O jus postulandi e o princípio constitucional da proteção do trabalhador

28 de abril de 2015

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RESUMO

O presente trabalho confronta o instituto do jus postulandi com o princípio constitucional da proteção do trabalhador, partindo uma análise histórica, de estudo da origem tanto do referido instituto quanto do referido princípio e chega até os dias atuais, onde o direito do trabalho e direito processual do trabalho avançam juntos, exigindo para seu conhecimento e aplicação eficaz de estudo e técnica.

Neste contexto, o artigo em questão segue acareando a prerrogativa postulatória das próprias partes no direito do trabalho, com o acesso à justiça e sobretudo a um processo  judicial justo, onde a atuação leiga se mostra ineficiente e deixa o trabalhador, objeto de proteção da Constituição Federal, desprotegido, mostrando assim a completa ineficácia da manutenção do jus postulandi que, por fim, apenas tem servido de desculpa para a inaplicação de honorários de sucumbência ao advogado/procurador.

PALAVRAS CHAVES: jus postulandi. Princípio. Trabalhador

THE JUS POSTULANDI AND THE CONSTITUTIONAL PRINCIPLE OF WORKER PROTECTION

ABSTRACT

This work confronts the institute jus postulandi with the constitutional principle of worker protection, leaving a historical analysis, the study of the origin of that institute as both the beginning and coming to the present, where the labor law and procedural law advance together, requiring for their knowledge and effective implementation and technical study.

In this context, the article in question follows the prerogative confronting the parts pleading themselves in labor law, with access to justice and especially to a fair trial where the action lay proves inefficient and leaves the employee, subject to protection of the Federal Constitution, unprotected, showing the complete ineffectiveness of keeping jus postulandi that ultimately only has served as an excuse for non-application of the burden of defeat lawyer / attorney

KEYWORDS: Jus Postulandi. Principle. Worker.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO………………………………………………………………………………………….05

2. DO JUS POSTULANDI E PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DO TRABALHADOR – CONCEITO E VISÃO HISTÓRICA – INCONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO TRABALHISTA…………………………………………………………………………………………….05

3. O JUS POSTULANDI FRENTE AO DIREITO MODERNO………………………………………..07

3.1   O problema da valoração da prova e do conhecimento técnico………………………………08

3.2 As consequências: inacessibilidade à justiça e desproteção do trabalhor………………………………………………………………………………………………………..10

4. CONSEQUÊCIAS DA MANUTENÇÃO DA PRERROGATIVA POSTULATÓRIA PELA PRÓPRIA PARTE………………………………………………………………………………14

4.1 Afronta ao artigo 133 da Constituição Federal…………………………………………….15

4.2 Desculpa para o não pagamento de honorários advocatícios………………………………………………………………………………………………….12

5. CONCLUSÃO ………………………………………………………………………………………….16

REFERÊNCIAS. …………………………………………………………………………………………..19

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo procura analisar o instituto do jus postulandi na justiça do trabalho e sua aplicabilidade e eficácia atual frente o direito moderno, sob o enfoque do trabalhador.

Parte referido trabalho de uma breve lembrança histórica, relembrando que, no passado, a defesa dos trabalhadores se dava sem a participação de procuradores/advogados, e que, quando da existência de regras simples de autocomposição, o instituto do jus postulandi era válido e eficaz, porém não mais o é nos dias de hoje.

Conceitua ainda o princípio constitucional da proteção do trabalhador como a base do direito do trabalho e a razão de ser de sua existência, posto que o mesmo visa igualar juridicamente partes de um contrato de trabalho que se encontram social e economicamente desiguais.

Neste contexto, o instituto do jus postulandi é confrontado com o princípio constitucional da proteção do trabalhador, pilar do direito do trabalho, analisando a eficácia do referido instituto frente a efetivação da real proteção do trabalhador e defesa de seus direitos, enfocando, inclusive, no direito de acesso à justiça.

Por fim, coube analisar que o seu desuso e inaplicabilidade reforça o entendimento acerca da essencialidade da atuação do advogado que tem previsão constitucional, e efetiva capacidade postulatória.

