justiça condena o estado a indenizar ônibus queimados

28 de fevereiro de 2009

Desembargador do TJERJ, membro da Associação Juízes para a Democracia, membro do Conselho Editorial da Revista Justiça & Cidadania

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Nota do Editor
A importante decisão da 12ª Câmara Cível, acompanhando o didático Voto do desembargador Siro Darlan, fundamentada inclusive pelo contundente depoimento do então Procurador-Geral de Justiça, Dr. José Muiños Piñero, hoje Desembargador do TJ/RJ, deixou patente a omissão do Estado, que, apesar do conhecimento antecipado da baderna programada dentro das prisões pelo crime organizado, se omitiu das providências de segurança, como disposto no artigo 144 da Constituição Federal, permitindo que ocorresse a institucionalização da anarquia com a depredação e incêndio de dezenas de ônibus.
Que o balizamento jurídico deixado especificamente no brilhante Voto do eminente desembargador Siro Darlan, a seguir transcrito, sirva para corroborar a plena e absoluta responsabilidade do Estado, que não pode se omitir no dever de prestar segurança pública e agir na proteção da incolumidade do patrimônio de seus administrados.

VOTO
(…)
Cuida-se de ação ordinária aforada pela Apelante objetivando a condenação do Estado do Rio de Janeiro por danos materiais e lucros cessantes em virtude de fato ocorrido no dia 30 de setembro de 2002, quando foram incendiados por marginais ônibus de empresas concessionárias de serviço público, em alguns pontos da região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro, sendo que diversos deles pertencentes à Autora.
O pedido encontra-se amparado na responsabilidade objetiva e subjetiva do Estado do Rio de Janeiro por conduta omissiva que consistiu em não agir específica e positivamente para evitar o incêndio, mesmo tendo ciência prévia do evento criminoso, ou de sua previsibilidade concreta de ocorrer.
Nos termos da sentença apelada, a pretensão da Autora não poderia ser acolhida (fls. 440/444) porque a mera omissão genérica da Administração Pública seria insuficiente para reparar os pleiteados pela Autora, posto não ficara demonstrado que o Estado por seus agentes poderiam ter previsto e agido de forma a impedir ação criminosa de terceiros, que queimaram os ônibus da Recorrente.
Nas razões recursais, sustenta a Autora que, ao contrário do entendimento da sentença, houve omissão específica do ente público, pois a Secretaria de Segurança Pública, ciente previamente da ocorrência criminosa, não agiu de forma específica para evitar o dano, deixando de cumprir seu dever constitucional e legal de prestar o serviço de segurança pública em locais, como na presente hipótese, onde sempre ocorrem perturbação da ordem.
A princípio, alguns doutrinadores apoiavam a tese de ser a responsabilidade do Estado sempre objetiva, fundamentada na Teoria do Risco Integral, modalidade de responsabilidade que não admite qualquer causa de exclusão. Contudo, o apuramento do estudo das teorias sobre a responsabilidade levou ao amadurecimento doutrinário com reflexo imediato nos julgados.
(…)
Desta forma, seguiu-se a Teoria do Risco Administrativo, que pode em breves linhas ser assim estampada, segundo as palavras do Professor Cavalieri:
“O risco administrativo torna o Estado responsável pelos riscos de sua atividade administrativa e não pela atividade de terceiros ou da própria vítima, e nem, ainda, por fenômenos da natureza, estranhos à sua atividade. Não significa portanto, que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular. Se o Estado por seus agentes, não deu causa a esse dano, se inexiste relação de causa e efeito entre a atividade administrativa e a lesão, não terá lugar aplicação da Teoria do Risco Administrativo e, por via de conseqüência, o Poder Público  não poderá ser responsabilizado.” (Programa de Responsabilidade Civil, 4ª Edição, pg. 239)
E, ainda, esmiuçando mais a responsabilidade do Estado, passou-se a perquirir se o evento era resultante de ação ou de omissão. Quando resultante da ação, mais facilmente se vislumbra o dever indenizatório. O mesmo não se dá com a conduta omissiva.
Outra não é a questão ora em exame. A Apelante alega que o Estado se omitiu em seu dever de prestar serviço de segurança pública, eis que, previamente cientificado do evento criminoso, nada fez para evitar os danos causados aos coletivos de sua propriedade.
