Edição 163
Perspectivas de curtíssimo prazo para o transporte público urbano no Brasil
9 de abril de 2014
Diretor Técnico da NTU
Muitos conhecem o ditado que diz: “O futuro é o resultado do que fazemos hoje”. Esse ditado não é uma verdade absoluta, mas é inquestionável no que se refere às consequências de nossas atitudes, ou à ausência delas, como pessoas, instituições, comunidade e nação. Em particular, muitos esquecem desse ditado quando situações extremas e negativas têm que ser enfrentadas. Frequentemente, as crises resultam da incapacidade de entender as consequências de escolhas equivocadas e/ou de perceber os sinais de alerta observados por todos os lados.
Infelizmente, existem indícios consideráveis apontando para uma situação bastante crítica no transporte público urbano nos próximos meses. Esses indícios são diversos e vêm se acumulando nos últimos anos. Por um lado, a situação social e econômica da população brasileira revela que entre 2005 e 2010 mais de 45 milhões de pessoas migraram da classe D/E para a classe C. Esse contingente populacional possui um perfil bastante diferenciado, que inclui expectativas de qualidade de vida muito maiores do que aquelas anteriormente observadas. Entre essas expectativas, a questão da mobilidade urbana inclui toda a dinâmica de deterioração das condições de deslocamento, em função da massificação do transporte individual, em detrimento dos investimentos em transportes públicos de qualidade. Consequentemente, existe uma percepção de que é inaceitável o distanciamento entre a qualidade dos serviços ofertados pelo poder público e demandados pela população.
Por outro lado, e de forma complementar, verifica-se que os efeitos inflacionários têm agravado cada vez mais o desempenho e a produtividade dos sistemas de transporte público urbano por ônibus nas prin- cipais cidades brasileiras. Gradualmente, os custos dos principais insumos do setor têm aumentado. Segundo dados do IBGE, os preços do óleo diesel, dos lubrificantes, dos pneus e das câmaras de ar, dos veículos e dos salários de funcionários sofreram reajustes que contribuíram para o aumento dos custos da ordem de 5,99%, no último ano. No mesmo período, no entanto, houve uma redução média nacional de 4,7% das tarifas do transporte público por ônibus das capitais. Essa combinação de aumento dos custos e redução das tarifas ocorreu concomitantemente à queda de produtividade em termos de redução da velocidade operacional, devido aos constantes congestionamentos e à operação em tráfego misto sem qualquer medida de priorização, e à queda de 30% no número de passageiros, que se consolidou ao longo dos últimos 18 anos.
Muito provavelmente, os próximos seis meses incluirão outros aumentos nos principais itens de custos do setor. Diariamente, rumores circulam sobre o iminente reajuste do preço dos combustíveis, pois a Petrobras tem operado com valores muito abaixo daqueles praticados internacionalmente. O recente aumento do óleo diesel (8%) teve impacto direto da ordem de 1,91% nos custos das empresas operadoras. Ademais, a temporada de negociações dos dissídios coletivos dos trabalhadores do setor inicia-se em janeiro e se estenderá até maio de 2014. Se nenhuma ação for tomada nos próximos meses, é muito provável que retornaremos à adoção do tão indesejado e famoso “gatilho” de reajuste de preços e salários, que contribuiu significativamente para o período de hiperinflação nos anos 80.
Sabendo dessas perspectivas de curtíssimo prazo, resta-nos um posicionamento firme seguido de ações contundentes para que o futuro imediato seja promissor e repleto de avanços. Há que se buscar medidas emergenciais desenvolvidas nacional e localmente. Um exemplo de medida emergencial é o recém lançado Programa Emergencial de Qualificação e Racionalização do Transporte Público da NTU, que poderia contribuir para melhorar a produtividade do sistema. Caso seja rapidamente apoiado pelo Governo Federal e desenvolvido pelos municípios, existe a perspectiva de implantar 4 mil quilômetros de faixas exclusivas em 46 das principais cidades brasileiras. Essa intervenção contribuiria para melhorar a qualidade dos serviços e, ao mesmo tempo, resultaria em reduções significativas das ineficiências que refletem nos custos tarifários. Obviamente, outras medidas tais como a desoneração dos tributos teriam reflexos imediatos no enfrentamento da crise que se aproxima. Então, é preciso agir antes que o futuro chegue e com ele os resultados de nossas escolhas. Caso contrário, estaremos expostos a consequências diversas, como a queda da qualidade dos serviços, o desemprego e a inviabilização de uma parte significativa das atividades urbanas.