2. DO JUS POSTULANDI E PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DO TRABALHADOR – CONCEITO E VISÃO HISTÓRICA – INCONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO TRABALHISTA

O jus postulandi das próprias partes é a prerrogativa (jurídica) que tem o cidadão de postular em juízo em defesa de seus próprios interesses, praticando inclusive todos os atos processuais, como o ajuizamento de ação trabalhista, produção de provas, interposição de recurso, dentre outras.

No entanto, importante destacar que o jus postulandi não reveste o cidadão que postula da chamada capacidade postulatória, que é inerente àqueles que estão habilitados ao exercício da defensoria pública ou da advocacia, devidamente inscritos nos quadros da OAB.

Assim, a capacidade postulatória diferencia-se do direito de postular porque nela está inserido o conhecimento técnico capaz de proporcionar a efetivação da tutela judicial, ao passo que este é um mero permissivo legal para atuar em juízo, e, na Consolidação das Leis Trabalhistas, está previsto no artigo 791.

Embora o jus postulandi seja conferido tanto ao trabalhador quanto ao empregador, o presente artigo tem em mira o direito conferido ao trabalhador. Nesse sentido, o princípio da proteção do trabalhador é inerente a todas as normas trabalhistas, que valem tanto do ponto de vista individual quanto coletivo, e estejam elas previstas na Constituição Federal, na Consolidação das Leis Trabalhistas, nas normas coletivas, ou qualquer outra fonte normativa. Dele decorrem princípios como o in dubio pro operário, aplicação da norma mais favorável, dentre outros.

Referido princípio, qual seja o da proteção do trabalhador, encontra respaldo no princípio da dignidade da pessoa humana e serve de base fundamental para a construção do ordenamento jurídico que rege a relação jurídica entre trabalhador/tomador de serviços/empregador.

Essa desvinculação dos direitos fundamentais da sua pura titularidade individual, num processo de objetivação, faz com que se passe a considera-los enquanto fundamentos da ordem jurídica da comunidade que impregnam todo o ordenamento jurídico. (CAVALCANTE, 2008; p. 55-56)

Sabe-se que o direito do trabalho nasceu para dar condições aos trabalhadores da época da revolução industrial, época esta marcada pelo abuso de poder dos empregadores, que submetiam os trabalhadores/operários a um ambiente de trabalho desumano com condições de trabalho extremamente precárias, jornadas extenuantes e salários vergonhosos.

É, portanto, o Direito do Trabalho descendente da Revolução Industrial, e surgiu rudimentarmente, desde àquela época, para proteger o trabalhador, que dentro de uma relação de emprego ou trabalho constitui a parte menos favorecida econômica, social e financeiramente.

Símbolo e Filho da Revolução Industrial, o direito do trabalho surgiu como uma resposta às péssimas condições de labor e aos níveis críticos de polaridade rentável dos grandes industriais, em face da miséria crescente e aterradora dos trabalhadores. O ideal liberal de igualdade entre o obreiro e o industrial foi a principal causa e justificativa para o abandono governamental, naquela época, aos trabalhadores. (ALMEIDA, 2012; p. 28)

Neste contexto de conflitos entre o empregado e o empregador, em que a miséria era crescente, depois de considerada evolução histórica, o direito do trabalho nasce em razão do trabalhador, nasce para dar ao trabalhador uma igualdade jurídica e protege-lo dos abusos de quem já era econômica e socialmente mais forte.

Essa vontade de proteger, em épocas retrógradas, no entanto, não nasceu já como sendo direito, e é aí que se insere o instituto do jus postulandi, que tem precedente à Época do Estado Liberal, que elaborou regras de autocomposição entre o empregado e empregador, regras estas que impediam a autodefesa, necessárias para a composição entre as partes e que não atribuíam a elas os títulos de vencedores e vencidos, e deixava assim o controle da situação ao Estado.

Assim, o direito material do trabalho possui como precedente o princípio da proteção do trabalhador, enquanto que o direito processual do trabalho encontra precedente nas regras de composição do Estado Liberal, que possui ligação direta com o jus postulandi das próprias partes.

3. O JUS POSTULANDI FRENTE AO DIREITO MODERNO

O jus postulandi das próprias partes, como vimos, no Direito do Trabalho, é o direito da própria parte postular em juízo suas pretensões, ou seja, aquilo que entende que, no âmbito do contrato de trabalho, lhe é devido e não foi pago.

