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Tributação dos serviços essenciais: Uma reforma para acabar com a injustiça tributária

3 de janeiro de 2019

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O sistema tributário brasileiro, tal qual descrito na trintenária Constituição Federal de 1988, forjou um modelo extremamente desestruturante e perverso, não apenas às empresas, mas substancialmente em relação ao consumo e detrimentoso à liberdade econômica e ao exercício da atividade empresarial.

Muito se discute sobre a microrreforma tributária e sua paralisação perante o Congresso Nacional, uma vez que, em tempos de crise orçamentária, a União, Estados e Municípios jamais abrem mão de suas
receitas.

A arrecadação a cada exercício fiscal ultrapassa a casa do trilhão de reais. Porém, em contrapartida, é manifesta a falência do setor público, alcançando as prefeituras, 1/3 delas sequer contando com recursos suficientes para o pagamento da folha de servidores. Vários estados estão no programa de reparcelamento de suas dívidas com a União, e esta, de seu turno, rola monstruosa dívida junto ao sistema bancário, encarecendo a taxa de juros e esmagando a cadeia produtiva e o negócio empresarial. É inconcebível que tantos trilhões vertam para o ralo, desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal, tendo sido a participação dos Tribunais de Contas, salvo raras exceções, destoante e extremamente leniente.

O principal aspecto a ser radicalmente reformado repousa na centralização do sistema em mãos da União. Apenas para que se tenha uma ideia, o Estado líder da Federação – São Paulo – arrecada cerca de R$ 550 bilhões e só consegue reaver 15%, e mesmo assim a duras penas.

Qualquer novo governo não encontrará muita consistência na repaginação da caótica Federação brasileira se não tiver a ousadia e a coragem de enfrentar esses graves problemas.

A tributação dos serviços essenciais demonstra incoerência, ilogicidade e perversidade. Não é possível que o contribuinte de menor renda esteja sujeito a mesma alíquota de outro de maior renda em relação aos serviços de luz, água, telefonia e transportes. A sugestão que se faz é que, de acordo com o consumo real, as alíquotas sejam diferenciadas entre 5% e 25%, e quando o consumo normal fosse ultrapassado, praticar-se-ia uma alíquota única de 30%. Com isso se descomplicaria o modelo e se facilitaria completamente a manobra de outros encargos nas faturas de energia elétrica e, principalmente, de telefonia celular.

O contribuinte brasileiro paga uma margem de 35% sobre o Produto Interno Bruto e mesmo assim as finanças públicas estão combalidas. Precisamos reduzir o número de Municípios e também de Estados, além de retirar das mãos da União a maléfica concentração dos tributos.

A tributação salarial também é nefasta, na medida em que o assalariado, tanto da iniciativa privada quanto do serviço público, não tem dentro de sua esfera a realização de planejamento, como fazem os grandes grupos econômicos.

A complexidade do sistema exige altíssimo custo da máquina administrativa, enormes gastos das empresas e uma justiça fiscal ineficiente, o que se incorpora à multiplicidade da legislação para catapultar aquilo que se denomina “Custo Brasil”.

Temos tributos, impostos e contribuições das mais diversas naturezas, cumulativos e não cumulativos, além do que o contribuinte é obrigado a recolher o lucro imobiliário na alienação de sua propriedade se não adquirir outro imóvel dentro de determinado lapso temporal. Ao nosso sentir, o lucro imobiliário deveria ser recolhido pelas incorporadoras e construtoras e não pelo consumidor, que na maioria das vezes faz a aquisição mediante financiamento, e com a finalidade de bem de família; não como forma de investimento, mas de moradia. Incorporadoras e construtoras que faturam milhões e entregam um padrão construtivo duvidoso deveriam pagar o lucro imobiliário, da forma como exemplificativamente se passa a definir.

Imagine-se que foram adquiridos quatro imóveis, cada um com suas respectivas matrículas, as quais serão unificadas ao tempo da incorporação com o desdobramento de matrículas individuais para o condomínio vertical. Os empresários gastaram R$ 10 milhões para a compra dos quatro imóveis e mais R$ 25 milhões para a construção do condomínio vertical, incluindo mão-de-obra e impostos diretos e indiretos, totalizando um custo de R$ 35 milhões. Ao tempo da alienação, considerando a velocidade, o financiamento e a intervenção do agente financeiro, conseguiram amealhar R$ 50 milhões. Ou seja, em três anos obtiveram um resultado positivo de R$ 15 milhões, o que daria, nessa linha de pensar, R$ 5 milhões ao ano, o que é extremamente rentável dentro das condições tipificadas. Nada impediria que fosse recolhido 5% a título de lucro imobiliário pelas empresas responsáveis pela edificação, dentro da competência do sujeito ativo da obrigação tributária, liberando assim o consumidor dessa verdadeira tributação mortífera.