A questão a saber é se a prova existente nos autos autoriza concluir-se pela existência de omissão específica do Estado, vale dizer, se  as autoridades da Secretaria de Segurança Pública tiveram ciência prévia quanto à possibilidade da ocorrência do evento, e não teriam  agido de forma específica a fim de evitá-lo; ou se, como afirmado na sentença, na hipótese, restaria configurada apenas mera omissão genérica do ente público  através de seus agentes, o que impossibilitava evitar a ação criminosa dos bandidos, hipótese comparada, conforme transcrito na sentença, a ocorrência de fenômenos da natureza (fls. 443), aresto da lavra da eminente Desª. Elisabete Filizzola.
Colocada a questão nestes termos, penso que os fatos da causa devem ser analisados e sopesados, para o correto desate da lide, dentro do contexto que antecedeu ao incêndio dos ônibus da Autora, pois, se é certo, como entendeu o nobre magistrado sentenciante, que a omissão genérica não seria suficiente para o acolhimento da pretensão deduzida, não é menos exato que no dia 30 de setembro de 2002, quando  estavam programados ataques a coletivos pelos marginais, a eclodirem no que se convencionou chamar de “o dia do medo”, as empresas  concessionárias de serviço público somente colocaram seus ônibus nas ruas porque estavam garantidas pela Polícia Militar de que haveria segurança, conforme noticiado pela imprensa, fls. 218.
De notar que desde 16 setembro, data em que o Comando Vermelho estava se articulando para fechar o comércio de vários bairros do Grande Rio, em protesto pela transferência de traficantes, o Estado, apesar de cientificado do que poderia ocorrer, não foi capaz de impedir que bandidos mantidos sob sua custódia em Bangu I, comandassem a ação criminosa que resultou no incêndio dos ônibus.=
Se toda a articulação dos meliantes foi direcionada do interior de um presídio de segurança máxima, não se pode compartilhar do entendimento da sentença, recepcionando a tese do Estado na peça de bloqueio, segundo a qual a ameaça efetivada pelos criminosos teria se dado de forma genérica, sem que as autoridades policiais tivessem ciência em que locais os atos criminosos iriam ocorrer, a meu juízo houve uma clara omissão específica da Secretaria de Segurança Pública de Polícia Militar.
Se o Estado não houvesse assegurado garantias de incolumidade às empresas de ônibus, através do seu serviço de inteligência, certamente elas não teriam colocado seus coletivos na via pública no dia dos fatos, restando bem caracterizada a omissão específica do ente estatal, visto que, havendo a possibilidade concreta de ocorrência de evento criminoso, estimulou que as empresas pusessem os ônibus em circulação, se omitindo, porém, na ação preventiva, dever legal da Polícia Militar em efetuar o policiamento ostensivo.
A omissão específica do Estado em impedir a concretização de evento delituoso, como sustenta a Apelante, fls. 465, previamente anunciado, que teve seu epicentro no interior de um presídio, demonstra à saciedade a falência do Estado, que se não pode levar a sua panresponsabilização, visto que a própria teoria objetiva comporta excludentes, mas que na hipótese afigura-se bem evidente sua omissão específica, dada a previsibilidade de concretização da ameaça da ação dos bandidos.
Ora, se o Estado, através de sua Polícia Militar, tinha o dever de impedir o evento danoso, que acabou infelizmente ocorrendo, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva, impondo-se-lhe a obrigação de indenizar, porque, mesmo não sendo o autor do dano, tinha a responsabilidade de evitá-lo.
(…)
Diante de tais antecedentes, ou seja, a publicidade e notoriedade das ameaças dos bandidos, que planejaram toda ação criminosa dentro de um presídio rotulado de segurança máxima e acrescido da importante prova oral, como se verá a seguir, não há como deixar de reconhecer a responsabilidade do Estado na espécie dos autos.
Com efeito, o ponto crucial da lide, de natureza fática, está na prova de haver a Secretaria de Segurança do Estado tomado conhecimento previamente da ação criminosa devastadora. Aliás, essa triste e temível característica tem marcado a atuação dos meliantes em nossa Cidade, infelizmente de ocorrências repetidas, de incidência quase que já comum, com assaltos, mortes, ameaças, intimidações, incêndios de ônibus. Sempre assim.
