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A responsabilidade do poder legislativo

28 de fevereiro de 2009

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A eleição do deputado Michel Temer como presidente da Câmara dos Deputados configura o reconhecimento a  um cidadão que se dispôs a dedicar a  vida às causas públicas e em benefício da cidadania.
Recém-formado pela Faculdade de Direito da Universi-dade de São Paulo, foi distinguido por convite de seu professor catedrático, Ataliba Nogueira, para integrar o gabinete na Secretaria de Educação. É um jurista nomeado, publicista e  constitucionalista, autor, dentre outros títulos, de importante obra sobre Direito Constitucional, já na 22ª edição. Foi Procurador-Geral do Estado de São Paulo e Secretário de Segurança Pública nos governos de Franco Montoro e Luiz Fleury Filho.
Como político foi líder do partido na Câmara e é presidente re-eleito do maior partido político do País.
A eficiente participação legislativa e política, a partir da eleição em 1987, como deputado constituinte, elevou-o, pela capacidade de articulação, ao exercício de 6 mandatos consecutivos como representante do Estado de São Paulo. Além disso, conseguiu aglutinar, com habilidade e trânsito entre oposição e governo – marcando um fato histórico, só alcançado pelo também paulista Ulysses Guimarães e o piauiense Flávio Marcílio –, o fato de eleger-se presidente da Câmara pela terceira vez.
A sua atuação parlamentar tem sido profícua. Foi presidente da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, que concentra os grandes debates constitucionais, além de ter  apresentado  projetos de grande repercussão e objetividade na aplicação e celeridade da justiça, dentre outros, os que originaram as leis dos Juizados Especiais (Lei nº 9.095/95) e de Repressão ao Crime Organizado (Lei nº 9.034/95).
Dentre as reconhecidas qualidades e aptidões do deputado Michel Temer, estão a de possuir o instinto nato da moralidade na causa pública e a retidão de caráter, que se coaduna e se assemelha com a postura dos grandes varões de antanho que o Estado de São Paulo deu como exemplo aos homens públicos, tais como Prudente de Morais, Campos Sales, Alcântara Machado, Rodrigues Alves, Ulysses Guimarães, Franco Montoro, e alguns outros que honraram e enobreceram a política e valorizaram o múnus público.
O pronunciamento feito pelo então candidato à presidência da Câmara, às véspera da sua consagrada  vitória, constitui uma peça ontológica, pelo significado moral e cívico que deixa como legado didático nos anais da Câmara dos Deputados.
Para o chamamento e congraçamento dos seus colegas, objetivando, através do proselitismo político, convencê-los a aderir à sua candidatura, Michel Temer tocou as teclas da racionalidade administrativa, da moralidade e da integridade ética parlamentar, com palavras que denodaram os seus propósitos na ação diretiva na presidência, como proclamou:
“(…)
que sozinhos não fazemos nada. Nem mesmo a Mesa Diretora consegue fazê-lo. Só o fará, se estiver ancorada, alicerçada, apadrinhada, suportada pela grande maioria da Casa.
Mas quero – confesso eu, que fui duas vezes Presidente da Casa e que, portanto, tenho relativa experiência – fazer com que a Câmara dos Deputados não seja apenas uma Casa produtora de leis ou que cumpra a sua função fiscalizadora. Quero que ela participe efetivamente do debate dos grandes temas nacionais.
Nós somos o primeiro Poder do Estado. (…) O Governo não é o Poder Executivo. Fala-se, na cultura política comum, que o Executivo é Governo, o que é fruto da nossa história. Desde o Brasil Colônia, sempre houve uma concentração de poderes em torno do Executivo. Mas Governo é Executivo, Legislativo e Judiciário. (…) Há um Poder que executa a vontade popular e, por isso, se denomina Poder Executivo. Há um Poder que jurisdiciona, ou seja, diz o direito aplicável às controvérsias – o Poder Judiciário. Mas agem baseados em quê? Baseados no que o Legislativo faz. São aplicadores da lei.
Portanto, ciente e consciente desta realidade, é claro que vamos continuar a legislar, é claro que vamos continuar a executar. (…)
Eu quero fazer desta Casa um centro de debates dos problemas nacionais. Está aí uma crise mundial, batendo às portas do País. Vamos debatê-la aqui e, sobre debatê-la, vamos usar a nossa Consultoria Legislativa, vamos trazer os versados na matéria, vamos discuti-la amplamente na Casa e formular ideias para o País, como farei, certa e seguramente.
(…)
Não haverá tema polêmico que não venha para o Plenário. Portanto, neste momento, vamos levar a Câmara dos Deputados para a sociedade.
(…)
E vou dizer mais uma obviedade: nós todos sabemos que em Brasília, Sr. Presidente, está o Brasil formal. O Brasil real está lá fora, nas nossas bases. É lá que estão as angústias. É lá que estão as preocupações. É lá que estão os principais problemas.”
E encerrando seu memorável discurso de candidato, disse:
“Senhor presidente, para não ultrapassar o meu tempo e ser obediente, portanto, à determinação da Mesa, à determinação do Regimento e à determinação da Constituição, apenas peço que se convençam destas ideias e de outras tantas que já transmiti no passado e transmitirei no futuro.”
A oração proferida na posse e que transcrevemos em seguida ratifica os pendores do homem público, interessado e preocupado com o presente e o futuro da política e da administração, não esquecendo da crise que o País terá de  enfrentar.

