A Malsinada MP 232

5 de fevereiro de 2005

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Com a brutal carga tributária que pesa sobre as pessoas físicas e pequenas empresas de serviços, no Brasil, aqueles que não são empregados ou trabalham no setor de prestação de serviços descobriram que melhor do que sonegar, do que correr o risco da sonegação e da ilegalidade, é optar, ao amparo da lei, pelo SIMPLES ou pelo pagamento do Imposto de Renda com base no lucro presumido. No início, o contribuinte usava como base de cálculo do imposto 12% de seu faturamento, sobre o qual incidia a alíquota de 15%. Essa simplificação trouxe para a formalidade milhares de pessoas que operavam como autônomos na informalidade ou sonegavam tributos na clandestinidade. Com o tempo, os exatores do Ministério da Fazenda elevaram essa base de cálculo para 32% (em 2003) e, agora, no dia 31 de dezembro de 2004, para 40% (mais 25%), através da famigerada MP nº 232/04. O Tesouro Nacional vai arrecadar mais R$ 2 bilhões com o Imposto de Renda e a CSLL, para compensar uma legítima e irrisória correção de 10% na Tabela de Imposto de Renda, que estava “congelada”  há dez anos.

A atuação do Ministério da Fazenda em nada deixa a dever à sanha arrecadatória do Governo anterior. Um aspecto a ser destacado é a maneira pela qual o Fisco federal vem transferindo o encargo e o ônus da arrecadação para os contribuintes contratantes de serviços de terceiros (limpeza, segurança, transporte, engenheiros, médicos, serviços e profissionais em geral). Por esse processo, uma empresa que contrata os serviços de terceiros está obrigada, hoje, a recolher, antecipadamente, os valores devidos pelo prestador de serviços, correspondentes ao INSS, ao IR, à CSLL, ao PIS e à COFINS. Com todos os ônus da antecipação, do capital de giro e da burocracia. Até os agricultores foram prejudicados, obrigados a recolher o Imposto de Renda e a CSLL quinzenalmente e não anualmente, como era antes. Contra um benefício de 10%, para as pessoas físicas, na correção da Tabela do Imposto de Renda, haverá um acréscimo de 25% no Imposto de Renda e na CSLL das empresas prestadoras de serviços.

Por outro lado, a MP 232 traduz uma velha implicância da Secretaria da Receita Federal contra os Conselhos de Contribuintes. Esses Colegiados, criados em 1931, representam uma das mais legítimas conquistas do contribuinte brasileiro, constituindo órgão auxiliar do Ministro da Fazenda, com as responsabilidades de rever as decisões fiscais em segunda instância, e que têm atuado com a maior probidade para corrigir enganos e arbitrariedades do Fisco. No Governo militar, denominado governo da “ditadura”, o acesso ao Conselho de Contribuintes era inteiramente livre. Veio o governo da democracia e obrigou o depósito de 30% do valor da causa para a interposição de eventual recurso. Houve até tentativa de elevar o depósito para 100%, que, de tão ilógico, não vingou. Os Conselhos de Contribuintes são órgãos do Ministério da Fazenda, subordinados ao Ministro de Estado, para rever as decisões dos órgãos da Secretaria da Receita Federal, de modo a coibir e corrigir os excessos na autuação e punição dos contribuintes.  Suas decisões, quando favoráveis aos contribuintes, eram finais, refletindo a posição oficial da Fazenda.  Agora, o Ministro aprova um parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, admitindo que, em tais casos, a Fazenda ingresse em juízo para anular as próprias decisões.

A MP 232 vai ainda mais longe. Comete acintoso desrespeito à Constituição Federal, ao ferir o direito de defesa dos participantes do SIMPLES e dos contribuintes com débito de até R$ 50 mil, os quais não terão mais acesso ao Conselho. O Presidente Lula não deve ter sido advertido para esse tipo de “maldade”, com a qual, certamente, não concordaria.  O ideal é que houvesse um processo simplificado para discutir as pequenas causas como na Justiça Comum. Aliás, já houve época, no Governo João Figueiredo, em que os fiscais eram instruídos no sentido de orientar e advertir os contribuintes faltosos, no caso de pequenos valores, antes de lavrar autos de infração cujo valor não compensasse os gastos com a cobrança do imposto. Uma decisão justa e inteligente, que está faltando ao Governo civil de hoje.

O povo está se sentindo ludibriado pelas autoridades fiscais. Os empresários pediram ao Governo para extinguir a cobrança em cascata do PIS e da COFINS. Foram atendidos, mas, acintosamente, as alíquotas desses tributos foram aumentadas em duas vezes e meia. Os trabalhadores do ABC pediram ao Presidente Lula a justa correção da tabela do Imposto Renda, da ordem de 37%. Foram atendidos, mas com um reajuste que não chega a 10%. Paralelamente, porém, a medida foi inserida num “saco de maldades”, que não recomenda nem a inteligência, nem a sensibilidade social e política dos exatores de impostos. Na Roma antiga, antes do Estado de Direito, também era assim.