Pois bem. Foi, exatamente, com a precípua finalidade de buscar essa prova, ou melhor, de se certificar da existência dessa prova relevante, uma vez que os autos continham apenas meras notícias, reportagens de jornais e informações da parte autora, que esta Câmara, na sessão de 18 de setembro de 2007 (fls. 552/558), decidiu converter o julgamento em diligência para que fossem ouvidas importantes autoridades estaduais, que funcionaram no caso e teriam veiculado a comunicação em referência.
E vejam o que se apurou:
Depondo neste Tribunal, perante este Relator, o eminente Revisor e o ilustre Membro do “Parquet”, publicamente, o então Procurador-Geral de Justiça, Dr. José Muiños Piñero Filho, hoje Desembargador desta Corte Fluminense, com a autoridade de seu alto cargo, de modo minucioso, afirmou, in verbis:
“… desde o ano de 1999, grupos de promotores vinham realizando diligências com especial destaque para o enfrentamento do denominado crime organizado; (…) que em uma dessas investigações (…) foi interceptada uma conversa telefônica envolvendo um perigoso líder de uma quadrilha criminosa, em cujo diálogo nitidamente percebia-se a orientação ou a determinação que se criasse em um determinado dia uma situação ameaçadora para a segurança pública, envolvendo coisas do tipo obrigar comerciantes a fechar as portas, impedir a circulação de pessoas e veículos, tudo a afrontar a sociedade; (…) que contatou pessoalmente e por telefone o Secretário de Segurança Dr. Roberto Aguiar; (…) que acertou com o referido Secretário de receber os promotores; (…) o Secretário os recebeu  no mesmo dia ou no máximo no dia seguinte; que após esse encontro narrado também pelos promotores, foi formalmente entregue o cd com as gravações e o Secretário fez questão de receber contra-recibo; que a entrega se deu em torno de 15 dias antes do chamado ‘dia do medo’.”
(…)
O objetivo da diligência ordenada pela Câmara foi plenamente atingido. Testemunhas de grande credibilidade, insuspeitas e categorizadas, vie-ram perante o Tribunal e afirma-ram, sem sombra de dúvida, que a Secretaria de Segurança Pública do Estado tomou amplo conhecimento, com suficiente antecedência, da ação criminosa que a bandidagem, plenamente conhecida das nossas polícias, iria desenvolver na Cidade – entenda-se “região metropolitana” –, numa segunda-feira, promovendo o caos, criando uma confusão geral, “fechar geral”, “parar o comércio”, “parar tudo”. Era a “segunda-sem-lei”.
E não se tratava de informação que as autoridades pudessem inter-pretar restringindo. Os antecedentes nessa área de violência pública articulada pelos bandidos; a forma como a ação criminosa foi determinada – “fechar geral”, “promover o caos”, “confusão geral”, “parar tudo”, “segunda-sem-lei”, – apesar de referência à Zona Sul da Cidade, não permitiam, absolutamente, nem que a prevenção se limitasse a  determinados lugares, nem que os responsáveis pela segurança pública, numa região tão conturbada pela violência da bandidagem, pela ação desafiadora dos criminosos, ao menos desacreditassem ou duvidassem das ameaças captadas e comunicadas pelo Ministério Público do Estado.
(…)
As autoridades estaduais de segurança simplesmente não fizeram coisa alguma especifica-mente para coibir, enfrentar, dificultar, desestimular a ação ameaçadora dos bandidos. E havia uma indicação importante, uma segunda-feira, a “segunda-sem-lei”. E não fizeram o que podiam e deviam fazer: acionar os serviços de inteligência e investigação, planejar a atuação ostensiva das Polícias Civil e Militar e torná-la efetiva em todas as áreas já mapeadas e de atuação dos Batalhões PM, não só na “zona sul”, se adotarmos literal interpretação da transcrição telefônica, como em todos os locais, onde o Estado deve prestar serviço de Segurança Pública.
Essa hipótese não é de omissão genérica, mas, com toda certeza, de omissão específica, ou faltosa, de grave omissão no cumprimento do dever de prestar segurança pública em proteção da incolumidade do patrimônio e das pessoas dos administrados, diante de uma grave e terrível ocorrência de pleno conhecimento das autoridades, conhecimento que se não era dirigido à certeza absoluta do evento, certamente vinculava-se à previsibilidade concreta de que iria ocorrer.
