistribuída entre os demais. Como o senhor vê essa questão? Acha viável que um tribunal seja administrado por alguém de fora da carreira, deixando para os juízes apenas as questões jurídicas que a administração de um tribunal apresenta?

Não vou dizer que o juiz seja um administrador nato. Eu mesmo sou um caso. A minha experiência de administração é da minha vida privada, o que é bem diferente de administrar a vida pública. Mas, para isso, temos, em cada tribunal, servidores altamente qualificados, que são nosso apoio no início da administração. Eu ainda estou na fase de aprendizado, mas assim como aprendemos a judicar, também aprendemos a administrar. Não é algo difícil de aprender quando você tem apoio técnico para te auxiliar. Nenhum administrador – seja prefeito, governador ou presidente da república – assume seu cargo com experiência suficiente para administrar o Município, o Estado ou o País. Ele se cerca de pessoas que têm esse conhecimento. E assim é no tribunal. Trazer alguém de fora eu acho externamente nocivo. É o próprio juiz que tem de administrar o tribunal e saber se cercar de bons profissionais em cada área. E é isso que estou procurando fazer.

Quanto à distribuição, não há a menor possibilidade de administrar um tribunal e receber distribuição de processos, isso é impossível. Hoje, permaneço no tribunal muito mais tempo e tenho uma carga de trabalho e uma responsabilidade muito maiores. Isso não é um problema porque é algo sobre o que estava consciente quando me candidatei à presidência, mas cito isso para mostrar que continuar na atividade judicante concomitantemente à administração seria inviável e perigoso.

Como será sua gestão? Quais são as prioridades definidas para seu trabalho como administrador da Corte?

Minha gestão será de trabalho, muito trabalho, com dedicação integral ao tribunal. Procurarei, dentre outras iniciativas, dar mais dinamismo às decisões administrativas e reduzir os encargos com pagamentos de aluguéis, porque apesar de sermos o mais antigo somos o único tribunal do País que não tem casa própria. Hoje, gastamos R$ 36 milhões em aluguéis por ano. É uma questão de economia, pois, com o montante dispendido ao longo de tantos anos, os imóveis, se próprios, já estariam pagos. A situação atual é insustentável em longo prazo, pois com o congelamento orçamentário previsto, chegará o dia em que não teremos mais recursos para pagar os aluguéis que, ao contrário do orçamento, são reajustados ano a ano.

Além disso, pretendo aperfeiçoar o PJe e priorizar o primeiro grau de jurisdição, que é a alma da Justiça do Trabalho, fornecendo-lhes os meios necessários à entrega de uma prestação jurisdicional célere, pois justiça que tarda, que não alcança os anseios da sociedade, não pode ser considerada justiça.

O senhor anunciou a intenção de criar um Comitê Gestor do Patrimônio, com a finalidade de gerir o patrimônio imobiliário existente e possibilitar a aquisição de imóveis próprios. Qual a situação atual desses imóveis?

Em 30 de janeiro deste ano a presidência do TRT-RJ instituiu a Comissão de Controle de Imóveis, por meio do Ato no 8/2017. O objetivo principal do grupo, formado por magistrados e servidores, é adotar medidas para atuar no controle constante e eficaz de todos os fatores referentes aos imóveis utilizados pelo Regional, inclusive alugados.

Compete à Comissão de Controle de Imóveis avaliar a possibilidade de aquisição de imóveis e acompanhar a execução do Plano de Obras aprovado pelo Órgão Especial; adotar medidas para atuar no controle constante e eficaz de todos os fatores referentes aos imóveis utilizados pelo Tribunal; avaliar as condições de infraestrutura física e de utilização dos imóveis e unidades para fins de priorização de obras no âmbito do TRT-RJ.

Portanto, o Comitê já foi formado e hoje estamos tratando das estratégias, pois alguns imóveis nós vamos reformar, outros pretendemos desocupar por não terem condições estruturais. A ideia é procurar outros imóveis, mas que, preferencialmente, sejam cedidos por algum órgão público, a exemplo de imóveis ociosos que sejam da União, o que não geraria ônus para o Tribunal. Já temos o espelho monitorado de todos os imóveis. O que pretendemos evitar é novas locações. Como disse, a aquisição de imóveis decorre da necessidade de reduzir despesas. Em médio prazo, isso representará uma economia considerável de recursos aos cofres públicos.

Outro projeto anunciado é a intenção de criar novos Postos Avançados, de modo a facilitar o acesso dos jurisdicionados à Justiça do Trabalho. Em quais localidades do Estado existe, hoje, esta necessidade de melhorar o acesso da população?

