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Ética e Transparência na Administração Pública ― A Responsabilidade dos Tribunais de Contas

31 de janeiro de 2007

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 O primeiro passo para uma abordagem da Ética é defini-la conceitualmente. A Ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. Não estabelece princípios, normas ou regras de comportamento, mas, a partir de experiência histórico-social no terreno da moral, procura determinar sua essência, sua origem, condições objetivas e subjetivas do ato moral. Seu objeto de estudo é constituído por atos humanos conscientes e voluntários, de indivíduos que afetam outros indivíduos, grupos sociais ou a sociedade em seu conjunto. Estes três elementos – consciência, livre escolha e alteridade – são essenciais à caracterização da conduta moral.

  Aristóteles considerava como a maior das virtudes humanas a capacidade de exercer ao máximo suas potencialidades, referindo-se claramente àquilo que era exclusivo ao homem – a razão –, e que só por meio dela poder-se-ia chegar à felicidade, considerada, para o filósofo grego, o bem supremo. O único meio para alcançá-lo era agir com temperança, buscando-se a justa medida entre os extremos, sempre visando à coletividade, ao bem comum, visto que o homem não é um ser isolado, mas um ser político. O bem da pólis é, portanto, maior e mais perfeito, sobrepondo-se a qualquer outro bem. Na “Ética a Nicômaco”, verifica-se que, na construção do pensamento aristotélico acerca dos atos virtuosos, ganham o sumo status aqueles que são dirigidos ao bem da coletividade.

Portanto, no plano das atividades políticas, é eticamente imprescindível que os governantes ajam, em qualquer circunstância, visando ao bem comum. A conduta do administrador público moralmente responsável deve sempre priorizar a coletividade, jamais perdendo de vista que os bens ou valores éticos submetem-se a uma ordem hierárquica, e que se deve privilegiar o bem maior em detrimento daquele que visa a um objetivo insignificante, no espectro das ações voltadas ao grupamento social.

No universo da administração pública, pesa sobre os governantes – além da responsabilidade pelas políticas públicas e gestão dos recursos – a responsabilidade moral de agir conscientemente de acordo com os parâmetros éticos.

A Constituição Federal de 1988 atribuiu aos tribunais de contas a incumbência de exercer o controle dos atos administrativos, por meio de fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial das entidades da administração pública, sob os critérios de legalidade, legitimidade, economicidade e eficiência, aplicando-se aos responsáveis por eventuais irregularidades sanções legais. Em última análise, os tribunais de contas – em cumprimento ao princípio da legalidade, insculpido no artigo 37 da Carta Magna – asseguram a consecução das finalidades públicas e a proteção dos direitos e interesses dos administrados contra possíveis atos lesivos ou ilegais dos administradores públicos, reclamando, por parte destes, um comportamento ético e moralmente responsável.

Para que os tribunais de contas exerçam com o mesmo rigor moral as atividades de controle externo que lhes são constitucionalmente conferidas, é necessário que estejam atentos e diligentes quanto à composição de seu corpo deliberativo, majoritariamente constituído por membros indicados pelo Poder Legislativo, órgão titular da função fiscalizadora, a quem incumbe, portanto, selecionar criteriosamente aqueles que passarão a integrar as cortes de contas, privilegiando, não só a capacidade técnica, mas, também, e sobretudo, a conduta moral como critérios de escolha.

A heterogeneidade social, somada às idiossincrasias pessoais, reflete-se de forma análoga na representação parlamentar de toda e qualquer sociedade. E é este universo legitimamente composto pela diversidade que se oferece à escolha livre e consciente, exigindo o máximo de ponderação e razoabilidade dos responsáveis pelas indicações de seus representantes.

Por outro lado, compete aos tribunais de contas a mesma exação quanto à escolha dos membros do Ministério Público de Contas e dos Auditores – submetidos a  rigoroso e exigente concurso público e com foco dirigido ao histórico ético dos aprovados –,  visando a garantir  a  responsabilidade no exercício de suas funções, que tocam o terreno incerto das ações morais, porquanto fiscalizam, além do cumprimento da lei e dos princípios que orientam a administração pública, a conduta ética dos governantes.