Transparência ativa e diálogo com a sociedade como estratégias para o tratamento da desinformação

20 de junho de 2022

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A desinformação sempre existiu em nossa sociedade. No entanto, é importante entendermos a dimensão que esse fenômeno alcançou nos últimos anos, especialmente no âmbito da revolução digital. Atualmente, vivemos uma transformação pela qual diversas ferramentas tecnológicas, como a Internet e a inteligência artificial, com as quais já estamos familiarizados há algum tempo, finalmente deixaram de ser fontes secundárias de produção de informação para se tornarem fontes primárias de como tomamos decisões, produzimos dados e construímos políticas públicas. Esse giro tecnológico é exatamente o que torna o fenômeno da desinformação muito mais dinâmico e veloz.

No âmbito desse contexto, percebemos um aumento expressivo de notícias falsas ou deturpadas sobre decisões e sobre os próprios ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive com atribuições de falas – que não aconteceram – aos membros da Corte.

Para entender e tratar esse quadro, o Supremo Tribunal Federal, sempre de ouvidos abertos à sociedade e com olhar propositivo, lançou duas importantes iniciativas de reforço institucional e de aproximação com o cidadão.

A primeira iniciativa consiste no Programa de Combate à Desinformação. O grupo de trabalho integrante desse programa, por meio de conversas com diversos setores do Estado e da sociedade civil, além de pesquisas empíricas realizadas nas plataformas digitais, procurou entender a dinâmica das práticas de desinformação que afetam a confiança do cidadão brasileiro no Supremo Tribunal Federal. O diagnóstico foi preciso: desinformação se trata com informação. Nesse sentido, o grupo propôs uma série de protocolos de comunicação para difundir informações claras, reais, objetivas e verdadeiras, em linguagem simples, sobre alguns pontos relativos à atuação do STF que têm sido mais conversados nas plataformas digitais.

Para bem cumprir essa missão, o STF firmou parcerias com entidades públicas e privadas, com destaque para universidades e pesquisadores, que colaboram para detecção das notícias falsas; realizam treinamentos e capacitações dentro e fora do STF; fornecem dados e métricas sobre as plataformas digitais; e produzem ou redirecionam informações verídicas sobre a Corte. Já são mais de 35 instituições parceiras. Como regra geral, as contribuições serão prestadas a título gratuito, não implicando gastos para o Poder Judiciário.

Os conteúdos produzidos observam as particularidades de cada público-alvo (jovens, advogados, acadêmicos, servidores públicos, população em geral e outros), seguindo, ainda, um tripé de objetivos: 1) traduzir (apresentar as decisões e as regras do tribunal em uma linguagem que permita a correta compreensão do que está sendo decidido pela Suprema Corte); 2) explicar (apresentar os atores do processo e seus argumentos, bem como as razões eleitas pelo Supremo na construção de suas decisões,); e 3) humanizar (apresentar temas relevantes que o Supremo Tribunal Federal decide ou já decidiu em favor do País e dos brasileiros ao longo das últimas décadas).

Em complemento a essa tarefa de difusão de informações corretas sobre o STF, foi instituído um protocolo de ação para casos potenciais de desinformação, garantindo previsibilidade e transparência às ações da Corte.

Todas essas iniciativas encontram-se especificadas na Resolução 742/2021, que instituiu o Programa com inspiração no sistema de proteção das liberdades de comunicação previsto na Constituição Federal de 1988 e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. A Constituição garante a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e o direito de informação e ideias de toda natureza. O Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição, tem sido paradigmático nas decisões judiciais em relação a esses temas. O País conta, ainda, com o Marco Civil da Internet, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e a Lei de Acesso à Informação, balizas normativas indispensáveis que devem ser observadas em todas as ações e iniciativas do tratamento à desinformação, que jamais pode transigir com as liberdades fundamentais dos indivíduos.

Além disso, ressalta-se que a criação do Programa está inserida no contexto do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável n° 16 da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (Paz, justiça e instituições eficazes), à qual o Supremo aderiu integralmente, que estabelece a meta de promover instituições fortes, inclusivas e transparentes em todos os níveis.

Sob essa mesma inspiração, a segunda iniciativa de aproximação com a sociedade consiste no Programa Corte Aberta, uma importante medida de aprimoramento da transparência no STF, que também se enquadra no contexto da revolução digital que estamos vivenciando. Em março de 2022, sob a liderança do Ministro Luiz Fux, após anos de esforço conjunto que ultrapassou diversas gestões, a Corte completou o seu ciclo de digitalização, passando a oferecer 100% de seus serviços judiciais e administrativos em modo on-line. O feito é histórico: o Supremo Tribunal Federal tornou-se a primeira Suprema Corte 100% digital do globo. Da visita turística guiada em suas dependências à participação nas sessões por videoconferência, o Tribunal encontra-se plenamente acessível de qualquer lugar do mundo.

Decorrência lógica desse processo de digitalização é a oportunidade do Tribunal abrir-se mais ainda à sociedade. O Corte Aberta, instituído pela Resolução 774/2022, aprimora a governança dos dados judiciais, tornando-os mais precisos, confiáveis, íntegros e acessíveis à população, consoante quatro os seus eixos de atuação: 1) a estruturação de dados, pela qual as bases de dados processuais do STF foram revisitadas para correção de inconsistências e delimitação de um novo protocolo de produção das estatísticas judiciais da Corte, tornando-as mais consistentes e acuradas; 2) a disponibilização de dados, pela qual se ampliou o inventário de dados estatísticos disponíveis à sociedade, inclusive com o aprimoramento dos painéis estatísticos do sítio eletrônico do STF; 3) a proteção de dados pessoais, que tem adequado os procedimentos e serviços de todas as unidades da Corte às exigências da LGPD; e 4) a segurança da informação, pela qual foram estabelecidos novos protocolos visando à integridade e ao funcionamento adequado dos sistemas operacionais e das páginas eletrônicas do STF.

Em suma, o Programa de Combate à Desinformação e o Programa Corte Aberta aprimoram os mecanismos de accountability do STF, melhorando a compreensão da sociedade sobre as informações produzidas pela Corte – aspecto essencial para o exercício da cidadania. Trata-se de compromisso perene e inarredável do Tribunal com a transparência ativa e com o diálogo com o cidadão.

As ações e os resultados desses dois trabalhos transversais e multidisciplinares, que contam com o esforço de duas equipe com mais de 60 integrantes, entre estatísticos, técnicos jurídicos, jornalistas, designers, desenvolvedores computacionais e outras expertises, podem ser acompanhados nas páginas dedicadas do sítio eletrônico do Supremo (https://portal.stf.jus.br/desinformacao/ e https://portal.stf.jus.br/hotsites/corteaberta/).