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Da majoração do limite etário para magistrados

31 de janeiro de 2008

Regina Coeli Medeiros de Carvalho Juíza Federal Titular da 18ª Vara do Rio de Janeiro

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Como é de conhecimento geral, a idade limite para que o trabalhador permaneça na vida ativa é de setenta anos, após o quê, este, se não requerer sua aposentadoria por tempo de serviço, será aposentado compulsoriamente.
A recente proposta para a Reforma do Judiciário prevê a majoração da sua aposentadoria compulsória de setenta para setenta e cinco anos.
A questão gerou as mais acirradas discussões e merece alguns momentos de reflexão.
Tenho que o tema deva ser abordado sob duas dimensões:
1 – Sob o prisma da Previdência Social;
2 – Sob o prisma da Reserva Técnica dos Tribunais
versus a Renovação da Magistratura e a Movimentação da Carreira.

No que concerne à previdência
Recentemente, a mídia fez veicular uma reportagem onde se verificava que a expectativa de vida do brasileiro aumentou, estabelecendo-se num patamar médio de 72 anos de idade.
A mídia, ainda, fez divulgar diversas reportagens sobre os avanços intelectuais de idosos, como a mineira de noventa anos que logrou aprovação no vestibular e outra senhora, na mesma faixa etária, que concluíra o segundo grau, dentre muitas outras notícias nesse sentido.
Pelo mundo todo, ouve-se falar nos avanços da medicina objetivando prolongar a vida humana com qualidade.
Isso é um fato inconteste. Apesar das intempéries climáticas, o homem está vivendo mais. Recentemente, o IBGE divulgou pesquisa dando conta de uma cifra em torno de seis mil centenários existentes no País.
Na Europa, discute-se a crise da previdência em razão do envelhecimento da população, que supera o número de  trabalhadores ativos, que sustentam os aposentados. A Itália vive essa crise há alguns anos, tendo-se notícia de que estava facilitando a imigração de mão-de-obra jovem para dar sustentação ao déficit da previdência com aposentados.
Na França, o novo Presidente enfrenta greves intermi-náveis e ameaças por bombas por estar propondo o fim do regime especial, que permitia aos funcionários públicos  aposentarem-se mais cedo que o trabalhador comum.
Os chamados “Tigres Asiáticos” nada fazem sem antes consultar seus Conselhos de Anciões. No Brasil, os idosos são ignorados, agredidos, desprezados. Onde estão eles, onde estamos nós?  A comparação é inevitável e o resultado desalentador.
Importante destacar que o aumento da expectativa de vida do brasileiro refere-se, especialmente, ao brasileiro de baixa renda – que tem pouco acesso à saúde e à alimentação – uma vez que representa mais de noventa por cento da população, sendo a parcela que vai influenciar a média apurada.  Certamente, a população de renda mais alta, que pouco influência a tendência dessa média, terá expectativa de vida mais alta ainda, conforme a acima citada mineira, professora aposentada que passou no vestibular de Direito.
Na verdade, os aposentados com faixas de benefícios mais altas são os que terão maior expectativa de vida, por disporem de melhores meios para obter uma melhor qualidade de vida na terceira idade.
É evidente que, quanto mais cedo o trabalhador se aposentar, mais tempo a previdência terá que suportar a despesa com o seu benefício, mesmo que este, por mais absurdo que seja, continue contribuindo para a previdência após a aposentadoria.
Uma comparação hipotética permitiria vislumbrar, em caso de servidor público, que a União estaria pagando em dobro pelo mesmo serviço quando poderia ter mais força de trabalho com uma aposentadoria mais tardia. É lógico que esta diretriz não poderia se aplicar à trabalhadores braçais, especialmente o trabalhador rural ou mesmo aqueles dos quais se exige esforço repetitivo, como exemplo a ser exceptuado.
Tenho que a questão merece um estudo mais aprofundado, tanto sob o ponto de vista do tempo de contribuição, quanto sob o ponto de vista da idade limite para se obter o benefício de aposentadoria.

No que concerne à magistratura
A questão toma proporções maiores quando analisamos a questão da Magistratura.
A magistratura, sendo uma das carreiras públicas de melhor remuneração, juntamente com os demais cargos jurídicos públicos, é um exemplo dos mais emblemáticos no sistema brasileiro.
Sendo uma carreira de cunho eminentemente intelectual, a perda com a aposentação assume dimensões extraordinárias.
O magistrado, no decorrer dos anos de trabalho, acumula um acervo intelectual de proporções incalculáveis. A expe-riência na magistratura revela-se como uma qualidade da maior relevância para administrar, com qualidade, a carga de trabalho que lhe é atribuída diariamente.
A saída de um magistrado, após muitos anos de trabalho, revela-se como uma perda irreparável, tanto sob o ponto de vista técnico, como sob o ponto de vista financeiro.
Sob o ponto de vista técnico, verifica-se que, com a vacância do cargo, será admitido um magistrado novo, em princípio, sem qualquer acervo de experiência como magistrado, mesmo que tenha passado pelas Escolas de Magistratura ou por outros cargos jurídicos.  A experiência prática de julgar suas próprias demandas é insubstituível.
Um magistrado de setenta anos está, ainda, em pleno vigor de suas condições intelectuais, apto a prosseguir julgando, aplicando e disseminando a sua experiência aos mais novos, devendo até mesmo ser utilizado no treinamento dos recém-admitidos através das escolas especializadas.
Quanto perdeu o Judiciário com a saída do Ministro Moreira Alves e a do Ministro Carlos Velloso? É incomensurável, mas, certamente, perdemos todos e muito.
Sob o ponto de vista financeiro é, também, uma perda irreparável, pois paga-se pelo mesmo cargo em dobro e sem a contra-partida de trabalho e produção intelectual. Ao passo que a manutenção de um magistrado por mais cinco anos, com ou sem tempo para aposentadoria e ainda integrando a força de trabalho da magistratura, é extremamente econômica, pois a sua permanência nos quadros economiza um posto de trabalho inativo e retém a experiência acumulada.
Concluindo, entendo que a proposta de majoração do limite etário da Magistratura, encartada no Projeto de Reforma do Judiciário, é absolutamente pertinente, atual, realística e necessária para incrementar a produtividade neste Poder, devendo ser implementada com a possível brevidade, a fim de impedir a evasão dessa reserva técnica da magistratura.