Mas não é só. Para cada atividade econômica se encontra uma espécie de tributação, o que também se aplica ao agronegócio e à propriedade rural e acaba inibindo investimentos e proporcionando aquilo que se compreende como desoneração fiscal. As desonerações fiscais previstas para 2019, segundo dita a previsão, alcançarão soma superior a R$ 400 bilhões. Enquanto a desigualdade social aumenta, a injustiça tributária é prejudicial ao consumo. A nota fiscal eletrônica identifica quanto imposto é pago em qualquer operação de compra e venda ou prestação de serviços.

Nessa ótica de visão, o problema essencial dos combustíveis reflete a penúria de ideias no campo tributário, com a demora da adoção de uma matriz energética limpa, capaz de trazer benefícios ao meio ambiente. Promovemos nos governos anteriores acentuado incremento no financiamento de veículos. Boa parte dos compradores não conseguiu liquidar o valor da obrigação. Milhares de carros foram alvos de busca e apreensão pelas financeiras. O risco da cobertura do seguro cresceu vertiginosamente, e também a aquisição de combustíveis, principalmente etanol e gasolina. A greve dos caminhoneiros demonstrou a fragilidade do nosso transporte público sem conotação multimodal e a extrema carestia de preços praticados no Brasil, um país no qual mais de 60 milhões de pessoas estão na faixa limítrofe de pobreza.

Na perspectiva divisada, não é possível termos 27 legislações distintas de ICMS, contribuições – PIS, Cofins e outras de quaisquer outras naturezas, sendo que a reforma proposta poria fim ao IPI, IOF, CSLL, PIS/Pasep, Cofins, Salário Educação, CID, ICMS estadual e INSS municipal.

Na vertente da substituição seria alçado o Imposto de Valor Agregado, preservando-se as contribuições previdenciárias e passando o ITCMD para a competência federal, ao passo que o IPVA, na esfera estadual, partilharia suas receitas com os Municípios.

Seguindo as pegadas da reforma, a União ficaria com os seguintes impostos: comércio exterior, imposto de renda, imposto de propriedade territorial rural, grandes fortunas, seletivo, causa mortis e doação, extraordinários de guerra e derivados da competência residual.

No que se refere às contribuições, permaneceriam as previdenciárias, de intervenção no domínio econômico, sociais gerais (Sistema S) e aquelas ligadas às categorias profissionais; e finalmente, taxas, contribuições de melhoria e empréstimos compulsórios. A Contribuição Sobre Lucro Líquido seria incorporada pelo Imposto de Renda, com a ampliação das alíquotas.

Na esfera de competência dos Estados e do Distrito Federal ficariam os impostos sobre as operações com bens e serviços, e ainda o IPVA, contribuições para custeio da Previdência dos servidores, taxas e contribuições de melhoria.

No âmbito dos Municípios teríamos o IPTU inter vivos (ITDI), contribuições para a Previdência e custeio do serviço de iluminação pública, taxas e contribuições de melhoria.

É chegado o tempo de se colocar fim à guerra fiscal e também às consequências perversas da anistia e dos programas de parcelamento consubstanciados nos Refis. Isso porque a carga tributária está fora da maioria da capacidade contributiva e acaba levando as empresas à insolvência fiscal. Num país no qual 95% das empresas são de pequeno e médio porte, sobrevivem com folga aquelas que perfazem os demais 5%, obtendo financiamentos a juros módicos junto ao BNDES, ao Banco do Brasil e à Caixa Econômica Federal, além de outras instituições públicas.

A forma de cobrança da Dívida Ativa da Fazenda Pública é verdadeira panaceia, não apenas pela defasagem da Lei no 6.830/80, mas sobretudo pela desatualização dos cadastros e do entupimento de milhares de demandas de custo econômico insignificante na esfera judicial.

Enquanto não conseguirmos a passos largos obter uma reforma tributária racional, lógica e coerente com a maioria dos contribuintes pessoas físicas e notadamente com as sociedades empresárias, diante do concerto de serem 95% do bolo formador da cadeia produtiva, continuaremos a marchar na contramão da História e nos encastelaremos, paradoxalmente, numa arrecadação de trilhões que traz por corolário uma verdadeira tornozeleira colocada nos pés dos administradores públicos, já que a maioria apresenta orçamento engessado, sem investimento na capacitação, tecnologia e robótica. O que demonstra a insensibilidade do Parlamento e a desconfiança do contribuinte sobre o amanhã tributário no Brasil, já que a injustiça fiscal é a mais triste história da realidade do nosso modelo predatório, de pouca competitividade e nenhuma eficiência em tratar desigualmente os desiguais.