Neste contexto de postulação pelas próprias partes em órgãos não judiciais, no intuito de se conciliar sem que haja vencedor e vencido é que o direito do trabalho nasceu, ramo do direito este que, atualmente, constitui uma justiça especializada, onde há uma produção legislativa considerável, cuja aplicação exige atuação técnica, sobretudo na parte processual onde se exigem produção de provas contundentes e conhecimento técnico de um conjunto de normas muitas vezes difícil até mesmo de serem interpretadas.

Referido conjunto normativo jurídico existe por conta da proibição estatal aos cidadãos de resolverem sozinhos seus próprios conflitos de interesses, tarefa esta conferida pela Constituição Federal ao Poder Judiciário.

Como bem deixa claro Martins (2010, p. 17):

Tem o Direito do Trabalho inúmeras regras que versam sobre a matéria. A maioria delas está contida na CLT.

No Direito do Trabalho, não existem apenas conjuntos de princípios e regras, mas também de instituições, de entidades, que criam e aplicam o referido ramo do Direito. O Estado é também o maior criador de normas de Direito do Trabalho, o Ministério do Trabalho edita portarias, resoluções, instruções normativas etc. A Justiça do Trabalho julga as questões trabalhistas.

As instituições perduram no tempo. Não são institutos, que compreendem um conjunto de regras a respeito da mesma matéria.

Ante a tal situação, de alta produção legislativa, que emana não só do Poder Legislativo do Estado, bem como do Executivo, e ante as variadas decisões dos Tribunais brasileiros, que ora divergem e ora coadunam entre si, percebemos o tanto que o direito moderno necessita para seu entendimento e aplicação de estudo e conhecimento técnico.

3.1 O PROBLEMA DA VALORAÇÃO DA PROVA E DA AUSÊNCIA DE CONHECIMENTO TÉCNICO

Um dos grandes problemas da atuação leiga no processo do trabalho é a valoração da prova, posto que, o sujeito que não conhece de direito e menos ainda de processo/procedimento jamais saberá valorar a prova de forma adequada, utilizando a mesma no intuito de fazer prova de suas próprias alegações e ainda a seu favor.

Como exemplo citamos Bezerra Leite (2010; p. 543-544):

Nos domínios da ciência jurídica processual, a palavra “prova” pode ser empregada com diversas acepções. Às vezes, concerne à atuação das partes no processo com o objetivo de evidenciar a existência do fato que pretendem demonstrar em juízo. Nesse sentido, utiliza-se a expressão “produzir a prova”.

(…)

Pode-se dizer, portanto, que prova, nos domínios do direito processual é o meio o meio ilícito para demonstrar a veracidade ou não de determinado fato com a finalidade de convencer o juiz acerca da sua existência ou inexistência.

Existem no processo do trabalho, assim como em qualquer outra seara do direito processual, vários tipos de prova, como a documental, a testemunhal e a pericial, de modo que as mesmas devem ser usadas de forma adequada e cautelosa para que haja êxito no processo.

A verificação da veracidade de tal tese é bastante simples, e para que se ilustre a referida, podemos, por exemplo, analisar a questão do dano moral no direito do trabalho.

O dano moral, quando alegado pela parte autora, deve sempre ser provado pela mesma, de modo que o ônus da prova é da parte que alega, conforme se deduz dos artigos 818 da CLT e 333, I do Código de Processo Civil, e, quando da inexistência da referida prova ou quando a mesma for mal feita, têm-se como entendimento majoritário dos tribunais brasileiros de que a indenização pelo pleiteado dano jamais será entendida como devida.