Já levantamos os locais e temos a intenção de abrir um posto em Campo Grande, abrangendo toda a Zona Oeste, um na Barra Tijuca, porque é distante do centro da cidade, e outro na Zona da Leopoldina. Com isso acredito que também poderemos acelerar a prestação jurisdicional e melhorar a vida do jurisdicionado.

O senhor afirmou que pretende dar continuidade aos projetos iniciados pela gestão anterior. Quais  seriam esses projetos e em que pé se encontram?

O TRT-RJ possui em vigor o seu Planejamento Estratégico, para o sexênio 2015-2020, alinhado às diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho. Esse planejamento contempla diversos projetos estratégicos, que são desenvolvidos pelas diversas áreas do Tribunal, e a continuidade desses projetos está sendo respeitada.

Como exemplos, pode-se citar o Projeto Estratégico no 12, que prevê a implantação de Sistema de Acessibilidade para Portadores de Necessidades Especiais nos Prédios do TRT-RJ; o Projeto Estratégico no 26, que trata da Ampliação do Programa de Adequação Ergonômica nas Unidades Judiciárias do TRT-RJ [estações de trabalho ergonomicamente adaptadas para servidores e magistrados]; o Projeto Estratégico no 16, sobre Governança e Gestão de Tecnologia da Informação [que busca o aprimoramento dos serviços de Tecnologia da Informação e Comunicação], entre outros. O andamento de todos os projetos estratégicos do TRT-RJ é frequentemente monitorado pela Presidência, através das Reuniões de Análise da Estratégia, e acompanhado por indicadores.

Em tempos de crise, alguns tribunais estão anunciando “enxugamento da máquina”. Esta será uma estratégia também na gestão do TRT1?

O enxugamento da máquina vem ocorrendo naturalmente, em razão do grande número de servidores requerendo aposentadoria. Não vejo possibilidade de maior enxugamento que este. Na realidade, necessitaríamos de mais servidores e mais magistrados para atender a crescente demanda de ações trabalhistas, devido à crise pela qual o País passa. Como isso não é possível, no entanto, pretendo aumentar a produtividade, de maneira a alcançar o objetivo de todo tribunal, qual seja, a boa prestação jurisdicional, Para dar uma ideia, no Recurso de Revista, quando assumi o Tribunal, havia 17 mil processos pendentes de análise. Pretendo normalizar isso até o final deste ano, e a estratégia adotada para alcançar esta meta será o uso de mutirões e o remanejamento de pessoal.

Um dos segmentos do Judiciário mais atingido pelos cortes de orçamento do Governo Federal foi a Justiça do Trabalho. Como o senhor pretende lidar com esta questão?

Como disse anteriormente, os cortes orçamentários nos obrigarão a aumentar a produtividade. Este é um desafio, um objetivo a ser alcançado pela nossa administração. Vamos deslocar os poucos recursos que temos para a atividade-fim. É claro que, assim, as atividades paralelas poderão ser prejudicadas, mas é o único jeito de fazer mais com menos recursos.

Como tem se refletido na Justiça Trabalhista o atual cenário de desemprego? Houve aumento no número de ações em andamento?

Fatalmente, um período de recessão significa desemprego. Em situações como essa, a Justiça do Trabalho se depara com uma realidade: o considerável aumento na demanda. De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Institucional do TRT-RJ, a média de crescimento no número de processos novos recebidos por distribuição no Regional tradicionalmente tem oscilado entre 3% e 4% de um ano para outro. Mas, de 2015 para 2016, a taxa de aumento ficou em 8,5% (de 253.063 para 274.651).

O Sistema de Acompanhamento de Pautas de Audiência do TRT1 completou um ano de funcionamento. Quais têm sido os ganhos que a ferramenta agrega ao Tribunal?

Criado em janeiro de 2016 (Ato 10/2016), o Sistema de Acompanhamento de Pautas de Audiências (APA) é uma iniciativa do TRT-RJ que visa melhorar o atendimento prestado a partes e advogados.

Ao entrar no sistema, o usuário terá acesso à pauta de audiências da data escolhida. Embaixo do número de cada processo, é possível visualizar o nome do advogado, das partes, horário e o status da audiência: agendada, suspensa, iniciada ou encerrada.

O secretário de audiências é quem alimenta o sistema, avisando quando cada audiência começa e termina. Assim, o sistema evita, por exemplo, que o advogado precise se deslocar até a Vara do Trabalho para saber se sua audiência já começou e quantas ainda faltam para chegar sua vez.

O APA reduz o fluxo de pessoas nos fóruns ao permitir que o advogado planeje melhor suas atividades. Ele pode ir a outra VT consultar um processo, ou, ainda, só se deslocar do escritório ao fórum em horário mais próximo do início de sua audiência. O sistema é excelente, mas ainda pouco conhecido. Estamos trabalhando para melhor divulgá-lo a fim de que alcance os resultados positivos que esperamos.