O pronunciamento
“Deputadas, deputados, meus amigos todos, eleitores e não eleitores. Aproveito a manifestação do Plenário para dizer que agora não há eleitores e não eleitores, há deputados do Poder Legislativo brasileiro.
Meus amigos, eu sempre aprendi a distinguir muito bem, coisa que poucos fazem, entre o momento político eleitoral e o momento político administrativo. No momento político eleitoral que antecede a eleição há uma disputa, muitas vezes, acirrada, em que vez ou outra podem lançar-se algumas farpas, mas que são superadas pela consciência que temos de que quem é eleito representa todos.
O momento político-administrativo é este que se inicia neste momento.
(…)
Quero reiterar meu agradecimento a todos. Precisamente agora que fui eleito, confesso que, quando falava como candidato na tribuna, tive a tentação de dizer o que agora vou registrar, ou seja, que não sou um Deputado eleito pelo PMDB em favor do PMDB. Sou um Deputado eleito Presidente pela Casa, integrada por vários partidos.
Tenho a consciência absoluta do papel que a vida, muitas vezes, nos entrega. Ela já me entregou vários papéis: o de Secretário de Estado, Líder do partido, Presidente do partido, e, hoje me entrega o papel de Presidente da Câmara dos Deputados. Eu quero representar este papel, e o farei com a dignidade que o cargo exige e comporta e que os 304 votos me autorizaram a assim me expressar.
Quero também dizer – acho que o momento é oportuno – que vamos atravessar um biênio complicado. Não temos a menor dúvida de que o período não será fácil. Portanto, nós todos temos que nos fraternizar, a começar pelos Poderes do Estado. Legislativo, Executivo e Judiciário hão de atuar em estreita harmonia, porque, acima de qualquer divergência está o interesse do País.
Volto a dizer que a crise que se avizinha encontrará resistência no País, especialmente no Poder Legislativo. Em meu discurso como candidato, eu disse: Nós precisamos habilitar, trabalhar aqui na Câmara dos Deputados, para que possamos formular ideias que levem o País a enfrentar qualquer espécie de crise.
Sabemos também – alguns dos colegas que comigo concorreram levantaram este dado – que temas como o da educação, da saúde e da segurança pública não serão tratados por nós, como muitas vezes o são durante as campanhas nas eleições, como temas eleitorais e, sim, como temas de interesse da sociedade brasileira. Por isso, a todos eles nós vamos nos dedicar.
Quero registrar também que neste período vamos regulamentar toda a Constituição brasileira, um trabalho que se iniciou com o Presidente Arlindo Chinaglia, mas que, evidentemente, não pôde ser levado a cabo, até o final. E, desde já, faço um parêntese para colocar entre parênteses  um dos aspectos mais importantes da minha manifestação: o elogio público que faço ao Presidente que deixa esta cadeira.
(…)
Eu acho que o Presidente Arlindo merece de todos nós o reconhecimento de quem sai e deixa nesta cadeira uma responsabilidade muito grande, quanto a deixar um exemplo. Deixa a nós a responsabilidade de nos conduzirmos nos termos em que ele conduziu, mas deixa a todos do Parlamento a ideia de que é preciso acabar com essa história de acordos feitos não serem cumpridos. Acordos feitos pelas lideranças, pelos partidos, pelas bancadas têm de vir para o Plenário com o cumprimento absoluto entre todos os membros da Casa. É isso, meus senhores e minhas senhoras, que dá relevo, que dá tamanho, que dá dimensão à nossa instituição.
Temos problemas urgentes pela frente – urgentes e ingentes –, mas não nos vamos atemorizar. Quando eventualmente tivermos que tomar medidas impopulares, quando vez ou outra, a imprensa, irmã siamesa do Poder Legislativo… A todo momento costumo dizer que o Legislativo forte é sinônimo de imprensa livre e imprensa forte, e que Legislativo fraco, Legislativo fechado é sinônimo de imprensa fraca, de imprensa desprestigiada, de imprensa que pode até ver calada sua voz, como aconteceu em muitos momentos da história do nosso País.
Então, nós vamos, ao longo desse tempo, enfrentar grandes temas. Mas devo dizer, por mais críticas que muitas vezes se façam ao Poder Legislativo, à Câmara dos Deputados, que a dignidade, o tamanho, a estatura pessoal, política, administrativa, moral, a experiência daqueles colegas, homens e mulheres que aqui estão, espancarão qualquer dúvida a respeito da eventual inoportunidade de uma medida adotada pela Câmara dos Deputados.
Quero, portanto, mais uma vez, agradecer o apoio, cum-primentar; não o fiz durante a minha fala como candidato, mas, às vezes, como diz o provérbio latino: verba volant, scripta manent (as palavras voam, os escritos permanecem).
Embora não tenha mencionado as mulheres – portanto, não verbalizei –, o fato é que já escrevi o meu compromisso com as colegas desta Casa de criar uma Procuradoria Parlamentar Feminina e, mais, fazer com que uma representante da comunidade feminina tenha assento no Colégio de Líderes. Parece pouco, mas é muito, tendo em vista que, embora tenhamos 46 deputadas nesta Casa, o fato é que 50% do eleitorado brasileiro é feminino.
De modo que, meus amigos e minhas amigas, V.Exas. hão de compreender que neste momento eu estou mais emocionado do que naquele: naquele eu estava assustado e emocionado, neste eu estou assustado e emocionado pela tarefa que vem pela frente. Não quero entrar em detalhes sobre o que vamos ou não fazer, porque será extremamente pretensioso. Vamos ou não fazer aquilo que o Plenário desta Casa, pelas suas lideranças, determinarem ao Presidente da Casa.
Mas quero registrar, desde já, que nós preservaremos a indenidade, a integridade do Poder Legislativo. O meu sonho é que, ao final deste mandato, que coincide, aliás, com as eleições ou re-eleições que todos nós vamos enfrentar, eu possa sair daqui, que nós todos possamos sair daqui e passar, entrar em todos os lares e bares, em todos os campos e recantos, caminhar por todos os caminhos e escaninhos, entrar em qualquer aeroporto, ir ao nosso eleitorado e este nos dirigir a voz, nos cumprimentar e dizer: Deputado, parabéns pela sua conduta no Poder Legislativo nacional.
Muito obrigado a todos.
Não quero deixar de agradecer também às lideranças partidárias e às bancadas que me apoiaram e de pedir-lhes que se irmanem com as lideranças e bancadas que não nos apoiaram. Este é, digamos assim, o fecho final daquilo que eu gostaria de dizer.”

