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Competência jurisdicional da Justiça Federal na ação de execução fiscal: Breve análise

6 de novembro de 2018

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Introdução

presente estudo se propõe a expor sucintamente, mas de forma sistematizada, a competência jurisdicional da Justiça Federal para o processamento e julgamento das ações de execução fiscal propostas pelos entes federais.

A questão se torna relevante em razão das recentes modificações legislativas que ampliaram sobremaneira as responsabilidades a cargo da Justiça Federal no que diz respeito a esta classe processual.

A ação de execução fiscal, prevista na Lei no 6.830/1980 (LEF), se trata da demanda judicial destinada à cobrança, em juízo, da Dívida Ativa de titularidade de entes que detenham a natureza jurídica de Direito Público.

Ainda, a demanda judicial de cobrança de Dívida Ativa tem como objeto satisfazer uma crise de inadimplência – pretensão resistida – não só de tributos, mas também de valores de natureza não-tributária.

Em linhas gerais, é oportuno salientar que o rito da ação de execução fiscal vem previsto de forma minuciosa em sua lei própria – a LEF – sendo-lhe aplicável, de maneira subsidiária, o Código de Processo Civil (art. 1o, “in fine”, da LEF).

Trata-se de demanda cujo título executivo é unicamente a certidão de dívida ativa, de natureza de título executivo não judicial, eis que lastreada em atuação administrativa e pré-processual a cargo do ente público credor.

A propósito, assim dispõe o art. 784, IX, do Código de Processo Civil:

Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

(…)

IX – a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

Ultrapassado este primeiro intróito, passam a ser analisadas, a seguir, as especificidades da ação de execução fiscal no que diz respeito à competência jurisdicional da Justiça Federal.

Competência jurisdicional da Justiça Federal para o julgamento de ações de execução fiscal propostas pelos entes públicos federais

Para fins da verificação de competência jurisdicional em ações de execução fiscal, faz-se necessária uma leitura conjunta do texto constitucional, em seu art. 109, bem como da Lei no 5.010/66, que organiza a Justiça Federal de primeira instância e dá outras providências.

Com efeito, em uma primeira análise, é possível perceber que, tratando-se de ação proposta pela União, a competência é atribuída como regra à Justiça Federal de primeira instância, nos termos do art. 109, I, da Constituição da República.

Quanto ao tema específico das execuções fiscais, afigura-se oportuna uma sucinta análise de direito intertemporal.

A Lei no 5.010/66, que rege a Justiça Federal de primeira instância, trazia previsão expressa de competência delegada à Justiça Estadual para o julgamento de ações de execução fiscal propostas na sede do domicílio do devedor em localidade que não fosse sede de órgão da Justiça Federal. Esta previsão estava normatizada no art. 15, I, da referida Lei, concretizando-se a possibilidade de competência delegada prevista constitucionalmente no art. 109, §3o, da Constituição da República. Assim, pode-se concluir que a referida previsão de competência delegada foi efetivamente recepcionada pela ordem constitucional instaurada pela Carta de 1988.

No entanto, a referida previsão normativa de competência delegada à Justiça Estadual para o julgamento de execuções fiscais restou expressamente revogada pela Lei no 13.043/2014, em seu art. 114 – assim, desde então, não mais se afigura possível o ajuizamento de execuções fiscais por ente federal perante a Justiça Estadual.

Neste ponto, registre-se, por oportuno, que, nos termos do art. 75 da Lei no 13.043/2014, “a revogação do inciso I do art. 15 da Lei no 5.010, de 30 de maio de 1966, constante do inciso IX do art. 114 desta Lei, não alcança as execuções fiscais da União e de suas autarquias e fundações públicas ajuizadas na Justiça Estadual antes da vigência desta Lei” (destacou-se).

Assim, executivos fiscais ajuizados em âmbito estadual antes da revogação do art. 15, I, da Lei no 5.010/1966 permanecem com seu trâmite na Justiça Estadual, havendo previsão legislativa expressa de perpetuatio jurisdictionis quanto às referidas ações.

De todo modo, com o advento da revogação mencionada, a conclusão óbvia é a de que todas as ações de execução fiscal ajuizadas por entidade federal, após o advento da nova lei, passam a ser processadas e julgadas exclusivamente por órgão da Justiça Federal, excetuadas aquelas já ajuizadas anteriormente à vigência da Lei no 13.043/2014.

Como último destaque, vale ressaltar o fato de que os juizados especiais federais não detêm competência para processar e julgar as ações de execução fiscal, conforme previsto expressamente pelo art. 3o, §1o, I, da Lei no 10.259 de 2001.

Competência territorial

Neste ponto do estudo, uma vez reconhecida a competência da Justiça Federal para o julgamento das ações de execução fiscal proposta por entes federais, afigura-se necessário responder à indagação sobre qual seria a competência territorial para o processamento dos feitos.

Com o advento do novo Código de Processo Civil, o ordenamento passa a prever um critério de competência territorial para as execuções fiscais, nos termos do art. 46, §5o, que dispõe que “[a] execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado”.

