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A moralidade ou a desonra política

30 de setembro de 2006

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“Vida pregressa é vida pregressa, não transita em julgado,não precisa de uma ação penal”.
Desembargador Roberto WiderPresidente do TRE-RJ

O espetáculo da imoralidade pública e das safadezas que se desenrolam no Congresso Nacional, e em especial, na Câmara dos Deputados, transforma o lamaçal da imoralidade o nivelamento da honra e da dignidade com o emporcalhamento da infâmia e da vilania que gravita e grassam no Legislativo Federal.

Os espantosos escândalos e a putrefata corrupção que vêm sendo denunciadas pelo Ministério Público Federal, pela Polícia Federal e pela Receita Federal, com prisões de quadrilhas sonegadores de tributos, pilhados com milhões de dólares em dinheiro e milhões de mercadorias contrabandeadas, demonstram de forma categórica, que a honestidade, a ética e a decência deixaram de existir em altos escalões da sociedade e da administração pública e privada, onde empresários de alto padrão se tornaram, através de delinqüência continuada, assaltantes dos cofres públicos da nação.

Nas eleições que se avizinham em 1º de outubro, centenas de deputados federais pilhados em flagrante delito e denunciados publicamente face às falcatruas praticadas por certo tentarão se apresentar novamente como candidatos aos mesmos cargos que conspurcaram com as bandalheiras do mensalão e dos sanguessugas, além de outras variadas patifarias, se valendo, para atingirem o propósito eleitoral, do arrimo do princípio da inocência, como disposto no artigo 5º, item LVII, da Constituição Federal.

Entretanto, para que esse descalabro não aconteça, torna-se necessário constituir uma esperança renovadora da manutenção da moral e princípios estatuídos no artigo 37 da Carta Magna para que o excelso Tribunal Superior Eleitoral interprete com a competência,  que é inerente à mais alta corte eleitoral da nação, os princípios constitucionais expressos na Lei Maior. Ditas leis pregam e impõem o cumprimento das normas estabelecidas nas cláusulas taxativas e positivas, que indubitavelmente determinam a obrigatoriedade e obediência, como dispostos nos artigos 14, parágrafos 9º e 10º; artigo 37, parágrafo 4º e artigo 55, parágrafo 1º da Constituição Federal.

Assim, o Tribunal Superior Eleitoral, com o poder normativo que ostenta ao lado do monopólio de jurisdição, pode mudar esse quadro eleitoral deprimente que se apresenta nestas eleições, com uma quadrilha de conhecidos e confessos delinqüentes, se contrapondo para sanear o meio e “fazer com que as eleições sejam legítimas”, trazendo de volta para o povo (que se queda estarrecido com o tamanho da canalhice desses criminosos que afrontam com suas candidaturas a moralidade e a dignidade da nação).

Vale transcrever trechos do causticante libelo do Desembargador Eliseu Fernandes, do Tribunal de Justiça de Rondônia, publicado na edição de agosto último desta revista: “É preciso dizer não ser aceitável a vulgarização que se impôs à presunção de inocência, a ponto de transformá-la em escudo da impunidade, subterfúgio jurídico, leito da hipocrisia e passaporte do regime democrático, e por tais circunstâncias, é preciso advertir que a moral, sob o ponto de vista axiológico, é superior ao direito. Por isso que o justo é eticamente moral e o direito material nem sempre decorre da lei justa e moralmente conformada” .

Torna-se também mais do que oportuno, reavivar o pronunciamento do Ministro Marco Aurélio Mello, na solenidade de posse na Presidência do Tribunal Superior Eleitoral: “No que depender desta Presidência, o Judiciário compromete-se com redobrado desvelo na aplicação da lei. Não haverá contemporizações a pretexto de eventuais lacunas da lei, até porque, se omissa a legislação, cumpre ao magistrado interpretá-la à luz dos princípios do direito, dos institutos de hermenêutica, atendendo aos anseios dos cidadãos, aos anseios da coletividade.”

Também é oportuna a manifestação do Corregedor-Geral do TSE, ministro César Asfor Rocha, publicada na mesma edição de agosto desta Revista a respeito do posicionamento da Justiça Eleitoral: “ Mesmo que o pedido não seja impugnado, o juízo eleitoral deverá indeferir o registro, caso tenha conhecimento de fato comprovado que importe o não preenchimento dos requisitos previstos na Constituição Federal ou na legislação infra constitucional.”

Igualmente, em defesa da realização de eleições limpas, despojadas de vícios e de candidatos de passado maculado com provas de corrupção, o Desembargador Roberto Wider, presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, não deixa dúvidas quanto à aplicação de corretivos aos candidatos indignos da postulação: “Nós não estamos tratando aqui de crimes e de ações penais pura e simplesmente, mas de uma forma de comportamento questionável para homens públicos. Vida pregressa é vida pregressa, não transita em julgado, não precisa de uma ação penal; vida pregressa é aquilo que nós conhecemos em relação aos antecedentes que se refiram à moralidade para o exercício do mandato público.”

No mesmo diapasão em favor da moralidade eleitoral, o ilustre Procurador da República, Dr. Antonio Fernando de Barros e Silva, em pronunciamento na posse do Presidente do TSE, afirmou: “A revelação das urnas não pode ser invocada como sanatória geral. A sociedade tem direito de exigir que a Justiça Eleitoral somente dê eficácia à manifestação eleitoral externada sem máculas.”

Também é oportuno a lembrança do artigo 5º da lei de Introdução do Código Civil, de 04.09.1942: “Na aplicação da lei, o juíz atenderá aos fins sociais a que se dirige e às exigências do bem comum.”

Finalmente, as manifestações que já estão ocorrendo nos julgamentos de registros de candidatos, nos diversos tribunais regionais eleitorais, produzidos por representantes do Ministério Público e de juízes eleitorais nos pedidos de postulantes comprometidos pela conduta comprovada de passado delituoso, reafirma as esperanças da sociedade, ávida por providências saneadoras, contra os delinqüentes que ainda pretendem continuar na deslavada exploração da credulidade pública e dos benefícios que pretendem explorar da nação.

Nas circunstâncias, torna-se imprescindível que a justiça eleitoral aja, neste momento, mantendo a esperança que ainda existe na sociedade, pois, caso contrário, pode ocorrer que os desígnios propalados pelos anarquistas Proudon, Malatesta, Bakunin, Propotkin, dentre outros, se concretizem com a negação dos valores dos homens públicos, descrédito nas eleições e a possível desobediência civil.

Deus, que dizem ser brasileiro, não há de permitir que a Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal se alheiem da defesa da moralidade, da dignidade, da ética e dos bons costumes, que estão em questão nas próximas eleições.