A trajetória da Justiça Eleitoral

24 de novembro de 2014

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Fernando-AlencastroA Justiça Eleitoral surge a partir da necessidade percebida por um grupo de políticos em romper com as práticas eleitorais do segundo período da República Velha, como a política do café com leite, o pacto dos governadores e o coronelismo, elementos de sustentação eleitoral da elite política republicana entre os anos de 1894 a 1930. Os governos republicanos, no exercício do poder, iriam caminhar em direção à preponderância progressiva de resultados eleitorais ao arrepio da vontade popular. (Portal São Francisco, 2012).

Em 1891, a primeira Constituição republicana, inspirada na Constituição norte-americana, estabelecia o federalismo e o presidencialismo como princípios norteadores do regime republicano. A Igreja foi desvinculada do Estado e estabeleceram-se eleições diretas para os cargos públicos como presidente, governadores, senadores, deputados estaduais e federais.

Primeiro governou Deodoro da Fonseca. Sucedeu-o seu vice, Floriano Peixoto, que completou o mandato e consolidou a República. Esse período foi denominado de República da Espada, visto que ambos eram marechais.

O segundo período da República Velha, que vai de 1894 a 1930, foi dirigido principalmente pelas oligarquias paulista e mineira, representadas pelos cafeicultores paulistas e os pecuaristas mineiros. Esse período foi marcado pelo governo de presidentes civis. Esses políticos saiam do Partido Republicano Paulista (PRP) e do Partido Republicano Mineiro (PRM). Esses dois partidos controlavam as eleições, mantendo-se no poder de maneira alternada, e contavam com o apoio da elite agrária do país e dos coronéis, nas cidades do interior.

Braga assevera que:

As eleições na República Velha eram manipuladas pelo Presi­dente da República, sob a máquina montada pela “política dos governadores” em aliança com a oligarquia rural, os coronéis da terra – o poder local. O alistamento passou a ser permanente, mas era feito pelas autoridades municipais e pelas autoridades judiciárias que dependiam do Governo. As mesas eleitorais continuaram com as funções de apurar os votos e elaborar as atas, sendo mantidas as fraudes nas eleições “a bico de pena” para favorecer os candidatos oficiais. Embora a legislação eleitoral estabelecesse o voto secreto, na realidade, foi mantido o voto a descoberto. Nas eleições da República Velha era praticada toda a sorte de fraudes, a própria eleição favorecia a fraude. Os principais movimentos reivindicatórios sobre matéria eleitoral durante a República Velha foram a luta pelo voto secreto e a luta pelo voto feminino, que só vieram a ser adotados depois da Revolução de 1930. (BRAGA, 1990, p. 66)

O coronel – figura muito comum durante os anos iniciais da República, principalmente nas regiões do interior do Brasil – era o comandante máximo da Guarda Nacional. Essa Guarda foi criada em 1831 e substituiu as ordenanças da época colonial. Não era paga pelo Estado e não fazia parte da burocracia oficial. Era sustentada pelos comandantes, em geral proprietários rurais e comerciantes ricos. Os coronéis se transformaram em chefes políticos locais, conforme José Murilo de Carvalho (apud AVELAR e CINTRA, 2007, p. 25).

O coronel era um grande fazendeiro que utilizava seu poder econômico para garantir a eleição dos candidatos que apoiava. Era usado o voto de cabresto, em que o coronel (fazendeiro) obrigava e usava até mesmo de violência para que os eleitores de seu curral eleitoral votassem nos candidatos apoiados por ele. Como o voto era aberto, os eleitores eram pressionados e fiscalizados por seus capangas para que votassem nos candidatos indicados. O coronel também utilizava outros recursos para conseguir seus objetivos políticos, tais como: compra de votos, votos fantasmas, troca de favores, fraudes eleitorais e violência.