Embora a leitura do texto normativo indique não haver preferência entre as alternativas, há parcela da doutrina que entende haver uma gradação entre os critérios fixados pelo art. 46, §5o, do Código de Processo Civil.

É interessante notar, como contraponto à posição indicada, que o texto normativo do Código de Processo Civil parece ter claramente optado por não dispor uma gradação entre o critério geográfico de competência, em sentido diametralmente oposto ao que ocorria na antiga previsão do Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 578.

Competência da Justiça Federal – Conselhos de Fiscalização Profissional

Adianta-se, desde logo, que os Conselhos de Fiscalização Profissional possuem a natureza jurídica de autarquia federal – à exceção da OAB, que possui natureza jurídica sui generis – conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade no 1.717 MC, que teve como relator o ministro Sydney Sanches e foi julgada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal em 22/09/1999.

Sendo assim, de pronto, é possível concluir-se que, tratando-se de ação proposta pelos Conselhos de Fiscalização Profissional, a competência jurisdicional para o julgamento do feito será atribuída, como regra, à Justiça Federal de primeira instância, nos termos do art. 109, I, da Constituição da República.

Neste sentido, e tratando do regramento geral sobre o tema, o enunciado sumular de número 66 do STJ afasta qualquer dúvida a este respeito, ao dispor ser de competência da “Justiça Federal processar e julgar execução fiscal promovida por Conselho de Fiscalização Profissional”.

Competência de outros ramos da Justiça

Vale registrar, ainda, que não se enquadram na seara da competência da Justiça Federal as seguintes demandas: execuções de multas trabalhistas – de competência da Justiça do Trabalho, conforme o art. 114, VII, da Constituição Federal, após a Emenda Constitucional no 45 de 2004; e execuções de multas eleitorais – de competência da Justiça Eleitoral, nos termos do art. 367, III e IV, do Código Eleitoral. .

Conclusão

A partir desta breve análise, o estudo se propôs a sistematizar, de maneira bastante sucinta, a competência jurisdicional da Justiça Federal em matéria de execuções fiscais.

Com apoio na doutrina e na jurisprudência, e tendo em vista as disposições legais e constitucionais que regem o tema, foi possível perceber que a Justiça Federal detém uma ampla competência para o julgamento das ações de execução fiscal.

Ganha relevo o fato, ainda, de que, com a Lei no 13.043/2014, restou ampliada a competência dos juízos federais neste âmbito, uma vez que restou extinta a competência delegada aos juízos estaduais para que julgassem execuções fiscais propostas pelos entes federais.

Com o presente estudo, espera-se que este tema, tão importante no cotidiano da Justiça Federal, possa reverberar para toda a comunidade jurídica e acadêmica.

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Notas___________________________

1 CHUCRI, Augusto Newton. Execução Fiscal Aplicada: análise pragmática do processo de execução fiscal. Coordenador João Aurino de Melo Filho, Augusto Newton Chucri – 6a. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017, pgs. 42.

2 Pela mesma razão, ações de execução fiscal propostas por outros entes federativos em desfavor de ente federal também serão ajuizadas perante a Justiça Federal, pelo critério “ratione personae”. Nesse sentido, e com a lição de que a questão não se enquadra em conflito federativo apto a levar a demanda ao Supremo Tribunal Federal, cite-se CHUCRI, Augusto Newton. Execução Fiscal Aplicada: análise pragmática do processo de execução fiscal. Coordenador João Aurino de Melo Filho, Augusto Newton Chucri – 6a. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 118.

3 HORTA, Bernardo Tinôco de Lima Horta. Breves apontamentos sobre as execuções fiscais ajuizadas por Conselhos de Fiscalização Profissional no âmbito da Justiça Federal, in Justiça Federal: estudos doutrinários em homenagem aos 45 anos da AJUFE. VELOSO, Roberto Carvalho; SILVA, Fernando Quadros da. [Orgs.]. Belo Horizonte: Editora D´Plácido, 2017, pgs. 39-51.

4 CHUCRI, Augusto Newton. Execução Fiscal Aplicada: análise pragmática do processo de execução fiscal. Coordenador João Aurino de Melo Filho, Augusto Newton Chucri – 6a. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 109.

5 O referido artigo assim dispunha: “Art. 578. A execução fiscal (art. 585, Vl) será proposta no foro do domicílio do réu; se não o tiver, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado”.

6 HORTA, Bernardo Tinôco de Lima Horta. Breves apontamentos sobre as execuções fiscais ajuizadas por Conselhos de Fiscalização Profissional no âmbito da Justiça Federal, in Justiça Federal: estudos doutrinários em homenagem aos 45 anos da AJUFE. VELOSO, Roberto Carvalho; SILVA, Fernando Quadros da. [Orgs.]. Belo Horizonte: Editora D´Plácido, 2017, pgs. 39-51.

7 CHUCRI, Augusto Newton. Execução Fiscal Aplicada: análise pragmática do processo de execução fiscal. Coordenador João Aurino de Melo Filho, Augusto Newton Chucri – 6a. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 123-126.