Entre as metas de 2017 do CNJ, na Justiça do Trabalho, um dos compromissos é que os TRTs reduzam em 2% o acervo dos dez maiores litigantes em relação ao ano anterior. Quais estratégias serão empregadas para alcançar esta meta?

Estamos programando reuniões com os maiores litigantes de nossa Região, objetivando a criação de meios de conciliação, para que seja possível reduzir o número de demandas e acelerar a solução dos conflitos em andamento. Nessas reuniões procuraremos melhor entender as razões do elevado número de demandas, de maneira que possamos, na medida do possível, encontrar meios adequados de prevenção.

De modo geral, a Justiça do Trabalho vê com certa antipatia a mediação extraprocessual feita por terceiros, e não pelo juiz. Isso pode acabar atraindo para os processos mais lides do que o necessário. Por que a Justiça do Trabalho ainda não abandonou o modelo demandista para adotar, institucionalmente, o modelo conciliatório?

Estamos em fase final de estudos para criar um grupo de conciliação e mediação que vai funcionar com um juiz coordenador e funcionários ou juízes aposentados atuando na conciliação e na mediação dentro do tribunal. Não vejo nenhuma dificuldade em se colocar pessoas que não sejam magistrados para mediar ou conciliar, desde que sejam supervisionadas por alguém que possa homologar conciliação. Posso ter dez mediadores treinados pela nossa Escola – e, preferencialmente, funcionários do Tribunal – que não sejam juízes, mas todos atuando sob a supervisão de um juiz.

RJC – Existe uma parcela da classe política, e mesmo do Poder Judiciário, que defende uma “necessária modernização das leis e das relações do trabalho”. Do seu ponto de vista o que compreenderia esta “modernização”? O que isso implicaria no atual cenário globalizado no qual vivemos?

FAZS – Não considero nossa legislação trabalhista antiquada. Muito pelo contrário, em determinados aspectos é, inclusive, bastante moderna, tanto que várias de suas normas processuais foram adaptadas ao Novo Código de Processo Civil brasileiro, pois contribuem, em muito, para maior celeridade na prestação jurisdicional. Entretanto, também não afasto a necessidade de algumas alterações pontuais, como, a título exemplificativo, aquelas voltadas à redução dos custos dos empregadores. Hoje, pelos encargos sociais que vêm embutidos em toda relação de emprego, um empregado gera custo superior a 40% dos salários que recebe, o que faz com que, muitas vezes, seja empurrado para a informalidade, o que, afinal, fatalmente gerará nova demanda trabalhista, com o empregado postulando o reconhecimento do contrato de trabalho firmado e pagamentos dos direitos dele decorrentes. Fossem os encargos menores, por certo nenhum empregador optaria por deixar na informalidade os contratos de trabalho de seus empregados.

Diante do cenário de crise político-institucional em que o País se encontra, o que esperar sobre o avanço da Reforma Trabalhista?

No Brasil, ao contrário de outros países, os sindicatos não foram criados pela base da pirâmide social, mas sim instituídos pelo Estado. A grande maioria dos sindicatos não tem representatividade necessária à defesa dos interesses da categoria. Como são abastecidos por recursos compulsoriamente recolhidos de seus “filiados”, muitos deles servem mais aos interesses de seus dirigentes, que, inclusive, se perpetuam nos cargos.

Duas alterações me parecem fundamentais, sem as quais nenhum avanço será alcançado: o fim da unicidade sindical e o fim da contribuição sindical compulsória, ambas baseadas no regime corporativo de [Benito] Mussolini, pois um único sindicato financiado por recursos compulsoriamente arrecadados pelo Estado é muito mais fácil de ser controlado.

O fim desses institutos implicará na criação de sindicatos fortes, com grande representatividade junto à base, geridos por recursos arrecadados não mais compulsoriamente, mas em decorrência de sua competência gerencial, o que, sem dúvida alguma, permitirá que o negociado prevaleça sobre o legislado.

Gostaríamos de saber sua opinião sobre a reforma da Previdência, que se encontra em andamento. O senhor acredita que, no futuro, alguma das mudanças previstas poderá se refletir no Judiciário?

Eu tenho minhas dúvidas se ela é realmente necessária e explico por quê. Tenho 67 anos de idade e, na minha vida, já passei por três ou quatro reformas previdenciárias, todas sob o mesmo fundamento. As reformas vieram, tivemos até mesmo a CPMF [Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira] e a Previdência continua quebrada. Será que está quebrada em razão do sistema que ela gera ou porque está mal gerida, mal administrada e tem muitos inadimplentes, inclusive o Estado? Não fiz um levantamento sobre o assunto, mas tenho muita reserva, não pela perda de diretos, mas porque já tivemos muitas reformas e o sistema previdenciário continua na mesma situação.