Victor Nunes Leal, autor do livro “Coronelismo, Enxada e Voto”, destacou o coronelismo como “resultado da superposição de formas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social inadequada”. O coronelismo seria “um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais”. Desse compromisso fundamental é que resultariam “as características secundárias do sistema “coronelista”, como sejam, entre outras, o mandanismo, o filhotismo, o falseamento do voto, a desorganização dos serviços públicos locais”. O eleitor, principalmente da área rural, cumpria apenas uma formalidade votando nos candidatos indicados (apud PORTO, 1995/2000, p. 253).

Na realidade, como afirma Cid Rebelo Horta (apud PORTAL SÃO FRANCISCO, 2008), “não eram eleições, mas, praticamente nomeações, com resultados certos e fatais, preestabelecidos. Faziam-se menos nas urnas que nas atas. Por isso, alguns políticos na prática costumavam fazê-la apenas nas atas, poupando trabalho e dinheiro”.

As fraudes, como voto de defuntos e ausentes, assinaturas falsas e o bico de pena completavam a prática eleitoral dirigida pela oligarquia. Se esses recursos não bastassem e ocorressem resultados que não atendiam às elites da República, estas contavam com a comissão de verificação de poderes que resolvia as dúvidas cassando o mandato dos indesejáveis dissidentes e opositores.

O coronel poderoso em sua região nunca fazia oposição ao governo estadual, pois dependia de verbas para obras no município e empregos para os correligionários e parentes. O pacto oligárquico anulava na prática a liberdade de voto e as eleições eram manipuladas pelas oligarquias.

Em 1930 ocorreriam eleições para presidência e, de acordo com a política do café com leite, seria a vez de assumir um político mineiro. Porém, o PRP, do presidente Washington Luís, indicou um político paulista, Júlio Prestes, à sucessão, rompendo com o café com leite. Descontente, o PRM junta-se a políticos da Paraíba e do Rio Grande do Sul e forma a Aliança Liberal para lançar à presidência o gaúcho Getúlio Vargas.

Júlio Prestes sai vencedor nas eleições de abril de 1930, deixando descontentes os políticos da Aliança Liberal, que alegam fraudes eleitorais.

Fato imprevisto agravou a crise: foi assassinado, a 26 de julho, em uma confeitaria do Recife, o governador da Paraíba, João Pessoa. Embora o assassino estivesse motivado por questões pessoais, João Pessoa figurou como candidato à vice-presidência de Getúlio Vargas, o que fez da sua morte uma grande comoção.

A Aliança Liberal foi muito influenciada pelo tenentismo, movimento de jovens militares que defendiam a moralização administrativa e política no país. Liderados por Getúlio Vargas, esses políticos e militares descontentes provocaram a Revolução de 1930.

Sobre a Revolução de 1930, Braga (1990, p. 68) discorre:

A Revolução de 1930 tinha como um dos seus princípios a reforma eleitoral. No Manifesto-Programa da Aliança Liberal constava a moralização do sistema eleitoral por meio da punição das fraudes, da implantação do voto secreto e do sistema de representação proporcional.

A Revolução de 1930 terminava com o domínio absoluto das oligarquias e encerrava a República Velha, na qual predominou a política dos governadores e da troca de favores entre governo federal e estaduais e a política do café com leite, com alternância de São Paulo e Minas Gerais na presidência da República.

É de Lima Sobrinho (1983, p. 163) a descrição da sensação que se apoderou na sociedade brasileira de então, um clima de festa nas ruas:

Toda a cidade vibrava, em delírio. Era a euforia cívica, na realização de um velho sonho revolucionário. E o entusiasmo não se limitava ao Rio. Todo o País fora presa, naquele dia, das mesmas expansões. Iam caindo por terra, silenciosamente, os derradeiros governos legais nos estados. Na Bahia, por volta das 12 horas do dia 24 de outubro, eram conhecidos os acontecimentos do Rio de Janeiro. Organizam-se logo passeatas, com os vivas normais à revolução e aos seus chefes.

