“Não existe democracia sem Judiciário forte, que não seja arrogante e dialogue com todos”

6 de fevereiro de 2015

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Luiz-Fernando-de-carvalhoEleito em dezembro passado, o novo presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, toma posse em fevereiro para o biênio 2015-2016. Ele terá a seu lado as desembargadoras Maria Inês da Penha Gaspar, como vice-presidente, e Maria Augusta Vaz, como corregedora-geral da Justiça. A Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj) será dirigida pelo desembargador Caetano Ernesto da Fonseca.

Aos 67 anos de idade, desembargador do TJRJ há 15, o desembargador Luiz Fernando comenta nesta entrevista alguns pontos de sua campanha à presidência do Tribunal, que tem como principal compromisso a valorização do Judiciário e da Magistratura. Uma de suas metas na gestão da Corte é investir no diálogo permanente com a sociedade civil e com o Executivo e o Legislativo do estado para dar mais autonomia e eficiência ao Judiciário.

Revista Justiça & Cidadania – Como o senhor avalia a última gestão do TJRJ e o que considera s destaques da administração da desembargadora Leila Mariano Carrilo?
Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho – É sempre difícil avaliar a gestão anterior àquela que se inicia, mas ela teve, indiscutivelmente, pontos positivos, principalmente na esfera administrativa. A desembargadora Leila Mariano Carrilo, a primeira mulher a presidir nossa Corte em 250 anos de existência do TJRJ, “arrumou a casa”, no que se refere a uma série de situações que estavam pendentes, precisando ser reformuladas. Ela é uma pessoa extremamente dedicada ao trabalho, organizada naquilo que faz, mas faço o que considero uma crítica construtiva à reformulação do Regimento Interno do Tribunal e do Código de Organização Judiciária. Devido ao sistema de votação, em tópicos de múltipla escolha, nem sempre o texto final reflete a vontade do eleitor que escolheu entre esta ou aquela determinada opção. Não que não pudesse haver questionário, mas teria de se seguir depois disso uma consolidação em texto final e ser novamente submetido a um Tribunal Pleno, aí sim, para aprovação.

JC – Um de seus compromissos de campanha foi a “valorização do Judiciário e da Magistratura”. De que maneira o senhor pretende colocar em prática essa meta? Quais serão as principais bandeiras?
LFRC – O Judiciário e a Magistratura têm papel fundamental no Estado Democrático de Direito. E a grande questão é que, em alguns momentos, isso é negligenciado, ou por elos com outros poderes, ou por uma questão de timidez, ou falha de percepção. O que se pretende é um Judiciário que seja construído com autonomia, independência, altivez, embora sem arrogância, e que possa fazer valer as suas garantias perante os demais poderes, com tratamento harmonioso com o Executivo e o Legislativo, mas que não deixe escapar um milímetro sequer a autonomia e a independência do Poder Judiciário. E muitos pensam que essa autonomia pertence ao Poder Judiciário, quando não é verdade. Só posso abrir mão daquilo que me pertence. Se o Judiciário abre mão de sua autonomia e independência, quem perde é o cidadão comum. O Judiciário, como tem a guarda da Constituição e dos Direitos Fundamentais da Cidadania, não tem disponibilidade daquilo que não é dele. E por que os direitos fundamentais foram colocados nas mãos deste poder? Porque enquanto o Legislativo e o Executivo são poderes assentados na maioria, o Judiciário não. Para que haja equilíbrio da Constituição, alguns poderes, no caso o Executivo e o Legislativo, se baseiam na vontade da maioria. O Judiciário tem como norte os Direitos Fundamentais postos na Carta Magna, um guardião da Constituição, ou seja, ele não se baseia em maioria ou minoria. Ele, na verdade, é um contrapoder, representa a garantia do cidadão comum contra os poderes baseados na maioria. Se houver um cidadão expressando a sua vontade perante o Judiciário usando o direito constitucional de ação contra 20 milhões do outro lado, se a razão estiver com ele, mesmo isolado, é essa a vontade que o Judiciário deve prevalecer. É um contra poder de maioria. A Constituição vale mais que a vontade da maioria. A vontade da maioria é mutável. As maiorias parlamentares e governamentais são mutantes, enquanto que a Constituição muda de vez em quando, mas possui pontos fundamentais, sensíveis, cláusulas pétreas, imodificáveis. O poder de emenda encontra limitações nas cláusulas pétreas. Não pode haver, por exemplo, emenda acabando com a Federação, com a República, com a separação dos poderes, ou instituindo o trabalho escravo. Antigamente o conceito era diferente. Quando não se tinha do Judiciário a conceituação de um Poder, deveria se esperar ser votado o projeto de emenda constitucional ou projeto de lei, para depois analisar a sua constitucionalidade. E isso mudou. Por exemplo, nos Estados Unidos da América, no famoso caso Marbury versus Madison, quando a suprema corte norte-americana pela primeira vez declarou inconstitucional um projeto de lei. Até então predominava a concepção dura lex, sed lex, dura é a lei, mas é a lei. E esta tinha de ser obedecida pelos súditos de qualquer maneira. Hoje, não somos súditos, mas cidadãos. Mauro Cappelletti (1927-2004), o grande professor da Universidade de Florença, dizia que a maior transformação da contemporaneidade foi exatamente a dos súditos em cidadãos. Antes, o governante era absolutista, agora não. Hoje, o cidadão pode se recusar a cumprir uma lei inconstitucional. Assim, quando se diz “valorização do Judiciário e da Magistratura” é no sentido de guardiões desse conjunto de valores expressos na Constituição; ele tem de ser respeitado, acatando-se o sistema de freios e contra freios. O valor pertence à cidadania, mas a garantia de que esse valor permaneça pertence ao Poder Judiciário. É uma questão conceitual de Estado. E não de qualquer Estado, mas do Estado Democrático de Direito.