Para fins de exemplo, citamos aqui uma ementa do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (Paraná):

TRT-PR-11-06-2013 INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NECESSIDADE DE PROVA ROBUSTA DA PRÁTICA DE ATO LESIVO AOS VALORES DA PERSONALIDADE DO TRABALHADOR. Para a configuração de ato ilícito, apto a ensejar a responsabilidade civil, é indispensável o concurso de três elementos: conduta humana, consistente em um comportamento doloso ou culposo causador de prejuízo a terceiro; nexo causal, qual seja, o vínculo que une o comportamento do agente ao prejuízo causado; e o dano propriamente dito, ou seja, lesão a um interesse jurídico material ou moral. O dano moral nada mais é que o dano provocado à esfera subjetiva de um indivíduo, a valores personalíssimos inerentes a sua qualidade de pessoa humana e, para o deferimento de pedido de indenização por danos morais, imprescindível prova robusta e inequívoca da prática, por parte do empregador ou seus prepostos, de ato lesivo aos valores da personalidade do trabalhador, tais quais a honra, a dignidade, a reputação, etc. “In casu”, não se pode inferir do conjunto probatório que, de fato, a Reclamante foi alvo de constrangimentos e de palavras desrespeitosas por parte de sua superiora hierárquica. Da mesma forma, o fato de constar do Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) a expressão “trabalhadores do açougue”, em que pese a Reclamante atuar como “técnica em enfermagem”, não denota violação à moral obreira, mormente quando a leitura integral de referido laudo permite inferir que a presença de tal expressão se deu em evidente erro material decorrente da utilização sobreposta de “modelo” documental preexistente. Não tendo sido, assim, robustamente demonstrada a prática de suposto ato ensejador de abalo na reputação profissional da obreira, não se cogita de indenização por danos morais. Recurso ordinário da Reclamante a que se nega provimento, no particular. (TRT-PR-00929-2012-068-09-00-6-ACO-21933-2013 – 7A. TURMA; Relator: UBIRAJARA CARLOS MENDES; Publicado no DEJT em 11-06-2013) – (Disponível em: http://www.trt9.jus.br/internet_base/jurisprudenciasel.do?evento=portlet&pIdPlc=jurisprudenciaselNav&acao=navega&pAcIniNavjurisprudenciaselNav=1#${item.linkEdicaoPlc})

Vemos do exemplo supracitado que o dano moral para que seja comprovado exige a demonstração de três requisitos como o dano propriamente dito, o ato ilícito causado pelo coator e o nexo causal entre a conduta ilícita e o dano sofrido, requisitos estes que somente conseguirão fazer sentido para aquele indivíduo que conhece de direito e sabe demonstrar satisfatoriamente em juízo a real existência dos mesmos, posto que, caso contrário, o autor jamais receberá qualquer tipo de indenização por danos morais.

Desta feita, como bem vimos no exemplo da indenização por dano moral, que é um único pedido, dos muitos existentes, passível de ser feito junto à Justiça do Trabalho, é imprescindível a atuação de indivíduo possuidor de conhecimento técnico suficiente para valorar a prova que se têm e para aplicá-la de acordo com o direito material e processual, o que torna assim essencial a atuação do advogado.

E nem se alegue a existência do impulso oficial do juiz, principalmente diante da realidade atual, vivenciada com o acúmulo de processos o que, por certo, não permite ao magistrado impulsionar o processo.

Dentro deste contexto, é o advogado que provoca o juízo, requerendo todas as providências que se fazem necessárias no curso do processo, incluindo-se aí a produção de provas e a elaboração e interposição de recursos. 

3.2 A CONSEQUENTE INACESSIBILIDADE À JUSTIÇA E DESPROTEÇÃO DO TRABALHADOR

Um outro aspecto que merece destaque quando se analisa o jus postulandi das próprias partes na justiça do trabalho é o acesso à justiça e a um processo judicial justo, direito este inerente a todos os cidadãos, pois decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, direito este constitucionalmente previsto no artigo 5º da Carta Magna.

Assim, deveria o Estado promover o acesso à justiça de seus cidadãos de forma igualitária, e um dos meios encontrados pelo Estado foi o de deixar o ranço do jus postulandi das próprias partes vigente em nosso ordenamento jurídico.

 Sabemos já que em outras épocas o que prevalecia era a autocomposição e que as regras existentes há muito tempo atrás eram direcionadas para as próprias partes que atuavam sem a presença de procurador de qualquer espécie. No entanto houve a evolução destas normas e ainda há, de modo que atualmente as normas e a aplicação das normas são infinitamente mais complexas e o seu estudo é imprescindível.

