Faculdade de Direito da UFMG, cenáculo do Direito, sementeira de homens públicos

14 de fevereiro de 2013

Carlos Mário da Silva Velloso Membro do Conselho Editorial / Ministro aposentado do STF

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Discurso pronunciado na sessão solene comemorativa dos 120 anos de fundação da Faculdade de Direito da UFMG, em Belo Horizonte, no dia 10/12/2012

“Até que editada a Lei de 11 de agosto de 1827, os brasileiros que desejassem seguir a carreira jurídica deviam matricular-se na Faculdade de Direito de Coimbra. Diplomados, de volta ao Brasil, pugnavam pela criação, aqui, de cursos de formação jurídica. Com a Lei de 11 de agosto de 1827, para cuja edição contribuíram, sobremaneira, foram instituídos, no Brasil, os cursos de Direito em São Paulo e Olinda.

Registra o professor Aroldo Plínio Gonçalves1 a observação de Haroldo Valladão no sentido de que, ‘no Império, o ensino superior era monopólio do Governo Central, que para o Direito criara apenas as Faculdades do Recife e de S. Paulo. Coube ao grande pensador, Leôncio de Carvalho, criar o ensino livre no Brasil pelo Decreto 7.247, de 19.04.1879, infelizmente não executado.’

Com a República, o Decreto de 02.01.1891, de Benjamin Constant, fez ressurgir o ensino livre. Foram criadas, então, as Faculdades Livres de Direito, com enfoque liberal e libertário. A educação, força inovadora da sociedade, teria que expandir-se, certo que ‘a liberdade deveria imperar e sua única regulação seria a seleção natural do próprio mercado.’2

As Faculdades Livres de Direito prestaram notáveis serviços ao nosso ensino e cultura, assinala Haroldo Valladão.3 Na mesma linha, anota Aroldo Plínio que a ‘as Faculdades Livres de Direito, que se formaram ao lado das duas Faculdades de Direito do País, criadas com a fundação dos Cursos Jurídicos, em 11 de agosto de 1827 – a de São Paulo e a de Olinda, depois transferida para Recife – iriam permitir o florescimento do Direito, a sistematização e a inovação, e iriam influir na codificação do direito positivo.’ E que a Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais, filha da República, não é a primeira, mas a terceira. A primeira foi a da Bahia e a segunda a do Rio de Janeiro, criadas em 1891. Seguiram-se a de Porto Alegre, de 1900; a de Belém do Pará, de 1901; a do Ceará, de 1903, a de Manaus, de 1909; a Teixeira de Freitas, em Niterói; a
de Pelotas, no Rio Grande do Sul e a do Paraná, em 1912.’4

Os inconfidentes tinham entre os seus propósitos, conseguida a independência, a criação da Universidade de Vila Rica. O sonho persistiu. Quando, a 4 de dezembro de 1892, em Ouro Preto, então a capital do Estado, um pugilo de juristas, capitaneados pelo Conselheiro Affonso Augusto Moreira Penna, impulsionados pelas ideias vindas dos centros de cultura jurídica da época, Faculdades de Olinda e São Paulo5 e, sobretudo, pelos ideais liberais das Revoluções Americana, de 1776, e Francesa, de 1789, se reuniram e criaram a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais de Minas, realizavam o sonho dos inconfidentes.

Nesse pugilo de idealistas – os pais fundadores – liderados por Affonso Penna, estavam Levindo Ferreira Lopes, Gonçalves Chaves, Francisco Luiz da Veiga, Afonso Arinos de Melo Franco, Camilo de Brito, Rabelo Horta, Augusto de Lima, Arnaldo de Oliveira, Edmundo da Veiga, Borja de Almeida, Donato Fonseca e Francisco Silviano de Almeida Brandão.

