Edição 293
Magistrados e especialistas debatem medidas de gestão de crises ambientais
2 de janeiro de 2025
Da Redação
Primeira edição da Jornada Jurídica de Prevenção e Gerenciamento de Crises Ambientais terminou com 103 enunciados aprovados
O Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF) realizou em novembro, na sede do CJF, a primeira edição da Jornada Jurídica de Prevenção e Gerenciamento de Crises Ambientais. Com a presença de ministros de tribunais superiores, juristas e membros da sociedade civil, o encontro debateu temas estratégicos para a gestão de crises ambientais e para a consolidação de um Poder Judiciário que atenda às necessidades da atual e das futuras gerações.
Na abertura da Jornada, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do CJF, ministro Herman Benjamin, ressaltou a importância da jurisprudência e da legislação brasileira para a proteção ao meio ambiente. “Não há país que tenha mais precedentes em Direito Ambiental do que o Brasil. Temos uma Constituição que nos ajuda muito. O julgamento final que pode ser feito é que o Poder Judiciário brasileiro está na vanguarda da proteção jurídica do meio ambiente em todo o mundo”.
O coordenador-geral do seminário e vice-presidente do STJ, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que a Jornada é importante para o Poder Judiciário para ampliar a discussão de temas presentes nas cortes brasileiras. “A Jornada tem como objetivo amadurecer posições interpretativas por meio do debate sério entre renomados professores e especialistas de todo o país. Os enunciados das Jornadas vêm servindo como um farol e um norte seguro para a aplicação dos precedentes do STJ e dos tribunais brasileiros”, enfatizou Salomão.
Em seguida, o coordenador científico do seminário, ministro Paulo Sérgio Domingues, detalhou os números da Jornada, com mais de 300 participantes, 301 propostas de enunciados encaminhadas às comissões temáticas e 183 selecionadas para debates. Domingues também enalteceu a legislação ambiental como pilar da democracia brasileira. “Nossa legislação ambiental é uma das mais abrangentes do mundo e baseada em princípios constitucionais que visam garantir a proteção do meio ambiente como direito fundamental de todos. A Constituição de 1988 consagrou o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um dos pilares do Estado Democrático de Direito”, afirmou o ministro.
Domingues também destacou que um dos principais desafios para o Poder Judiciário é a aferição do dano climático causado por ação humana. “Essa tarefa é difícil, porém o Judiciário não pode se omitir. É preciso investir no fortalecimento das estruturas de fiscalização, na cooperação entre as instituições e na tecnologia disponível para a localização e a mensuração de danos ambientais”.
O ministro também enfatizou a importância de ações do Judiciário no cumprimento dos compromissos assumidos pelo Brasil na COP-29. “As instituições judiciárias precisam se preparar para acompanhar a efetivação desses compromissos e, quando necessário, atuar perante o poder público para garantir seu cumprimento. Ninguém pode se omitir”, concluiu Domingues.
A mesa de abertura também contou com a presença do diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), ministro Benedito Gonçalves, da subprocuradora-geral da República junto ao STJ, Luiza Frischeisen, do presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), juiz federal Caio Marinho, e da presidenta da Comissão Especial de Mudanças Climáticas e Desastres Ambientais da OAB Nacional, Marina Gadelha.
O papel fundamental do Brasil e da Amazônia – A primeira conferência do dia foi realizada pelo professor titular da Universidade de São Paulo (USP) Paulo Saldiva, pesquisador e especialista dos efeitos da poluição do ar na saúde. Ele enfatizou que o Brasil tem papel fundamental no contexto da mudança climática, por ter os melhores dados de saúde e de monitoramento do desmatamento entre os países da região amazônica. “Já descobrimos o problema e como ele acontece. Agora precisamos implementar medidas efetivas baseadas no que já sabemos que funciona. Isso precisa ser construído com a sociedade”.
Em seguida, o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Rodrigo Agostinho, afirmou que o grande problema ambiental brasileiro é o desmatamento ilegal, em especial na Amazônia, que é a maior causa das emissões de gases de efeito estufa do Brasil. “Já perdemos 65 milhões de hectares dentro da Amazônia, ou seja, 20% da maior floresta tropical do mundo. Só com floresta não iremos resolver as mudanças climáticas. No entanto, sem floresta, será impossível resolver”.
Jurisprudência ambiental consolidada – O ministro Herman Benjamin lembrou que o STJ julga mais litígios ambientais por ano do que todas as cortes supremas da América Latina somadas. O presidente do STJ também citou precedentes da jurisprudência do tribunal em Direito Ambiental, em especial a definição de que a responsabilidade por dano ambiental é objetiva.
Benjamin ressaltou, no entanto, que o STJ precisa estar atento ao impacto das mudanças climáticas sobre essa jurisprudência consolidada. “As petições iniciais precisam ser revistas. É essencial que tragam, de forma clara, o impacto das mudanças climáticas, como desmatamentos ou construção de resorts à beira-mar, ignorando o aumento do nível do mar e a importância de manguezais e dunas na proteção do litoral.”
Plenária e enunciados aprovados – No segundo dia da Jornada, foi realizada a Reunião Plenária para apreciação e votação dos enunciados. A reunião foi mediada pelo ministro Paulo Sérgio Domingues que, em seu discurso, elogiou o empenho dos presidentes das três comissões temáticas: ministros do STJ Sebastião Reis Júnior, Paulo Dias de Moura Ribeiro e Sérgio Kukina.
Domingues defendeu ainda a importância da realização da Jornada para garantir o delineamento de posições interpretativas sobre a prevenção e o gerenciamento de crises ambientais e a segurança jurídica na atuação dos magistrados. “O trabalho que fazemos aqui não é doutrinário. Os enunciados têm o objetivo fundamental de ajudar os juízes no exercício da Justiça, da jurisdição. A função da Jornada é fornecer diretrizes, nortes interpretativos e segurança aos magistrados, para que possam decidir.”
No encerramento da Jornada, o presidente do STJ, ministro Herman Benjamin, enalteceu o conhecimento jurídico dos especialistas em Direito Ambiental que participaram do encontro e apresentaram enunciados jurídicos qualificados.
“Confio muito no conhecimento de todos os participantes. A grande conquista desta Jornada foi o debate franco e muito respeitoso entre as várias formas de pensar e enxergar a questão ambiental. Tivemos aqui uma elevada representatividade de biomas e estados, o que garante mais credibilidade e força aos enunciados apresentados”, concluiu Benjamin.
I Jornada Jurídica – A primeira Jornada Jurídica de Prevenção e Gerenciamento de Crises Ambientais foi realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, com o apoio do STJ, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
Enunciados – Durante o evento foram recebidas 301 propostas de enunciados, das quais 183 foram selecionadas para debate nas três comissões de trabalho. Dessas, 111 foram levadas para apreciação e votação na plenária. Os conteúdos dos enunciados servirão de orientações estratégicas para a prevenção dos conflitos decorrentes de mudanças climáticas, adoção de compliance ambiental pelos entes públicos ou privados para restauração de danos e participação dos atingidos pela crise na gestão das soluções.
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