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Ética e Política: uma reflexão

5 de julho de 2000

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Não é difícil justificar a atualidade e o interesse pela temática relacionando ética e política. Muito mais difícil é compreender as suas implicações e o modo pelo qual elas correspondem à crise que vivemos contemporaneamente.

Pesquisas de opinião divulgadas com freqüência demonstram a falta de credibilidade e a baixa aceitação da classe política. É possível que a incapacidade de resolução dos problemas seja um fator determinante. No entanto, é possível que o enfraquecimento dos liames entre a ética e a política sejam a causa maior da frágil imagem dos políticos junto à população.

O objetivo deste pequeno trabalho, que posteriormente será aproveitado como um dos capítulos da tese que desenvolverei sob o título de Ética, Política e Direito, é o de fazer uma breve revisão histórica da evolução da relação entre a ética e a política, dando destaque aos pressupostos teóricos de Max Weber, e propor uma forma de aproximação entre as duas, o que nos parece ser o anseio de todos os que, embora entendendo teoricamente pouco de uma ou de outra, acreditam que ainda é possível associá-las no cotidiano da vida.

A palavra ética não tem o mesmo sentido para todos. Quando comparamos as definições dos antigos e dos modernos, percebemos que são radicalmente diferentes e que isto cria em torno delas um verdadeiro campo de contradições.

Os gregos subordinavam a ética (ethikós) às idéias de felicidade e de encontrar um soberano bem, fazendo com que o homem se bastasse a si mesmo. Era um pouco livrar-se do fatalismo e dominar as próprias paixões.

Aristóteles, no início da Ética a Nicômaco, entende que a investigação em torno do que deve ser o bem e o bem supremo pertence à uma ciência mais importante e mais arquitetônica: a política. E um outro texto, Política, afirma: Está claro que existe uma ciência à qual cabe indagar qual deve ser a melhor constituição; qual a mais apta a satisfazer nossos ideais sempre que não haja impedimentos externos; e qual a que se adapta às diversas condições em que devem ser posta em prática.

Na sua visão, a política, ciência maior, englobaria boa parte da ética, estando as duas absolutamente coladas    – sendo que a segunda quase toda dentro da primeira. Enfim, para os gregos, política e ética eram quase que sinônimos.

Esta visão grega foi base da episteme medieval, baseada fundamentalmente no pensamento tomista em torno da idéia de buon governo. A religiosidade acentua-se nesse período, influenciando de forma crescente as relações entre ética e política. É com o fim das categorias medievais que começa a modernidade.

Com Hobbes e Maquiavel, a política liberta-se da moral e da religião.

Maquiavel subverte o conceito e os valores e separa, de forma inequívoca, política e ética. O entrelaçamento profundo que havia entre essas duas esferas da práxis se desintegra. As inúmeras interpretações de sua obra têm somente reforçado a tese de que foi ele, em Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio, e, fundamentalmente, em O Príncipe, o autor das bases teóricas dessa divisão. Ao mesmo tempo, seus mais diversos exegetas vêem em sua obra a demonstração de uma política voltada exclusivamente para seus fins. O enigma de sua obra está presente em qualquer análise que interrogue sobre as fronteiras da ética. Segundo Newton Bignotto: “Maquiavel não foi um moralista, nem procurou redefinir valores como fizeram Spinoza, Hobbes, etc. Isso não impediu que algumas páginas de O Príncipe provocassem escândalos justamente porque parecem atacar de uma maneira brutal crenças e valores que constituíam o núcleo da moral cristã. Ao afirmar por exemplo, que ‘a um príncipe não é necessário possuir todas as qualidades, mas é necessário parecer tê-las’, ou que ‘as violências devem ser feitas todas ao mesmo tempo, a fim de que seu gosto, persistindo menos tempo, ofenda menos’, Maquiavel parece sugerir que a boa ação política não deve levar em conta valores que sejam incapazes de garantir seu sucesso, mas apenas o que conduz à meta desejada, que, no caso dos príncipes, é a manutenção do Estado. Tanto os que criticam Maquiavel por separar a política da ética quanto os que se esforçam em mostrar que ele não fez mais do que descrever o funcionamento dos Estados reais contentam-se em ver nele o criador da ‘razão do Estado’, e em pensar que o abandono dos parâmetros morais implica a volta a um estado de competição regulado unicamente pelo desejo de conquista. Não é o próprio Maquiavel que afirma, em concordância com esses intérpretes, que ‘os homens esquecem mais facilmente a morte do pai do que a perda do patrimônio’ (O Príncipe, XVII)”.