A Faculdade, que nasceu como pessoa privada, foi instalada, solenemente, no dia 10 de dezembro de 1892, há exatamente 120 anos. Em 1893, é reconhecida oficialmente pelo governo. O decreto federal 1.289, de 21 de fevereiro de 1893, equiparou-a às instituições federais e a prerrogativa de faculdade livre, livre para ensinar o direito forte na liberdade, com autonomia didática, administrativa e financeira.6

Esse modo de pensar e de agir foi sempre uma constante no ideal dos que vieram depois. Exemplo disso é a manifestação do professor Francisco Brant, em 1927, quando a Faculdade, com a criação da Universidade de Minas Gerais, passou a integrá-la. Não obstante conservar a mesma natureza e autonomia, por força da Lei nº 956, de 7 de setembro de 1927, o voto de Francisco Brant foi contrário ao que chamava de oficialização. Lembrou ele, em 1948, numa reunião da Congregação, o que foi lavrado em ata: ‘Meu voto foi contrário à oficialização do nosso instituto, fundado livre pelos seus instituidores e livre tem sido nos cinquenta e seis anos de sua existência e funcionamento. Não há preço que equivalha à abdicação de nossa autonomia administrativa e econômica.’7

Não foi à toa que Tancredo Neves, filho ilustre desta Casa, proclamou que o outro nome de Minas é liberdade.

São três as fases da nossa Faculdade, assinalam Mizabel Derzi e Elza Afonso: ‘a primeira delas corresponde ao período que decorre de sua fundação – ano de 1892 – e alcança o ano de 1927, data em que foi fundada a Universidade de Minas Gerais. A segunda, ao período compreendido entre 1927 e 1949, ano em que se deu a federalização da Universidade de Minas Gerais. A terceira compreende o período que se estende a partir de 1949.8

Na sua terceira fase, comemora a Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais o 120o ano de sua fundação e instalação. E o faz, ressaltou a professora Amanda Flávio de Oliveira, que a dirige com honra e lustre, orgulhosa de ‘sua trajetória de inegável contribuição para os grandes debates travados no cenário político-econômico e social do país, e dos inúmeros nomes pertencentes aos seus quadros que se revelaram e se revelam, ainda hoje, expoentes da política nacional, além de personagens essenciais no processo de desenvolvimento e de amadurecimento institucional brasileiro.’9

Afonso Pena foi o primeiro diretor da Faculdade. Seguiram-se os professores Antônio Gonçalves Chaves, Francisco Mendes Pimentel, Edmundo Lins, Arthur Ribeiro de Oliveira, Francisco Brant, Lincoln Prates, Antônio Martins Villas Boas, José Geinaert do Valle Ferreira, Alberto Deodato Maia Barreto, Lourival Vilela Viana, Wilson Melo da Silva, Messias Pereira Donato, José Alfredo de Oliveira Baracho, Washington Peluso, Aloísio Gonzaga, Ariosvaldo de Campos Pires, Joaquim Carlos Salgado e, atualmente, desde 2011, Amanda Flávio de Oliveira, a primeira mulher a dirigir a nossa Faculdade.

O corpo docente ‘foi sempre constituído por uma elite cultural e política do País.’10 O seu fundador, o conselheiro Afonso Penna, foi presidente do Estado e presidente da República, falecendo no exercício desse cargo. Há episódio, que registrei em palestra,11 que o dignifica e demonstra o estadista com a marca do espírito dos habitantes destas montanhas misteriosas.

Recorda o ministro Paulo Brossard, no discurso que pronunciou na Assembleia Legislativa gaúcha, quando a integrava, na homenagem prestada a Pedro Lessa, que o presidente Afonso Penna, tendo que preencher vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal, fixou-se no nome do jurista mineiro, que lecionava na famosa Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Convidou, então, Pedro Lessa para o cargo. A Nação, entretanto, esclarece Brossard, ‘retribuía parcamente seus juízes e eram copiosos os rendimentos que o grande causídico e professor colhia do seu talento, de sua reputação, da sua capacidade e da sua probidade profissionais. Mas, se recebeu desvanecido o convite do conselheiro Afonso Penna, dele declinou, dizendo os motivos. Teria até de impor-se algumas restrições, para viver no Rio de Janeiro com os exíguos vencimentos de juiz da Suprema Corte.’

