Edição 31
A desfaçatez de uma criminosa
5 de fevereiro de 2003
Raul Celso Lins e Silva Desembargador
A delinqüente, Jorgina Maria de Freitas Fernandes Jorgina Maria de Freitas Fernandes, criminosa confessa, tendo fraudado a Previdência Social em centenas de milhões de reais, escorchados dos cofres públicos, com a conivência e participação de uma quadrilha, teve o descaramento de ajuizar uma ação de indenização contra os jornais O DIA, O GLOBO, JORNAL DO BRASIL e OUTROS, tentando absurdamente indenização por ofensa a honra e a moral.
Por oportuno, e para causticar a malfadada, insólita e despresível criatura, com o atrevido e cínico pedido, transcrevemos o bem feito voto do Relator, Desembargador Raul Celso Lins e Silva, aprovado pela unanimidade dos Desembargadores que compõem a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, cujo teor transcende pelas palavras, com a verrima que insere:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 27.654/2002
INDENIZAÇÃO. VEICULAÇÃO PELA IMPRENSA ESCRITA DE MATÉRIAS QUE TERIAM OFENDIDO A HONRA E A MORAL DA AUTORA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
RECORDISTA EM FRAUDES CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL TEM A CÍNICA E DESPUDORADA INICIATIVA DE AFORAR AÇÃO INDENIZATÓRIA EM FACE DE JORNAL QUE MERAMENTE RETRATA A VERDADEIRA REALIDADE. INEXISTÊNCIA DE DOR, VEXAME, HUMILHAÇÃO, CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO APELO.
ACORDAM os Desembargadores que compõem a Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro, por uninimidade, em conhecer e improver o apelo, em conformidade com o voto do Relator.
V O T O
Não satisfeita com o rombo causado aos cofres públicos e provocar ainda mais despesas com os processos, investigações, viagens internacionais e outros inúmeros procedimentos com o objetivo de apurar os fatos e resgatar parte do patrimônio público apropriado indevidamente, a internacionalmente conhecida, “JORGINA MARIA DE FREITAS FERNANDES” ajuizou a presente demanda indenizatória, com o intuito de receber verba reparatória de dano moral, tendo em vista as publicações na imprensa escrita de matérias assim intituladas:
“FRAUDADOR FAZ PARTE DA QUADRILHA DE JORGINA”
“NOVOS PROCESSOS PODEM COMPLICAR VIDA DE JORGINA. FRAUDADORA ESTARÁ EM LIBERDADE ATÉ AMANHÃ, CASO OFÍCIO DO STF SAIA LOGO”
“FIGURINHA FÁCIL.
QUEM ANDA CIRCULANDO COM DESENVOLTURA PELA SOFISTICADA GRANJA BRASIL, EM ITAIPAVA, É A MEGAFRAUDADORA DO INSS JORGINA DE FREITAS”
“QUEM ROUBOU, VAI ENSINAR A ROUBAR”
“ORNELAS NÃO QUER JORGINA LIVRE”
A hipótese presente retrata, com propriedade, o que vem a ser a banalização do direito à prestação jurisdicional, porquanto, não satisfeita em roubar, mentir, fugir e praticar inúmeros delitos penais, a recordista em fraudes contra a previdência social tem a cínica e despudorada iniciativa de ajuizar ação indenizatória em face de jornal que meramente retrata a verdadeira realidade dos fatos.
A apelante, depois de locupletar-se do dinheiro público, de afrontar todo o país com sua fuga e, em seguida confessar, cinicamente, em entrevista concedida à Rede Globo, a autoria dos crimes a ela imputados, torna-se beneficiária das modernas técnicas do direito penal, de redução de pena, transação penal, pena alternativa, progressividade, etc. etc., e já está prestes a deixar a cadeia de onde não deveria sair até fizesse retornar aos cofres públicos todo aquele produto que usurpou da forma mais sórdida e indigna.
É a legislação nascida para beneficiar certos condenados, da qual se vale a apelante, também condenada por crimes que deveriam ser considerados hediondos, pois se trata de assalto aos cofres públicos, dinheiro que deveria ser destinado à educação, à saúde, à fome, ao saneamento, aos aposentados e, no entanto, destinou-se às contas bancárias mantidas por Jorgina no exterior.
Com efeito, não poderia ser outro o resultado da demanda.
É certo que para configurar-se o dano moral, faz-se necessário que o fato objeto de divulgação, como aqui, não seja verdadeiro.
Ao contrário, a apelante toma um fato verdadeiro, o considera ofensivo à sua moral e afora demanda indenizatória.
É óbvio que não teria como comprovar que as matérias articuladas pela apelada não seriam verdadeiras e o seu cinismo nem sequer chegou à ameaça de negar os fatos a si atribuídos.
É inusitada a audácia, a justificar que se aloque esta demanda entre aquelas da chamada indústria do dano moral.
Pertinente a sentença quando afirma que “…a autora sabe que é fraudadora e que lesou o país. Os adjetivos, que lhe são atribuídos, não se referem a fatos, objeto de investigação, mas decorrentes de decisão condenatória, que só não transitou em julgado, face à inexistência de inúmeros recursos, que impedem a ocorrência daquele termo e ao abarrotamento do Poder Judiciário provocado, também, por demandas como esta, ora submetida a julgamento.
Em outros termos, a autora sabe que lesou os cofres públicos, fraudando o INSS. Tem consciência dos prejuízos vultosos que causou ao país.
Ora, o dano moral pressupõe desgosto íntimo. E a aflição psíquica decorre, exatamente, da inverdade do fato, o que causa justa revolta naquele que sofreu o dano.
No caso da autora não é o que ocorre. O fato é verídico e ela sabe que cometeu os fatos que lhe são atribuídos e agora demonstra estranha suscetibilidade.”
Os fatos articulados pelo jornal são absolutamente verdadeiros, expressam a triste realidade e não ofendem a honra de quem avalia a sua própria honorabilidade de forma a supor que ela exista.
Honra tem íntima relação com reputação e diz respeito à consideração e homenagem à virtude, ao talento, à coragem, às boas ações ou às qualidades de alguém, pundonor, brio, grandeza, esplendor, glória, probidade, honestidade, decoro.
E onde estão tais qualidades na figura da apelante?
Falar-se em dor subjetiva, em humilhação, integridade, exposição a vexame e dignidade, significa dizer que exposto a vexame, humilhado, ferido na sua integridade e dignidade, está o país que produz uma fraudadora, foragida da justiça por tanto tempo, com a Interpol à sua caça, manchete em jornais de todo o mundo como exemplo do vergonhoso comportamento adotado no patrocínio de causas acidentárias que proporcionaram assaltos aos cofres públicos.
Ante a ausência de atos que possam ter ferido a honra e a moral da recorrente, pela apelante “avaliadas” e por mim não encontrados, evidentemente que inexistem danos a serem reparados, daí porque, conheço e nego provimento ao recurso.
É como voto.
Rio de Janeiro, 08 de janeiro de 2003.
Des. Luiz Carlos Guimarães – Presidente
Des. Raul Celso Lins e Silva – Relator