JC – O senhor também pretende dar atenção contínua ao diálogo entre o Judiciário e a sociedade civil, assim como o poder Executivo e o Legislativo do estado. Em linhas objetivas, qual a relevância desse diálogo como garantia da autonomia e da eficiência do Judiciário? Um exemplo prático.
LFRC – É fundamental, porque se o Judiciário tem um distanciamento da sociedade civil, ele se enclausura, fica encapsulado. Na verdade, o Judiciário da segunda metade do século XX e início do século XXI precisa interagir com a sociedade civil, e não para falar apenas nos autos, como antigamente se dizia: “o que não está nos autos, não está no mundo”. Isso é uma alienação completa, um despojamento da pessoa de sua própria realidade. Seja com a sociedade civil ou com os demais poderes, o Judiciário precisa ter essa interação ativa que represente a realidade de um Poder do Estado. A concepção do Judiciário até a primeira metade do século XIX era mais ou menos a de um departamento do Estado. Na França, o Judiciário não é considerado um poder até hoje. Lá o juiz tem a sua autoridade garantida pelo primeiro ministro. Hoje em dia, no Brasil, temos uma das Constituições mais avançadas do mundo nos direitos das garantias fundamentais, seja contra o poder político ou econômico. Há países onde a Constituição, embora exista normalmente, consagra o arbítrio. Nós temos o direito de defesa, direito à moradia, à saúde e à educação, que o Estado tem de realizar, ou se abster de desrespeitar, como o direito à liberdade de imprensa. Porque na base dela está o direito de informação do cidadão. A liberdade não é um valor em si, assim como a autonomia do Judiciário. Ambos são valores instrumentais para garantir o Estado Democrático de Direito, a liberdade dos cidadãos. Um governo que não tenha imprensa livre tenderá sempre a ser um governo despótico.

JC – E o senhor vê no Brasil algum risco de ameaça à liberdade de imprensa em médio ou curto prazo?
LFRC – Não vejo, felizmente, risco algum de que isso aconteça. Nós tivemos um longo período em que isso aconteceu – a ditadura militar brasileira, de 1964 a 1985 – e estamos vendo o resultado disso agora na Comissão da Verdade, tentando curar aquelas feridas e traumas. Qualquer regime despótico, seja muçulmano, católico, militar, civil, é contra a essência da perseguição do Homem do seu direito à liberdade. O Homem nasceu para ser livre. O que o impede de se ser livre é o despotismo, o arbítrio, a exploração econômica dos mais fracos, o desemprego. Nós não podemos dizer que há um homem completo, na acepção da palavra, se este se encontra desprovido de trabalho.

