Edição 53
Porque e como subsidiar o transporte público
5 de dezembro de 2004
Luiz Carlos de Urquiza Nóbrega Técnico em transportes e Diretor da Associação Comercial do Rio de Janeiro
Três grandes acontecimentos sobre transporte público ocorreram na cidade do Rio de Janeiro, nos dias 10, 11 e 12 de novembro: o 11º Congresso sobre Transporte de Passageiros; o seminário “Pacto Federativo para o Transporte Público – uma Agenda para o Barateamento das Tarifas” e a 5ª Feira Rio Transportes.
A prioridade dos temas tratados e o nível de conferencistas, autoridades e especialistas que participaram dos trabalhos permitem previsão de resultados práticos e imediatos, por imperativos de interesse público e clamor da sociedade, expresso pelo MDT – Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos.
Com efeito, não há mais como protelar medidas conjuntas e convergentes da União, dos Estados e Municípios, destinadas a definir e operar políticas públicas que priorizem de modo concreto o transporte coletivo em nossas cidades e metrópoles.
As razões para a urgência dessas definições são múltiplas e graves: 1º) A poluição ambiental causada por milhões de automóveis e outros veículos retidos em congestionamentos ou circulando em baixa velocidade vem comprometendo seriamente a qualidade do ar e, conseqüentemente, a saúde da população e do planeta; 2º) Especialistas calculam que aproximadamente são sacrificados na existência de homens e mulheres, três anos de suas vidas consumidos em enervantes engarrafamentos; 3º) É incalculável a queima inútil e irracional de derivados do petróleo (gasolina, óleo diesel e gás natural veicular), consumidos, sem qualquer vantagem para a economia, em trânsito crescentemente caótico nas vias urbanas; 4º) Os custos dessas irracionalidades são inevitavelmente repassados na produção de bens e serviços, afora conseqüências não mensuráveis na saúde da população, na produtividade da força de trabalho e na qualidade de vida. Calcula-se um prejuízo de 5 bilhões de reais por ano com o tempo perdido de horas não trabalhadas.
O Brasil está com mais de meio século de atraso em relação à Europa e aos Estados Unidos em políticas apropriadas de transporte. De fato, nos países mais adiantados, há décadas seus governantes compreenderam que transporte público de qualidade e confiável deveria ser tratado como elemento propulsor do desenvolvimento social e econômico. Portanto, deveria ser encargo do estado lato sensu, com recursos da sociedade, subsidiar a atividade e promovê-la de modo contínuo e vigoroso. Veja-se o quadro (pág. 12) que mostra a porcentagem de subsídios nas tarifas pagas pelos usuários em algumas cidades da Europa.
Nos Estados Unidos, há muito tempo o poder público assumiu elevada parte dos custos. Na cidade de Nova Iorque, o usuário do metrô, dos trens suburbanos e dos ônibus só paga 50% dos custos. Na capital do Estado, Albany, os ônibus são subsidiados em 70%.
Em regra esses subsídios europeus e americanos são injetados diretamente nas operadoras estatais ou privadas, exigindo forte burocracia de controle e auditagem.
No Brasil, assiste-se ao exemplo da cidade de São Paulo, com a tarifa única, impondo subsídios do orçamento público ainda não claramente mensurados. A burocracia de controle dos subsídios também não se revela clara.
Como praticar os subsídios?
A partir da elevada estrutura de custos das empresas operadoras dos serviços de ônibus – modal que atende a 90% da população fluminense – e de equivocadas políticas de benefícios tarifários, é possível montar prático e eficiente modelo de subsídio, dentro do almejado pacto federativo.
As medidas que simplificarão o processo e reduzirão as tarifas poderão ser:
– eliminação da forte carga tributária incidente sobre as operadoras, da ordem de 32% dos respectivos custos; as perdas da receita por parte dos municípios, estados e da União poderão ser compensadas com aumento nas alíquotas do IPVA e do IPI sobre automóveis, utilitários e respectivos assessórios;
– assunção, por municípios, estados e União, nos respectivos serviços de transporte público jurisdicionados dos encargos de gratuidade – idosos, estudantes, deficientes e doentes crônicos – desonerando em conseqüência esses custos, hoje total ou parcialmente repassados para as tarifas; estima-se que essa despesa, atualmente, é da ordem anual de 6 milhões de reais, que poderão ser reduzidos se houver substituição do atual modelo linear, que na maioria dos casos não leva em conta o nível de renda do beneficiário, critério mais justo já adotado pelo Bolsa Família;
– subsídio, pela União de 50% do óleo diesel e do GNV efetivamente consumidos pelas empresas concessionárias, fazendo-se a compensação mediante adicional no preço da gasolina e do álcool.
Certamente outras medidas poderão ser adotadas para a melhoria da qualidade e da produtividade do transporte público, como investimento em corredores expressos para ônibus e terminais de integração, expansão paulatina da redes de transporte de massa e desestímulo gradual ao uso perdulário do automóvel, em face da boa opção do coletivo, no interesse social.
Se levado em conta que 40% dos usuários do transporte coletivo já dispõem do subsídio do vale-transporte concedido pelos empregadores, a conjugação desse importante mecanismo com as medidas acima sugeridas acarretarão histórico avanço na melhoria do transporte público no Brasil, reduzindo custos para todos, provendo inclusão por justiça social e induzindo maior desenvolvimento econômico e melhor qualidade de vida.