Diante da recusa, revela Paulo Brossard que Afonso Penna respondeu assim a Pedro Lessa: ‘A Constituição da República outorga ao Presidente o poder de nomear os ministros do Supremo Tribunal, entre os brasileiros de notável saber jurídico e reputação ilibada. Lembrando-me do seu nome, escolhendo a sua pessoa, penso que cumpri o meu dever de Presidente para com a Nação. Se V.Exa., como brasileiro, quiser cumprir o seu, é um problema que não está ao meu alcance.’ Essas palavras, acrescenta Brossard, ‘naturalmente encontraram eco na personalidade vibrátil, corajosa e digna do famoso advogado e professor, que, ato contínuo, aceitou o cargo, parcamente remunerado, para cumprir o seu dever de brasileiro. E, no juízo de todos, o mineiro Pedro Lessa foi o maior dos juízes que o Supremo Tribunal tem tido em toda a sua história’,12 nomeado que fora para a Corte Suprema, em 26 de outubro de 1907, por decreto do presidente Afonso Penna, preenchendo a vaga ocorrida com a aposentadoria de Lúcio de Mendonça. O mineiro do Serro, Pedro Lessa, pela sua atuação como juiz do Supremo Tribunal, autor principal da doutrina brasileira do habeas corpus, foi cognominado o Marshall brasileiro.13

No discurso que proferiu na sessão comemorativa dos setenta e cinco anos desta Faculdade, o professor Edgar de Godoi da Mata Machado anotou que ‘estimulante é verificar o que atraia a Mário Casasanta na história da Faculdade. Sempre viu nesta um cenáculo das letras e uma sementeira de homens públicos. Estes os dois traços que evidenciou, ao retratar os primeiros mestres. Se, de nossa parte, quisermos balizar a atuação da Faculdade no meio em que se situa, com projeção sobre todo o país, cremos que se pode assinalar uma tríplice presença sua: presença na política, presença nas letras, presença na ciência.’14

No registro da professora Amanda Flávio de Oliveira, ‘desde a sua fundação, em Ouro Preto, aos dias atuais, circularam, por seus corredores, nomes de considerável valor, fazendo desta Casa, que é de Afonso Penna, igualmente a Casa de Afonso Arinos, Levindo Lopes, Augusto de Lima, Francisco Silviano de Almeida Brandão, Carlos Maximiliano, Caio Mário da Silva Pereira, João Eunápio Borges, Orlando de Carvalho, Tancredo Neves, Pedro Aleixo, Francisco Salles, Milton Campos, Bias Fortes, Rondon Pacheco, Mello Viana, Ozanan Coelho, Orozimbo Nonato, Antônio Augusto Junho Anastasia, Sepúlveda Pertence, Maurício Corrêa, Carlos Mário da Silva Velloso, Adhemar Maciel, Sálvio de Figueiredo Teixeira, José Sette Câmara, Francisco Rezek, Antônio Augusto Cançado Trindade, Edgar de Godoi da Matta Machado, Raul Machado Horta, Paulo Neves de Carvalho, Jair Leonardo Lopes, Washington Peluso, Amílcar de Castro, o compositor Fernando Brant, Ziraldo, Rubem Braga, Fernando Sabino, Carlos Castelo Branco, Paulo de Tarso Flecha de Lima, Darcy Bessone, Geraldo Muzzi, José Roberto Gonçalves, José Carlos da Matta Machado, entre tantos outros membros de sua comunidade acadêmica que deixaram marcas indeléveis na história nacional.’15

Gastão da Cunha, dos nossos primeiros docentes, foi, além de embaixador do Brasil na França, presidente do Conselho Superior das Nações. Afrânio de Mello Franco foi juiz do Tribunal da Haya (1921), a mesma Corte que Ruy Barbosa integrou e dignificou. Integraram e integram a Corte Internacional de Justiça, em Haya, com brilho notável, José Sette Câmara Filho, Francisco Rezek e, atualmente, desde 2009, Antônio Augusto Cançado Trindade.

A professora, advogada, ex-procuradora-geral do Estado e do Município de Belo Horizonte, das maiores tributaristas brasileiras, Misabel Derzi – que gostaríamos de vê-la integrando o Supremo Tribunal Federal – anota que ‘não há qualquer grande doutrina acerca da democracia, dos limites da autoridade, do direito e da política que tenha sido desenvolvida e se imposto em território brasileiro sem sofrer influência da comunidade de juristas, docentes e discentes da Faculdade de Direito da UFMG.’`16

Dezenas e dezenas de ex-alunos e muitos dos nossos professores integraram e integram o Tribunal de Justiça do Estado, o que vem desde o antigo Tribunal da Relação. Convém anotar que a criação da Faculdade ocorreu em seguida à organização da Justiça do Estado, realizada em 28/11/1891. O Tribunal da Relação se compunha de 9 desembargadores, um dos quais serviria como procurador-geral. Eram 115 as comarcas, com um juiz de Direito em cada comarca, além do Tribunal do Júri.

