A gestão democrática do poder judiciário

30 de setembro de 2009

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Ao longo dos anos, a Magistratura brasileira tem sofrido com a falta de planejamento estratégico, principalmente no que se refere à discussão do orçamento e à definição de prioridades na gestão do Judiciário. Essa falta de conhecimento e de planejamento refletem-se na qualidade dos serviços prestados e aumenta a morosidade na prestação jurisdicional, sem dúvida a maior crítica da população em relação ao Poder Judiciário.
Com o propósito de identificar as principais dificuldades e propor soluções viáveis para assegurar à sociedade brasileira um serviço de excelência, a Associação dos Magistrados Brasileiros promove, de 29 a 31 de outubro, em São Paulo, o XX Congresso Brasileiro de Magistrados. Ao todo serão quatro conferências e 20 palestras para debater, de forma ampla, a democratização interna do Judiciário enquanto um Poder republicano. O objetivo do evento é estimular os juízes a participar diretamente nas escolhas das administrações e políticas de gestão e estabelecer princípios maiores de transparência.
Na abertura do Congresso, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, fará uma conferência magna sobre “Planejamento Estratégico no Poder Judiciário”. No segundo dia do evento, o Presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, apresentará uma Visão Legislativa sobre a Reforma do Judiciário. Em seguida, o Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Francisco Rezek, discutirá a “Gestão Democrática no Judiciário”. No último dia do evento, o Ministro da Justiça, Tarso Genro, fará a conferência de encerramento sobre o “Poder Judiciário na Sociedade Moderna”.
Entre os palestrantes confirmados estão nomes como o do Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Luiz Phillipe Vieira de Mello Filho; do Corregedor Nacional de Justiça, Gilson Dipp; e da Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Fátima Nancy Andrighi; além de desembargadores, juízes e promotores.
O tema do XX Congresso Brasileiro de Magistrados, a “Gestão Democrática do Poder Judiciário”, foi definido em razão da preocupação da AMB com o aperfeiçoamento institucional do Poder Judiciário. E, nesse contexto, o debate sobre a gestão e os seus reflexos na prestação dos serviços jurisdicionais são assuntos de natureza obrigatória.
Para a AMB, são necessárias profundas mudanças na gestão e na estrutura do sistema judicial. É preciso planejar melhor e priorizar as reais necessidades na discussão e na aplicação dos recursos financeiros. Segundo levantamento realizado pela Associação em fevereiro deste ano, 99% dos magistrados não sabem o valor destinado à unidade em que atuam. Como resultado, muitas comarcas e varas judiciais sofrem com a deficiência de material, equipamentos e pessoal.
Quando o assunto é segurança, a mesma pesquisa aponta um dado alarmante, que denuncia a vulnerabilidade dos prédios da primeira instância do Judiciário. A pesquisa mostra que quase metade deles não tem nenhum tipo de policiamento. Nas varas em que há policiais trabalhando, 85% dos juízes consideram o número insuficiente.
A tecnologia da informação ainda não está presente na maioria das unidades judiciais. Mais de 80% das varas não contam com sistemas integrados e quase metade dos juízes ainda utiliza carimbos, sem realizar o registro eletrônico das informações.
O levantamento da AMB também apontou que o número de juízes no Brasil é insuficiente para a quantidade de processos: 85% das varas judiciais têm mais de mil processos em andamento. Além do número insuficiente de magistrados, a pesquisa revela que a quantidade de pessoal técnico é praticamente a metade do que seria necessário para atender à demanda do Judiciário.
Contudo, mesmo se a atual estrutura da Justiça não consegue suprir a demanda da sociedade, a solução para esse problema não reside no aumento do número de varas e servidores públicos. Em primeiro lugar, o orçamento do Judiciário não suportaria por muito tempo o aumento constante de sua estrutura. Além disso, a constituição de seu quadro de funcionários já foi ampliada nos últimos anos e, mesmo assim, não houve avanços significativos no atendimento à população em razão dessa medida.
A Associação dos Magistrados Brasileiros acredita que, para mudar esse panorama, é imprescindível que o juiz assuma o papel de gestor público, que acompanhe a aplicação do orçamento e colabore na definição de prioridades, levando em conta todas as intenções e compromissos e a alocação dos recursos públicos para atividades de relevância para a sociedade. Também é importante que o juiz apresente relatórios periódicos de prestações de contas, municiando os cidadãos com informações essenciais. Além disso, o magistrado deve fazer uma avaliação de desempenhos para que possa referendar ou retificar os rumos da administração.
Na avaliação de desempenho, a sociedade também tem seu papel. O cidadão deve aferir se o gestor público fez tudo o que lhe competia, se fez com menor custo e de forma a alcançar o melhor resultado para a sociedade, se observou a lei, se elegeu prioridades compatíveis com a natureza e a missão institucional e se cumpriu a finalidade do ente público que administra.
Esta mudança envolve todos os magistrados, inclusive os juízes de primeiro grau e os primeiros administradores das unidades de trabalho na reflexão sobre o conjunto de necessidades da organização, com vista ao cumprimento de sua missão.
No entender da AMB, o Judiciário já vem assumindo posturas e adotando medidas que visam a aproximação e o diálogo permanente com a sociedade no sentido de qualificar os serviços que presta aos jurisdicionados.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) definiu e limitou os vencimentos dos magistrados e servidores; aboliu a prática do nepotismo observando a qualificação e a impessoalidade no recrutamento de funcionários; instituiu o voto aberto e fundamentado nas promoções e remoções de juízes, passando a prevalecer a qualidade e a produtividade na movimentação da carreira; implantou o programa “Justiça em Números”, que acompanha e divulga a produtividade de todos os magistrados brasileiros; vem realizando em todos os estados da federação audiências públicas, que têm permitido a identificação das causas do congestionamento nas tramitações dos processos em cada Estado, assim como apura possíveis desvios éticos e morais na conduta de alguns magistrados e servidores.
Todas essas medidas aproximaram o Judiciário da sociedade e promoveram uma melhor prestação jurisdicional. É neste contexto que se insere o debate do XX Congresso Brasileiro de Magistrados, na busca por um Judiciário forte e legitimado.