Um “gatilho”contra o desemprego

5 de maio de 2003

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Deputado Walter Feldman fala de seus projetos e sobre as propostas de reformas enviadas pelo presidente ao Congresso Nacional

O deputado Walter Feldman (PSDB-SP) ex-presidente da Assembléia Legislativa de São Paulo, membro efetivo da Comissão Especial de Reforma Tributária e presidente da Subcomissão Permanente de Ordenamento Territorial e Regiões Metropolitanas da Câmara Federal – apresentou, no início de abril, projeto de lei que cria o “gatilho desemprego” – mecanismo que objetiva reduzir o desemprego no país, considerado pela maioria da população o grande problema a ser enfrentado pelos governantes.

De acordo com sua proposta, uma vez atingido o nível de 10% – cujos indicadores serão definidos pelo Poder Executivo – será acionado o “gatilho’. A partir de então, as empresas poderão contratar novos empregados com regimes trabalhista e tributário especiais. Ou seja: com a redução das alíquotas de contribuição do PIS (Programa de Integração Social), COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e do IR (Imposto de Renda), incidentes sobre a folha de pagamentos referentes as contratações feitas após o gatilho ter sido acionado.

Nas últimas semanas, o deputado tem recebido manifestações de apoio de diversas entidades, como, por exemplo, a Força Sindical e a FIESP (Federação das Industrias do Estado de São Paulo). O projeto já está sendo analisado pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Pública da Câmara dos Deputados. Depois, segue para as comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça.

Nesta entrevista, o deputado Feldman, que é médico e atua como parlamentar desde 1982 – foi duas vezes consecutivas vereador e deputado estadual, também fala sobre as reformas tributaria e da Previdência e sobre política.

Veja a seguir trechos da entrevista por e1e concedida a esta revista.

Deputado, por que um gatilho desemprego?

Porque na situação em que nos encontramos, com mais de 12% da População Economicamente Ativa (PEA) sem ocupação, segundo dados do IBGE, com um número absurdo de pessoas vivendo de bicos, sem registro em carteira e sem direito a beneficio algum, toda medida que contribua para ampliar a quantidade de pessoas empregadas deve ser adotada. Não por acaso, a maioria dos cidadãos coloca o combate ao desemprego como a prioridade das prioridades. Sem trabalho, a pessoa perde a auto-estima, perde tudo.

Seu projeto resolve o problema?

Claro que não. Mas, se aprovado, contribuirá para torná-lo menos dramático. O que não é pouco. A solução passa pelo crescimento econômico, por investimentos em setores que, além de atenderem as demandas sociais, como habitação e saneamento básico, geram uma grande quantidade de postos de trabalho.

O atual governo alega que o desemprego elevado e uma herança da era FHC…

O PT deveria deixar de lado a esquizofrenia e assumir suas responsabilidades. Não da para ser governo e oposição a um só tempo. Agora mesmo, o governo concedeu um aumento ridículo ao funcionalismo publico, de 1 % sobre a folha de pagamentos. Poderia ter dado um reajuste maior? Seguramente. Ocorre que o governo procura, por assim dizer, criar “um colchão de credibilidade”, para agradar ao mercado. Não é por acaso que, nos primeiros meses do ano, gastou apenas 0,4% dos recursos anuais previstos para investimentos e geral é aplicação na área social. Por isso, digo que o superávit primário obtido nos primeiros meses não resulta de “mágica” da equipe econômica. É conseqüência direta de uma política que prevê – ao menos por enquanto – forte arrocho sobre as atividades públicas.

O que se pode esperar da reforma tributaria a ser aprovada pelo Congresso?

Ela, certamente, ficara aquém das expectativas. O ideal seria que a reforma desonerasse a produção, acabasse com a comutatividade dos impostos, distribuísse de forma mais adequada os recursos entre União, Estados e municípios, seduzisse a carga tributaria. Nesse primeiro momento, isso não será possível.

O que vira, então, será inútil?

Não. Deveremos ter uma legislação mais enxuta, que permita combater a sonegação fiscal, em especial do ICMS, e reduzir a carga de impostos incidentes sobre a cesta básica. Parece pouco. Mas não é.

E a reforma da Previdência?

Ela é necessária. Sempre foi. O problema é que, na oposição, o PT sempre teve um discurso. Agora, no governo, foi obrigado a se render aos fatos. Política seria se faz com coerência, princípios, mas também com o apego a fria realidade dos números. Por mais bravatas que se façam, o dinheiro não cai do céu. Dai, ser necessária a cobrança de uma contribuição de parte dos servidores inativos e o estabelecimento de um teto para as aposentadorias. Do contrario, o país estoura. E os mais pobres, de novo, continuarão pagando a parte mais pesada da contra.

Como o senhor avalia o fato de o PT ter sido eleito com uma bandeira e governar com outra?

Infelizmente, isso faz parte da nossa cultura política. Muitos políticos, como o próprio presidente da Republica admitiu publicamente, entendem que a oposição cabe o papel de fazer bravatas, criticar por criticar, prometer o que não pode ser cumprido. Daí, parte significativa do desgaste da c1asse política. O curioso é que o PT vive uma espécie de esquizofrenia: quer ser governo e oposição ao mesmo tempo, talvez para ocupar todos os espaços políticos disponíveis.