Advogados pedem que STF suspenda decisão de Fux que vetou juiz das garantias

16 de dezembro de 2020

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Em janeiro, Fux suspendeu trechos da Lei “anticrime” até julgamento de mérito. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Um número elevado de pessoas está submetida a constrangimento ilegal pela não aplicação das garantias instituídas em favor dos investigados e réus pela Lei 13.964/2019, apelidada de “anticrime”. É o que alegam os advogados do Instituto de Garantias Penais, em Habeas Corpus coletivo levado ao Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira (16/12). O pedido ainda não foi distribuído.

A discussão central é uma liminar do ministro Luiz Fux que, há quase um ano, suspendeu a eficácia de trechos da lei. Com a decisão, Fux impediu a implementação do juiz das garantias e suspendeu a obrigatoriedade de audiências de custódia em 24 horas.

No HC, os advogados pedem a suspensão dessa liminar e alegam que a aprovação dos dispositivos buscou “tornar o processo penal brasileiro mais compatível com o sistema acusatório, de matriz constitucional”.

“Os avanços levados a efeito pelo legislador no sentido da realização de um processo penal justo tiveram sua eficácia paralisada por decisão monocrática cuja não submissão a referendo pelo Plenário consubstancia grave constrangimento ilegal imposto a um número indeterminado – embora passível de determinação – de investigados e réus, que se encontram continuamente privados do exercício de importantes garantias processuais legitimamente criadas pelo legislador ordinário”, afirmam.

Outra reclamação é a falta de previsão de reagendamento de uma audiência pública que aconteceria inicialmente em março, mas teve de ser adiada como medida preventiva a epidemia de coronavírus. Em despacho em abril, Fux afirmou que as novas datas seriam “designadas oportunamente”. Segundo os advogados, no entanto, até agora não há definição de datas, nem mesmo na modalidade virtual.

“É dizer, durante esse longo período, não se submeteu a decisão à apreciação colegiada do Plenário do STF, o que finda por subverter o ideal de colegialidade da Corte e a própria sistemática processual do controle de constitucionalidade”, afirma Ticiano Figueiredo, presidente do IGP.

HC contra ato do STF
Ao julgar o pedido, o colegiado deverá perpassar pelo conhecimento do Habeas Corpus contra ato de um ministro da corte, um tema que há anos gera divergência no tribunal. A jurisprudência pacífica na corte é a de que não cabe Habeas Corpus contra ato de ministro e o Plenário não teve a oportunidade de aprofundar presencialmente a discussão. Ainda assim, alguns ministros já sinalizaram a intenção de que isso seja superado.

No HC coletivo desta quarta, os advogados defendem que o instrumento deve “servir à tutela dos direitos de liberdade, pouco importando, data venia, a forma pela qual o Estado ou o particular ameaça ou viola a liberdade de locomoção do(s) indivíduo(s)”.

Jurisprudência do STF define não caber HC contra ato de ministro. Foto: Dorivan Marinho/SCO/STF

“Não se pode criar um ‘topos’, é dizer, um lugar-comum no qual há um esquema argumentativo pronto e que pode ser reproduzido em qualquer situação: a jurisprudência pode sofrer modificações ante a complexa realidade dos fatos e do direito”, aponta o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que atuou com o IGP.

A corte, inclusive, teve pontos de inflexão, como mostrou reportagem da ConJur. Em agosto de 2015, assentou que HC é “ação nobre sem qualquer limitação na Constituição Federal” em julgamento que terminou em empate de cinco a cinco. Por consequência, beneficiou o réu. O caso tratava da delação premiada do doleiro Alberto Youssef.

Menos de seis meses depois, por seis a cinco, voltou ao posicionamento anterior sobre a questão, e tornou-se a não admitir HC contra decisão monocrática de ministro da corte.

Já em 2018, a Corte teve novamente a chance de se manifestar em Plenário sobre o tema, em caso que discutia prisão domiciliar a Paulo Maluf. No entanto, a análise ficou prejudicada quando Fachin preferiu conceder HC de ofício para manter a domiciliar por questões humanitárias.

Na ocasião, Toffoli e o ministro Gilmar Mendes se posicionaram a favor do cabimento de HC contra atos de ministros da corte. Gilmar Mendes afirmou, à época, que a corte precisava discutir logo essa matéria. Falou que sempre foi a favor do cabimento do HC nesses casos, principalmente pelo o que chamou “uso exorbitante e excessivo” dos poderes monocráticos.

Em maio deste ano, já com Plenário virtual, os ministros admitiram um Habeas Corpus contra decisão monocrática da ministra Cármen Lúcia. O pedido do Habeas Corpus foi negado, mas a postura, elogiada por advogados.

De lá para cá, a corte voltou a reafirmar a jurisprudência. Também em Plenário virtual, os ministros negaram um conjunto de HCs impetrados que tinham como autoridade coautora o ministro Alexandre de Moraes, relator do chamado inquérito das fake news.

Para especialistas, as idas e vindas afetam a segurança jurídica e passam um mau exemplo aos magistrados de instâncias inferiores. Recentemente, a OAB decidiu que vai levar ao Congresso uma proposta de alteração legislativa para garantir o cabimento do HC contra ato coator praticado por ministro da corte ou seus órgãos fracionários.

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Publicação original: Conjur