Em todos os tribunais trabalhistas do País a história é sempre a mesma: sobram vagas e faltam juízes. A seu ver, o que está errado? Os concursos são exigentes demais ou as faculdades não preparam o bacharel adequadamente?

Os dois, talvez. Acho que determinados concursos públicos têm um grau de exigência desnecessário. Por outro lado, quando vamos corrigir uma prova – e eu já participei de algumas bancas –, encontramos candidatos absolutamente despreparados. Se fosse feito um concurso com questões mais práticas e menos rigorosas, talvez conseguíssemos, por exemplo, trazer para a magistratura mais profissionais da advocacia, que têm uma grande experiência prática.

Diferentemente de outros países como França, Alemanha e Inglaterra, para ficar apenas nesses exemplos, a preparação de um candidato a juiz exclui totalmente a participação dos tribunais ou das escolas de magistratura. Os candidatos se preparam a seu modo, prestam um concurso e, se aprovados, viram juízes. Esse modelo não acaba atraindo para o Judiciário gente sem vocação ou sem preparação específica? O que pode ser feito para corrigir esse rumo?

Foi o que disse na questão anterior. Talvez, se o concurso público primasse por questões do dia a dia, fosse possível trazer para o Judiciário profissionais atuantes, com mais experiência prática. Hoje, você toma posse e fica seis meses na escola judicial, depois de um tempo começa a realizar audiências, mas sob monitoramento. Então, nosso sistema está parecido com o da França e da Alemanha. A diferença é que lá isso [treinamento] é feito de maneira precedente, e aqui é posterior. O que vejo hoje é que a maior parte daqueles que ingressam na magistratura é composta por “profissionais do estudo”. E isso traz pessoas que nem sempre têm experiência prática.

Para quem está de fora, parece que há uma luta permanente entre a classe dos advogados e a classe dos juízes, como se houvesse uma tensão permanente entre dois profissionais que deveriam estar do mesmo lado. Também é assim na Justiça do Trabalho?

No mês de março, a Ouvidoria TRT-RJ reuniu-se com a Ouvidoria da OAB-RJ, com objetivo de retomar a parceria – que começou a ser alinhavada em 2014 – entre as duas instituições para aperfeiçoar procedimentos voltados a melhorar a relação entre advogados/servidores e magistrados. A proposta é utilizar a mediação para resolver conflitos que possam ocorrer no dia a dia entre eles e utilizar esse instrumento para aprimorar os serviços prestados pelo Regional à população. Eu fui advogado militante, então meu relacionamento com a classe sempre foi o melhor possível. Entendo que advogado e juiz têm o mesmo objetivo, a diferença é que o juiz decide e o advogado defende os direitos daquele que representa. Então, são pessoas que se completam, e não antagônicas.

A partir deste ano, os concursos para ingresso na magistratura do trabalho serão nacionais. Embora o direito do trabalho seja federal, isso não vai criar um descompasso, trazendo para o Rio de Janeiro, por exemplo, juízes aprovados em outra região do país, mas que não têm nenhuma familiaridade com as matérias e com a realidade do juiz do trabalho do estado? Qual a sua opinião?

Acredito que não, até porque, na prática, até hoje, os candidatos que se apresentam no Rio nem sempre são daqui do Estado. Quando eles tomam posse, podem ter dificuldade de se adaptar em outro Estado. E, por isso, alguns tomam posse e logo pedem remoção para os Regionais de origem. Já havia esse descompasso e, portanto, não vejo nenhuma alteração nesse sentido.

Entre colegas, funcionários e advogados o senhor tem fama de ser um magistrado austero, exigente com o trabalho e inflexível com falhas e desvios na função judicante. Em sua opinião, de que tipo de juiz a sociedade precisa?

Eu sou um magistrado à moda antiga. Considero juiz aquela pessoa séria, pelo menos no exercício de sua atividade – não se pode misturar as coisas. Na minha vida pessoal, sou brincalhão, amigável, expansivo. Na atividade profissional, entendo que o juiz tem que ser sério, impor respeito e credibilidade. E brincadeiras não fazem parte disso. Falhas eu aceito, porque todos estão sujeitos, desde que sejam involuntárias. Eu sou exigente com horário, com o cumprimento da lei. Por exemplo, no nosso tribunal, há anos, cumprimos uma jornada de sete horas ininterruptas. Alguém trabalha assim, sem parar para a refeição? Visando resolver essa questão quero instalar o controle de ponto pelo sistema e restabelecer a jornada legal, de oito horas, com uma hora para refeição, no total de 40 horas semanais. Não sou intransigente, sou absolutamente legalista.