Igualmente, é significativo o número de Desembargadores do Trabalho e Desembargadores Federais, que integraram e integram o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, este sediado em Brasília, egressos da nossa Faculdade. Alguns deles foram e são seus professores. Está presente, nesta solenidade, a presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, desembargadora Deoclécia Amoreli Dias, diplomada por esta Casa.

Justiça e ensino jurídico são irmãos gêmeos. Proclamada a independência, em 1822, a Constituição do Império, de 1824, mandou criar o Supremo Tribunal de Justiça, como sucessor da antiga Casa da Suplicação. A Lei de 18 de setembro de 1828 criou o Supremo Tribunal de Justiça, instalado em 1829. É importante anotar que os cursos jurídicos foram instituídos, no Brasil, em 1827. Vejam a coincidência de datas. Cursos jurídicos criados em 1827, Supremo Tribunal de Justiça criado em 1828 e instalado em 1829.

E fato nem sempre lembrado é que o Supremo Tribunal de Justiça de Portugal somente foi criado em 1833. É dizer, o Supremo Tribunal de Justiça do Brasil, criado em 1828, e que, proclamada a República, foi sucedido pelo Supremo Tribunal Federal, é mais antigo do que o Supremo Tribunal de Justiça de Portugal.

Convém anotar, entretanto, que o Judiciário brasileiro somente se fez poder político com a República. A partir daí, cresceram as suas atribuições, passando a fazer os juízes o controle de constitucionalidade das leis, controle difuso, segundo o modelo norte-americano, e o controle da Administração Pública. A Constituição de 1934, criando a ação interventiva, prius da intervenção federal nos Estados-membros, formulou o embrião do controle de constitucionalidade concentrado, em abstrato, que veio a ser instituído com a Emenda Constitucional no 16, de 1965, à Constituição de 1946. A Constituição de 1988, a mais democrática das Constituições que tivemos, ampliou os poderes do Judiciário, em termos de jurisdição constitucional, nos seus dois campos, controle de constitucionalidade difuso e concentrado e jurisdição constitucional das liberdades.

Os trabalhos e estudos de publicistas mineiros, ex-alunos e professores da nossa Faculdade, muito contribuíram para essa evolução. Menciono, dentre outros, Afonso Arinos, Milton Campos, Paulo Neves de Carvalho, Washington Peluso, Orlando Magalhães Carvalho, Caio Mário da Silva Pereira, Darcy Bessone, Gerson Boson, Pedro Aleixo, Raul Machado Horta, José Alfredo de Oliveira Baracho, Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, Jair Leonardo Lopes, Misabel Derzi, Sacha Calmon Navarro Coelho, Messias Pereira Donato, Antônio Álvares da Silva, Isabel Vaz, João Bosco Leopoldino, Joaquim Salgado.

Minas sempre foi celeiro de juristas. A entidade que congrega os juristas mineiros, a Academia Mineira de Letras Jurídicas, presidida pelo ministro e professor Adhemar Ferreira Maciel, que integra a federação das Academias de Letras Jurídicas, liderada pela Academia Brasileira de Letras Jurídicas, e que ora homenageia a nossa Faculdade, tem como titulares de quase todas as suas quarenta cadeiras, a começar do presidente, ministro Adhemar Maciel, escritor e dos melhores expositores do Direito Constitucional norte-americano, professores e ex-alunos desta Casa, seja do bacharelado, do mestrado ou do doutorado.

O mesmo se diz da centenária Academia Mineira de Letras, presidida pelo acadêmico Orlando Vaz Filho, meu colega da turma de 1963, da nossa Faculdade. Integraram-na, dentre outros, menciono alguns já falecidos, Arthur Versiani Velloso, Cyro dos Anjos, Wilson Mello da Silva, Caio Mário da Silva Pereira, Orlando Magalhães Carvalho, Milton Campos, Abgar Renault, Tancredo Neves, Mário Casasanta, Pedro Aleixo, Gerson de Britto Melo Boson, Raul Machado Horta, Oscar Corrêa, Alberto Deodato, Cândido Martins de Oliveira Júnior, Ariosvaldo de Campos Pires, Edgar de Godoi da Mata Machado, Afonso Penna Júnior.