JC – Aprimorar o diálogo com a sociedade implica, naturalmente, a aproximação com a população. Nesse sentido, o que será feito para ampliar o acesso à Justiça na 1a instância?
LFRC – Nós temos de reequipar a 1a instância, que anda muito carente. O Judiciário cresceu tanto que, em 1988, quando da promulgação da Constituição, tramitaram no Brasil 350 mil processos. Hoje, tramitam 100 milhões; e só no Rio de Janeiro são quase 10 milhões, 10% da demanda nacional. Precisamos diversificar os meios de combate a esse gigantismo da demanda processual, além de termos um processo mais rápido, mais célere, mais efetivo, e, para isso, vem o novo Código de Processo Civil ser sancionado em breve. Temos de usar meios alternativos, como a conciliação, a mediação e a arbitragem; temos de usar um processo coletivo que seja digno desse nome, que produza resultados em até 100 mil processos, ou seja, você julga um, evitando que 100 mil entrem. Pretendemos incrementar, fomentar isso, e encontrar parceiros envolvidos, como Defensoria Pública, o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), clubes de serviço, entidades mediadoras que já existem, para que o TJ possa, pela sua condição e autoridade moral, se constituir em uma espécie de articulador de todo esse esforço coletivo, exercendo papel de coordenação, para que todos esses mecanismos sejam usados, diminuindo a demanda, senão o cidadão não se aproximará do Judiciário. E quando o fizer, ou será com medo ou com descrença, muitas vezes saindo daqui pior do que entrou. Não podemos conceber que um processo dure 10, 20, 30 anos. Que uma execução de sentença dure igual tempo. A demanda, como já disse, se agigantou e diante disso devemos ser criativos e empenhados em um esforço absoluto pela reversão.

JC – Aumentar o número de juízes seria uma opção?
LFRC – Não adianta, no quadro atual, aumentar o número de juízes. Um País com carências de educação, saúde, moradia e trabalho como o Brasil não conseguirá aumentar o número de juízes ao nível de que precisa. É só fazer aquele cálculo dos 350 mil processos de 1988 para 100 milhões que temos hoje. Isso porque tínhamos mais ou menos seis mil juízes naquela época. Em vez dos 15 mil, 16 mil juízes de hoje, teríamos o quê, 200 mil ou 500 mil juízes? Seria como, em linguagem vulgar, o cachorro correr atrás do próprio rabo. Aumentando o número de juízes, aumenta-se também a demanda. Essa não é a solução do problema. As ações aumentam em progressão geométrica. E os meios humanos de resolução das demandas aumentam em progressão sequer aritmética. Ainda há a crise do Estado brasileiro, e a questão do petróleo no nosso estado, a redução da arrecadação do ICMS – à metade do valor anterior –, o problema dos royalties do petróleo, que a União não tem repassado; algo que, por lei, o Rio de Janeiro e o Espírito Santo têm direito. O que a União tem repassado, com atraso, é um valor menor do que é de direito do estado. Portanto, as principais fontes de receita do estado, ICMS e royalties do petróleo, estão comprometidas neste momento. O TJRJ pretende realizar um seminário com a participação de todos os interessados, chamar o Executivo, o Legislativo, a OAB, a Defensoria Pública, a imprensa, a sociedade civil, além de entidades empresariais. Pretendemos sediar, então, grande seminário sobre as alternativas para a saída da crise econômica em que vivemos. Temos de ver o que cada um pode fazer na sua área de atuação. E temos certeza de que todos juntos saíremos mais rápido dessa crise. A crise não é invencível, mas há descrença na capacidade de se sair dela é.

