Sentido prático e real da globalização

31 de março de 2007

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O cenário mundial, nos dias de hoje, tem a especulação como pano de fundo. Milhões de jovens operadores, à frente de seus computadores, “viajam” por todos os mercados financeiros, de serviços e de commodities, colhendo ou divulgando informações, análises e relatórios. A utilização desses dados é manipulada de acordo com os interesses de cada um, formando um gigantesco caleidoscópio de especulações no amplo quadro da globalização.

Esses operadores são os responsáveis pelas variações, de curto prazo, nos preços das mercadorias que indicarão o curso da inflação, fazendo subir ou baixar as cotações das ações nas Bolsas de Valores e das taxas de câmbio.

Uma notícia, por exemplo, sobre as negociações relacionadas à política nuclear do Irã ou da Coréia do Norte pode desencadear uma série de ações especulativas sobre o preço do petróleo, a inflação mundial, as taxas de juros nos Estados Unidos, ou uma relação de ordem inversa, começando com as variações nos preços das commodities na Bolsa de Chicago ou das cotações dos metais, na Bolsa de Londres.

Especulou-se, nos últimos dias, que a inflação média norte-americana, em janeiro, teria sido de 0,3%, o que poderia levar o FED, o banco central dos Estados Unidos, a manter, por um prazo maior, a taxa de juros de 5,25%. A partir daí, começa-se a especular se existem algumas “bolhas” nas Bolsas de Valores, em relação à cotação de ações que venham de uma longa tendência de alta.

No dia 27 de fevereiro último, houve uma corrida na Bolsa de Valores de Xangai, que caiu 8,8%. O “efeito China” teve características únicas: o jornal Legal Times denunciou que, por apropriações indébitas e fraudulentas, as empresas estatais chinesas tiveram prejuízo de US$ 45 bilhões, em 2004, e seguem tendo perdas de US$ 12 bilhões anuais. A trajetória de crescimento da China está ameaçada. Daí que a queda na Bolsa de Xangai teve um efeito dominó sobre o resto do mundo: a Bovespa caiu 6,62%; New York, 3,29%; Nasdaq, 3,86%;Tóquio, 0,52%; Londres, 2,96% e Malásia, 2,81%.

As Bolsas chinesas operam com um montante de capital de US$ 1,16 trilhão, e a queda nas cotações estaria também ligada ao anúncio de que serão impostas restrições ao ingresso de capitais estrangeiros. Sobre o efeito China, e com maior força, acrescentem-se as desastrosas declarações do ex-presidente do FED Allan Greenspan, de que a economia norte-americana caminha para uma recessão no final deste ano. Os diretores dos bancos centrais estão navegando na contramão, até mesmo quando já estão aposentados.

Está aberta, pelos especuladores, mais uma “temporada de caça”.

É perfeitamente possível admitir que, a médio e longo prazos, essas especulações serão neutralizadas, em um sentido ou em outro, desde que os principais indicadores apontem na direção de que a economia americana continuará crescendo sustentadamente e também a China, que hoje representa, em ordem de importância, o segundo centro de gravidade da economia mundial. Para que se tenha uma idéia da importância da China, basta lembrar que sua produção siderúrgica (450 milhões de toneladas) é 4,5 vezes a produção dos Estados Unidos e 12 vezes a do Brasil.

Com todo esse poder de fogo, a China vem dando um extraordinário impulso à economia mundial, desde 1980, porém, a partir de agora, passa a exercer também uma ação comercial predatória, no processo de globalização iniciado nos anos 90.

Estados Unidos e China são as duas “variáveis” mais importantes, que continuarão comandando a evolução dos mercados mundiais. O governo brasileiro não pode deixar de estar atento a essa evolução, com o sentido de proteger, legitimamente, a indústria nacional e garantir a capacidade competitiva de nossas empresas nos mercados externos. Para tanto, é importante descartar-se de ultrapassadas ideologias, que ainda prevalecem em alguns de nossos ministérios, a começar pela política externa, embora já se note uma sinalização “renovadora” no relacionamento com os Estados Unidos.