A Academia Mineira de Letras também se associa às homenagens a esta Casa, como bem expressou o presidente Orlando Vaz na bela alocução que proferiu.

No nosso Estado, não se fica apenas aí. Lembra a nossa diretora, professora Amanda Flávio de Oliveira, que ‘foi no seio da Escola e da inquietude intelectual e política de seus integrantes que importantes Instituições nasceram: é o caso do Instituto dos Advogados de Minas Gerais e da Seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil.’17

Na linha do preconizado pelos professores Mário Casasanta e Edgar da Matta Machado, linhas atrás mencionados, é relevante a contribuição da Faculdade de Direito da UFMG aos tribunais superiores e ao Supremo Tribunal Federal.

É ver.

Do antigo Tribunal Federal de Recursos e do Superior Tribunal de Justiça, sucessor daquele, são oriundos da nossa Faculdade os ministros Francisco de Paula Lagoa Filho (TFR), Joaquim Justino Ribeiro (TFR), José Aguiar Dias (TFR), Armando Leite Rollemberg (TFR), Carlos Mário da Silva Velloso (TFR), José Pereira de Paiva (TFR), Márcio Ribeiro (TFR), Sebastião Alves dos Reis, Carlos Mário da Silva Velloso (STJ), Sálvio de Figueiredo Teixeira (STJ), Adhemar Ferreira Maciel (STJ), Armando Leite Rollemberg (STJ), Fernando Gonçalves (STJ), Nilson Vital Naves (STJ), Arnaldo Esteves Lima (STJ), Assusete Dumont Reis Magalhães (STJ). O ministro mineiro, Eduardo Andrade Ribeiro de Oliveira (STJ), diplomou-se pela Faculdade Mineira de Direito da PUC. Apesar de ter sido aprovado no vestibular da UFMG, preferiu a Católica, porque ali lecionava o seu pai, o desembargador Aprígio Ribeiro de Oliveira Júnior.

Do Tribunal Superior do Trabalho são originários desta Casa os ministros Carlos Alberto Reis de Paula, professor da Casa, futuro presidente do TST, a partir de fevereiro de 2013, José Roberto Freire Pimenta, Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Manoel Mendes de Freitas, Vantuil Abdala, Allyrio de Salles Coelho, Geraldo Starling Soares, Afonso Celso Moraes de Sousa Carmo e Galba Magalhães Velloso.

Outros ministros foram diplomados pela Faculdade Mineira de Direito da PUC, que nasceu irmã da nossa Faculdade. Os seus professores, quase todos, eram professores também aqui e era estimulante a emulação entre as suas Escolas, cada uma delas buscando a primazia na excelência dos cursos ministrados. Diplomaram-se na Católica os ministros José Luciano de Castilho Pereira, Dora Maria da Costa e Márcio Eurico Vital Amaro.

O Supremo Tribunal Federal, instalado em 28 de fevereiro de 1891, sucedeu o Supremo Tribunal de Justiça do Império. A história do Supremo Tribunal Federal confunde-se com a história da República. Proclamada esta, a 15 de novembro de 1889, o Decreto nº 510, de 22.06.1890, significou o primeiro passo para a instituição do Supremo Tribunal Federal segundo o modelo da Suprema Corte norte-americana. O Decreto nº 848, de 11.10.1890, transformou o Supremo Tribunal de Justiça no Supremo Tribunal Federal. Promulgada a Constituição republicana, a 24.02.1891, instalou-se o Supremo Tribunal Federal, no dia 28.02.1891, com quinze ministros, a maioria vinda do Supremo Tribunal de Justiça, maioria que, entretanto, ‘pouco se demoraria no novo Tribunal’, informa Leda Boechat Rodrigues.18

A forma de investidura adotada seguiu o modelo da Suprema Corte norte-americana: indicação do nome de cidadão de notável saber e reputação, ao Senado, pelo Presidente da República; após aprovação do Senado, nomeação pelo Presidente da República. As Constituições que se seguiram mantiveram o modelo, com acréscimos: cidadão com notável saber jurídico e reputação ilibada, com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, exigindo-se aprovação do nome pelo voto da maioria absoluta do Senado Federal (C.F., art. 101 e seu parágrafo único). É mais do que centenária, portanto, a forma adotada pelas Constituições republicanas.