Notas do Editor _________________

As fotos das páginas 8 e 9, focalizam as homenagens prestadas ao deputado Michel Temer pela direção da Revista e a Confraria Dom Quixote, com a outorga do troféu Dom Quixote pelo senador Bernardo Cabral, em solenidade realizada em Brasília e a outorga do troféu Sancho Pança, fiel escudeiro de Dom Quixote, entregue pelo professor Ives Gandra Martins, em festividade realizada em São Paulo.
As duas figuras, criadas pela imaginação do universal escritor Miguel Cervantes de Saavedra, expressam a realização dos sonhos do cavaleiro da triste figura, seja na luta em favor dos injustiçados e desassistidos, na busca incessante de um amor puro e espiritual, seja na tragédia ou dramaticidade da sua loucura na defesa da dignidade e determinação, que o faz triunfar sobre seus enganos e fracassos.
Dom Quixote nos transmite uma lição de purificação do mundo pelo heroísmo, que deixou ensementada a consciência dos tempos seguintes, pelo sentido de pureza, fidelidade, amor, coragem e renúncia, por sentir que sem isso a sua vida não teria sentido.
Sancho Pança é simples, bronco mas atilado, esperto e prudente, serviu ao patrão como fiel escudeiro, demonstrando na simplicidade de suas ponderações o sentido dos sonhos e devaneios de Dom Quixote e a sua observação entre o impossível e a realidade. Ante a oferta do governo de uma ilha com todas as promessas de mordomia e grandes vantagens, desde que abandonasse Dom Quixote, recusa, deixando como resposta o que constitui um dos exemplos mais significativos e representativos da fidelidade: “Tenho que segui-lo. Somos da mesma aldeia; tenho comido do seu pão; quero-lhe bem, sou agradecido, deu-me as crias da sua égua, e, sobretudo, sou fiel. Portanto, é impossível que nenhuma outra circunstância nos separe, a não ser a pá e a enxada do coveiro”.
Assim, a outorga dos troféus ao deputado Michel Temer não poderia ser mais oportuna e representativa, graças aos princípios que vem aplicando na sua profícua existência como professor de Direito, respeitável homem político, de vida privada ilibada e como excepcional representante legislativo do povo do Estado de São Paulo no Congresso Nacional.