Considerando-se o plano político social em que estão inseridos os cidadãos brasileiros, considerando a atual pobreza, o baixo nível da educação e sobretudo a ignorância quanto aos seus próprio direitos e o desconhecimento das leis, nos perguntamos: a prerrogativa postulatória conferida aos trabalhadores promove, nos dias de hoje, o real acesso à justiça? O trabalhador terá, se atuando sozinho perante o órgão judicial, a real proteção, conferida a ele em todo o ordenamento jurídico, inclusive em âmbito constitucional? Quais são as consequências da manutenção do instituto do jus postulandi em nosso ordenamento?

Como resposta a tais questões, é importante relembrarmos aqui uma questão extremamente atual, que remete ao acesso à justiça.

Diz-se muito hoje em dia não somente ao acesso a justiça e sim acesso a uma ordem jurídica justa, o que pressupõe, além de previsão legislativa de direitos materiais, um acesso a um processo judicial justo, que é possível tão somente quando da atuação de pessoas capacitadas tecnicamente, posto conhecerem de um complexo ordenamento e modo de atuação judicial.

O devido processo legal configura ao trabalhador/cidadão dupla proteção, qual seja proteção de direito material em primeira instância e proteção de direito formal /processual em segunda instância, de modo que a ampla defesa só é atingida quando há a igualdade técnica nesta discussão de direitos entre os litigantes, e tal igualdade técnica somente é possível através da atuação de advogados, e pressupõe assim uma igualdade de condições, ou seja, a paridade de armas.

A atuação do advogado foi tida pela própria Constituição Federal Brasileira, através do artigo 133, como indispensável à administração da justiça, e, diga-se de passagem, em todas as “justiças”, ou seja, para todos os casos, o que inclui a Justiça do Trabalho, posto que a norma não prevê nenhuma exceção: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”

Menegatti é claro em seu estudo quanto a viabilidade do uso do instituto do jus postulandi:

(…) não se concebe no processo moderno a possibilidade de que o jus postulandi prevaleça, uma vez que esse não garante participação de forma efetiva do cidadão em todas as fases do processo.

Quando contraposta à moderna concepção de acesso à justiça, tem-se que a participação com paridade de armas exige uma defesa técnica, situada com os procedimentos, capaz de aconselhar a parte, conduzi-la pelos tormentosos e intricados caminhos do processo, em meio a um emaranhado de diplomas legais e que tornam difícil a compreensão dos meios necessários para alcançar a tutela judicial pretendida.(MENEGATTI, 2011, p. 58)

Ora, ante o complexo ordenamento jurídico atual, e a renovação das normas, bem como a necessidade de atuação técnica dentro de um processo judicial, contexto este no qual se insere as contendas trabalhistas, é de fácil conclusão que o uso/aplicação do jus postulandi jamais promoverá o real acesso à justiça e tampouco a um processo judicial justo.

Quanto à matéria vale citar ainda o ex ministro do TST, Marco Aurélio (abr/jun 2011):

(…) sustentei que o disposto no art. 133 da Constituição não inviabilizaria o acesso ao Judiciário, ao contrário, iria torná-lo mais seguro, porquanto o Direito é uma ciência e, enquanto tal, os institutos, as expressões, os vocábulos têm sentido próprio, devendo ser articulados por profissional especializado, o advogado. (…) Relatei minha experiência perante a Justiça do Trabalho, por quinze anos, na qual pude comprovar que, na prática, a capacidade postulatória não se revertia em prol do empregado. Ao reverso, terminava gerando massacre técnico. (Disponível em <http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/handle/1939/25196)

Sérgio Pinto Martins (2010; p. 60) por sua vez bem expõe:

O advogado deveria ser necessário em todo e qualquer processo, inclusive na Justiça do Trabalho, pois é a pessoa técnica, especializada na postulação. A Ausência de advogado para o reclamante implica desequilíbrio na relação processual, pois não terá possibilidade de postular tão bem quanto o empregador representado pelo causídico, podendo perder seus direitos pela não observância de prazos, etc.

Assim, é de fácil percepção que jamais, no contexto atual, o jus postulandi irá promover para aquele que se usa do referido instituto um acesso à justiça, posto que não dá base para um processo justo, visto que inexiste, nestes casos, um trabalho técnico que pode se dar somente através da atuação de advogado, que diariamente trabalha o conhecimento do direito, ordenamento jurídico e atuação processual.