Há propostas para mudança do critério adotado. Eu próprio, em palestra proferida num Congresso da Academia Brasileira de Direito Constitucional, realizado em Curitiba, em 2003, apresentei sugestão, que pode ser assim resumida: as Universidades, pelas suas Faculdades de Direito, indicariam dois nomes dentre seus professores; os Tribunais Superiores indicariam, cada um deles, dentre seus juízes, dois nomes; os Tribunais de Justiça dos Estados, agrupados na respectiva região, indicariam dois de seus juízes. São cinco as regiões. Assim, os Tribunais de Justiça indicariam dez nomes. Os Tribunais Regionais Federais indicariam, cada um deles, um nome. O mesmo ocorreria com os Tribunais Regionais do Trabalho. O Ministério Público da União indicaria dois nomes; o mesmo ocorreria com os Ministérios Públicos estaduais que, agrupados, respectivamente, nas cinco regiões do país, indicariam dois nomes. O Conselho Federal da OAB indicaria dois nomes de advogados. Os indicados deveriam satisfazer os requisitos do art. 101 da Constituição e deveriam contar com mais de vinte anos de exercício no magistério superior, na magistratura, no Ministério Público e na advocacia, respectivamente.

Os nomes seriam enviados ao Supremo Tribunal que, em sessão pública, elegeria, dentre eles, seis nomes. A lista sêxtupla seria encaminhada ao Presidente da República, que escolheria um nome, que seria levado à aprovação da maioria absoluta dos membros do Senado Federal. O candidato seria submetido, no Senado, à sabatina, da qual participariam representantes dos órgãos indicadores dos candidatos.

A nomeação, dessa forma, teria transparência e, portanto, maior legitimidade.

Da primeira Constituição republicana, de 1891, aos dias de hoje, 121 anos são passados, foram nomeados 165 ministros, certo que os dez primeiros integraram o Supremo Tribunal de Justiça. Pela ordem de antiguidade, o primeiro dos ministros do Supremo foi João Evangelista de Negreiros Sayão Lobato, Visconde de Sabará, nascido no Serro, Minas Gerais. O mais moderno, que acaba de empossar-se no cargo, é o ministro Teori Zavascki.

Integraram e integram o Supremo Tribunal Federal os seguintes ministros por ordem alfabética, egressos da Faculdade de Direito da UFMG: Adolpho Augusto Olinto; Antônio Gonçalves de Oliveira; Arthur Ribeiro de Oliveira; Antônio Martins Vilas Boas; Carlos Maximiliano Pereira dos Santos; Carlos Fulgêncio da Cunha Peixoto; Carlos Mário da Silva Velloso; Edmundo Lins; Francisco de Paula Rocha Lagoa; Heitor de Souza; João Luiz Alves; José Francisco Rezek; José Paulo Sepúlveda Pertence; Maurício José Corrêa; Orozimbo Nonato; Olavo Bilac Pinto; Oscar Dias Corrêa.

A ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha bacharelou-se pela Faculdade Mineira de Direito da PUC. Todavia, o seu mestrado foi feito na Faculdade de Direito da UFMG.

O professor Raul Machado Horta foi convidado, em 1971, a ocupar uma das cadeiras do Supremo Tribunal. Entretanto, devido a afazeres pessoais, sobretudo porque não desejava afastar-se de sua cátedra, na Faculdade, declinou do convite. Em 1917, o professor Mendes Pimentel, que foi diretor da Faculdade e Reitor da Universidade de Minas Gerais, recebeu idêntico convite, do qual declinou.19

O ‘site’ do Supremo Tribunal revela que as Faculdades de Direito de maior prestígio, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais (UFMG), Pernambuco e Rio Grande do Sul foram as que mais ministros deram ao Supremo Tribunal Federal. Igualmente, os Estados de maior tradição jurídica forneceram ao Supremo Tribunal maior número de juízes: Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco, Bahia e Rio Grande do Sul. 20 Leia-se Faculdade de Direito da UFMG, dado que todos os indicados para o Supremo, até agora, são egressos desta Faculdade.

