Edição 78
O Estado de Direito e o Direito do Estado
31 de janeiro de 2007
Ives Gandra da Silva Martins Membro do Conselho Editorial, Professor emérito das universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e CIEE
Texto extraído de conferência do professor Ives Gandra da Silva Martins, proferida em 26/09/2006 na sede da LEX editora.
Em artigo meu na coluna quinzenal que mantenho no Jornal do Brasil, analisei a obra de Friedman – do Thomas Friedman, não de Milton Friedman, Prêmio Nobel de Economia –, jornalista do “New York Times”, que escreveu um livro muito interessante intitulado “O mundo é plano”.
Trata-se de uma análise do mundo a partir do que o autor denomina de “três eras da globalização”. Haveria uma primeira era, que teria começado com a descoberta da América, em 1492, até 1800. Corresponderia à globalização das nações. Nesse período, o mundo inteiro foi conquistado e as fronteiras deixaram de existir. Depois, chega-se à segunda era, denominada a “era das grandes empresas”, de 1800 a 2000, em que os grandes conglomerados terminam dominando as nações e formatando a segunda era da globalização. Por fim, o autor denomina a era em que vivemos de “a era da globalização”, em que o mundo se torna plano, por força da internet, da comunicação.
Friedman mostra, como exemplo, que bilionários americanos apresentam suas declarações de imposto de renda na Índia porque lá o custo tributário é cinco vezes menor, e que chineses e indianos fornecem tudo – em matéria de serviços – para os Estados Unidos porque a mão-de-obra nesses países é mais barata. Chineses e indianos aprendem a falar com o sotaque próprio dos americanos e adquirem, quando em contato com os ingleses, seu estilo sofisticado, abandonando a pronúncia própria da língua inglesa falada por indiano.
Para Thomas Friedman, a globalização dos indivíduos é o que torna o mundo plano.
Nas duas trilogias que escrevi – e aqui é publicada a primeira –, analisei também a globalização, mas em cinco eras. Nesse artigo, procuro relembrar o que chamo de “início da história da humanidade” – não só a história do “homo sapiens”, que hoje se sabe ter começado há 190 mil a.C.. Há anos atrás, falava-se que o “homo sapiens” aparecera há 160 mil anos e que teria convivido, inclusive, com o homem de Neanderthal.
No artigo, escrevo sobre “homo sapiens” que há 20 mil anos deixou marcas em Altamira e em outras cavernas, considerando a primeira era da globalização como aquela em que se formaram os grandes impérios a partir das grandes conquistas em que predominava o uso das armas. Venciam aqueles que possuíam mais armas e homens. Foi a era dos sumerianos, dos elamitas, dos assírios, dos babilônios, que sucederam aos sumerianos.
O primeiro rei babilônio foi Hamurabi, que elaborou, com seus auxiliares, um código, que é de longe o mais conhecido, embora não o mais antigo. Há, pelo menos, uma dezena de códigos anteriores a Hamurabi, tais como os de Entenema, Urukagina, Gudez, Urnammu, Azzittishu, Lipita Ishtar, Esnnunna, Shulgi e outros textos incompletos. Essa era vai, a meu ver, até o Império Romano.
Nesse tempo, também o valor supremo era a força: o mais forte conquistava, e as reformulações geográficas ocorriam em face do princípio do mais forte. Entretanto, quando o pensamento grego começa a se difundir, proporciona-se uma visão diferente do homem. É interessante notar essa realidade nos primeiros impérios a partir do exame dos códigos e das cartas então produzidas pelos governantes.
Por exemplo, Hamurabi, que governou durante 42 anos, escreveu 153 cartas e em todas elas procurou ser justo. No entanto, a justiça era considerada apenas nas relações entre os particulares, e não entre o governante e o povo, porque, sendo aquele descendente dos deuses, representante dos deuses, não se punha em questão problemas de governo ou de sua autoridade. O governo era intocável e se encontrava em nível superior ao povo, pois o soberano era o representante dos deuses.
Quem lê o Código de Hamurabi fica impressionado. As primeiras três páginas são ocupadas apenas pelos títulos do governante, como descendente das divindades: “Eu, representante do Deus Acade”, “Querido do Deus Acade” e vai por aí afora, citando todo elenco dos deuses até chegar aos primeiros dispositivos de seu Código.
