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Na democracia, o poder do povo é soberano

30 de junho de 2011

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Em nome da democracia e da Justiça, muito se tem invocado o politicamente correto, mesmo que para isso se tenha de rasgar a Constituição. Trata-se de, no mínimo, farsa intelectual tentar analisar a questão por opiniões próprias, preceitos próprios ou, até mesmo, costumes e tradições religiosas.

O politicamente correto expõe a homofobia e mascara a teofobia. Bem como os homossexuais, os religiosos têm sofrido de forma até mesmo debochada preconceitos e críticas quando se posicionam à frente daquilo em que acreditam.  Assim, se olharmos os dois pontos de vista, ambos estão se posicionando erroneamente. Nem o Supremo Tribunal Federal, nem o movimento a favor da união homoafetiva ou casamento gay (como preferir) acertaram em suas invocações imoderadas e intolerantes.

Com certeza a Constituição Federal, devendo ser lembrada como nossa Magna Carta, garante sim, a todos nós, e não somente a uma parcela em particular, a igualdade, mas não essa igualdade confusa e arbitrária. Ela própria salienta questões que acabam por especificar situações em que somos tratados diferentemente, como questões etárias. Isso não quer dizer que estejamos sendo discriminados por não sermos considerados maiores em determinadas situações. Um bom exemplo seria o fato de um menor de 16 anos poder votar e não poder solicitar sua Carteira de Habilitação. Essa questão vem sendo polemizada há muito tempo, mas ninguém viu o STF rasgar a Constituição e declará-la, por si mesma, inconstitucional!

Ocorre que em relação à questão julgada pelo STF insurge uma minoria influente amparada pela alegação de que o Poder Legislativo demora em muito para solucionar tal questão. Ofenderam-se direitos universais em prol do favoritismo particularista de alguns e pela covardia de solucionar a pendência de forma correta. Podemos afirmar que houve uma total invasão das atribuições do Poder Legislativo. A questão é só uma: a quem reclamamos essa arbitrariedade? A quem recorremos?

Sabemos que é mais uma etapa da luta contra preconceitos e tabus existentes no Brasil. Ocorre que o Supremo Tribunal Federal é o interpretador da nossa Constituição. Nela se deve amparar para perseguir a vontade do constituinte, não confrontar esta vontade de frente e rasgá-la impunemente sem legitimidade para tanto. O grande problema é que ambos os lados tentaram esvair goela abaixo suas vontades, sem nenhum tipo de respeito e tolerância. Tolher a liberdade de opção sexual é estupidez; porém, empurrar a aceitação em meio à sociedade, ferindo a liberdade de crença, é estupidez semelhante.

Não se pode considerar uma ofensa aos princípios religiosos e familiares conceder aos casais homossexuais direitos análogos aos percebidos na união estável. A grande aflição que nos agride a alma é inserir palavras na Constituição; “casamento” e “união civil” não são meras palavras ao serem inseridas. Mesmo que o Supremo tenha tido a louvável intenção de combater preconceitos e truculências arcaicas nos pensamentos da sociedade, essa Corte não pode fechar os olhos para princípios da maioria da população e inovar sem respaldo constitucional, invadindo o Poder Legislativo. Na democracia, nenhum poder é soberano.

Levantou a minoria homossexual os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. O STF violou, em nome desses, o princípio da segurança jurídica. Nenhuma tradição, nenhum princípio ou, ainda, nenhum costume deve ser quebrado por enxames modistas de uma minoria. Como dito, a minoria deve, sim, ser respeitada. Porém, não às custas de ofensa à constitucionalidade brasileira.

Mais uma vez, não se trata de negar direitos aos casais homossexuais, e, sim, de não aceitar que novos conceitos sejam truculentamente inseridos na CRFB/88. Tais conceitos são claramente rejeitados pela maioria da sociedade. O poder de “impor” à sociedade novos padrões em relação à união de casais ou ao casamento é do Congresso Nacional, e somente dele. Abriram-se, assim, precedentes para que o Supremo Tribunal Federal e suas Excelências substituam as atribuições daquele. Sobre o que mais se espera daqui para a frente que o STF legisle?