Uma palavra a respeito do corpo discente da Faculdade. O professor Edgar da Mata Machado, que aqui ingressou como aluno, lembra, no discurso que proferiu em comemoração aos setenta e cinco anos da Escola, a luta travada pelo corpo discente, ‘às vezes clandestinamente, pela redemocratização do Brasil, durante o regime ditatorial de 1937 a 1945.’ 21

Batalhar pelos superiores interesses da cidadania e pela liberdade, o espírito cívico e libertário, foi e tem sido o ideal maior dos alunos da Faculdade. Menciono por todos que se empenharam pela democracia, José Carlos da Mata Machado, que se imolou pela liberdade.

Eram intensos os debates, nos anos cinquenta e sessenta, no Centro Acadêmico Afonso Pena, o CAAP, a mais antiga entidade estudantil de Minas, fundada em 1908, e no Centro Acadêmico Pedro Lessa, o CAPL, este o braço cultural daquele, nas tardes de sábado e até aos domingos. E jamais os alunos se descuidavam dos estudos. Buscavam aperfeiçoar-se, participavam de júris simulados, não foram poucos os que venceram concursos de oratória de âmbito nacional. Orlando Vaz Filho, presidente da Academia Mineira de Letras, venceu concurso nacional de oratória, realizado no Rio de Janeiro, após sagrar-se finalista no certame aqui realizado.

E participavam os alunos de congressos organizados pelas suas entidades de representação, escreviam para revistas especializadas, disputavam os prêmios que se destinavam aos que mais se destacavam no estudo, o ‘Prêmio Rio Branco’, o mais significativo, o ‘Prêmio Francisco Brant’, o ‘Prêmio Antônio Carlos’, este instituído em homenagem ao fundador da UMG, pelo Reitor Mendes Pimentel, o ‘Prêmio Raphael Magalhães,’ dentre outros.

O sentido desta solenidade, senhoras e senhores, convida-nos a breves reflexões sobre o ensino do Direito, no Brasil, ainda mais porque o presidente do CAAP há pouco assomou esta tribuna e fez entrega ao Magnífico Reitor de manifesto dos alunos para que a excelência do ensino aqui ministrado seja mantida e assegurada.

Há praticamente unanimidade na afirmativa de que o ensino jurídico, no Brasil, está em crise. Quando do centenário da criação dos cursos jurídicos, ocorrido em 1927, tínhamos 14 faculdades de Direito, com cerca de 3.200 alunos.22 Hoje, temos mais de mil e duzentas. Os Estados Unidos da América, com mais de 300 milhões de habitantes, têm pouco mais de duzentas. Temos, na verdade, ‘fábricas de bacharéis,’ a desová-los, aos milhares, a cada ano, sem suficiente preparo técnico.

A OAB, justiça se lhe faça, tem reagido e tem procurado intervir na avaliação dos cursos jurídicos. E tem conseguido algum sucesso. Ela deve manifestar-se, previamente, pelo seu Conselho Federal, nos pedidos de autorização e reconhecimento dos cursos a serem implantados. Mas os pareceres da OAB não são vinculativos e a decisão final é do Ministério da Educação, que se revela displicente no autorizar e reconhecer os cursos.

O Exame de Ordem revela a deficiência do ensino. Esse Exame foi declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Ele é absolutamente necessário. Todavia, o movimento de bacharéis reprovados no Exame, coadjuvados pelas ‘fábricas de bacharéis,’ pugna pela sua extinção. Tramitam, no Congresso, cerca de 18 propostas que, se aprovadas, poderão extingui-lo ou modifica-lo substancialmente.

Num dos exames da OAB, realizado em abril de 2004, o índice de reprovação ultrapassou o percentual de 70% na primeira etapa.23

Quer-se o caos?

Felizmente, há escolas que ministram bom ensino do Direito. De regra, as públicas, as pontifícias e um número razoável de faculdades privadas.

Não tenho a pretensão, nem me seria possível, neste espaço, dissertar a respeito do que é preciso fazer. Apenas menciono algo que me parece evidente: que o ensino do Direito há de ser essencialmente formativo e não informativo, preparando o aluno para saber pensar o Direito, pensar juridicamente, desenvolvendo nele a capacidade de crítica diante da realidade24 e do próprio Direito.

