(Editorial originalmente publicado na edição 60, 07/2005)
Algumas explicações prévias são necessárias para justificar as observações que farei.
Fui Conselheiro da OAB-Seccional de São Paulo por quatro mandatos (oito anos) e presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (dois anos). Como Conselheiro, tive como companheiro e presidente o atual Ministro da Justiça, Márcio Thomás Bastos, colega de turma da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e sempre devotado defensor da classe dos advogados.
Participei de três bancas examinadoras para concurso de juízes federais e estaduais (duas para Justiça Federal e uma para Justiça Estadual).
Defendi, por outro lado, a equiparação dos delegados federais e estaduais – em parecer elaborado para a Associação Nacional que os congregava- às demais carreiras jurídicas (magistrados e membros do Ministério Público).
Por fim, em meus artigos, sempre exaltei a importância do Ministério Público, na preservação da lei e das instituições.
Certa vez, em debate num Seminário em Brasília organizado para parlamentares, Roberto Campos, fez críticas ao “lobby” da advocacia que colocara dois artigos na C.F. (133 e 103 inciso VII), quando as outras profissões não haviam conseguido tal inclusão, ao que respondi que a advocacia era tão essencial à administração da Justiça, como o era o Poder Judiciário e o Ministério Público. Destaquei que, na Constituição, o MP era disciplinado em cinco artigos, o Poder Judiciário em 30 artigos, ao Poder Legislativo foram dedicados 29 e ao Executivo 17, além de lhes ser reconhecida legitimidade para propor ações diretas de inconstitucionalidade. O Senador Elcio Álvares e o saudoso Deputado Eduardo Magalhães concordaram com minhas observações e Roberto Campos, vencido, com seu humor de sempre, declarou que precisaria, talvez, contratar um “advogado” para proteger-se contra tal unanimidade da mesa.
Nessa observação, está a essência do direito de defesa. Os integrantes de todos os Poderes e todos os cidadãos necessitam recorrer a advogados para pleitearem seus direitos em juízo ou se defender de quaisquer acusações, pois, ao contrário das ditaduras, onde não existe o direito de defesa, nas democracias é este o principal alicerce a garantir a segurança e a certeza do Direito (art. 5º, inc. LV, da C.F.).
Por outro lado, o artigo 133 da lei suprema declara:
“Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.
Ora, nos últimos tempos tem se visto uma brutal maculação da inviolabilidade do advogado no exercício de suas funções.
Membros da Polícia Federal, do Ministério Público, lastreados em mandados inespecíficos de busca e apreensão ou de prisão, têm perpetrado – contra a Constituição Federal – invasões em escritórios de advocacia, apreendendo e retirando computadores, documentos de todos os clientes que nada têm a ver com a diligência em questão, num flagrante ferimento ao sigilo profissional e às prerrogativas dos advogados.
Exatamente, pelo profundo respeito que tenho às três instituições (Poder Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal) – pois, de resto, não as teria defendido no passado pro honore, isto é, sem qualquer tipo de remuneração profissional- é que venho denunciar, pelas páginas desta Revista, o fantástico perigo que tais práticas trazem à democracia brasileira.
Quero deixar claro que não estou aqui defendendo a não apuração dos fatos. O que estou dizendo é que não podem confundir o defensor com o acusado e dar o mesmo tratamento a um e outro, sob pena de inviabilizar a defesa.
Alerto, inclusive, magistrados, policiais federais e membros do Ministério Público que a forma vexatória, com que muitas vezes estas invasões e prisões são feitas, podem gerar ações futuras de reparação e pedidos de indenizações por danos morais ou patrimoniais, que a União será obrigada a ressarcir (art. 37 § 6º da C.F.), lembrando-se que a ação de regresso contra os autores da lesão, por prática excessiva no exercício das funções, é imprescritível (art. 37 § 5º da C.F.), podendo acompanhá-los além da aposentadoria e até a morte, sobre o excesso de exação (art. 316 do Código Penal) ser punível.
O certo é que o bom senso tem que prevalecer nestas investigações, para que não façam lembrar as que tiveram lugar nos regimes de exceção, de triste memória. Os Conselhos Nacional da Magistratura e do Ministério Público deveriam ser acionados pela OAB, através de seus representantes nas comissões, a fim de que se apure a responsabilidade por tais violações e se restaure o profundo respeito que deve haver entre as três instituições fundamentais à ordem democrática, ou seja, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Advocacia.