Os gregos, entretanto, obrigaram o homem a pensar. Desde os filósofos pré‑socráticos até os da trindade áurea, surgiu a consciência de que o poder já não pode mais ser exercido, pura e simplesmente, por delegação divina. É interessante notar que as cidades-estado gregas terminam gerando uma primeira concepção realmente moderna de democracia, principalmente entre os atenienses. A cidade‑estado de Atenas conhece, inclusive, a tripartição de poderes. Era, é verdade, uma democracia de elite, mas uma democracia. Já não era mais possível governar nos velhos termos. Nesse momento, para mim, começa uma segunda era da globalização, inspirada nos gregos. O instrumento da globalização não é mais a força, mas o direito. Roma dura dois mil e cem anos – seu império vai desde 753 a.C. até 1453 d.C., com a queda de Constantinopla – exclusivamente, graças ao direito.
Hoje não tenho a menor dúvida de que, se Roma não tivesse utilizado o direito como instrumento de conquista, jamais teria mantido por tanto tempo o império. Quando lemos, no Ato dos Apóstolos, São Paulo dizendo: “Sou cidadão romano. É possível chibatar um cidadão romano?” percebe-se que a afirmação deixa o centurião extremamente preocupado, porque não era possível açoitar alguém com cidadania romana.
O espisódio demonstra o que representava possuir a cidadania romana. Na verdade, Saulo não nascera em Roma, mas podia afirmar “Eu sou cidadão romano de nascença” porque sua cidade apoiara Augusto contra Marco Antônio, e, em razão disso, Augusto outorgara a cidadania romana a todos os seus cidadãos e descendentes. O centurião, que comprara a cidadania por um alto preço, ficou realmente apavorado por tê-lo chibatado. Roma percebeu que dar garantia do direito romano aos povos conquistados, na medida da sua fidelidade, permitia que o Império se estendesse e permanecesse.
Basta dizer que Antonino Caracala, em 212 d.C, com o Império Romano, já carcomido em seu poder pela divisão entre dois imperadores e já não mais vivendo o período da Pax Romana, ao estender a cidadania romana a todo o território que dominava, atrasou, em 250 anos, a queda de Roma ocidental. No Império Romano do Oriente, o restabelecimento por Justiniano, de sua legislação, permitiu que, por ainda mais 900 anos, predominasse como império, nessa era que chamo de “globalização do direito”. Houve, no Ocidente, o interregno da Idade Média, mas não do Oriente.
Por fim, entramos na terceira globalização, que começa em 1492, como diz Thomas Friedman. Só que, na visão que exponho nessas duas trilogias, das quais a primeira está sendo republicada agora pela Lex, ela vai até 1776, com a Revolução Americana. Trata-se do período que leva ao aparecimento da primeira Constituição moderna (a americana de 1787). Nomeio esta era de globalização como “era da universalização geográfica”, porque o mundo, a partir de 1492, se estende em todas as dimensões. Conquista-se o globo pelas grandes navegações, pelo engenho dos portugueses, navegadores formados na Escola de Sagres – se é que realmente houve uma. Passa-se das monarquias absolutas à Revolução Americana, que gera a primeira grande Constituição moderna, depois da experiência de um constitucionalismo diferente e mitigado surgido na Inglaterra em 1215.
Da Constituição americana, de 1787, vamos à francesa, de 1791, após a revolução que, destinada a promover a fraternidade, a igualdade e a liberdade, gerou o maior banho de sangue da história francesa. Entramos no que chamo de “quarta era da globalização”, que é a era do constitucionalismo, em que, efetivamente, o mundo passa a se reger pelas Constituições. Essa era surge, na França, apesar da Revolução Francesa, e nos Estados Unidos, e todos os países vão começando a elaborar seu texto supremo. Isso ocorreu também no Brasil, quando Dom Pedro I, depois de destituir, dissolver a constituinte, promulgou uma Constituição que, apesar de imposta, era boa para a época.
