O mundo está mudando

14 de julho de 2011

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(Artigo originalmente publicado na edição 95, 06/2008)
 
A História do mundo é marcada por uma sucessão de “civilizações”. Algumas duraram milênios, outras duraram séculos. É interessante como a humanidade passou de uma civilização à outra praticamente sem perceber, uma vez que as mudanças são feitas contínua e lentamente. Essas mudanças, como é natural, não são percebidas pelos contemporâneos, que não se dão conta das transformações.
 
Da Pré-História, que pode ter durado milhões de anos, passamos, sem perceber, à História, na qual os documentos somente nos dão conta da civilização dos egípcios, dos povos da Mesopotâmia (babilônios, assírios, caldeus) e dos persas, após a descoberta da linguagem escrita, muitos séculos após a sua iniciação.
 
A civilização judaica é um capítulo à parte, na qual tem início a religião monoteísta, a religião dos livros, iniciada por Abrahão, Jacob, Moisés, Josué e outros patriarcas judeus, assim como a dos hindus e a dos chineses. Daí entramos na civilização da Grécia antiga, de Atenas e Esparta, dos filósofos como Aristóteles, Sócrates, Platão, e a do Império Romano, com a sua organização quase moderna e seus códigos de leis. É a época da Antiguidade, marcada pelas ‘guerras de conquistas’. Os países mais poderosos eram os que possuíam os melhores exércitos, com os quais roubavam as riquezas de outros povos e aprisionavam seus habitantes, transformados em escravos, destinados aos trabalhos na lavoura e na construção dos palácios.
 
A religião, pagã ou hebraica, confundia-se com o Estado, uma instituição que veio surgindo aos poucos, em um processo de evolução natural, na medida em que as populações errantes foram se aglomerando em vilas e cidades, grandes e pequenas.
 
Quando os invasores bárbaros invadiram Roma, por volta do século V, todo o mundo que consideramos no capítulo Antiguidade desmoronou. A História encerrou um capítulo e abriu outro, conhecido como a Idade Média, que durou, praticamente, até o século XV. A civilização parou. O Estado foi pulverizado e os governos reorganizados em torno dos castelos feudais e das catedrais, nos quais os bispos e arcebispos, ligados à Igreja Católica cristã, liderada por um Papa sediado em Roma, também agiam como senhores feudais. Acima dos condes, duques e marqueses (os senhores feudais), surgiram os reis – na Inglaterra, na França, na Prússia, na Áustria, na Espanha, em Portugal –, chefes do sistema aristocrático, que reunia não só a força militar como os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário associados à Igreja. É a fase do Absolutismo dentro do regime feudal da Idade Média.
 
A partir dos vilarejos, que circundavam os castelos e as catedrais, foram surgindo as metrópoles – Paris, Londres, Viena, Roma, Madri, Lisboa – e as cidades-estados italianas, que prosperaram à base do comércio com o Oriente (Florença, Nápoles, Veneza).
 
Os estudos sobre a geografia terrestre, a descoberta de novos instrumentos de navegação marítima (a bússola e o astrolábio) e o comércio com as Índias deram origem ao período das grandes navegações, que levaram os europeus, principalmente os portugueses e os espanhóis, a darem a volta na África (Vasco da Gama), a descobrirem a América (Cristóvão Colombo) e o Brasil (Pedro Álvares Cabral), e a cruzarem do Atlântico ao Pacífico, na Terra do Fogo (Fernão de Magalhães), chegando mais tarde à Austrália, à Nova Zelândia e à Indonésia. É o predomínio do comércio sobre a agricultura, o início do Mercantilismo, que vai durar até o novo ciclo da Revolução Industrial.
 
A Revolução Industrial começou no século XVIII, praticamente com a invenção de novos equipamentos para a indústria têxtil, como a fiandeira Jenny, em 1750, e a máquina a vapor, descoberta por James Watt. Daí vieram os novos navios e as locomotivas a vapor, que revolucionaram os meios de transporte e consolidaram a nova era do Capitalismo, período em que ocorreram as maiores e mais rápidas transformações e o maior progresso da humanidade. Mais tarde, vieram os automóveis e os aviões.
 