Este é o sentido da redação do art. 144 da CF a seguir transcrita, verbis: “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.”
A Secretaria de Segurança é integrada por órgãos e mecanismos altamente profissionais, especialmente dentro das Polícias Civil e Militar, portanto, plenamente apta a se assenhorear de todos os dados, elementos e fatores para uma atuação preventiva oficial eficaz.
A omissão específica do Estado, destarte, afigura-se inquestionável. E na medida em que essa omissão criou ou garantiu condições próprias e favoráveis aos tumultos que redundaram nos incêndios de ônibus, aí se configurou a causa adequada dos danos demonstrados e reclamados pela Apelante.
(…)
Não se trata, pois, de mera ausência do serviço, simples falta da administração na área de Segurança Pública, a chamada “omissão estatal”. Trata-se de verdadeira conduta ilícita, tanto que é certo constituir dever do Estado prover a segurança dos cidadãos em geral, prover a  todos os interesses da coletividade, entretanto, diante de qualquer evento lesivo causado por terceiro em via pública, desde que no local devesse estar presente a Polícia para evitá-lo ou coibi-lo; ou, estando presente, deixar de agir devidamente; ou, ainda, tendo prévia ciência da ocorrência, haja simplesmente se omitido de agir, situações que constituem a conhecida omissão específica, aí o Estado responde segundo os princípios da responsabilidade subjetiva, na modalidade de culpa ou dolo, conforme haja ocorrido falta do serviço (e.g., negligência ou imperícia dos agentes policiais) ou propósito deliberado de omitir a atuação estatal.
(…)
Dizer que se não podia exigir da Administração que evitasse toda e qualquer ação criminosa que viesse a ocorrer naquele dia 30.9.2002, através da disponibilidade de policiais para todos os locais da região administrativa, malgrado o exagero da colocação, data venia, não reflete a realidade da situação. Com efeito, não se cuida de evitar toda e qualquer ação criminosa, mas, apenas aquela que fora anunciada e comunicada previamente às autoridades de segurança do Estado, as quais, diante da ciência, proveniente de fonte idônea, de tão grave ameaça à ordem pública, tinham o dever indeclinável de planejar e executar operação preventiva eficiente. O que as contingências exigiam do Estado eram essas providências, tais cuidados e esforços. E tanto que assim agisse, teria cumprido a sua missão constitucional (art. 144 da CF), ainda que, efetivamente, não pudesse evitar os tumultos e os danos.
Mas, na espécie presente, ao que se infere do processo, a Polícia não fez coisa alguma, o que tipifica verdadeiramente a figura da omissão específica ou faltosa, a par do que, na verdade, bastaria a previsibilidade do evento, aspecto que se mostra inegável no caso em foco.
O dever de indenizar, pois, se constitui em virtude da previsibilidade do evento grave e da inobservância das providências preventivas exigidas pelas circunstâncias.A tese da omissão genérica, prestigiada pela sentença, não se aplica à hipótese, que, se acolhida, significaria a confissão da impotência do Estado, que tem o dever de atuação em casos específicos onde há presunção de ocorrência de violação à ordem pública, prevista no art. 144 da Constituição Federal e nos arts. 183, 188 e 189 da Constituição Estadual.
O dever legal de agir pelas autoridades policiais, foi a causa decisiva dos danos sofridos pela Autora-apelante, pela completa ausência de policiamento ostensivo e preventivo na via pública, local onde se encontravam os coletivos da Recorrente, mesmo diante da ciência prévia do evento delituoso – ou da previsibilidade concreta de sua ocorrência – que acabou criando condições específicas para a consumação do evento.
(…)
Averbe-se, por derradeiro, que, sendo uma concessionária de serviço público, a Autora por imperioso dever constitucional não poderia afastar-se da área crítica, onde ocorreu o evento, nada obstante sua altíssima incidência criminal, posto que, tal missão somente poderia ser desempenhada a contento se tivesse o anteparo da autoridade policial, que, na hipótese, conforme a prova produzida preferiu omitir-se, confessando seu completo desaparelhamento para o mister que lhe fora confiado.