A Revolução de 1930 foi, para muitos historiadores, o movimento mais importante da história do Brasil do século XX. Foi ela quem, para o historiador Fausto (1972, p. 112), acabou com a “hegemonia da burguesia do café, desenlace inscrito na própria forma de inserção do Brasil, no sistema capitalista internacional”.

A Revolução de 1930 tinha como um dos princípios a moralização do sistema eleitoral. Um dos primeiros atos do governo provisório foi a criação de uma comissão de reforma da legislação eleitoral, cujo trabalho resultou no primeiro Código Eleitoral do Brasil. Tinha como bandeira o lema Representação e Justiça, trazido ao movimento pelo gaúcho Joaquim Francisco de Assis Brasil.

Assis Brasil, que vivenciou a mudança da forma de governo no Brasil, de Monarquia à República, e nessa época já publicava seus primeiros livros, indignou-se com as fraudes com que eram realizadas as primeiras eleições da recém-proclamada República brasileira. Engaja-se assim no movimento revolucionário de 1930, dando suporte intelectual e político à Aliança Liberal, liderada por seu conterrâneo, Getúlio Vargas.

O jurista Luiz Carlos Lopes Madeira (2005) demonstra, em seu discurso na sessão comemorativa dos 60 anos do TSE, que a influência de Assis Brasil nos ideários eleitorais da Revolução de 1930 e na própria elaboração do Código Eleitoral de 1932 foi enorme.

Relata Lopes Madeira que, na quarta edição de “Democracia Representativa”, obra de Assis Brasil, estão os alicerces do que viria a ser o Código de 1932. Em linguagem escorreita e sóbria, analisa os fundamentos e as condições do voto, a representação das opiniões políticas e as eleições, passando em revista os principais sistemas da época. Foi no Manifesto de Montevidéu, como é conhecido o Manifesto da Aliança Libertadora do Rio Grande do Sul ao país, que, disse ele, conforme descrito pelo jurista Madeira (2005, p. 16):

O que há de fazer não são reformas sedativas, paliativas, remendos. O que reclama o augusto soberano, de quem só há apelação para ele mesmo – é a remodelação radical da República. Essa não poderá ser operada pelas delongas, chicanas e escusos desvios dos processos ordinários, nem sob a inspiração e a autoridade da mesma casta que foi causa ou instrumento do mal a suprimir. Essa remodelação necessária e inevitável há de ser feita com as naturais atenuações da doçura da índole brasileira, pelos meios sumários da revolução.
O Brasil pretende ser considerado um país civilizado: pois bem, o Brasil não dispõe das duas condições mais rudimentares e essenciais para tal, porque o Brasil não tem representação e não tem justiça.
[…]
Denunciada a causa do mal, está indicado virtualmente o remédio.
Eis a solução:
– contra a ausência de representação – o estabelecimento do voto secreto, única forma de voto sério; e a inscrição obrigatória, ou automática, dos cidadãos capazes, ao atingir a maioridade política.
[…]
– contra a falta de justiça– atribuição da legislação processual à legislatura federal; e efetivação da independência do Poder Judiciário, baseada na prerrogativa de nomear, mediante rigoroso concurso, os juízes primários, promovê-los até os mais altos postos por antiguidade ou mérito positivo, fiscalizando a ação de todos.

Ainda Madeira (2005, p.18), discorrendo sobre Assis Brasil, assim continua:

Vitoriosa a Revolução de 1930, aceita o Ministério da Agricultura. Ele, que recusara qualquer pasta sob Deodoro! Na despedida ao Rio Grande, registra as condições de sua participação:
Não disputemos lugares oficiais, nem recusemos a nossa colaboração quando solicitada. Deixemos a competição eleitoral, para quando houver eleições.
[…]
Só o que devemos fazer questão, mas essa fechada, intransigente, de honra e de sangue – é de cumprirem fielmente os postulados da revolução, a começar pelo sólido e leal estabelecimento dos quatro esteios mestres, das quatro colunas principais do edifício: alistamento automático, voto secreto, representação proporcional, independência dos juízes. Resumo – Representação e Justiça.

