Edição 288
Segurança para os membros do MP é fundamental para o Estado Democrático de Direito
5 de agosto de 2024
Tarcísio Bonfim Presidente da Conamp
Os membros do Ministério Público são responsáveis pelo cumprimento diário de inúmeras responsabilidades decorrentes de sua missão constitucional. Não apenas desempenham atividades administrativas e judiciais, mas também atuam fortemente, ao lado de outras instituições no combate à criminalidade e à corrupção. Isso os coloca em risco real, afetando suas vidas pessoais e de suas famílias com ameaças constantes e, em casos extremos, até homicídios, existindo, infelizmente, várias ocorrências destes casos no Brasil e na América Latina.
Diante desta realidade, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), que representa mais de 16 mil profissionais no Brasil, apresentou, em 2020, à Procuradoria-Geral da República (PGR) um projeto de lei buscando o reconhecimento do risco inerente das atividades exercidas por Procuradores e Promotores de Justiça.
A Câmara dos Deputados já aprovou um texto que reconhece o risco contínuo e intrínseco às atividades do Ministério Público e da magistratura. Esse projeto de lei torna crime os homicídios ou lesões corporais dolosas cometidos contra os familiares e os membros dessas carreiras devido ao exercício de suas funções.
Aqui é fundamental saudar a atuação do ex-presidente Manoel Murrieta, que, ao longo de duas gestões, não poupou esforços para garantir que a segurança dos membros do Ministério Público fosse tratada como prioridade, bandeira esta que se espraiou na FLF e na IAP. Seu compromisso e sua dedicação foram fundamentais para avançar a agenda de proteção e reconhecimento dos riscos enfrentados pelos nossos colegas, deixando um legado importante que continuaremos a fortalecer.
O texto aprovado, uma versão apresentada pelo relator deputado Federal Rubens Pereira Júnior (PT-MA) para o Projeto de Lei no 996/2015, originalmente proposto pelo ex-deputado Roman (PR), define medidas para assegurar a segurança desses profissionais e proteger a confidencialidade de seus dados pessoais.
Por sua vez, no âmbito do Senado Federal (PL no 4.015/2023 – antigo PL no 996/2015), foi sob a relatoria do senador Weverton Rocha (PDT-MA) que a matéria teve apreciação na Comissão de Constituição e Justiça e no plenário, sendo aprovada com ajustes que resultaram no seu retorno à Câmara dos Deputados. Sem dúvida, sua aprovação definitiva representa conquista significativa para a carreira e para a sociedade brasileira.
Busca-se que a normativa garanta proteção aos membros da instituição por meio de solicitação encaminhada à polícia judiciária com descritivo dos fatos e dos documentos relevantes. O processo será priorizado e mantido em sigilo, com as primeiras medidas sendo implementadas imediatamente. O projeto lista, entre outras ações para garantir a segurança individual, o uso de coletes à prova de balas, de veículos blindados e de escolta.
Desde 2015, em seu art. 121, §1o, inciso VII, o Código Penal já estabelece penas para o homicídio qualificado praticado contra autoridades ou agentes descritos nos arts. 142 e 144 da CF, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, variando de 12 a 30 anos de reclusão, podendo ser aplicada quando o crime for cometido contra cônjuge, parceiro ou parente até o terceiro grau. Tal proteção é o escopo constante do referido projeto de lei, que visa punir com severidade o crime perpetrado contra os membros do Ministério Público ou da magistratura e seus familiares.
Da mesma forma, as lesões dolosas terão suas penas aumentadas em casos semelhantes. O texto também classifica como crime hediondo o homicídio qualificado, a lesão corporal gravíssima e a lesão seguida de morte quando praticadas contra esses agentes estatais responsáveis por combater a criminalidade.
Em relação a crimes cometidos por organizações criminosas, já existem diretrizes para a proteção pessoal dos membros do Ministério Público e da magistratura, bem como de suas famílias. O substitutivo do Deputado Rubens Júnior inclui medidas específicas, como reforço na segurança, escolta total ou parcial, coletes à prova de balas, veículos blindados e trabalho remoto. Também é possível a remoção temporária, mediante solicitação do membro do Ministério Público ou do Poder Judiciário, com garantias de assistência na mudança, transporte e acesso a instituições educacionais públicas para seus filhos e dependentes.
A concessão da escolta será avaliada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ou pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Caso a solicitação de reforço de segurança ou uso de colete balístico seja negada, será possível recorrer à instância hierárquica superior.
Quanto à proteção de dados, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) enfatiza que o risco associado ao desempenho das funções dos membros do Ministério Público e do Poder Judiciário deve ser sempre considerado. Qualquer vazamento ou acesso não autorizado desses dados, que possa ameaçar a integridade do titular, será comunicado à Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Esta tomará medidas urgentes para mitigar os efeitos do incidente. A LGPD também prevê multas diárias ou únicas pelo não cumprimento de suas diretrizes. O Projeto de Lei no 996/2015 estipula que essas multas sejam dobradas quando se referirem a dados pessoais tratados pelo texto.
É importante lembrar que, no dia a dia, procuradores e promotores de Justiça enfrentam o crime organizado, combatem a corrupção e lidam com grupos criminosos, estando profundamente envolvidos na luta contra a criminalidade grave. Os riscos inerentes à função advém não somente do enfrentamento do crime organizado, mas, por vezes, a atuação firme do Ministério Público na defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis atinge interesses de pessoas e grupos poderosos, o que se constata, na atualidade, com muitos membros do Ministério Público sob proteção devido a ameaças e riscos sérios às suas vidas e de suas famílias.
Portanto, a atuação do Ministério Público se estende tanto à esfera administrativa quanto extrajudicial, abrangendo todas as etapas de processos civis ou criminais para proteger os direitos legais estabelecidos pela Constituição e pelas leis. Em suma, é função do Ministério Público resguardar o interesse público.
Na apresentação das acusações, membros do Ministério Público participam de audiências com os acusados e, em casos de crimes dolosos contra a vida, comparecem às sessões do tribunal do júri, onde apresentam oralmente os fatos e elementos do caso e, ao final, pedem a condenação dos acusados.
O Ministério Público também busca, por meio de ações penais e civis apropriadas, a punição nos âmbitos penal, civil e administrativo dos autores de ilícitos em geral. Essas responsabilidades destacam a importância de reconhecer que a atuação dos membros do Ministério Público envolve uma amplitude maior e acarreta riscos significativos e que não são abstratos, uma vez que concretamente vários membros da instituição já foram vítimas de investidas em razão de suas atuações na defesa dos direitos da sociedade.
Esse passo pode não apenas melhorar a atuação do Ministério Público, mas também fortalecer a democracia brasileira e o Estado de Direito. O reconhecimento legislativo do risco inerente na atuação dos membros do Ministério Público é fundamental para garantir maior segurança à atuação estratégica dos procuradores e promotores de Justiça brasileiros no enfrentamento à corrupção e à criminalidade grave, questões urgentes e de interesse de toda a sociedade.
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