Ainda no mesmo texto, Bignotto afirma: “O que Maquiavel descobre (…) não é a independência da ética da política. A história romana prova o contrário. O que ele mostra é que nas fronteiras do político, lá onde a ética e a religião fracassam, continua a existir uma forma de governo que conserva elementos fundamentais de todas as outras.

Maquiavel demonstra os limites da ética, seja religiosa ou de qualquer ordem, para guiar os homens para construção do Estado. Acredita ele que a formação eficaz de uma sociedade politicamente organizada não terá suas bases em uma estrutura ética e em valores morais. A política é práxis. A conquista e a manutenção do poder são objetos de técnica. A estabilidade da sociedade exige uma racionalidade. É esta racionalidade, este paradigma, que Maquiavel propõe.

As teses de Hobbes, expressas fundamentalmente no Leviatã, acentuam as características de uma soberania absoluta, indivisível, postas ante-riormente por Bodin. Segundo Hobbes, no estado de natureza, os homens eram todos iguais e tinham os mesmos direitos, pois a natureza deu tudo a todos. Não havendo limites ao exercício da liberdade, o estado da natureza é o de guerra de todos contra todos, bellum omniun contra omnes, em que o homem se comporta como se fosse o lobo do homem, homo homini lupus. Na sua visão contratualista, o Estado detém todo o poder, é absoluto, só assim é possível organizar a sociedade. Só deste modo a ordem impõe-se ao caos. O soberano é o único poder legislativo. Não há lei senão a sua ordem expressa. Ou seja, a ética dos homens precisa estar adequada à ética do soberano.

Outro pensador preocupado com a questão é Nietzsche, embora considerado por muitos um pensador apolítico, por preconizar o afastamento da política cotidiana de sua época.

Revestida de um caráter supra-histórico, a sua visão de um eterno retorno apresenta-se como uma forma extrema de niilismo. O filósofo alemão parece julgar compatíveis a força de persuasão do pensamento ético com um determinismo cosmológico.

Em  A Gaia Ciência, escreve: Se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: ‘Esta vida, assim como tu a vives agora e como a viveste, terás de vivê-las ainda uma vez e ainda inúmeras vezes; e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e grande em tua vida há de retornar, e tudo na mesma ordem e seqüência – e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez – e tu com ela, poeirinha da poeira!’ – Não te lançarias no chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasse assim? Ou  viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: ‘Tu és um deus, e nunca ouvi nada mais divino!’.

Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse; a pergunta, diante de tudo e de cada coisa: ‘Quero isto ainda uma vez e ainda inúmeras vezes?’ pesaria como o mais pesado dos pesos sobre teu agir! Ou então, como terias de ficar de bem contigo mesmo e com a vida, para não desejar nada mais do que esta última, eterna configuração e chancela?”

Ao anunciar a morte de Deus, Nietzsche revela a sua aceitação do “nada” como absoluto. O Deus morto é o Deus cristão que significa não só a figura histórica de Cristo, mas o mundo supra-sensível em geral, os ideais, as normas, os princípios, os fins, os valores que, colocados acima do mundo terreno, lhe davam orientação e sentido. O discurso niilista de Nietzsche levou Dostoievski a afirmar, por meio de um dos seus personagens, Ivan Karamozovoski, que “se Deus não existe, tudo é permitido”. Estava assim reforçada a idéia de que todo mundo pode fazer o que julga melhor para sua causa, interesse ou prazer.