Essa Constituição de 1824 foi a mais estável de todas as nossas Constituições, até hoje. Sua vigência ocorreu no período de 25 de março de 1824 até 1889, com algumas modificações, servindo de sustentação ao Império. A constituição republicana só foi promulgada em 91. A partir de então, tivemos as chamadas Constituições “provisórias”, em 1891, 1934, 1937, 1946, 1967, 1969, 1988. Com a de 1988, já com 58 emendas, estamos sob a mais provisória de todas as Constituições.
A era do constitucionalismo regeu o mundo até quando? Até a quinta era da globalização, que, para mim, não começa, como Thomas Friedman diz, em 2000, mas em 1989, com a queda do Muro de Berlim. Aí, sim, passamos a ter um mundo globalizado com o conhecimento, a tecnologia, a internet e, principalmente, a busca de garantias efetivas dos direitos que foram universalizados na era anterior. Norberto Bobbio dizia que o mundo viveu, no século XX, a descoberta de seus direitos fundamentais (o homem, por meio do conhecimento, percebeu quais eram eles). Contudo, o século dessa conscientização não foi da garantia dos direitos fundamentais, que, certamente, a nova era da globalização propiciará, encontrando meios de assegurá-los através do Estado.
Até que ponto o homem terá inteligência para compreender que vivemos em um planeta global, onde todos os povos têm de ser respeitados em sua maneira de ser, em sua cultura, em sua forma, em seus valores? Ou compreendemos esta nova realidade, ou então viveremos em guetos, com permanentes conflitos, que não acabarão devido à intolerância na convivência entre os países.
Em 1964, tive contato com um homem que muitos acreditam ter sido um péssimo governante, e outros, um ditador excepcional. Não tenho a menor dúvida de que era um ditador, mas permitiu a preservação de valores maiores dentro de Portugal: Oliveira Salazar.
Esse contato pessoal ocorreu depois de ter proferido palestra, no Castelo de Guimarães, juntamente com o, então, presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa, Adriano Moreira. Por ser eu o mais jovem (com 29 anos) de todos os representantes dos países que participavam do “congresso das comunidades” – e qualquer outro brasileiro mais velho que fosse escolhido, poderia gerar mal-estar entre os 5 famosíssimos que ali estavam – acabei por ser escolhido para falar em nome das comunidades de língua portuguesa, representadas no evento por 32 numerosíssimas delegações.
Parece que o presidente do Conselho de Ministros de Oliveira Salazar, que ouvira por rádio, gostou do que eu disse e me convidou, tão logo cheguei a Lisboa para uma visita. Por que conto esse fato? Porque Salazar disse-me, naquela ocasião, que, quando Truman negociou com ele, em 1946, a cessão da Base dos Açores, fez-lhe prognósticos: o primeiro, que os americanos iriam recuperar, economicamente, a Europa com o Plano Marshall, e que o “American way of life”, iria ser o padrão de toda a Europa, em face da felicidade que a América propiciaria aos europeus; o segundo, que o dinheiro dos Estados Unidos estenderia essa felicidade ao mundo inteiro.
Ele, Salazar, contestara imediatamente ambas as afirmações advertindo o presidente norte-americano de que os europeus poderiam até se recuperar – não se conheciam, ainda, os efeitos do Plano Marshall –, mas que ele perdesse a ilusão porque, com o estilo próprio de quem se considera auto‑suficiente, não reconheceriam jamais que o Plano Marshall os teria tirado do caos econômico. Nunca atribuiriam aos americanos aquela vitória. Ao contrário, iriam se transformar em adversários dos norte-americanos em muitos pontos. E acrescentou: “os Estados Unidos não têm dinheiro suficiente para transferir o seu jeito de ser para o mundo inteiro. Até porque cada povo tem sua cultura, a sua forma de viver.
Portugal é um país que teve suas colônias e ainda tem algumas e sabemos que não é tão fácil a convivência entre culturas diferentes, religiões diferentes e povos diferentes”. Ele me dizia isso em 1964, atrás da Assembléia Nacional, onde morava, em Lisboa. Chamava-me de professor, falava muito manso, mas muito bem, e radiografava seu interlocutor com seu olhar. Nesse evento, a história deu-lhe razão, e não ao presidente Truman. Penso que o presidente Bush também não aprendeu muito. Ele continua dizendo a mesma coisa que Truman e vivendo problemas maiores, por não perceber, simplesmente, que os povos são diferentes.
