Quebra das Instituições

30 de julho de 2003

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(Editorial originalmente publicado na edição 36, 07/2003)

“Se o tráfico vencer um braço do Estado, acabou. Nós passamos o poder para eles. Nós sabemos que tem que ter autorização do tráfico nessas comunidades. Isso é do conhecimento nacional, e não só do Rio de Janeiro. Para alguém ser eleito deputado e fazer um trabalho comunitário, tem que ter autorização.”
Tenente-Coronel Erir Ribeiro, ex-comandante 4º BPM

As contundentes declarações do ex-comandante do 4º Batalhão de Polícia Militar do Rio de Janeiro, tenente-coronel Erir Ribeiro, publicadas no jornal O Globo, edição de 24 de maio passado, representam, infelizmente, a quebra e a desmoralização do Estado Democrático de Direito que imaginamos estar vivendo.

Desde a promulgação da Constituição Federal, em 05 de outubro de 1988, não se ouvia de uma autoridade constituída uma declaração tão humilhante e tão desmoralizadora contra as instituições vigentes quanto a do ex-comandante de Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Um dos princípios básicos da Constituição – alçada como cláusula pétrea e direito milenar de propriedade, está presentemente sendo desmoralizado e desonrado com a omissão consentida do poder constituído, que se encontra humilhado e encurralado por uma onda de líderes baderneiros e celerados, pondo em risco a tranquilidade dos legítimos possuidores das propriedades – que já anunciam e se aprontam para um revide que poderá como uma chispa, deflagrar e ensanguentar toda zona rural. Onde está o governo?

Os inconsequentes pronunciamentos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, contra os Poderes Judiciário e Legislativo, com os quais têm afrontado os princípios constitucionais, estão causando constrangimentos, revide e revolta, como demonstrado pela contradita dos membros do Judiciário e Legislativo, das associações de magistrados, do Ministério Público e inclusive da OAB.

É até compreensível – pela frustração que representam – os pronunciamentos do presidente Lula, que nestes meses do seu noviciado no governo, estão demonstrando a impaciência em não poder pôr em prática os programas e promessas que foram feitas continuadamente durante todos esses anos em que disputou a presidência da República.

Entretanto, a menos que o presidente Lula seja desmemoriado, não pode jamais esquecer da sua participação efetiva na promulgação da CF/88, a qual, entre outros princípios, constituiu garantias como cláusulas pétreas, que asseguram taxativamente a independência e harmonia dos Poderes da República, e firmaram expressamente os direitos inarredáveis que implicitam e consagram o direito adquirido e a coisa julgada – questões estas, que durante toda a sua vivência sindical e política, defendeu ardorosamente perante todos os setores, principalmente os trabalhadores, funcionários públicos federais, estaduais e municipais –, o que incontestavelmente alavancou e propiciou a sua vitória eleitoral.

Nos tempos atuais, quando a nação vive em pleno e regular Estado Democrático de Direito, com funcionamento inconsútil das instituições, não há clima e tempo que propicie a revogação dos princípios constitucionais, tornado-se vedado a quem quer que seja, desconhecer e tentar mudar as regras impostas pela Carta Constitucional.

Fora disto, é evocar a prática dos sonhos de Malatesta, Proudhon, Bakunin e outros anarquistas.

É hora de reflexão, de lembrar das consequências e resultados como a quebra da ordem e da hierarquia; da indisciplina e abastardamento das instituições em 1964, e inclusive, lembrar o legado desastroso do ex-presidente Collor e suas consequências.