Magistratura valorizada

8 de agosto de 2014

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Presidente da AMB, João Ricardo Costa reage as críticas de senadores de que o adicional por tempo de serviço fará com que os magistrados ganhem acima do teto. PEC que institui o benefício está pronta para ser votada no Senado

magistratura_valorizada“O argumento de que o adicional aos magistrados quebra o teto não é válido”, declarou o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo Costa, com relação às críticas feitas à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 63/2013, que prevê a criação de um adicional por tempo de serviço para os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público (MP). A proposição está pronta para ir a Plenário do Senado Federal, mas a falta de consenso tem emperrado a votação.

A PEC 63 já foi discutira em Plenário em três sessões. Por falta de acordo, acabou sendo retirada da pauta para novas rodadas de negociações. A expectativa era a de que a votação ocorresse na quinta-feira (7/8), mas a proposta não entrou na ordem do dia. A proposição prevê o pagamento, a magistrados e a membros do MP, de uma parcela mensal indenizatória de 5% do subsídio, a cada cinco anos de atividade jurídica, até o limite de 35%.

A proposta é polêmica. Quando estava em debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ), alguns senadores afirmaram que a aprovação do adicional permitiria aos magistrados ganharem acima do teto do funcionalismo público, fixado em R$ 29,4 mil – atual remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em uma das sessões, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) declarou que a instituição do adicional provocaria um efeito dominó. “Dificilmente vamos conseguir segurar isso para as outras carreiras”, acusou na ocasião. Além de Gleisi, votaram contra a PEC na CCJ os senadores Eduardo Suplicy (PT-SP), Armando Monteiro (PTB-PE) e Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).

A AMB e demais entidades representativas da magistratura, como a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), têm batalhado pela aprovação do texto. João Ricardo afirmou que o pleito é legítimo. “A magistratura pede a alteração na remuneração da carreira de forma transparente, por meio de uma Emenda Constitucional, para que a carreira possa ser valorizada. O País não pode tomar como base um sistema ortodoxo de remuneração, a ponto de desestabilizar uma carreira de Estado”, disse ao portal da Revista Justiça & Cidadania.

Confira a íntegra da entrevista:

Por que a PEC 63/2013 é tão importante para a magistratura?

– A PEC 63/2013 é o instrumento que tornará possível a recomposição da carreira. Hoje, o Poder Judiciário enfrenta um problema. A cada ano, um número maior de juízes está deixando a magistratura. Não existe um plano de carreira que possa garantir a valorização do juiz ao longo da sua atuação. Nos últimos cinco anos, quase 600 juízes deixaram a carreira. Desses, 100 desistiram da profissão ou nem mesmo chegaram a tomar posse. Não há um estatuto que regulamente a carga laboral do magistrado, como acontece com a maioria da população que trabalha oito horas por dia. A magistratura é uma carreira praticamente exclusiva, pois o juiz não pode atuar em nenhuma outra área, a não ser lecionar em uma instituição de ensino. De acordo com o relatório Justiça em Números 2013, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de processos em trâmite no Judiciário brasileiro cresceu 10,6% nos últimos quatro anos. Foram mais de 92 milhões de ações em tramitação em 2012. Somos cerca de 20 mil magistrados no País. O juiz tem, cada vez mais, papel relevante para a sociedade. Somos exigidos por uma demanda que cresce a cada dia, pela pressão externa e por responsabilidades e dedicação ao Poder Judiciário. Ainda com base no relatório do CNJ, cada magistrado proferiu, em 2012, 1.450 sentenças em média, o que representa um aumento de 1,4% em relação ao ano anterior. É o terceiro ano consecutivo em que o índice registra crescimento na produtividade. É preciso que a autoestima do juiz seja resgatada e que a carreira seja valorizada, para que possamos ter profissionais ainda mais preparados atuando na Justiça. Interessa a todos – à sociedade, à democracia e ao País – termos uma Justiça valorizada.

Como a AMB vem atuando no Congresso para a aprovação da proposta?

– A AMB tem buscado o diálogo, que é fundamental. Tivemos algumas reuniões, inclusive com o presidente do Senado Federal, senador Renan Calheiros. Além do CNJ, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado também reconhece a constitucionalidade da PEC 63/2013 e a necessidade de valorização da magistratura ao longo da carreira. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional já previa em seu texto o adicional por tempo de serviço (ATS) aos magistrados, como forma de equacionar uma série de defasagens. Temos demonstrado ao Senado que o impacto orçamentário será mínimo, atendendo completamente à Lei de Responsabilidade Fiscal. Tanto na União como nos estados, a valorização da carreira, a partir do adicional por tempo de serviço aos magistrados, terá um impacto médio de 2% na folha de pagamento do Judiciário. Em alguns tribunais, o impacto será igual ou inferior a 1%.

A aprovação do adicional não permitirá que alguns magistrados ganhem acima do teto?

– O argumento que o adicional aos magistrados quebra o teto não é válido. A magistratura pede a alteração na remuneração da carreira de forma transparente, por meio de uma Emenda Constitucional, para que a carreira possa ser valorizada. O País não pode tomar como base um sistema ortodoxo de remuneração, a ponto de desestabilizar uma carreira de Estado.

Como o senhor avalia o comentário da senadora Gleise Hoffman, por ocasião da apreciação da PEC na CCJ do Senado, em maio, de que a aprovação do texto poderia acarretar num efeito dominó, já que outras categorias poderiam reivindicar o adicional, o que oneraria as contas públicas?

– Para a AMB não existe esta possibilidade. O próprio Senado Federal compreendeu as motivações para restringir a PEC à carreira da magistratura. Seria importante que o governo tivesse a compreensão do que está ocorrendo no Poder Judiciário brasileiro. Isso somente poderia ocorrer se o Executivo fosse dado ao diálogo.

Ao invés do adicional, não seria melhor a aprovação de uma lei que corrigisse as distorções salariais e reestruturasse a carreira?

– A Lei Orgânica da Magistratura Nacional somente pode ser modificada por meio de Emenda Constitucional. A PEC 63/2013 tem exatamente a proposta de recompor as distorções salariais e reestruturar a carreira. O adicional por tempo de serviço para a magistratura está previsto originalmente no artigo 65, VIII, da Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional): “gratificação adicional de cinco por cento por quinquênio de serviço, até o máximo de sete”. Ou seja, o texto de 1979 já previa uma parcela mensal de valorização por tempo de exercício, equivalente a 5% do subsídio a cada cinco anos de efetivo exercício em atividade jurídica, até o máximo de 35%.