Da esquerda para a direita: o desembargador do TJRJ Cláudio Dell’Orto, a doutoranda em Direito Constitucional
Luna van Brussel Barroso e o ministro do STJ Ricardo Cueva
Nova edição do programa “Conversa com o Judiciário” debateu a jurisprudência e a regulação da internet. Promovido pela Revista Justiça & Cidadania, em parceria com a Federação das Empresas de Mobilidade do Estado do Rio de Janeiro (Semove), o seminário teve a presença de magistrados e de especialistas que apresentaram os desafios da regulação e as tendências da jurisprudência nos tribunais superiores.
Moderação e responsabilidade civil – O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva iniciou a apresentação com o histórico da regulação da internet no Brasil a partir da vigência do Marco Civil da Internet de 2014. Segundo Cueva, a legislação “já envelheceu e precisa ser revista”, especialmente em relação à remoção de conteúdo ofensivo e criminoso e à responsabilidade civil das plataformas.
Ele lembrou que era preciso deixar as novas empresas do mercado de tecnologia e as plataformas digitais se desenvolverem livremente, com imunidade de responsabilidade civil sobre o conteúdo veiculado. No caso da legislação brasileira, estabeleceu-se o modelo de reserva de jurisdição, em que as plataformas só seriam responsabilizadas caso se recusassem a obedecer a ordem judicial de remoção de conteúdo.
“Essas empresas passaram a ser imunes de ações indenizatórias e deixaram de ter um dever ativo de moderação do conteúdo de ódio. As fake news, os ataques à democracia e o discurso de ódio se devem a esse modelo adotado nos EUA que se difundiu pelo mundo e que permitiu que as big techs passassem a ter um poder econômico enorme. Isso tudo causou uma situação que é muito difícil de se resolver hoje: a moderação do conteúdo”, afirmou.
O magistrado ressaltou também que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar em breve a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet e destacou que a jurisprudência do STJ tem evoluído no sentido de consolidar o entendimento de que o artigo 19 não impede que as empresas exerçam o dever de moderar conteúdo criminoso ou ofensivo.
O ministro, que também é membro do Grupo de Trabalho do Conselho Nacional de Justiça sobre inteligência artificial no Poder Judiciário, citou ainda o surgimento do direito à desindexação, que consiste na retirada de conteúdo da internet, impedindo a divulgação de informações consideradas desatualizadas ou que possam comprometer a pessoa em razão de eventos ocorridos no passado.
Inteligência artificial e Poder Judiciário – Na sequência, o desembargador Cláudio Dell’Orto, presidente do Comitê Gestor de Inteligência Artificial do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro (CGIA), defendeu a necessidade de regulação da internet e ressaltou a importância de novas tecnologias para o Poder Judiciário. Dell’Orto também falou sobre o ASSIS, ferramenta de inteligência artificial criada pelo TJRJ e de uso exclusivo de magistrados, que é utilizada em 54 juizados especiais cíveis e fazendários.
“O ASSIS é uma ferramenta de inteligência artificial para elaboração de minutas de relatórios, de decisões e de sentenças em processos judiciais eletrônicos. A ferramenta é utilizada nos juizados especiais cíveis. A segurança dessa tecnologia é importante, pois o Judiciário é o depositário e o guardião de informações sensíveis e sigilosas contidas nos processos”, disse.
Desafios das democracias – A doutoranda em Direito Constitucional Luna van Brussel Barroso focou a apresentação no impacto que as novas tecnologias têm sobre o Estado Democrático de Direito. Segundo Luna, a era digital alterou radicalmente o funcionamento dos meios de comunicação tradicionais, a partir do surgimento de plataformas digitais em que qualquer pessoa pode publicar informações sem controle prévio e sem regras de apuração dos fatos.
“Nós temos um mundo em que qualquer pessoa pode atuar como jornalista e publicar informações, divulgando para milhões de pessoas. Esse cenário tem fatores positivos para a ampliação do debate público, mas tem o lado negativo, que é permitir o abuso desses ambientes digitais por pessoas que tenham interesses ilícitos e que divulguem desinformação”, afirmou.
Luna explicou que o controle humano do conteúdo publicado nas plataformas digitais é inviável por conta do excesso de informações, mas que as big techs passaram a recorrer a mecanismos de inteligência artificial para realizar a moderação de conteúdo ilícito.
“Nesse cenário, o direito fundamental da liberdade de expressão tem as principais questões resolvidas por algoritmos e por mecanismos de inteligência artificial. Como conferir legitimidade a esses algoritmos? Essa é a complexidade que todas as democracias do mundo enfrentam”, ponderou.
Novas tecnologias no segmento de transportes – O presidente executivo da Semove, Armando Guerra, também participou do seminário e concentrou a apresentação na importância das inovações tecnológicas para a operação do cartão Riocard Mais. Ele destacou que a instituição opera cerca de 5,5 milhões de transações por dia e ressaltou a importância dos investimentos em tecnologia para o segmento de transportes do Rio de Janeiro, garantindo a eficiência e a segurança do serviço para os usuários e os operadores.
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