No período que vai da descoberta da máquina a vapor até os dias de hoje, foram inúmeras as ondas de inovações, cabendo destacar a indústria do carvão, a descoberta do petróleo como combustível e matéria-prima de milhões de novos produtos industriais, a descoberta da eletricidade e da telefonia. Nesse contexto, a aviação veio ocupar um lugar de destaque, revolucionando os meios de transporte e os instrumentos da guerra, com o uso da pólvora. É interessante assinalar que desde as guerras de Dario e de Alexandre, até as campanhas de Napoleão, em 1850, foram utilizados os mesmos meios de transporte das tropas e táticas dos exércitos. Tudo isso mudou de forma surpreendente a partir da Primeira Guerra Mundial, em 1914. A Segunda Guerra Mundial, de 1939 a 1945, trouxe-nos a descoberta e o uso da energia atômica, com desdobramentos que ainda não sabemos aonde podem nos levar.
 
Hoje, onde estamos? Para onde vamos? Alguém sabe?
 
A onda da Revolução Industrial vem se multiplicando: primeiro a iluminação, o raio X, o automóvel, a aviação, as viagens espaciais, depois a revolução no mundo das comunicações, o telefone, o telégrafo, o telex, a televisão, o computador, a Internet, o telefone celular. E vem chegando um novo mundo, o mundo da nanotecnologia. Alguns falam na primeira, na segunda, na terceira Revolução Industrial.
 
Um dos aspectos mais impressionantes dos avanços da civilização, a partir da Segunda Guerra Mundial, é, sem dúvida, a revolução do conhecimento, proporcionada pelo rápido desenvolvimento da tecnologia das comunicações. Esse cenário oferece aspectos positivos, de um lado, e negativos, de outro. Do lado positivo temos todos os benefícios da modernidade, incluindo o aperfeiçoamento das técnicas no campo da saúde, responsáveis pela melhoria da qualidade de vida, redução da mortalidade infantil e alongamento das expectativas de vida.
 
A economia mundial vive um de seus melhores momentos, com a expansão do comércio internacional e o enriquecimento dos chamados países emergentes. A China, a Índia, a Rússia e o Brasil, assim como vários países da Ásia e da América Latina, estão apresentando as mais elevadas taxas históricas de progresso social e crescimento econômico.
 
Em contrapartida, é impressionante a dimensão do quadro negativo, que inclui enormes disparidades de renda dentro das comunidades nacionais, bem como entre as nações dos diferentes continentes. O luxo e a riqueza convivem, lado a lado, com a miséria e a pobreza, nos dias de hoje, como conviviam há milênios.
 
A ordem mundial continua fortemente marcada pelas desavenças políticas, raciais e religiosas, pelo crescente terrorismo e pelas ameaças de guerras nucleares. A brutalidade do ataque às Torres do World Trade Center em Nova Iorque, em 11 de setembro de 2001, foi uma revelação do atraso e da ignorância que ainda prevalecem nos meios religiosos.
 
A conjuntura política atual está marcada por uma corrida armamentista – quem sabe a preparação de uma Terceira Guerra Mundial. A China está armada “até os dentes”, assim como a Rússia, Irã e Israel. Os Estados Unidos estão construindo uma linha de mísseis na Polônia, amedrontando a Rússia. Há guerra civil em vários países da África e sérios conflitos raciais na Europa. Na América Latina, a Venezuela está gastando bilhões de dólares na compra de equipamentos militares, fomentando um nacionalismo retrógrado na Bolívia e no Equador, além de apoiar e financiar a ação subversiva das Farc, na Colômbia, e promover uma campanha de ódio contra os Estados Unidos.
 
Pairam, ainda, sobre esse cenário, os riscos de uma recessão econômica mundial a partir da crise financeira iniciada nos Estados Unidos. É difícil prever o que poderá acontecer no futuro próximo, mas tudo indica que o melhor caminho é continuar trabalhando normalmente, contribuindo para manter um clima de confiança nas relações entre o setor privado e o Governo, entre o capital e o trabalho, dentro do país e nas relações internacionais.
 

 
Ernane Galvêas
Economista
Ex-Ministro da Fazenda