Modernamente, a relação entre ética e política precisa enfocar os escritos de Hanna Arendt. Em O que é Política, ao procurar encontrar o sentido conceitual para a questão, afirma: “A pergunta sobre o sentido da política exige uma resposta tão simples e tão conclusiva em si que se poderia dizer que outras respostas estariam dispensadas por completo. A resposta é: O sentido da política é a liberdade”.

Para Arendt, a política e a liberdade estão ligadas e a tirania é a pior de todas as formas que o Estado pode assumir. Essa tirania estatal é na prática antipolítica. Esta diretriz atravessa o pensar e o agir da humanidade até os tempos mais recentes. A veracidade nunca foi considerada uma virtude política, pois as mentiras têm sido tradicionalmente justificáveis, dependendo das circunstâncias. A mentira, na reflexão arendtiana, entre os homens que agem e atuam politicamente, não é acidental. Celso Lafer, um especialista brasileiro no pensamento de Hanna Arendt, ao analisar a questão afirma: “A falsidade deliberada lida com fatos contingentes; com assuntos que não carregam no seu bojo uma verdade inerente, e não tem um corpo definido com a clareza da evidência. Por isso são vulneráveis. Fatos necessitam de testemunho e testemunhas confiáveis para serem estabelecidos, pois sempre comportam dúvidas. Por isso, a mentira é uma tentação, que não conflita com a razão, porque as coisas poderiam ser como o mentiroso as conta. (…) Essa necessidade de proteger a verdade fatual, que para Hanna Arendt é a verdade política, resulta, assim, de não ser ela evidente e de poder ter como o seu contrário não apenas o erro ou a ilusão, mas a mentira. Esta, na sua plenitude, é, para usar a definição de Santo Tomás, o ato de quem pretende, enganado, induzir em falsidade a opinião alheia”.

O que se percebe no pensamento de Hanna Arendt é uma denúncia contundente do desencontro entre a ética e a política e seus trabalhos teóricos são importantes subsídio para a discussão que trava-se atualmente na tentativa de criar novo paradigma para a questão.

Max Weber é, talvez, o maior crítico da modernidade ocidental. Sua obra tem sido interpretada repetidamente, neste século, como fundamental para um diagnóstico desta mesma modernidade. Pensador original, sua contribuição teórica transcende escolas e correntes do pensamento filosófico social, porque a singularidade de suas idéias não identifica-se com as existentes em sua época. Entre o que distingue sua personalidade, podemos citar a imposição de normas absolutamente rígidas a si mesmo e atitudes fortemente independentes, o que levara, muitas vezes, a parecer controverso. A compreensão do psiquismo de Weber é importante no entendimento de seu pensamento. Como filósofo, foi político; como político, foi cientista. Não teve uma filosofia sistemática, mas o seu espírito era filosófico. Interpretá-lo sem levar em consideração essas premissas é caminho fácil para equívocos e paradoxos.

É quase no final da vida que Weber profere as duas conferências que marcam o seu confronto entre as esferas da ciência e da política: A ciência como vocação (1917) e A política como vocação (1919).

É em  A Política como Vocação, que encontramos as bases teóricas para análise do pensamento weberiano, em relação a sua concepção de Estado e de sua compreensão da política e seu relacionamento com a ética.

E então, que relações têm realmente a ética e a política? Não haverá qualquer ligação entre as duas, como já se afirmou ocasionalmente? Ou será verdade o oposto: que a ética da conduta política é idêntica como a de qualquer outra conduta?

Discorrendo sobre a sua concepção de Estado, formas de legitimação do poder e a “vocação do político” é que Weber chega a uma dualidade conceitual: ética da convicção e ética da responsabilidade.

A ética da convicção weberiana é uma ética de deveres e que têm como direcionamento a realização do que se deve, obtendo o possível de acordo com princípios.