O certo é que hoje estamos vivendo em um mundo novo, plano, aberto. Estamos percebendo que não estamos convivendo com as demais culturas com o respeito necessário. Ainda se acredita que a força é a única forma de impor nossa maneira de ser. Aí reside o fracasso monumental dos Estados Unidos em relação ao Iraque e ao Afeganistão. Não perceberam que o diálogo à exaustão é a única possibilidade de aproximação entre os povos. O respeito e a tolerância em relação às diferenças pode ser o instrumento para ofertar garantia aos povos; pode ser um caminho extraordinário de convivência com povos de culturas variadas, com maneiras de ser peculiares, em um mundo que, do ponto de vista econômico, já está completamente globalizado.
Hoje, as empresas que Friedman colocava como conformando a Era das Empresas, de 1800 a 2000, são aquelas que efetivamente coordenam e definem os caminhos da humanidade. Se analisarmos em profundidade o que está acontecendo, verificaremos que a própria política tributária, em muitos países, deixou de estar condicionada pela União Européia, em que é exclusivamente definida pelos governantes que adaptam-na aos interesses das empresas globalizadas, visto que seu direito de definir as melhores opções de investimentos conforma a política fiscal, de incidências ou isenções tributárias. E a competitividade internacional começa a reduzir fantasticamente, em alguns países de elevadíssima carga tributária, o nível impositivo.
Vê-se, por exemplo, que o Brasil é apresentado como um país em que, segundo o “The Economist”, a carga tributária representa 36% do PIB. A maior carga tributária maior do mundo, que é a da Suécia, está em 52%. A Suécia, que já chegou a níveis de mais de 70 % a fim de competir com outras nações, foi obrigada a reduzir sua carga impositiva para aproximadamente 52%. Se analisarmos os dados tributários de outros países, vamos verificar que países como Israel, que tem carga tributária abaixo de 44%; Itália, 44%; Canadá, 37%; França, 46%; Holanda, 45%; Áustria, 46% e a Dinamarca, 50%, são países, que ao lado da Alemanha e do Canadá – estes últimos estão pouco acima do Brasil, porque apresentam menos de 40% –, têm as mais altas cargas tributárias.
Caso, entretanto, comparemos esses países sob o prisma da competitividade, em face do nível da renda per capita, verificaremos que o Brasil tem hoje o mais alto nível impositivo, considerando-se os mesmos critérios. A renda per capita do Brasil é de 2500 dólares, enquanto a renda per capita de Polônia e Hungria, por exemplo – países que estão no patamar do Brasil –, está aproximadamente 5 mil dólares per capita. O Canadá tem renda entre 23 a 24 mil dólares per capita; a Itália, 22 mil; mesmo Israel, 17.500; a França, acima de 22.500; a Suécia, 27.500; Dinamarca, 30 mil e os Estados Unidos, 35 mil.
O Brasil, com renda de míseros 2.500 dólares por ano, possui carga tributária de 36%, segundo “The Economist”, o que, em comparação com esses países, com uma média de 43%, revela uma situação dramática, já que todos possuem renda per capita consideravelmente maior. Se considerarmos a relação carga tributária/renda per capita, o Brasil está perdendo, de longe, competitividade internacional. E esta é a razão pela qual crescemos apenas 2,3%, quando todos os países cresceram muito mais que o Brasil, e de forma fantástica.
Em face dos problemas que hoje o país enfrenta, principalmente com excesso de tributos, juros e encargos sociais, entendi oportuno entregar à Editora Lex a reedição de meus quatro opúsculos. O livro “O Estado de Direito e o Direito do Estado” é uma análise conjuntural do problema jurídico que revelamos, na época da primeira edição, quando vigorava no país o regime de exceção. Apresentei caminhos que me pareciam adequados para voltarmos democracia, daí seu título. Nesse trabalho, sustento que o Estado tem direitos, mas o verdadeiro Estado de direito é aquele que se destina, fundamentalmente, a servir ao cidadão.
