O poder judiciário

15 de julho de 2011

Bernardo Cabral Presidente de Honra do Conselho Editorial

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(Artigo originalmente publicado na edição 97, 08/2008)
 
Os verdadeiros problemas do Judiciário não são, como se pretende apresentar às vezes, apenas a falta de verbas, de prédios, de funcionários, etc., mas também estar o Judiciário formado numa cultura difícil de entender a sociedade e seus conflitos, além de estar bloqueado para internamente discutir e permitir que setores e grupos sociais livremente discutam a efetiva democratização desse ramo do Estado.
 
A nova organização mundial das relações humanas exige do Poder Judiciário o redimensionamento de seu próprio papel, comprometendo-se definitivamente como responsável por prestação jurisdicional mais ampla e eficiente, mais afinada com uma realidade afeita a vertiginosas mudanças.
 
A esta altura, a ninguém se permite ignorar que – princípio básico elementar, sem o qual não sobrevive a mais incipiente democracia –, a Justiça deve ser acessível a todos. Mas a garantia de acesso e de exercício de direitos é responsabilidade também do Executivo e do Legislativo. É tempo, assim, de contar-se com o Estado suficientemente estruturado e aparelhado para tanto; é tempo de proporcionar-se aos menos afortunados, de maneira eficaz, a assistência jurídica integral e gratuita; é tempo, enfim, de as garantias constitucionais saírem do papel, revelando-se como instrumentos concretos e ao alcance de todo e qualquer cidadão. Ao Poder Judicário cumpre, por sua vez, ao interpretar a lei, ato de vontade, assumir a cota de responsabilidade que lhe cabe na promoção da cidadania e da justiça social.
 
Convém estimular a mudança de atitude do Poder Judiciário que, em paralelo com a organização da sociedade civil, deve compreender a democracia participativa como o melhor e mais adequado meio para definição de novas diretrizes. O processo de democratização não se insere, portanto, somente na criação de controles democráticos das atividades que não sejam jurisdicionais, mas, também, de transparência e simplificação das suas atividades.
 
Impõe-se, pois, a reorientação do Judiciário para exercer ativamente atribuições que possibilitem a realização do objetivo principal e último: a concretização inquestionável, e não apenas teórica, virtual, da garantia de acesso à Justiça a todos, indistinta e eficazmente, sem o que qualquer democracia não passa de caricato arremedo ou mera utopia.
 
Dessa forma, a democratização do Poder Judicário é pressuposto fundamental para que o mesmo seja reconhecido efetivamente pela sociedade civil como um eficiente distribuidor de justiça e, portanto, Poder Estatal.
 
No caso brasileiro, a divulgação da informação crítica acumulada a respeito do Poder Judiciário, por meio de programas que informem a sociedade civil sobre o funcionamento dos órgãos do Judiciário, bem como a confecção e distribuição de jornais e cartilhas para fins de conscientização sobre procedimentos para reivindicação de direitos, são relevantes para a eficiência da atividade jurisdicional. Afinal, não há exercício de direito sem a consciência do Direito e não somos cidadãos se ignoramos a nossa cidadania.
 
Como se vê, não é possível banalizar a discussão sobre o Judiciário, tão relevantes e abrangentes são as questões nela implícitas. Mesmo o afã de promover a tão demandada agilização não justifica a supressão e a ignorância de temas vitais para a verdadeira democratização.
 
Da mesma forma, o ponto candente que é o do controle do Judiciário pela sociedade não pode ficar submetido a um órgão criado “soi disant” para tal fim, sob pena de se empobrecer a possibilidade de concretização de formas democráticas de participação popular na administração da Justiça.
 
Isso porque a essência do regime democrático repousa na existência de uma Justiça forte, independente e livre. Não há registro em nossa história que diga o contrário. O enfraquecimento do Poder Judiciário, sem dúvida, somente estimula o arbítrio e a injustiça.
 

 
Bernardo Cabral
Consultor da Presidência do CNC
Membro do Conselho Editorial