JC – Outro ponto de sua campanha foi a meta de ampliar os projetos sociais do TJRJ. Quais deles receberão mais atenção? Existe intenção do Judiciário fluminense colocar em prática algum projeto nesse âmbito?
LFRC – Eles já existem, o Tribunal tem investido bastante neles nos últimos anos. Eu poderia citar o Justiça Itinerante, que são ônibus que vão aos lugares onde não há fóruns, porque a população de certas comunidades menores não justifica a construção de um fórum; seria uma despesa grande para o contribuinte. Mas essa população, por ser minoritária, não pode ficar sem Justiça. Então o Tribunal conta hoje com cerca de 15 a 20 ônibus, que se deslocam até esses locais, com um juiz, um promotor, um defensor, um serventuário da Justiça. E ali se realizam acordos, divórcios consensuais, registros de nascimento e outros procedimentos. Outro projeto é o Justiça Cidadã, do qual participam lideranças comunitárias dos bairros da periferia do Rio de Janeiro, subúrbios, cidades da Baixada Fluminense. Essas lideranças vêm aqui e passam três meses recebendo aulas em um curso que inclui Direito Constitucional, Civil, do Consumidor, de Família, Penal, Empresarial, ou seja, de todas as naturezas. No final, há uma formatura e esses líderes comunitários, que são também formadores de opinião, voltam para a sua comunidade e tornam-se multiplicadores do conhecimento que adquiriram. Isso é um exercício democrático de conhecimento jurídico; e o conhecimento jurídico não pode ser monopólio do jurista, que deve contribuir para a sua disseminação. O TJRJ realizou recentemente dois mil casamentos comunitários no Maracanãzinho. Fizemos também 160 casamentos homoafetivos. Essa é uma demonstração de que a Justiça vem se despindo de uma visão preconceituosa da sociedade. A função do Judiciário é a pacificação social. E fazer um casamento, levar uma justiça itinerante a qualquer lugar, varas de violência doméstica contra a mulher, tudo isso é realizar a pacificação social. O processo judicial é um meio de fazer justiça, mas não é o único. As conciliações, as mediações, são formas de fazer justiça mais amplas que o processo, que é um meio utilizado quando tudo falhou, mas não é dono do monopólio de se buscar justiça e fazer justiça.

JC – Qual o objetivo e como funcionará a Central de Atendimento aos Magistrados, outro dos pontos de sua campanha?
LFRC – Na verdade, o nome agora é Departamento de Atendimento aos Magistrados (Damag). Seu objetivo é liberar o tempo do magistrado para realizar as suas atividades próprias. Porque hoje o juiz tem problemas que todos nós temos, como um ar-condicionado quebrado, o conserto de uma torneira, do carro, do próprio computador. Ele tem de ligar para vários departamentos do Tribunal até localizar quem fará o serviço, e a previsão para realizá-lo. Ou seja, perdiam um tempo que deveriam estar dedicando à atividade jurisdicional. A ideia é a criação de um departamento, de número único, 0800, com quatro pessoas: dois desembargadores, um juiz e um servidor. A pessoa que atender o telefonema do juiz fará o percurso que ele faria e dará a resposta para solucionar o problema. Porque nós precisamos que o juiz tenha todo o tempo possível liberado para a sua atividade funcional. Ele não deve perder tempo com detalhes que alguém, com atribuição administrativa, pode fazer. Ao contrário dos processos que julga, algo que ninguém pode fazer por ele. É lógico que isso é melhor para o juiz, mas há também uma utilidade social. Porque assim que o juiz se libera disso e cuida de seus processos, é a sociedade a maior beneficiária.