Faço, inclusive, comparação entre as classes militares e civis, mostrando a necessidade de uma grande compreensão por parte dos dois lados, para que pudéssemos sair de uma forma indolor do regime de exceção, para a democracia. Tenho a impressão de que, de alguma forma, o livro representou uma colaboração, já que alguns de nossos amigos civis estavam vinculados ao governo, naquela época, e o receberam bem. Entre eles cito o senador Paulo Brossard, que, vindo do Partido Libertador do Rio Grande do Sul, atuava em Brasília, no MDB. O certo é que tivemos uma saída do regime militar não‑traumática. Não uma saída sangrenta, como, em muitos casos de mudança de regimes de exceção para a democracia no continente.
No segundo livro, já analiso o período em que já se mostrava irreversível o fim do regime de exceção. Já se preparava a eleição que Tancredo viria a ganhar. Eu presidia, à época, o Instituto dos Advogados de São Paulo, e defendia a campanha “Diretas Já”. O Instituto, inclusive, encampou a tese da “constituinte exclusiva” à qual sempre fui favorável. Ou seja: uma Constituição elaborada por um conjunto de pessoas eleitas apenas para aquela tarefa e que, terminados os trabalhos, voltariam para casa. Pessoas como as de hoje: o Antônio Carlos e Pedro Dallari (que foi deputado estadual e é professor de nível) que poderiam concorrer e oferecer uma real contribuição, com seus profundos conhecimentos de direito constitucional, ou seja, do que é uma Constituição e do que é um processo constituinte.
No livro, saliento quais seriam os riscos daquele momento de transformação. No momento, entretanto, em que o presidente Sarney assumiu a presidência, verificamos que ocorreu aquilo que Alvin Toffler apresentou em “A Terceira Onda”: O fortalecimento da classe dos burocratas é o que me levou a escrever “A nova classe ociosa”, adotando o mesmo prisma de um grande economista que tinha um mau-humor tão grande quanto Marx, ou seja, Thorstein Veblen. Ele dizia que a classe ociosa, à época, era a dos empresários. Nos primórdios, a classe ociosa era a dos homens, que viviam seu esporte predileto que era a guerra. As mulheres exerciam a grande atividade de sustentar as famílias. Desde os povos primitivos e mesmo entre os índios, os homens ou guerreavam ou tratavam de negócios, mas tudo que era difícil ficava para as mulheres fazerem. No século XIX, foram os empresários que se transformaram em uma imensa classe ociosa, em relação aos trabalhadores. Eu aproveitei o estudo do Veblen e sugeri que a nova classe ociosa seria composta pelos detentores do poder. Burocratas e políticos passaram a ser os governantes.
O livro “Roteiro para uma Constituição” foi escrito a pedido de alguns parlamentares com sugestões que, segundo Antônio Carlos do Amaral, em parte foram aceitas pelos Constituintes e, por outro lado, consideradas demasiadamente utópicas como, por exemplo, a de transformar o Tribunal de Contas em um órgão do poder Judiciário, em um poder “responsabilizador”, para que todos tivessem respeito por suas decisões, sendo não apenas um órgão acólito do Poder Legislativo, o que reduz sua força.
Essa tese foi considerada ilusionária, pois, nenhum país do mundo adotara antes tal modelo. Como em muitas oportunidades, me referi tanto aos escritos que compõem a primeira trilogia, com o “Roteiro para uma Constituição”, alguns amigos sugeriram que os reeditasse. Carlos Sérgio Serra e Dirceu Coutinho entenderam que valeria a pena retornar a essas reflexões e publicá-los. Não mudei uma linha sequer, porque muitas daquelas idéias continuam rigorosamente atuais. A outra trilogia que escrevi é composta dos livros “Uma visão do Mundo Contemporâneo”, “A Era das Contradições” e “A Queda dos Mitos Econômicos”. Os dois primeiros livros estão esgotados e o terceiro ainda em sua carreira editorial. Neles, já faço uma análise da situação mundial a partir da queda do muro de Berlim, procurando em uma visão extra-profissional e extra-jurídica, tentar compreender a sociedade em que vivemos.
Meu grande conforto, ao ler que o livro de Thomas Friedman está fazendo um sucesso estupendo, é que, na verdade, muitas das coisas ou quase tudo o que ele está dizendo agora, eu já havia dito com muita antecedência, com a diferença de que escrevi em português e ele em inglês, o que faz uma diferença fantástica, no que diz respeito à divulgação das idéias.