Como bem destacou Celso Lafer: “Politicamente a plena afirmação de uma ética de princípios significa a redução total da política à moral, tal como preconizado por Erasmo de Roterdam em A educação do príncipe cristão, publicado em 1515 – contemporâneo, portanto, de O Príncipe, de Maquiavel, que é de 1513. No seu livro Erasmo afirma a prioridade da magnanimidade, da temperança e da honestidade, portanto, do agir honesto e do não fazer mal a ninguém, ou seja, a face não demoníaca do poder”.

Essa forma ética encontra em Santo Agostinho e Kant, com suas condenações veementes a qualquer forma de mentira, um forte suporte.

Em oposição, temos a ética de responsabilidade, que é uma ética de resultados ou de objetivos. Esta ética não parte de racionalidade do valor consagrado no princípio e sim segundo o fim, ou seja, da adequação dos meios aos fins perseguidos. Mentir ou enganar é permitido, desde que, o resultado alcançado as legitime ( O Utilitarismo de Benthan com sua “felicidade do maior número de pessoas” é um exemplo).

A dedicação à política, para Weber, exige a compreensão da situação paradoxal destes dois princípios éticos:

Quem busca a salvação da alma, sua e dos outros, não deve buscá-lo no caminho da política, pois as tarefas totalmente diferentes da política só podem ser resolvidas pela violência. O gênio ou o demônio da política vive numa tensão interna com o deus do amor, e com o Deus cristão expresso pela Igreja.

A afirmação de Weber, segundo Katie Argüello, “tenta delimitar as esferas das atividades humanas, as quais possuem suas finalidades e regras específicas de atuação”.

Sobre o questionamento de qual ética é compatível com os dilemas próprios da ação política, a resposta  é dada por muitos analistas da obra de Weber. Para Argüello, “parece que Weber indica a ética da responsabilidade, pelo fato de que esta leva em conta a ciência moderna e tende a dominar o mundo. A consciência da impossibilidade de alcançar uma forma cognoscitiva objetiva’ convence o ético da responsabilidade a cumprir a ação, que não deve ser necessariamente rigorosa, e a aceitar plenamente as suas conseqüências”.

Esta responsabilidade nunca é descolada, entretanto, do que Weber chama de vocação política. O homem político precisa alimentar-se da paixão.

“Há dois modos principais pelos quais alguém pode fazer da política a sua vocação: viver ‘para’ a política, ou viver ‘da’ política. Esse contraste não é, de forma alguma, exclusivo. Em geral, o homem faz as duas coisas, pelo menos em pensamento e, certamente, também a ambas na prática. Quem vive ‘para’ a política faz dela a sua vida, num sentido interior. Desfruta a posse pura e simples do poder que exerce, ou alimenta seu equilíbrio interior, seu sentimento íntimo, pela consciência de que sua vida tem ‘sentido’ a serviço de uma ‘causa’. Nesse sentido interno, todo homem sincero que vive para uma causa também vive dessa causa. A distinção, no caso, refere-se a um aspecto muito mais substancial da questão, ou seja, o econômico. Quem luta para fazer da política  uma “fonte de renda”  permanente, vive “da” política como vocação, ao passo que quem não age assim vive ‘para’ a política”.

Outro ponto importante em Weber, para compreensão da sua concepção de relação entre ética e política, é o que ele entende por Estado. Ao afirmar que o Estado é a instituição política que detém o monopólio da violência legítima e que este é o instrumento utilizado pela política, Weber mostra a relação entre o poder e a força. Esta utilização da violência como um meio para atingir determinado fim exacerba o paradoxo ético fundamental da atividade política. O questionamento é “quando, e em que proporção, usar a violência?” Essa resposta é necessária para todos quantos praticam a política, pois os resultados obtidos importam mais do que os “princípios”, mesmo que a intencionalidade subjetiva de todos seja igual, isto é, boa.

Esta ética de responsabilidade e resultados faz exigências: “O homem político precisa ter consciência da ‘irracionalidade ética do mundo’ e das ameaças que a sua causa possa sofrer no percurso da ação política”.

Enfim, Weber permite a “mentira caridosa” os médicos – para esconder a doença e ajudar o doente a viver melhor, por exemplo – na política.