Deve-se aqui separar aqueles moderados dos que simplesmente querem impor o que acham certo. Não é assim que funciona! Não se pode enfiar garganta abaixo o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Já se sabe hoje que a entidade familiar, seja ela homo ou heterossexual, já é reconhecida pelo povo brasileiro. Haja vista a paternidade socioafetiva que vem galgando patamares de reconhecimento pela Justiça brasileira; isso prova que os conceitos vêm sendo mudados. Mas, não quer dizer que tenhamos de inovar até mesmo no processo legislativo para agradar uma minoria que alega o tempo todo ser marginalizada.

Sabemos que existe uma lacuna na lei, no Artigo 226 da CRFB/88, no qual a união estável apenas é reconhecida como a existente entre o homem e a mulher. Isso prova, sem nenhuma margem de dúvida, que a vontade do constituinte era de não reconhecimento do casamento enquanto união entre pessoas do mesmo sexo. Vale destacar aqui o voto da ministra Carmem Lúcia: É exato que o § 3º do Artigo 226 da Constituição é taxativo ao identificar que ‘Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar’. Tanto não pode significar, entretanto, que a união homoafetiva (…) seja, constitucionalmente, intolerável e intolerada, dando azo a que seja, socialmente, alvo de intolerância, abrigada pelo Estado Democrático de Direito. Esse se concebe sob o pálio de Constituição que firma os seus pilares normativos no princípio da dignidade da pessoa humana, que impõe a tolerância e a convivência harmônica de todos, com integral respeito às livres escolhas das pessoas”.

Ela mesma, ministra Carmem Lúcia, reconhece a lacuna e o desrespeito ao artigo acima citado e aos protocolos de reescrita da nossa Magna Carta. A união estável recebe a devida proteção do Estado, sendo esta bem definida pela própria Constituição. E não cabe ao STF reescrevê-la, rasgá-la e enxovalhá-la. Intolerância social e preconceitos irracionais não podem realmente ser vitoriosos em nenhuma forma de sociedade.

E como fica o PLC 122, que quer ampliar ainda mais o direito de se expressar dos homossexuais e, de forma desigual, nega o mesmo direito aos religiosos?  Ora… inverteu-se completamente a via do preconceito alegado. O preconceito vem vindo de todos os lados. Assim como todos os que optam pelo homossexualismo têm o direito de expressar sua preferência, os religiosos também o possuem. Mas, no caso, não o direito de opção ou preferência, apenas de opinião, crença e fé.

Como dito, aberto o precedente, será que o STF, nesse PLC 122, não irá invadir as paredes do Legislativo mais uma vez e ordenar o que a religião deve ou não professar? Trata-se de uma decisão que traz à memória o AI-5, porém, de forma menos sincera. Destarte tudo o que foi dito, não significa negar a existência da lacuna legal; não significa negar a existência dessas relações homossexuais ou homoafetivas; não se trata de intolerância religiosa (embora ela exista); o cerne aqui é a declarada inconstitucionalidade da própria Constituição por parte do Supremo.

No mais, somente uma Emenda à Constituição poderia moderar essa intolerância recíproca e mudar o conceito reescrito pelo STF. Nem mesmo a mais bela e sábia das decisões deixa de ser arbitrária quando substitui a vontade dos representantes do povo. Afinal, o poder deve sempre emanar de suas mãos!

Em nome da “igualdade” e da “dignidade da pessoa humana” foram violados direitos de ambos os lados: heterossexuais e gays. Com base nisso, operou-se o milagre de se poder pisar na Constituição, de se aplicarem subterfúgios e de se mascarar o que se entende por politicamente correto. Mas, a própria Corte sabe que de correto nada existiu. Se o Congresso não o fez, foi porque não quis.

Aplausos ao poder da minoria: reescrever a Constituição não é para qualquer um! Atribuição do Congresso usurpada pelo Supremo Tribunal Federal não feriu nenhuma classe em questão. Feriu o povo brasileiro.