Perspectivas de curtíssimo prazo para o transporte público urbano no Brasil

9 de abril de 2014

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Andre-DantasMuitos conhecem o ditado que diz: “O futuro é o resultado do que fazemos hoje”. Esse ditado não é uma verdade absoluta, mas é inquestionável no que se refere às consequências de nossas atitudes, ou à ausência delas, como pessoas, instituições, comunidade e nação. Em particular, muitos esquecem desse ditado quando situações extremas e negativas têm que ser enfrentadas. Frequentemente, as crises resultam da incapacidade de entender as consequências de escolhas equivocadas e/ou de perceber os sinais de alerta observados por todos os lados.

Infelizmente, existem indícios consideráveis apon­tando para uma situação bastante crítica no transporte público urbano nos próximos meses. Esses indícios são diversos e vêm se acumulando nos últimos anos. Por um lado, a situação social e econômica da população brasileira revela que entre 2005 e 2010 mais de 45 milhões de pessoas migraram da classe D/E para a classe C. Esse contingente populacional possui um perfil bastante diferenciado, que inclui expectativas de qualidade de vida muito maiores do que aquelas anteriormente observadas. Entre essas expectativas, a questão da mobilidade urbana inclui toda a dinâmica de deterioração das condições de deslocamento, em função da massificação do transporte individual, em detrimento dos investimentos em trans­portes públicos de qualidade. Consequentemente, existe uma percepção de que é inaceitável o distanciamento entre a qualidade dos serviços ofertados pelo poder público e demandados pela população.

Por outro lado, e de forma complementar, verifica-se que os efeitos inflacionários têm agravado cada vez mais o desempenho e a produtividade dos sistemas de transporte público urbano por ônibus nas prin- cipais cidades brasileiras. Gradualmente, os custos dos principais insumos do setor têm aumentado. Segundo dados do IBGE, os preços do óleo diesel, dos lubrificantes, dos pneus e das câmaras de ar, dos veículos e dos salários de funcionários sofreram reajustes que contribuíram para o aumento dos custos da ordem de 5,99%, no último ano. No mesmo período, no entanto, houve uma redução média nacional de 4,7% das tarifas do transporte público por ônibus das capitais. Essa combinação de aumento dos custos e redução das tarifas ocorreu concomitantemente à queda de produtividade em termos de redução da velocidade operacional, devido aos constantes congestionamentos e à operação em tráfego misto sem qualquer medida de priorização, e à queda de 30% no número de passageiros, que se consolidou ao longo dos últimos 18 anos.

Muito provavelmente, os próximos seis meses inclui­rão outros aumentos nos principais itens de custos do setor. Diariamente, rumores circulam sobre o iminente reajuste do preço dos combustíveis, pois a Petrobras tem operado com valores muito abaixo daqueles praticados internacionalmente. O recente aumento do óleo diesel (8%) teve impacto direto da ordem de 1,91% nos custos das empresas operadoras. Ademais, a temporada de negociações dos dissídios coletivos dos trabalhadores do setor inicia-se em janeiro e se estenderá até maio de 2014. Se nenhuma ação for tomada nos próximos meses, é muito provável que retornaremos à adoção do tão indesejado e famoso “gatilho” de reajuste de preços e salários, que contribuiu significativamente para o período de hiperinflação nos anos 80.

Sabendo dessas perspectivas de curtíssimo prazo, resta-nos um posicionamento firme seguido de ações contundentes para que o futuro imediato seja promissor e repleto de avanços. Há que se buscar medidas emergenciais desenvolvidas nacional e localmente. Um exemplo de medida emergencial é o recém lançado Pro­grama Emergencial de Qualificação e Racionalização do Transporte Público da NTU, que poderia contribuir para melhorar a produtividade do sistema. Caso seja rapidamente apoiado pelo Governo Federal e desenvolvido pelos municípios, existe a perspectiva de implantar 4 mil quilômetros de faixas exclusivas em 46 das principais cidades brasileiras. Essa intervenção contribuiria para melhorar a qualidade dos serviços e, ao mesmo tempo, resultaria em reduções significativas das ineficiências que refletem nos custos tarifários. Obviamente, outras medidas tais como a desoneração dos tributos teriam reflexos imediatos no enfrentamento da crise que se aproxima. Então, é preciso agir antes que o futuro chegue e com ele os resultados de nossas escolhas. Caso contrário, estaremos expostos a consequências diversas, como a queda da qualidade dos serviços, o desemprego e a inviabilização de uma parte significativa das atividades urbanas.