E no mesmo discurso traz Madeira (2005, p. 18) a opinião de Afonso Arinos sobre Assis Brasil:

É muito curiosa a presença de Assis Brasil no processo político brasileiro, especialmente no processo das ideias políticas. Se há um homem que tenha contribuído originalmente no campo das ideias políticas, foi Assis Brasil. Ele é de fato o principal cientista político do princípio da República até 1930, e mesmo depois de 1930. Assis Brasil não era um jurista, embora o pensamento político dele muitas vezes se revestisse de conteúdo jurídico importante. Não tinha tampouco preocupação especial em matéria de sociologia. Era antes de tudo um pensador político. Os seus livros – como a Democracia representativa, que publica pouco depois de Da República e do regime presidencial – são estudos memoráveis pelo que contêm de antecipação política.

Gaúcho de Pedras Altas, deputado à Assembleia provincial do Rio Grande do Sul nas últimas legislaturas do Império, deputado à Constituinte de 1890 e diplomata, sua preocupação sempre foi a de que ninguém tinha garantido o reconhecimento como eleitor; se fosse eleitor, se votava; e se votasse, se o seu voto seria apurado de maneira que ele pudesse representar a vontade popular. Nos anos que antecedem a Revolução de 1930, as eleições são uma ficção.

Após a implantação da Justiça Eleitoral, sob sua inspiração, os eleitores escolhem os representantes para os principais postos de poder, e pouca gente duvida da legitimidade do processo eleitoral brasileiro. As fraudes foram amplamente eliminadas. Portanto, considerando todas as suas obras publicadas e os seus ideais eleitorais, Joaquim Francisco de Assis Brasil pode ser considerado como o referencial teórico da existência da Justiça Eleitoral brasileira.

O Código Eleitoral de 1932 é um marco na história institucional brasileira, pois evolui de um sistema eleitoral parlamentar, quando o legislativo era o poder que organizava as eleições, e passa a adotar o atual sistema eleitoral jurisdicional, no qual o judiciário, pela atuação da Justiça Eleitoral é quem, além de organizar as eleições, julga a conduta dos candidatos e normatiza o pleito.

Costa Porto (1990/2000, p. 125) destaca que, assu­mindo a chefia do Governo Provisório, após a revolução de 1930, Getúlio Vargas designou, pelo Decreto n. 19.459, de 6 de dezembro de 1930, uma subcomissão legislativa para estudar e propor a reforma da lei e do processo eleitorais. O grupo, composto por Assis Brasil, João G. da Rocha Cabral e Mário Pinto Serva, julgou que sua tarefa deveria ser dividida em duas partes, a primeira dizendo respeito ao alistamento dos eleitores – projeto publicado em setembro de 1931 –, a segunda, referente ao processo de eleições.

Os avanços realizados pela subcomissão na elaboração da reforma eleitoral desembocam no Decreto n. 20.076, de 24 de fevereiro de 1932, instruindo novo Código Eleitoral para o país. Esse decreto, que regulamentava em todo o país o alistamento e as eleições federais, estaduais e municipais, trazia uma série de inovações.

A maior delas, sem dúvida, era o estabelecimento do sufrágio universal direto e secreto. O voto secreto – uma das medidas consideradas básicas para a moralização da prática eleitoral no Brasil – constituiria um dos pontos-chave de toda a campanha da Aliança Liberal. A conquista do voto secreto representava aspiração antiga de todos aqueles que, vendo-se excluídos do poder, lutavam para alcançá-lo ainda na década de 1920 (COSTA PORTO, 1995/2000, p. 125).