Quanto a proteção do trabalhador, da mesma forma, a mesma é impossível ocorrer de fato ante a atuação leiga no processo do trabalho, posto mais uma vez o trabalhador, quando do uso do jus postulandi, atuar sem a presença de um expert no assunto, capaz de entender a relação processual existente, produzir provas e de fato promover o alcance dos direitos do trabalhador, igualando-o juridicamente com seu empregador.

É que o trabalhador, ante o contexto social e político brasileiro, não conhece com profundidade seus direitos e também como proceder ante a justiça. Não sabe os trâmites de fóruns, não sabe quais são os prazos e tampouco consegue produzir provas que lhe favoreçam, o que resulta no fracasso quanto ao alcance de seus direitos.

O trabalhador tem pouco conhecimento acerca da parte processual do direito trabalhista, posto se tratar justamente de direito estritamente técnica, de modo que aí reside a indispensabilidade do advogado, que detentor de todos os conhecimentos necessários para promover o real acesso à justiça, promoverá e garantirá, através de sua atuação técnica a devida proteção ao trabalhador.

Nesta linha de pensamento, percebemos que, além de não haver o real acesso à justiça com o uso do jus postulandi, o trabalhador leigo jamais terá seus direitos efetivamente defendidos, e assim, vemos o princípio razão da existência das leis trabalhistas cair por terra, posto que a proteção do trabalhador nunca será efetiva quando da atuação leiga deste dentro da justiça do trabalho.

Neste mesmo sentido entende Sérgio Pinto Martins (2010; p. 61):

O empregado que exerce o ius postulandi pessoalmente acaba não tendo a mesma capacidade técnica que o empregador que comparece na audiência com advogado, levantando preliminares e questões processuais. No caso acaba ocorrendo desigualdade processual, daí a necessidade do advogado.

O não alcance dos direitos pelo próprio trabalhador, que faz uso da prerrogativa postulatória, é grave, posto que inexistindo referido alcance, o mesmo está desprotegido, e referida ausência de proteção é completamente contrária à razão de ser do ordenamento jurídico trabalhista, que possui como princípio máximo a proteção do trabalhador.

Para se destacar a importância do referido princípio, explica Maurício Godinho Delgado (2009; p. 183):

(…) Efetivamente, há ampla predominância nesse ramo jurídico especializado de regras essencialmente protetivas, tutelares da vontade e interesses obreiros; seus princípios são fundamentalmente favoráveis ao trabalhador; suas presunções são elaboradas em vista do alcance da mesma vantagem jurídica retificadora da diferenciação social prática. Na verdade, pode-se afirmar que sem a ideia protetivo-retificadora, o Direito Individual do Trabalho não se justificaria histórica e cientificamente.

Assim, claro fica o absurdo que é a manutenção do instituto do jus postulandi  em nosso ordenamento jurídico, posto que o mesmo não promove o direito de acesso à justiça face a ausência de atuação técnica em defesa dos direitos do trabalhador, e ainda lesa o trabalhador no sentido de não promover a igualdade jurídica decorrente de sua hipossuficiência social e econômica ante o seu empregador, prejudicando irremediavelmente o mesmo que não terá seus direitos efetivamente defendidos, fato este que extermina o princípio basilar do direito do trabalho, qual seja a proteção do trabalhador.

4. MANUTENÇÃO DA PRERROGATIVA POSTULATÓRIA PELA PRÓPRIA PARTE QUE NÃO SE JUSTIFICA

Como vimos, a manutenção da prerrogativa postulatória atribuída à própria parte através do artigo 791 da CLT, ou seja, o jus postulandi, em nosso ordenamento jurídico, não mais se justifica frente ao complexo emaranhando de normas de direito do trabalho e ainda à atualização cada vez mais rápida das leis trabalhistas, que exigem conhecimento técnico para a efetiva defesa do trabalhador, bem como para proporcionar a este a efetiva proteção e o real acesso à justiça.