O desaparelhamento da Polícia Militar, como bem ilustrado no jornal “O Globo” de 5 de outubro de 2008, que, segundo a reportagem tem um déficit de dez mil homens para o combate à violência e no patrulhamento ostensivo, seguramente, constitui uma das causas da costumeira “faute du service”, e vai de encontro à tese do Estado, que, citando jurisprudência inapropriada para o desate da lide, fls. 250/251, alega, sem qualquer comprovação, que, para evitar o ato ilícito, seria necessária a distribuição de policiais para cada metro da Região Metropolitana.
Desta forma, imputa-se ao Réu-apelado dita responsabilidade de indenizar. Configurado o liame de causalidade, impõe-se a responsabilidade do Réu, justificando, assim, a procedência do pleito indenizatório.
Por conseguinte, tendo a parte autora comprovado a propriedade dos coletivos descritos na exordial conforme documentos de fls. 207/211 e 241/243, e a destruição dos mesmos em decorrência de incêndio que provocou a perda total dos mesmos, conforme atesta o Laudo de Exame de Local de Incêndio (fls. 215/216), e a responsabilidade estatal na forma das razões expendidas, resta induvidoso o direito à indenização dos danos materiais sofridos.
Igualmente merece acolhida a pretensão autoral de reparação de lucros cessantes, uma vez que por lucro cessante se denomina o reflexo futuro do ato ilícito sobre o patrimônio do lesado.
(…)
In casu, os lucros cessantes, são perfeitamente cabíveis, haja vista que no ramo de atividade da empresa autora – qual seja o transporte coletivo de passageiros – a ausência de 8 coletivos na sua frota enseja, por decorrência lógica e factual, grave prejuízo em sua atividade empresarial, o que acarreta, inegavelmente, baixa em seus lucros diários.
(…)
Neste sentido, uma vez configurada a ocorrência dos danos materiais, tem-se devidamente atestado o an debeatur, remanescendo, apenas e tão-somente, a apuração acerca do seu quantum, ou seja, de seu valor final; apuração esta que pode perfeitamente ser realizada em fase de liquidação por arbitramento.
Registre-se que a indenização por lucros cessantes deve ter como início a data do evento em que ocorreram os incêndios, devendo ter seu termo final à data em que a parte autora supostamente adquiriu outros veículos para reposição das linhas de transportes de passageiros atendidas pelos veículos sinistrados.
A gravidade dos fatos relatados nestes autos, no que diz respeito à responsabilidade estatal, na área de Segurança Pública através da omissão de seus agentes públicos, demanda que se faça extrair peças da presente ação, a serem encaminhadas ao Exmo. Sr. Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, para apuração de eventual responsabilidade administrativa ou criminal das autoridades públicas envolvidas no episódio descrito na exordial.
Em consequência do que ora se decide, em razão do provimento do recurso da parte autora, passa a caber na hipótese que os honorários advocatícios, ora fixados em R$ 10.000,00 (dez mil reais) na forma do § 4º do art. 20 do CPC, deverão ser suportados pela parte ré, dada a inversão dos ônus sucumbenciais.
(…)
Por tais razões, voto no sentido de não conhecer do Agravo Retido e conhecer do presente recurso de Apelação, para dar-lhe provimento, reformando a r. sentença monocrática, para julgar procedente o pedido inicial e condenar o Estado do Rio de Janeiro a indenizar a Autora-apelante, a título de danos materiais (danos emergentes e lucros cessantes), o valor dos coletivos de sua propriedade que foram incendiados, indicados na peça exordial e no seu aditamento, conforme se apurar em liquidação por arbitramento, devendo o montante ser acrescido de correção monetária e juros de mora de 1% a.m., a contar da data do evento (Súmulas 43 e 54 do STJ). Condena-se, ainda, o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais) na forma do art. 20, § 4º, e isentando-o do pagamento das custas judiciais, na forma do artigo 17, inciso IX, da Lei nº 3.350/90, extraindo-se as principais peças da presente ação, encaminhando-as ao Exmo. Sr. Procurador Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, para apuração de eventual responsabilidade administrativa ou criminal das autoridades públicas envolvidas no episódio descrito na exordial.

Rio de Janeiro, 14 de outubro de 2008.

Desembargador SIRO DARLAN DE OLIVEIRA
Relator