JC – Quais são hoje os principais problemas que enfrenta o TJRJ e quais são as propostas de sua gestão para lidar com eles?
LFRC – Um dos principais problemas está na primeira instância, relegada por muito tempo a uma situação quase de abandono, sem receber atenção diante do gigantismo de sua demanda, mesmo sendo ela a vitrine do Judiciário. O cidadão comum chega primeiro ao juiz e não aos desembargadores. E quando ela ficou relegada? Houve muitas obras aqui, mas a maioria destinada à segunda instância. Tivemos de mudar 50 varas para a Praça Onze, porque aqui (Avenida Erasmo Braga, 115, Castelo) havia risco de incêndio, instalações hidráulicas e elétricas superadas. Há 50 anos, quando foi inaugurado, o fórum recebia certa quantidade de pessoas, entre testemunhas, peritos, juízes, servidores, advogados, promotores. Hoje, esse número é muito maior. A desembargadora Leila Mariano precisou, literalmente, correr para locar um prédio na Praça Onze, transferir varas cíveis, de família, para liberar as daqui e fazer obras necessárias para colocar esta instalação de acordo com a demanda atual. E a presidente verificou riscos concretos de incêndio. Imagine uma circulação de, talvez, 70 mil pessoas por dia no edifício. Nós não podemos arriscar nada nesse sentido, vamos tomar todas as precauções. A obra é tão séria que a previsão inicial de conclusão é de 30 meses, ou seja, eu tomo posse em fevereiro, saio em dois anos e ela não estará pronta. Isso se não houver a necessidade de prorrogação de prazo. Nós precisamos resgatar a autoestima principalmente dos juízes de primeira instância e dos servidores. Porque os desembargadores que formam a segunda instância estão hoje com instalações razoáveis – até porque a Justiça não foi feita para abrigar luxo –, mas que estimulam o trabalho. É necessária a valorização dos servidores. Antigamente, um servidor da Justiça Federal deixava-a para trabalhar aqui. Hoje, acontece o contrário, porque se ganha o dobro, ou o triplo lá. Mas por que a diferença de salários para exercer o mesmo cargo, o mesmo trabalho? Se é da União vale mais do que fosse do estado? Não. Precisamos dar condições de capacitação e também recursos financeiros, melhoria de remuneração. Outra prioridade, como já disse, são os métodos alternativos à Jurisdição: a conciliação, a mediação e a arbitragem. Isso porque cada vez que você resolve um conflito é um processo que deixa de entrar. E estamos em uma situação tão grave do ponto de vista do gigantismo da demanda que é preciso não só resolver os processos, mas também evitar que eles surjam. Outra questão prioritária para nós é a comunicação social do Judiciário, que não tem sido ainda – embora tenha melhorado bastante – plenamente satisfatória. Em primeiro lugar, é necessária uma política de comunicação social. A desembargadora Leila Mariano, durante sua gestão, começou a elaborar um plano de política de comunicação social no Judiciário. Eu pretendo incrementar e dar todo o estímulo a esse projeto. Em segundo lugar, a operacionalidade disso. Não adianta um plano espetacular, sem estrutura para operar, com jornalistas, em um departamento de comunicação social do Tribunal. E que essa comunicação social atinja o público externo, evidentemente: a sociedade civil, que é destinatária do nosso trabalho; e a mídia impressa e eletrônica, pois se não atingimos a mídia, falhamos também com a sociedade civil. Finalmente, a questão da comunicação interna, em que, surpreendentemente, somos muito fracos; às vezes, nós aqui dentro somos os últimos a saber das coisas. Em reunião recente com a presidência discutimos isso mesmo: assuntos cujos leitores da revista Justiça & Cidadania tomam conhecimento – os ônibus da Justiça Itinerante, os casamentos comunitários etc. –, a maioria do nosso público interno desconhece que exista. Porque não há um endomarketing, não há um trabalho de comunicação interna sistemático.

JC – Considerando os problemas que enfrenta o Judiciário, alguns já citados aqui a morosidade, excesso de demandas , há expectativa de mudanças positivas nesse cenário?
LFRC – Totalmente. Quando a gente se conforma com as dificuldades, com os revezes, é evidente que se espalha uma atitude de desalento, de desânimo. Mas o que estamos procurando demonstrar é que o contrário também é verdadeiro. A gente pode demonstrar uma atitude de resgate da autoestima, de que o Judiciário tem um imenso papel social a desempenhar, fundamental para a democracia, tanto quanto dos demais poderes – e, em alguns momentos, até mais. Tudo isso precisa ser visto de uma forma entusiasmada, em que cada servidor, cada juiz, cada magistrado de qualquer instância deve ter a consciência de que o seu trabalho depende não só da solução de um processo, mas também da construção de uma democracia sólida, consistente, que não pede favor a ninguém para existir. E isso é muito importante, porque não existe democracia sem Judiciário forte, autônomo, altivo, que não seja arrogante e que dialogue com todos. E o Judiciário, quando foi construído no Brasil, com a chegada da Família Real – junto aos primeiros Tribunais de Apelação da Bahia, de São Paulo, entre outros –, a mentalidade era escravocrata, de subserviência, de subalternidade, ou seja, de acordo com a mentalidade daquela época. A sociedade não sendo democrática, o Judiciário não será democrático. Agora, quando há um Estado de Direito Democrático, o Judiciário não só deve sê-lo, como deve ter a noção do dever de ser um poder democrático.