As bases da relação entre ética e política têm sido analisadas por muitos teóricos. A teoria clássica maquiavélica produziu uma gama de “técnicas” para proceder politicamente, todas elas em maior ou menor grau separando a política da ética.

No lado oposto, teses com base em Santo Agostinho, por exemplo, vislumbram a idéia de que a política deve basear-se na moralidade. Weber é um dos autores que rejeita a opinião de que a política se baseia na moralidade e recomenda a chamada “ética da responsabilidade”. No seu entender, a obrigação ética do político é descobrir as conseqüências previsíveis de suas ações e assumir as responsabilidades por elas. A moralidade kantiana não teria lugar na política. A “ética da responsabilidade” weberiana parece não dar respostas, entretanto, à pergunta crucial sobre quais conseqüências são boas e quais são más.

A complexidade crescente do mundo, dificultando análises, não permite, na maior parte das vezes, estabelecer se determinada situação “é boa ou é má”. Soma-se a isso a compreensão ideológica, que é outra variável a ser ponderada.

Ao assumir a responsabilidade por conseqüências, pressupomos uma distinção prévia entre “boas e más” conseqüências. Neste aspecto uma outra variável merece ser analisada, que é o declínio do Estado-Nação. Estaria alguém tendo uma atitude eticamente adequada ao defender o seu país em detrimento de conseqüências extremamente danosas para a população de outra nação? Como seria vista, por Weber, a política externa norte-americana que, parece ser absolutamente responsável com o povo dos Estados Unidos e irresponsável com muitos povos subdesenvolvidos afetados negativamente por uma política neoliberal?

Uma preocupação que aflige aqueles que estudam a questão é como reunir a visão popular (que aproxima a ética da política) da visão exercitada pela classe política (muito mais realista e técnica), em um momento de absoluto enfraquecimento das instituições políticas em geral.

Celso Lafer, ao analisar a questão e relacioná-la com a democracia, diz: “Porque a democracia se baseia no princípio da confiança e da boa-fé, e não no medo, ela sucumbe quando a esfera do público perde transparência e se vê permeada pelo ‘segredo’ e pela ‘mentira’, que é o que ocorre quando a palavra esconde e ‘engana’, ao invés de ‘revelar’, conforme determina o princípio ético da veracidade”.

Da mesma maneira, afirma a respeito do pensamento de Hanna Arendt, “é a mentira dos governantes que gera o ceticismo e a impotência dos governados, que não tem base para agir sem os alicerces da verdade dos fatos”.

Faz-se necessário aproximar ética e política. É preciso procurar formas que possam fazer com que as duas não sejam dois círculos separados, como a distinção de moral e direito de Kelsen, mas que sejam dois círculos excêntricos, com a maior área em comum possível, de forma a aproximá-las sem reduzir uma a outra.

Mas, como fazer?

A resposta é difícil, mas pode começar a ser encontrada em Boaventura Souza Santos. Ao analisar o projeto da modernidade ele afirma que esta é caracterizada pôr um equilíbrio entre regulação e emancipação. O pilar de regulação é constituído por três princípios: o princípio do Estado (Hobbes), o princípio do mercado (Locke) e o princípio da comunidade (Rousseau). É este terceiro, que na sua impureza (como se não aceitando a dicotomia entre Estado e Sociedade Civil) tem impulsionado uma série de novos movimentos sociais pelo mundo. Esta luta num campo público, mas não estatal, será capaz, no nosso entendimento de ajudar a produzir aproximação desejada. É o que Agnes Heller e Ferenc Fehér chamam de a ética do cidadão. Para eles: “Quanto mais ampla a experiência de vida, quanto mais múltiplas as necessidades dos atores políticos, maior é probabilidade de que normas e regras justas possam substituir as existentes”.

A aproximação da ética e política estão no nosso entendimento condicionadas neste instante a um avanço dos movimentos sociais. O crescimento da luta nestes espaços públicos, não-estatais, dos quais estes movimentos são o melhor exemplo, poderão ser o amálgama da aproximação entre ética e política.