A Casa, que carinhosamente chamamos de Casa de Afonso Penna, está entre as faculdades que ministram ensino de qualidade. A sua história demonstra que ela tem sido escola de líderes e de excelência, por isso mesmo admirada e querida, do que podem orgulhar-se os seus dirigentes, os seus professores, os seus alunos, os seus servidores.

As instituições, eu sempre dizia, quando presidi o Supremo Tribunal Federal, valem por si, mas a sua grandeza depende das pessoas que as fazem funcionar. Esta Faculdade, desde os seus primórdios, tem produzido homens e mulheres notáveis, justamente pela grandeza dos homens e das mulheres que a integraram no passado e a integram no presente.

Que assim seja, sempre.”

Notas ____________________________________________________________________________________

1 Gonçalves, Aroldo Plínio. 100 Anos de Processo Civil na Faculdade de Direito da UFMG – Da Fundação ao Centenário, Del Rey Editora, 2012, p.11.

2 Martinez, Sérgio Rodrigo. A Evolução do Ensino Jurídico no Brasil, trecho adaptado da obra Manual da Educação Jurídica, ed. Juruá, 2003, em www.ensinojuridico.pro.br.

3 Valladão, Haroldo. História do Direito Especialmente do Direito Brasileiro, Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1977, p. 175. Ap. Gonçalves, Aroldo Plínio. Ob. cit.

4 Gonçalves, Aroldo Plínio. Ob.cit., ps. 11-12. Valladão, Haroldo.Ob. cit., p. 176.

5 Arinos, Affonso. Memória Histórica de 1894, sobre as origens da fundação da Faculdad, ap. Derzi, Misabel, e Afonso, Elza, “Dados para uma História da Faculdade de Direito da UFMG”, volume I, p. 11.

6 Derzi, Misabel de Abreu Machado, e Miranda Afonso, Elza Maria, “Dados para uma História da Faculd ade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais”, volume I, p. 11

7 Idem, idem, volume II, p. 8.

8 Idem, idem, volume I, “Introdução”.

9 Oliveira, Amanda Flávio, discurso proferido na Câmara dos Deputados, em Brasília, em 30.10.2012, na sessão solene em homenagem aos 120 anos da Faculdade de Direito da UFMG.

10 Derzi, Misabel, e Elza Afonso, ob. cit., volume I, p. 88.

11 Velloso, Carlos Mário da Silva, “Pedro Lessa e a Teoria Brasileira do Habeas Corpus”, palestra proferida na Cidade do Serro, MG, em 21.09.2002, na solenidade comemorativa dos trezentos anos da Cidade.

12 Brossard, Paulo, discurso pronunciado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, na homenagem prestada a Pedro Lessa. Revista Jurídica, nº 41 (1959), ps. 25 e segs.

13 Rosas, Roberto, “Pedro Lessa e o Supremo Tribunal Federal”, Revista de Informação Legislativa, nº 37, ps. 133 e segs.

14 Mata Machado, Edgar de Godoi da, Discurso em comemoração aos setenta e cinco anos da Faculdade de Direito, em Arquivo da Diretoria.

15 Oliveira, Amanda Flávio, ob. cit.

16 Werneck, Gustavo, “Escola de líderes e de excelência”, em “Estado de Minas”, 27.10.2012.

17 Oliveira, Amanda Flávio, discurso proferido na sessão solene da Câmara dos Deputados, em homenagem aos 120 anos da Faculdade de Direito da UFMG, em 30.10.2012.

18 Rodrigues, Leda Boechat, “História do Supremo Tribunal Federal”, Civilização Brasileira, Rio, 1965, I/17.

19 Derzi, Misabel, e Afonso, Elza, ob. cit., I/94.

20 Portal do STF, www.stf.jus.br.21 Derzi, Misabel, e Afonso, Elza, ob. cit.. II/90

22 Borges, José Carlos, em www.jurisway.org.br;

23 Rivas, Leonardo José Pádua, “O ensino jurídico brasileiro e propostas para a melhoria da qualidade do ensino”, www.direitonet.com.br/artigos.

24 Idem, idem.