Segundo o mesmo autor, nesse sentido, a consagração do voto secreto significava não só o cumprimento de uma primeira grande promessa da Revolução, o saneamento dos costumes políticos do país, como também passo essencial para a reintegração do Brasil ao futuro regime constitucional. Além disso, o novo código ampliava o corpo político da nação, concedendo o direito de voto a todos os brasileiros maiores de 21 anos, alfabetizados, sem distinção de sexo. Pela primeira vez, as mulheres conquistavam o exercício da cidadania, o que, além de ter significado político muito importante, implicava acréscimo numérico substancial ao corpo de votantes.

Em relação à obrigatoriedade do alistamento e do voto, a Subcomissão preferiu não adotá-la pura e simplesmente, preferindo optar por meios que estimulassem e forçassem a prática do exercício do voto. O Código Eleitoral estabelecia também a representação proporcional para todos os órgãos coletivos de natureza política do país, questão que vinha sendo anteriormente debatida no âmbito do direito constitucional brasileiro e criava, como grande inovação, a representação política das classes.

Braga (1990, p. 68) descreve que o Código Eleitoral de 1932 passou para a Justiça Eleitoral todos os trabalhos eleitorais: alistamento, organização das mesas, apuração dos votos, reconhecimento e proclamação dos eleitos, atribuindo-lhe essas competências. Esse código instituiu o voto secreto, o voto feminino e o sistema de representação proporcional e regulou em todo o País as eleições federais, estaduais e municipais.

O novo código instituía a Justiça Eleitoral, composta por um Tribunal Superior no Distrito Federal, por Tribunais Regionais em todas as capitais de estado e por juízes eleitorais nas comarcas e distritos. Tal iniciativa eliminava um dos maiores problemas eleitorais do país, uma vez que retirava do poder legislativo a faculdade de fiscalizar as eleições e reconhecer os candidatos eleitos.

Essa havia sido a base formal sobre a qual se assentara o mecanismo da chamada política dos governadores da República Velha, que perpetuava no poder os situacionismos locais, bloqueando pelas degolas a ascensão de quaisquer candidatos de oposição. O estabelecimento da Justiça Eleitoral, ao lado do voto secreto, ganhava a dimensão de um ato de moralização da vida política no Brasil, possibilitando a livre expressão da vontade popular e a abertura do jogo político democrático com a participação efetiva das oposições.

O próprio Assis Brasil, em discurso na constituinte de 1933, entusiasma-se ao afirmar que:

Agora, o Brasil já teve a sua oportunidade de possuir a sua lei de representação. Ele já deu a melhor prova que jamais poderá dar. Estou mesmo convencido de que, nos poucos anos que me restam de vida, não terei oportunidade de observar outro espetáculo como ao que assistimos quando da eleição desta Assembleia. Não tínhamos educação para compreender os seus termos, o seu espírito, mesmo porque ela tem muito de original: não é cópia de lei alguma. Começa por isto: somos o primeiro país do mundo que fez um código eleitoral. (ASSIS BRASIL, 1934, p. 501-504)

Marco Maciel, então Senador pelo Partido Democratas (DEM) de Pernambuco, ao discursar na sessão do Senado Federal do dia 24 de março de 2008, assim se manifestou sobre o Código de 1932:

Assis Brasil, de fato, foi um grande político. Divergiu de Getúlio Vargas, mas não se negou a colaborar com ele após a Revolução de 30, que foi uma revolução que teve um caráter renovador.
Contam, não sei se é verdade, que Getúlio Vargas desejou contar com a colaboração de Assis Brasil, mas achou que este, por ser seu adversário, certamente iria recusar. Usou, então, um interlocutor para conversar com Assis Brasil, que teria dito: “Olha, toda pessoa tem um preço. Para colaborar, cobro o meu preço”. Getúlio, por meio desse interlocutor, teria então perguntado: “Qual é o seu preço?”. Ele teria então respondido: “O meu preço é que ele execute aquilo que são minhas ideias. Se ele aceitar minhas ideias, meu preço é esse. Colaboro se ele concordar com aquilo que eu penso que deva ser feito”. Getúlio, então, concordou com a ideia de Assis Brasil.
A partir daí, tivemos um Código Eleitoral, o de 1932, o que representou uma grande inovação, pois muitos países do mundo ainda não tinham Código Eleitoral. Muitos, aliás, ainda não têm uma Justiça Eleitoral como a que temos no Brasil. Isso tudo começou em 1932, com esse novo Código Eleitoral. A partir daí, inclusive, nós conferimos o voto à mulher. Nós fomos um dos países que cedo admitiram o voto à mulher, aliás, antes que o fizessem alguns países da Europa, países mais desenvolvidos. Então, eu diria que esse Código Eleitoral foi um passo importante para a sociedade brasileira. (MACIEL, 2008)