Aliás, a súmula 425 do Tribunal Superior do Trabalho restringiu o jus postulandi às varas do trabalho e proibiu que houvesse atuação dos próprios trabalhadores em ações rescisórias, mandados de segurança, cautelares e recursos de competência do TST sob a alegação de que nestes procedimentos a aplicação do conhecimento técnico é necessário. Ora, seria então referida súmula ilegal, por ser contrária ao artigo 791 da CLT, ou o início do reconhecimento da real necessidade de atuação através de advogado na Justiça do Trabalho?!

A edição da referida súmula é o reconhecimento que deu o Poder Judiciário de que somente um advogado é capaz de proporcionar ao trabalhador a defesa de seus direitos, e fazer valer assim o princípio protetivo, fato do qual se retira a conclusão de que a manutenção da prerrogativa postulatória pelas próprias partes constitui afronta ao ordenamento jurídico brasileiro em geral, sobretudo à Constituição Federal, e ainda, serve de escopo para o não pagamento de honorários de sucumbência ao advogado atuante em processo trabalhista, como se a prerrogativa postulatória das próprias partes anulasse o direito do advogado de ter para si uma remuneração pelo trabalho prestado, que, diga-se de passagem, constitui verba alimentar.

4.1 AFRONTA AO ARTIGO 133 DA CONSTITUIÇÃO FEDRAL

O jus postulandi constitui uma afronta à Constituição Federal porque viola o seu artigo 133, que reconheceu o advogado como indispensável à administração da justiça, de modo que não abriu, na norma em questão nenhuma exceção, excluindo assim a possibilidade das partes poderem atuar na justiça sem se fazerem representadas por procuradores judiciais, razão pela qual deveria o jus postulandi ser extinto do ordenamento jurídico.

Ora, sendo o advogado constitucionalmente reconhecido como essencial para o correto deslinde das demandas, é inegável que o mesmo faça jus aos honorários de sucumbência sempre, e frise-se aqui o sempre, que houver sua atuação.

Ainda que se sustentasse, assim como o TST sustenta, que o artigo 791 da CLT foi acolhido pela Constituição de 1988, e que exsurge uma exceção à regra da essencialidade, há que se considerar que tal ideia reside somente no plano teórico, posto que na prática, como antes já se disse a essencialidade do advogado se mostra flagrante.

Ora, caso houvesse o real uso do jus postulandi, têm-se que seria uma tarefa tormentosa e árdua até mesmo para os juízes lidar diretamente com as partes, de modo que tal situação configura exatamente culpa da organização do poder judiciário, que vai desde o modelo de concursos utilizados para contratação de juízes onde o preparo psicológico dos mesmos é irrelevante, e a sua atuação em assistência direta à parte constituiria ainda parcialidade.

Ademais, a afronta, ainda que se entenda como não literal, mostra-se diretamente ligada com a essência e objetivo da norma contida no artigo 133 da Constituição Federal, qual seja o de valorizar o advogado, conferindo-lhe caráter de imprescindibilidade ante o processo judicial.

Assim, a violação da norma, mesmo ante a tentativa de se sustentar a exceção e recepção da norma do artigo 791 da CLT, é flagrante pois atinge a essência do conteúdo normativo do artigo 133 da Carta Magna.

4.2 DESCULPA PARA O NÃO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Não bastasse o já exposto, há ainda que se considerar que a Constituição Federal, em seu artigo 133 reconheceu o advogado como indispensável à administração da justiça, de modo que não abriu, na norma em questão nenhuma exceção, excluindo assim a possibilidade das partes poderem atuar na justiça sem se fazerem representadas por procuradores judiciais, razão pela qual deveria o jus postulandi ser extinto do ordenamento jurídico.

Assim, ainda que se persista na manutenção da prerrogativa postulatória das próprias partes, o advogado pode e deve atuar como representante judicial das partes no processo do trabalho, e, quando assim for feito deverá o mesmo receber os honorários.

Ora, o cálculo é muito simples, se o advogado atuar como procurador judicial, faz jus o mesmo a receber sucumbência, se não houver sua atuação, não haverá sucumbência.

Não existe correlação entre a prerrogativa postulatória da própria parte com a efetiva atuação do advogado no processo, posto que a possibilidade de contratação de advogado existe e quando de sua atuação não há que se falar em não pagamento de honorários advocatícios.

