Os Lumpens da Política

30 de setembro de 2011

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(Editorial originalmente publicado na edição 133, 09/2011)

Os que assistiram, vivenciaram ou conheceram os governantes e políticos de antes, principalmente até a transferência da capital da República para Brasília, devem ter saudades da postura, da dignidade, da ética e da moralidade que possuíam e demonstravam naqueles tempos, merecedores que eles eram do respeito e da consideração da sociedade.

Brasília, inquestionavelmente, trouxe os grandes e benfazejos benefícios da interiorização política e social do País, tornando possível o apressamento do desenvolvimento e do progresso de que hoje a sociedade desfruta em todos os setores e atividades. O apressamento e a corrida necessários para atender à implantação do arcabouço que se tornou a cidade destinada a abrigar a sede administrativa e política do Brasil, entretanto, propiciou também, com o desordenamento da aplicação de normas legais na contratação das obras e construções públicas, os abusos representados pelos superfaturamentos, a corrupção desenfreada e o enriquecimento ilícito de empresários aprovei­tadores da ocasião, o que resultou na formação de uma nova casta de políticos venais que, infelizmente, proliferam como lumpens até estes tempos.

Daí terem surgido políticos desvinculados do interesse público, partidos políticos amorfos, corrupção generalizada e a mediocridade cada vez mais ousada, dentre outras graves mazelas. Lamentavelmente, podemos dizer: nunca, na história deste país, viu-se tanta leviandade, roubalheira, verdadeiro assalto aos cofres públicos, em detrimento de um povo carente que assistiu, atônito, a uma quadrilha tomar de assalto a Nação, com enriquecimentos meteóricos, escândalos no âmbito dos ministérios importantes, desvio de verba destinada ao socorro de regiões assoladas por catástrofes e, igualmente, o surrupiar de toneladas de alimentos arrecadados para atender às populações assoladas pela desgraça, as quais, infelizmente, ainda se encontram desprotegidas, sem moradia e famintas.

Impunidade, desleixo e desrespeito representam a tragédia por que passamos. A prática contumaz da desonestidade, que corrompe a administração pública como demonstram os escândalos, deixa à mostra, indelével e tristemente, o quadro de tantos e escabrosos atos criminosos, que emporcalham os políticos detentores de cargos governamentais e envergonham a Nação, sem que os delinquentes que os praticaram sejam exemplarmente justiçados e levados aos cárceres.

Enquanto isso não acontece, e as portas da cadeia continuam fechadas para essa corja de delinquentes apontados em inquéritos que tramitam na Polícia Federal e no Ministério Público, os corruptos continuam impunes afrontando a sociedade com impávida sordidez, em confronto com a falta de investimento em saúde, mostrando a miséria que sangra nos hospitais públicos, nos quais falta tudo, as deficiências na educação, por falta de escolas, professores e, inclusive, merenda escolar, o enfrentamento da bandidagem em plenos centros das cidades e meios rurais, o que revela a falta de segurança da população, que se queda atônita e completamente desamparada. Tudo isso afora a sonegação dos mínimos direitos constitucionais, dentre os quais proteção à maternidade e à infância, moradia, trabalho e assistência aos desamparados.

Enquanto indigitados ladrões do erário público, ministros, senadores, deputados, governadores, prefeitos e apaniguados detentores de cargos públicos se locupletam com o esbanjamento dos furtos propiciados pelas falcatruas e patifarias em detrimento da Nação, milhares de coitados sofrem nos hospitais públicos, jogados em macas pelos corredores e até mesmo no chão por falta de leitos. Essas imagens dolorosas confrangem a alma e o coração de quem as assiste, num transe desumano e cruel.

O remédio para combater e aniquilar esses homúnculos que se aboletaram em posições políticas de mando – os quais, em prática criminosa de atos de improbidade administrativa contra a Nação, furtaram bilhões de reais que deveriam ser aplicados em benefício da desassistida população – é eles receberem, com o devido rigor, o que a lei prescreve.

O produto dos crimes praticados, quando não aplicado no atendimento social pelo desvio dos fins, gera, em consequência, os horrores e as desgraças que acontecem nos hospitais públicos, com mortes por falta de atendimento hospitalar, de médico e de medicamentos, constituindo um verdadeiro assassinato pela ausência do combate à moléstia, na maioria das vezes curável. Em decorrência do desvio da verba própria, falta saneamento básico em zonas propícias às moléstias geradas pelos mosquitos e outros males, resultando em maleita, hepatite A, cólera e outras doenças que matam, indiscriminadamente, recém-nascidos, crianças, idosos e outras vítimas da miséria e da pobreza, desgraça debitada à corrupção, que impede a construção das obras necessárias.

Outras epidemias endêmicas que poderiam já ter sido combatidas e eliminadas também podem ser debitadas na conta da corrupção, assim como a falta de atendimento em saúde, educação e moradia. A fome e a miséria poderiam ter sido pelo menos atenuadas, se não houvesse, não só no País como no exterior, uma corrupção endêmica, a qual, no Brasil,  é superior a 50 bilhões de dólares, todos os anos!

É triste ler, nos jornais, cartas de leitores com qualificativos jocosos sobre assuntos que deveriam ser levados a sério e não no deboche, como se a honra, a dignidade, a moralidade, a ética, o respeito, o patriotismo e outros predicados cívicos e morais tivessem deixado de existir, dando lugar à corrupção e à ladroagem pública, ao desrespeito, à imoralidade, à traição, à falsidade, ao roubo público e até consentido.

Diante dessa constrangedora descrição, se não houver uma firme disposição de  combater a corrupção sob todos os meios  e condições, como já se vislumbra com as posições cívicas e patrióticas da OAB, CNBB, Frente Parlamentar de Combate à Corrupção e ABI, e com a  disposição proclamada pela presidenta Dilma Rousseff e seu diligente Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, poderá se chegar à triste conclusão de que o País perdeu a inteligência e a consciência moral, pois já não há princípio que não esteja sendo desmentido nem instituição que não esteja sendo escarnecida. É patente que não se acredita mais na honestidade dos homens públicos. Enquanto isso, a classe média, enfastiada, abate-se progressivamente na inércia.