Ao Código Eleitoral de 1932, seguiram-se o de 1950 e o de 1965, aprovado pela Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965, que é o código vigente. A história da Justiça Eleitoral confunde-se com a do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Criado em 1932 com o nome de Tribunal Superior de Justiça Eleitoral, seu primeiro presidente foi o Ministro Hermenegildo Rodrigues de Barros. A Constituição do Estado Novo, de 1937, outorgada por Getúlio Vargas, extinguiu a Justiça Eleitoral. O TSE foi novamente criado, já com a denominação atual, em 1945, instalando-se no dia 1o de junho e, a partir de então, figurou em todas as Constituições da República.

A Justiça Eleitoral, desde sua criação em 1932, teve sobre ela depositada grande responsabilidade e esperança. Responsabilidade, pois herdava uma prática eleitoral absolutamente fraudulenta vivenciada na República Velha. Esperança, pois, com a sua criação, esperava a classe política e social brasileira que as eleições passassem a ser limpas e verdadeiras, onde o voto votado fosse o voto apurado.

A partir de sua trajetória pode-se afirmar que a Justiça Eleitoral correspondeu às expectativas nela depositadas. Transformou as eleições brasileiras em referência, nos dias de hoje, para todo o mundo, com tecnologias do tipo votação eletrônica com apuração quase que imediata e a recente identificação do eleitor pelo sistema biométrico, artifício que se insere na segurança do voto e na certeza de que o eleitor que estiver presente estará representando a si próprio e não a terceiro. Um passo, entre outros tão arrojados e contemporâneos, que mostra a Justiça Eleitoral justificando todo o depósito de confiança e esperança que lhe foi creditado e que a cada ano tem sido correspondido.

Refêrencias bibliográficas ________________________________________________________

ASSIS BRASIL, Joaquim Francisco. Anais da Assembleia Nacional Constituinte. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, nov./dez. 1933, 1934. v. 2.
AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio. Sistema político brasileiro. 2. ed. São Paulo: UNESP, 2007.
BRAGA, Hilda Soares. Sistemas eleitorais do Brasil: 1821–1988. Brasília: Subsecretaria de Edições Técnicas do Senado Federal, 1990.
LIMA SOBRINHO, Barbosa. A verdade sobre a revolução de outubro – 1930. 3. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 1983.
MACIEL, Marco Antônio. Pronunciamento feito na sessão do Senado Federal de 31/03/2008. Publicado no Diário do Senado Federal de 1o/4/2008, p. 7.339.
MADEIRA, Luiz Carlos Lopes. Discurso proferido na sessão comemorativa dos 60 anos da justiça eleitoral. Tribunal Superior Eleitoral 60 anos. Brasília: Seção de Publicações Técnico-Eleitorais do TSE, 2005.
PORTAL SÃO FRANCISCO. A república velha. Disponível em: <http://www.colegiosaofrancisco.com.br/alfa/republica-velha/republica-velha-1.php>. Acesso em: 23 mar. 2008, 15h50.
PORTO, Walter Costa. Dicionário do voto. Brasília/São Paulo: Editora UnB/Imprensa Oficial do Estado, 1995/2000.