 Além do mais, há que se considerar que os honorários advocatícios constituem verba alimentar do advogado, é a contraprestação pelo serviço prestado, mais um motivo pelo qual não se justifica a sua atuação em processo com o não recebimento de uma remuneração para tanto:

Ora, afastar os honorários advocatícios na seara trabalhista é o mesmo que ir contra os princípios trabalhistas, que, embora aplicáveis ao empregado, não afastam sua expansão aos demais trabalhadores, principalmente se levarmos em conta os princípios constitucionais trabalhistas, quais sejam, dignidade do trabalhador, valorização do trabalho, justiça social, entre outros.

Destarte, existe, mais argumentos para a garantia das verbas alimentícias aos advogados, além de não gerar diminuição nos créditos devidos ao empregado de direito, servindo mesmo de meio de coação ao empregador em cumprir a legislação do trabalho, uma vez que, caso deixe para “usar” a Justiça do Trabalho como extensão do seu departamento de recursos humanos, deverá arcar copm o acréscimo de 20% a título de honorários. (FILHO. ROSA. Disponível em http://tpmagister.lex.com.br/lexnet/lexnet.dll/Dout/3ae?f=templates&fn=document-frame.htm&2.0 >)

Ora, com o exposto percebemos que o inexistência de honorários sucumbenciais ao advogado na Justiça do Trabalho não se justifica de nenhum lado, inexistindo assim qualquer embasamento jurídico para a negação da aplicação dos referidos honorários, posto que a manutenção do jus postulandi não impede a aplicação de condenação de pagamento de honorários de sucumbência ao advogado, de modo que a norma do artigo 761 da CLT tem servido apenas como uma desculpa para o boicote dos honorários advocatícios aos procuradores judiciais.

Ora, mais uma vez se vê o absurdo que é a manutenção de referida norma em nosso ordenamento, posto que é usada para negar ao advogado o direito à verba alimentar, qual seja, os honorários advocatícios.

5. CONCLUSÃO

Conclui o presente trabalho que atualmente o instituto do jus postulandi, conceituado como a prerrogativa postulatória que tem os cidadãos de ajuizarem ações na justiça do trabalho sem a presença de procurador/advogado, é ineficaz, e um ranço da época em que as partes realizavam suas pendências através de regras de autocomposição.

Ademais, considerando o Direito do Trabalho atual, que se encontra avançado, complexo e com um grande volume de criação de leis, bem como, considerando-se o Direito Processual do Trabalho, que institui regras próprias, prazos, e procedimentos os quais, se não forem seguidos corretamente, podem gerar o completo insucesso de uma ação, chega-se a conclusão que fica impossível a efetiva proteção do trabalhador frente a atuação de um leigo, mesmo sendo ele detentor do direito de postular.

Ainda, insustentável fica o impulso oficial do juízo de ações onde os trabalhadores atuam por conta própria, face ao grande acúmulo processual e o abalroamento da Justiça do Trabalho, que impossibilita os Magistrados de terem tempo suficiente para impulsionarem os processos.

Neste contexto, conclui-se ainda que o advogado é essencial à administração da justiça, e deve impulsionar o processo obedecendo as regras formais, agindo em defesa do trabalhador e promovendo assim o efetivo acesso à justiça a fim de garantir a aplicação do princípio constitucional da proteção do trabalhador, e que tal atuação deve se dar em todos os graus de jurisdição, ao contrário da parca limitação dada pela súmula 425 do TST.

Por fim, esclarece o presente trabalho que, já que o instituto do jus postulandi não garante a efetividade do princípio constitucional em questão, e, a regra que o instituiu (art. 791 da Consolidação das Leis Trabalhistas) apenas estabeleceu uma faculdade para os cidadãos de agirem sozinhos ou através da presença de advogado, a referida norma tem sido usada de desculpa para a não fixação de honorários advocatícios aos patronos das partes litigantes, que deveriam receber sucumbência em razão de os honorários advocatícios constituírem verba alimentar.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Deise Coelho de. Acesso à Justiça e o Jus Postulandi das próprias partes no direito do trabalho. Letras jurídicas. 1ª Ed. São Paulo. 2012;

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